Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Nº 5001540-41.2021.4.03.0000

RELATOR: Gab. 38 - DES. FED. FAUSTO DE SANCTIS

IMPETRANTE: ARISTIDES ZACARELLI NETO, VICTOR REZENDE FERNANDES DE MAGALHAES
PACIENTE: PEDRO PEREIRA DE FREITAS, PAULO DE OLIVEIRA MEDEIROS, VICENTE DE PAULA ALVES DA CUNHA, FRANCISCO DE ASSIS FERNANDES, BENEDITO YUKIHIDE TAMASHIRO

Advogados do(a) PACIENTE: ARISTIDES ZACARELLI NETO - SP168710-A, VICTOR REZENDE FERNANDES DE MAGALHAES - SP323257-A
Advogados do(a) PACIENTE: ARISTIDES ZACARELLI NETO - SP168710-A, VICTOR REZENDE FERNANDES DE MAGALHAES - SP323257-A
Advogados do(a) PACIENTE: ARISTIDES ZACARELLI NETO - SP168710-A, VICTOR REZENDE FERNANDES DE MAGALHAES - SP323257-A
Advogados do(a) PACIENTE: ARISTIDES ZACARELLI NETO - SP168710-A, VICTOR REZENDE FERNANDES DE MAGALHAES - SP323257-A
Advogados do(a) PACIENTE: ARISTIDES ZACARELLI NETO - SP168710-A, VICTOR REZENDE FERNANDES DE MAGALHAES - SP323257-A

IMPETRADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO/SP - 6ª VARA FEDERAL CRIMINAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Nº 5001540-41.2021.4.03.0000

RELATOR: Gab. 38 - DES. FED. FAUSTO DE SANCTIS

IMPETRANTE: ARISTIDES ZACARELLI NETO, VICTOR REZENDE FERNANDES DE MAGALHAES
PACIENTE: PEDRO PEREIRA DE FREITAS, PAULO DE OLIVEIRA MEDEIROS, VICENTE DE PAULA ALVES DA CUNHA, FRANCISCO DE ASSIS FERNANDES, BENEDITO YUKIHIDE TAMASHIRO

Advogados do(a) PACIENTE: ARISTIDES ZACARELLI NETO - SP168710-A, VICTOR REZENDE FERNANDES DE MAGALHAES - SP323257-A
Advogados do(a) PACIENTE: ARISTIDES ZACARELLI NETO - SP168710-A, VICTOR REZENDE FERNANDES DE MAGALHAES - SP323257-A
Advogados do(a) PACIENTE: ARISTIDES ZACARELLI NETO - SP168710-A, VICTOR REZENDE FERNANDES DE MAGALHAES - SP323257-A
Advogados do(a) PACIENTE: ARISTIDES ZACARELLI NETO - SP168710-A, VICTOR REZENDE FERNANDES DE MAGALHAES - SP323257-A
Advogados do(a) PACIENTE: ARISTIDES ZACARELLI NETO - SP168710-A, VICTOR REZENDE FERNANDES DE MAGALHAES - SP323257-A

IMPETRADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO/SP - 6ª VARA FEDERAL CRIMINAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

O DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS:

Trata-se de Habeas Corpus, com pedido de liminar, impetrado por Aristides Zacarelli Neto, em favor de PEDRO PEREIRA DE FREITAS, PAULO DE OLIVEIRA MEDEIROS, VICENTE DE PAULA ALVES DA CUNHA, FRANCISCO ASSIS FERNANDES e BENEDITO YUKIHIDE TAMASHIRO contra ato imputado ao Juízo Federal da 6ª Vara Criminal de São Paulo /SP, nos autos da ação penal nº 5004822-08.2020.4.03.6181.

Em suas razões, o impetrante afirma que os pacientes foram denunciados pela suposta prática do delito previsto no artigo 17 da Lei nº 7.492/1986, pois teriam, em tese, entre os meses de janeiro e dezembro de 2016, na cidade de São Paulo/SP, realizado operações de crédito vedadas por lei, consubstanciadas no recebimento de adiantamentos. Sustenta, em síntese, a atipicidade da conduta à luz das alterações advindas da Lei nº 13.506/2017. Aduz que o MPF requereu a suspensão da ação penal subjacente para manifestação dos pacientes acerca do Acordo de Não Persecução Penal –ANPP. Nesse passo, requer, liminarmente, a suspensão da ação penal, incluindo a manifestação dos pacientes acerca do ANPP; no mérito, o trancamento da ação penal nº 5004822-08.2020.4.03.6181, por falta de justa causa para prosseguimento do feito.

A inicial veio acompanhada de documentação digitalizada (ID152062903, ID152062909, ID152062911, ID152062913, ID152062916 e ID1520629217).

O pedido liminar foi indeferido (ID152231641).

A autoridade impetrada prestou informações (ID152365710, ID152365711, ID152365712, ID152365713, ID152365714, ID152365715 e ID152365716).

Oficiando nesta instância, o Ministério Público Federal opinou pela denegação da ordem (ID153521073).

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Nº 5001540-41.2021.4.03.0000

RELATOR: Gab. 38 - DES. FED. FAUSTO DE SANCTIS

IMPETRANTE: ARISTIDES ZACARELLI NETO, VICTOR REZENDE FERNANDES DE MAGALHAES
PACIENTE: PEDRO PEREIRA DE FREITAS, PAULO DE OLIVEIRA MEDEIROS, VICENTE DE PAULA ALVES DA CUNHA, FRANCISCO DE ASSIS FERNANDES, BENEDITO YUKIHIDE TAMASHIRO

Advogados do(a) PACIENTE: ARISTIDES ZACARELLI NETO - SP168710-A, VICTOR REZENDE FERNANDES DE MAGALHAES - SP323257-A
Advogados do(a) PACIENTE: ARISTIDES ZACARELLI NETO - SP168710-A, VICTOR REZENDE FERNANDES DE MAGALHAES - SP323257-A
Advogados do(a) PACIENTE: ARISTIDES ZACARELLI NETO - SP168710-A, VICTOR REZENDE FERNANDES DE MAGALHAES - SP323257-A
Advogados do(a) PACIENTE: ARISTIDES ZACARELLI NETO - SP168710-A, VICTOR REZENDE FERNANDES DE MAGALHAES - SP323257-A
Advogados do(a) PACIENTE: ARISTIDES ZACARELLI NETO - SP168710-A, VICTOR REZENDE FERNANDES DE MAGALHAES - SP323257-A

IMPETRADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO/SP - 6ª VARA FEDERAL CRIMINAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

O DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS:

A ação de Habeas Corpus tem pressuposto específico de admissibilidade, consistente na demonstração primo ictu oculi da violência atual ou iminente, qualificada pela ilegalidade ou pelo abuso de poder, que repercuta, mediata ou imediatamente, no direito à livre locomoção, conforme previsão do art. 5º, inciso LXVIII, da Constituição Federal e art. 647 do Código de Processo Penal.

É sob esse prisma, pois, que se analisa a presente impetração.

Consta na denúncia que no período de 04 de janeiro a 29 de dezembro de 2016, na cidade de São Paulo/SP, PAULO DE OLIVEIRA MEDEIROS, VICENTE DE PAULA ALVES DA CUNHA e FRANCISCO ASSIS FERNANDES, na qualidade de diretores estatutários de Instituição Financeira e contando com o auxílio material de BENEDITO YUKIHIDE TAMASHIRO, responsável pela contabilidade da empresa, teriam supostamente autorizado adiantamentos da AMERICAN LIFE COMPANHIA DE SEGUROS para o diretor presidente e acionista controlador, PEDRO PEREIRA DE FREITAS, o qual teria recebido em tese, o montante de R$2.067.997,85 (dois milhões, sessenta e sete mil, novecentos e noventa e sete reais e oitenta e cinco centavos), inclusive para pagamento de suas despesas pessoais.

Nesse contexto, foram denunciados pelo delito previsto no artigo 17, caput, da Lei nº 7.492/1986, na forma da redação anterior dada pela Lei nº 13.506, de 13.11.2017 (ID 152062908).

A denúncia recebida em 26.10.2020 considerou preenchidos todos os requisitos estampados no artigo 41 do Código de Processo Penal, bem como presente a justa causa para a persecução penal, já que embasada em provas da existência de fatos que, em tese, constitui crime, e indícios suficientes de autoria. Determinou em sua decisão, a citação dos acusados, nos termos dos artigos 396 e 396-A, ambos do Código de Processo Penal (ID 152062909).

O MM. Juízo a quo deferiu o pedido do Ministério Público Federal de suspensão da ação penal para negociar possível acordo de Não Persecução Penal-ANPP, nos termos do artigo 28-A do Código de Processo Penal (ID152062913).

DAS ALTERAÇÕES INTRODUZIDAS PELA LEI N.º 13.506, DE 13 DE NOVEMBRO DE 2017(DOU 14.11.2017)

 

Na época dos fatos, o art. 17, caput, da Lei n.º 7.492/1986, assim dispunha:

 

Art. 17: Tomar ou receber, qualquer das pessoas mencionadas no art. 25 desta lei, direta ou indiretamente, empréstimo ou adiantamento, ou deferi-lo a controlador, a administrador, a membro de conselho estatutário, aos respectivos cônjuges, aos ascendentes ou descendentes, a parentes na linha colateral até o 2º grau, consanguíneos ou afins, ou a sociedade cujo controle seja por ela exercido, direta ou indiretamente, ou por qualquer dessas pessoas:

Pena - Reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa.

 

Ocorre que, a partir das alterações introduzidas pela Lei nº. 13.506/2017, as redações dos artigos 17 da Lei n.º 7.492/1986 e do art. 34 da Lei n.º 4.595/1964 passaram a ser as seguintes:

 

Art. 17. Tomar ou receber crédito, na qualidade de qualquer das pessoas mencionadas no art. 25, ou deferir operações de crédito vedadasobservado o disposto no art. 34 da Lei no 4.595, de 31 de dezembro de 1964. (Redação dada pela Lei nº 13.506, de 2017)

Pena - Reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa.

 

Art. 34. É vedado às instituições financeiras realizar operação de crédito com a parte relacionada. (Redação dada pela Lei nº 13.506, de 2017)

I - (revogado); (Redação dada pela Lei nº 13.506, de 2017)

II - (revogado); (Redação dada pela Lei nº 13.506, de 2017)

III -(revogado); (Redação dada pela Lei nº 13.506, de 2017)

IV - (revogado); (Redação dada pela Lei nº 13.506, de 2017)

V - (revogado); (Redação dada pela Lei nº 13.506, de 2017)

§ 1o (Revogado). (Redação dada pela Lei nº 13.506, de 2017)

§ 2o  (Revogado). (Redação dada pela Lei nº 13.506, de 2017)

§ 3o Considera-se parte relacionada à instituição financeira, para efeitos deste artigo: (Incluído pela Lei nº 13.506, de 2017)

I - seus controladores, pessoas físicas ou jurídicas, nos termos do art. 116 da Lei no 6.404, de 15 de dezembro de 1976;(Incluído pela Lei nº 13.506, de 2017)

II - seus diretores e membros de órgãos estatutários ou contratuais; (Incluído pela Lei nº 13.506, de 2017)

III - o cônjuge, o companheiro e os parentes, consanguíneos ou afins, até o segundo grau, das pessoas mencionadas nos incisos I e II deste parágrafo;(Incluído pela Lei nº 13.506, de 2017)

IV - as pessoas físicas com participação societária qualificada em seu capital; e (Incluído pela Lei nº 13.506, de 2017)

V - as pessoas jurídicas: (Incluído pela Lei nº 13.506, de 2017)

a) com participação qualificada em seu capital; (Incluído pela Lei nº 13.506, de 2017)

b) em cujo capital, direta ou indiretamente, haja participação societária qualificada; (Incluído pela Lei nº 13.506, de 2017)

c) nas quais haja controle operacional efetivo ou preponderância nas deliberações, independentemente da participação societária; e (Incluído pela Lei nº 13.506, de 2017)

d) que possuírem diretor ou membro de conselho de administração em comum. (Incluído pela Lei nº 13.506, de 2017)

§ 4o Excetuam-se da vedação de que trata o caput deste artigo, respeitados os limites e as condições estabelecidos em regulamentação: (Incluído pela Lei nº 13.506, de 2017):

I - as operações realizadas em condições compatíveis com as de mercado, inclusive quanto a limites, taxas de juros, carência, prazos, garantias requeridas e critérios para classificação de risco para fins de constituição de provisão para perdas prováveis e baixa como prejuízo, sem benefícios adicionais ou diferenciados comparativamente às operações deferidas aos demais clientes de mesmo perfil das respectivas instituições; (Incluído pela Lei nº 13.506, de 2017)

II - as operações com empresas controladas pela União, no caso das instituições financeiras públicas federais;(Incluído pela Lei nº 13.506, de 2017)

III - as operações de crédito que tenham como contraparte instituição financeira integrante do mesmo conglomerado prudencial, desde que contenham cláusula contratual de subordinação, observado o disposto no inciso V do art. 10 desta Lei, no caso das instituições financeiras bancárias; (Incluído pela Lei nº 13.506, de 2017)

IV - os depósitos interfinanceiros regulados na forma do inciso XXXII do caput do art. 4o desta Lei;(Incluído pela Lei nº 13.506, de 2017)

V - as obrigações assumidas entre partes relacionadas em decorrência de responsabilidade imposta a membros de compensação e demais participantes de câmaras ou prestadores de serviços de compensação e de liquidação autorizados pelo Banco Central do Brasil ou pela Comissão de Valores Mobiliários e suas respectivas contrapartes em operações conduzidas no âmbito das referidas câmaras ou prestadores de serviços; e (Incluído pela Lei nº 13.506, de 2017)

VI - os demais casos autorizados pelo Conselho Monetário Nacional. (Incluído pela Lei nº 13.506, de 2017)

§ 5o Considera-se também realizada com parte relacionada qualquer operação que caracterize negócio indireto, simulado ou mediante interposição de terceiro, com o fim de realizar operação vedada nos termos deste artigo. (Incluído pela Lei nº 13.506, de 2017)

§ 6o O Conselho Monetário Nacional disciplinará o disposto neste artigo, inclusive a definição de operação de crédito, de limites e de participação qualificada. (Incluído pela Lei nº 13.506, de 2017)

 

É certo que, de acordo com o princípio tempus regit actum, aplica-se a lei vigente ao tempo do fato, de modo que a lei penal posterior não deve, em princípio, retroagir, a menos que se trate de lex mitior, isto é, salvo se essa lei, de uma forma ou de outra, for benéfica ao acusado (inteligência do art. 5º, XL, da CF e do art. 2º, parágrafo único, do CP).

A nova redação do art. 17 da Lei n.º 7.492/1986, em termos gerais e sob alguns aspectos, favorece os acusados em geral, já que, a partir da vigência da Lei n.º 13.506/2017, foram estabelecidas seis circunstâncias em que houve abolitio criminis, isto é, seis exceções à caracterização de operação de crédito vedada (vide os seis incisos do parágrafo 4º do art. 34 da Lei n.º 4.595/1964), apesar de remeter a futura regulamentação, a saber:

 

1-Operações realizadas em condições compatíveis com as de mercado, sem benefícios adicionais ou diferenciados comparativamente às operações deferidas aos demais clientes de mesmo perfil;

2-operações com empresas controladas pela União, no caso das instituições federais;

3-operações que tenham como contraparte instituição integrante do mesmo conglomerado prudencial, desde que contenham cláusula contratual de subordinação, observada a determinação de que compete privativamente ao BACEN realizar operações de redesconto e empréstimos a instituições financeiras bancárias;

4-depósitos interfinanceiros regulados pelo CMN;

5-obrigações assumidas entre partes relacionadas em decorrência de responsabilidade imposta a membros de compensação e demais participantes de câmaras ou prestadores de serviços de compensação e de liquidação autorizados pelo BACEN ou pela CVM e suas respectivas contrapartes em operações conduzidas no âmbito das referidas câmaras ou prestadores de serviços;

6-demais casos autorizados pelo CMN.

 

Atente-se que não se há de falar em supressão da figura criminosa prevista no art. 17 da Lei n.º 7.492/1986. A conduta de deferir empréstimos, adiantamentos ou quaisquer outras operações de crédito vedadas continua incriminada (princípio da continuidade normativo-típica), não obstante as alterações introduzidas pela Lei n.º 13.506/2017. Inclusive, a pena cominada continua idêntica.

O que houve foi que, após as alterações introduzidas pela Lei n.º 13.506/2017, o art. 17 da Lei nº. 7.492/1986 tornou-se norma penal em branco, isto é, passou a necessitar do complemento oriundo do art. 34 da Lei n.º 4.595/1964 para ser aplicado, o qual descreve o conceito de operação de crédito vedada como sendo aquela realizada com parte relacionada, esta entendida como sendo controladores (pessoas físicas ou jurídicas), diretores e membros de órgãos estatutários ou contratuais e respectivos cônjuges, companheiros e parentes, consanguíneos ou afins, até o segundo grau, além de pessoas físicas com participação societária qualificada em seu capital e de pessoas jurídicas: a) com participação qualificada em seu capital, b) em cujo capital, direta ou indiretamente, haja participação societária qualificada, c) nas quais haja controle operacional efetivo ou preponderância nas deliberações, independentemente da participação societária, d) que possuírem diretor ou membro de conselho de administração em comum.

Com efeito, antes de ser alterado, o art. 17 da Lei n.º 7.492/1986 não exigia qualquer complemento para a caracterização do crime, isto é, trazia em seu próprio bojo o conceito de empréstimo ou adiantamento vedados como sendo aqueles deferidos a controlador, a administrador, a membro de conselho estatutário, aos respectivos cônjuges, aos ascendentes ou descendentes, a parentes na linha colateral até o 2º grau, consanguíneos ou afins, ou a sociedade cujo controle seja por ela exercido, direta ou indiretamente, ou por qualquer dessas pessoas. A partir das alterações introduzidas pela Lei n.º 13.506/2017, o art. 17 da Lei n.º 7.492/1986 passou a não ser mais aplicável por si só, já que, para concretizar essa norma, o intérprete precisará recorrer a complemento contido em outra lei, vale dizer, ao conceito de operações de crédito vedadas contido no art. 34 da Lei n.º 4.595/1964.

Por um lado, a nova lei é, em geral, mais favorável ao acusado, já que acrescenta seis exceções à configuração do delito (vide incisos I ao VI do parágrafo 4º do art. 34 da Lei n.º 4.595/1964), ou seja, situações em que se imporá o reconhecimento de abolitio criminis, de modo que, presentes quaisquer destas seis circunstâncias, a lei nova deverá retroagir e se aplicar aos fatos anteriores à sua vigência. Por outro, não se pode ignorar que houve, também, a ampliação do conceito de parte relacionada para incluir, p. ex., também pessoas físicas ou jurídicas com participação qualificada (cuja definição, por sua vez, será disciplinada pelo CMN, nos termos do parágrafo 6º do art. 34 da Lei n.º 4.595/1964), previsão normativa que somente se aplicará aos fatos posteriores à vigência da Lei n.º 13.506/2017. Em suma, deverá o julgador apreciar cada caso concreto à luz tanto da lei anterior quanto da lei posterior e, após comparar os resultados, escolher aquele que mais favorecer o agente.

Nesse prisma, não se verifica o alegado constrangimento ilegal.

Com efeito, as provas que instruíram o pedido não autorizam a imediata conclusão no sentido de que as exceções previstas nos incisos I a VI do parágrafo 4º do art. 34 da Lei n.º 4.595/1964 aplicar-se-iam ao caso concreto.

De outro giro, o Processo Administrativo nº 15414.609858/201704, a princípio, não foi o único que lastreou a denúncia, cuja análise demandaria dilação probatória.

Ademais, maiores incursões acerca desse e dos outros temas levantados, demandariam revolvimento fático-comprobatório, o que não se admite na via estreita do Writ.

Ante o exposto, DENEGO A ORDEM DE HABEAS CORPUS.

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ARTIGO 17 DA LEI Nº 7.492/1986. ALTERAÇÃO DO DISPOSITIVO APÓS A DATA DOS FATOS (2016) PELA LEI Nº 13.506/2017. APÓS AS ALTERAÇÕES INTRODUZIDAS PELA LEI N.º 13.506/2017, O ART. 17 DA LEI Nº. 7.492/1986 TORNOU-SE NORMA PENAL EM BRANCO, NECESSITANDO DO COMPLEMENTO ORIUNDO DO ART. 34 DA LEI N.º 4.595/1964 PARA SER APLICADO. AUSÊNCIA DE PROVAS PRÉ-CONSTITUÍDAS SUFICIENTES A AUTORIZAR A IMEDIATA CONCLUSÃO DE QUE AS EXCEÇÕES PREVISTAS NOS INCISOS I A VI, DO PARÁGRAFO 4º DO ART. 34 DA LEI N.º 4.595/1964, APLICAR-SE-IAM AO CASO CONCRETO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO DEMONSTRADO. ORDEM DE HABEAS CORPUS DENEGADA.

- Consta na denúncia que no período de 04 de janeiro a 29 de dezembro de 2016, na cidade de São Paulo/SP, PAULO DE OLIVEIRA MEDEIROS, VICENTE DE PAULA ALVES DA CUNHA e FRANCISCO ASSIS FERNANDES, na qualidade de diretores estatutários de Instituição Financeira e contando com o auxílio material de BENEDITO YUKIHIDE TAMASHIRO, responsável pela contabilidade da empresa, teriam supostamente autorizado adiantamentos da AMERICAN LIFE COMPANHIA DE SEGUROS para o diretor presidente e acionista controlador, PEDRO PEREIRA DE FREITAS, o qual teria recebido em tese, o montante de R$2.067.997,85 (dois milhões, sessenta e sete mil, novecentos e noventa e sete reais e oitenta e cinco centavos), inclusive para pagamento de suas despesas pessoais. Nesse contexto, foram denunciados pelo delito previsto no artigo 17, caput, da Lei nº 7.492/1986, na forma da redação anterior dada pela Lei nº 13.506, de 13.11.2017.

- A denúncia recebida em 26.10.2020 considerou preenchidos todos os requisitos estampados no artigo 41 do Código de Processo Penal, bem como presente a justa causa para a persecução penal, já que embasada em provas da existência de fatos que, em tese, constitui crime, e indícios suficientes de autoria. Determinou em sua decisão, a citação dos acusados, nos termos dos artigos 396 e 396-A, ambos do Código de Processo Penal.

- O MM. Juízo a quo deferiu o pedido do Ministério Público Federal de suspensão da ação penal para negociar possível acordo de Não Persecução Penal-ANPP, nos termos do artigo 28-A do Código de Processo Penal.

- Na época dos fatos, o art. 17, caput, da Lei n.º 7.492/1986, assim dispunha: Art. 17: Tomar ou receber, qualquer das pessoas mencionadas no art. 25 desta lei, direta ou indiretamente, empréstimo ou adiantamento, ou deferi-lo a controlador, a administrador, a membro de conselho estatutário, aos respectivos cônjuges, aos ascendentes ou descendentes, a parentes na linha colateral até o 2º grau, consanguíneos ou afins, ou a sociedade cujo controle seja por ela exercido, direta ou indiretamente, ou por qualquer dessas pessoas:Pena - Reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa.

- É certo que, de acordo com o princípio tempus regit actum, aplica-se a lei vigente ao tempo do fato, de modo que a lei penal posterior não deve, em princípio, retroagir, a menos que se trate de lex mitior, isto é, salvo se essa lei, de uma forma ou de outra, for benéfica ao acusado (inteligência do art. 5º, XL, da CF e do art. 2º, parágrafo único, do CP).

- A nova redação do art. 17 da Lei n.º 7.492/1986, em termos gerais e sob alguns aspectos, favorece os acusados em geral, já que, a partir da vigência da Lei n.º 13.506/2017, foram estabelecidas seis circunstâncias em que houve abolitio criminis, isto é, seis exceções à caracterização de operação de crédito vedada (os seis incisos do parágrafo 4º do art. 34 da Lei n.º 4.595/1964), apesar de remeter a futura regulamentação.

- Não se há de falar em supressão da figura criminosa prevista no art. 17 da Lei n.º 7.492/1986. A conduta de deferir empréstimos, adiantamentos ou quaisquer outras operações de crédito vedadas continua incriminada (princípio da continuidade normativo-típica), não obstante as alterações introduzidas pela Lei n.º 13.506/2017. Inclusive, a pena cominada continua idêntica.

- O que houve foi que, após as alterações introduzidas pela Lei n.º 13.506/2017, o art. 17 da Lei nº. 7.492/1986 tornou-se norma penal em branco, isto é, passou a necessitar do complemento oriundo do art. 34 da Lei n.º 4.595/1964 para ser aplicado, o qual descreve o conceito de operação de crédito vedada como sendo aquela realizada com parte relacionada, esta entendida como sendo controladores (pessoas físicas ou jurídicas), diretores e membros de órgãos estatutários ou contratuais e respectivos cônjuges, companheiros e parentes, consanguíneos ou afins, até o segundo grau, além de pessoas físicas com participação societária qualificada em seu capital e de pessoas jurídicas: a) com participação qualificada em seu capital, b) em cujo capital, direta ou indiretamente, haja participação societária qualificada, c) nas quais haja controle operacional efetivo ou preponderância nas deliberações, independentemente da participação societária, d) que possuírem diretor ou membro de conselho de administração em comum.

- Antes de ser alterado, o art. 17 da Lei n.º 7.492/1986 não exigia qualquer complemento para a caracterização do crime, isto é, trazia em seu próprio bojo o conceito de empréstimo ou adiantamento vedados como sendo aqueles deferidos a controlador, a administrador, a membro de conselho estatutário, aos respectivos cônjuges, aos ascendentes ou descendentes, a parentes na linha colateral até o 2º grau, consanguíneos ou afins, ou a sociedade cujo controle seja por ela exercido, direta ou indiretamente, ou por qualquer dessas pessoas. A partir das alterações introduzidas pela Lei n.º 13.506/2017, o art. 17 da Lei n.º 7.492/1986 passou a não ser mais aplicável por si só, já que, para concretizar essa norma, o intérprete precisará recorrer a complemento contido em outra lei, vale dizer, ao conceito de operações de crédito vedadas contido no art. 34 da Lei n.º 4.595/1964.

- Por um lado, a nova lei é, em geral, mais favorável ao acusado, já que acrescenta seis exceções à configuração do delito (vide incisos I ao VI do parágrafo 4º do art. 34 da Lei n.º 4.595/1964), ou seja, situações em que se imporá o reconhecimento de abolitio criminis, de modo que, presentes quaisquer destas seis circunstâncias, a lei nova deverá retroagir e se aplicar aos fatos anteriores à sua vigência. Por outro, não se pode ignorar que houve, também, a ampliação do conceito de parte relacionada para incluir, p. ex., também pessoas físicas ou jurídicas com participação qualificada (cuja definição, por sua vez, será disciplinada pelo CMN, nos termos do parágrafo 6º do art. 34 da Lei n.º 4.595/1964), previsão normativa que somente se aplicará aos fatos posteriores à vigência da Lei n.º 13.506/2017. Em suma, deverá o julgador apreciar cada caso concreto à luz tanto da lei anterior quanto da lei posterior e, após comparar os resultados, escolher aquele que mais favorecer o agente.

- As provas que instruíram o pedido não autorizam a imediata conclusão no sentido de que as exceções previstas nos incisos I a VI do parágrafo 4º do art. 34 da Lei n.º 4.595/1964 aplicar-se-iam ao caso concreto. De outro giro, o Processo Administrativo nº 15414.609858/201704, a princípio, não foi o único que lastreou a denúncia, cuja análise demandaria dilação probatória. Ademais, maiores incursões acerca desse e dos outros temas levantados, demandariam revolvimento fático-comprobatório, o que não se admite na via estreita do Writ.

- Ordem de Habeas Corpus denegada.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Primeira Turma, por unanimidade, denegou a ordem de habeas corpus, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.