APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5010484-78.2019.4.03.6183
RELATOR: Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOAO VITAL VASCONCELOS
Advogado do(a) APELADO: KLEBER VELOSO CERQUEIRA GONCALVES - SP246724-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5010484-78.2019.4.03.6183 RELATOR: Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: JOAO VITAL VASCONCELOS Advogado do(a) APELADO: KLEBER VELOSO CERQUEIRA GONCALVES - SP246724-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de mandado de segurança impetrado por JOÃO VITAL VASCONCELOS contra ato do Gerente Executivo do INSS da CIdade Ademar, São Paulo, objetivando que o desconto incidente sobre o benefício de aposentadoria por idade do qual é titular seja limitado a 30% (trinta por cento). Liminar deferida para determinar a suspensão do desconto dos valores do benefício de aposentadoria do impetrante (ID 144520759). A autoridade impetrada não apresentou informações. O Ministério Público Federal manifestou-se pelo prosseguimento do feito (ID 144520776). Sentença pela concessão da segurança, "para determinar à autoridade impetrada, que proceda ao desconto na aposentadoria por idade, NB 41/189.016.431-0, percebida pelo impetrante, entretanto, com a ressalva de que não poderá ultrapassar 30% do valor mensal recebido" (ID 144520778). Apelação da autarquia, na qual sustenta, em síntese, que "não se mostra crível impor ao INSS a análise em prazo exíguo do requerimento administrativo de determinado segurado por ordem judicial, quando inexistem condições fáticas e momentâneas de aplicar o mesmo entendimento para todos os demais casos pendentes de apreciação , pelo não acolhimento do pedido formulado na exordial" (ID 144520780 - Pág. 5). Sem contrarrazões, subiram os autos a esta Corte. Manifestação do Ministério Público Federal pela desnecessidade de sua intervenção (ID 144867611). É o relatório.
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5010484-78.2019.4.03.6183 RELATOR: Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: JOAO VITAL VASCONCELOS Advogado do(a) APELADO: KLEBER VELOSO CERQUEIRA GONCALVES - SP246724-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): No caso vertente, observo que a sentença recorrida determinou que o desconto na aposentadoria por idade NB 41/189.016.431-0, percebida pelo impetrante, não poderá ultrapassar 30% do valor mensal recebido. Entretanto, em suas razões, o apelante argumenta tão somente o prazo para a conclusão de pedidos administrativos, não impugnando o fundamento da sentença recorrida. Desse modo, de acordo com o disposto no art. 932, III, do Código de Processo Civil de 2015 (e art. 514, II, do CPC de 1973) o recurso não poderá ser conhecido, pois se apresenta dissociado dos fundamentos da sentença proferida. Neste sentido, o entendimento do Colendo Superior Tribunal de Justiça e desta Corte Regional: "PROCESSUAL CIVIL. RAZÕES DA APELAÇÃO DISSOCIADAS DA SENTENÇA. ART. 514, INCISO II, CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. 1. No presente caso, o recorrente, ao apresentar sua apelação, limitou-se a defender o mérito da ação, qual seja, seu direito à indenização pelas benfeitorias efetuadas no imóvel, não impugnando, em qualquer momento, o fundamento da sentença apelada que extinguiu o feito, em razão da ocorrência de coisa julgada, fundamento suficiente a manter a decisão do juízo a quo. 2. A jurisprudência desta Corte Superior é no sentido de que as razões de apelação dissociadas do que decidido pela sentença equiparam-se à ausência de fundamentos de fato e de direito, exigidos pelo art. 514, II, do CPC, como requisitos de regularidade formal da apelação. 3. Agravo regimental não provido." (STJ, Segunda Turma, AGREsp 1381583, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJE 11.09.2013). "PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO LEGAL. ART. 557, DO CPC. PENSÃO POR MORTE. RAZÕES DISSOCIADAS. 1. Cuida-se de pedido de concessão do benefício de pensão por morte decorrente do falecimento do filho da parte autora. 2. Contudo, em razões de agravo interno, pleiteia a parte autora a concessão do benefício de pensão por morte decorrente do falecimento de seu cônjuge. 3. Incumbe ao recorrente a adequada e necessária impugnação do decisum que pretende ver reformado, com exposição dos fundamentos de fato e de direito de seu recurso, de modo a demonstrar as razões de seu inconformismo com a sentença prolatada, a teor do disposto nos artigos 514, II, e 515, caput, ambos do diploma processual civil. 4. Recurso de Agravo legal a que se nega provimento." (TRF - 3ª Região, 7ª Turma, AC 0016247-61.2010.4.03.9999/SP, Relator Desembargador Federal Fausto de Sanctis, julgado em 06.05.2013, e-DJF3 Judicial 1 de 15.05.2013). Da remessa necessária. Cumpre esclarecer, inicialmente, a possibilidade de serem realizados descontos nos benefícios previdenciários, como prescrevem os artigos 115, inciso II, da Lei nº 8.213/91, e 154, §§ 2º e 3º, do Decreto nº 3.048/99, respectivamente: "Art. 115. Podem ser descontados dos benefícios: (...) II - pagamento de benefício além do devido; (...) § 1o Na hipótese do inciso II, o desconto será feito em parcelas, conforme dispuser o regulamento, salvo má-fé." "Art. 154. O Instituto Nacional do Seguro Social pode descontar da renda mensal do benefício: I - contribuições devidas pelo segurado à previdência social; II - pagamentos de benefícios além do devido, observado o disposto nos §§ 2º ao 5º; III - imposto de renda na fonte; (...) § 2º A restituição de importância recebida indevidamente por beneficiário da previdência social, nos casos comprovados de dolo, fraude ou má-fé, deverá ser atualizada nos moldes do art. 175, e feita de uma só vez ou mediante acordo de parcelamento na forma do art. 244, independentemente de outras penalidades legais. § 3º Caso o débito seja originário de erro da previdência social, o segurado, usufruindo de benefício regularmente concedido, poderá devolver o valor de forma parcelada, atualizado nos moldes do art. 175, devendo cada parcela corresponder, no máximo, a trinta por cento do valor do benefício em manutenção, e ser descontado em número de meses necessários à liquidação do débito." Quanto à possibilidade de restituição de valores recebidos a título de benefício concedido irregularmente, assim já decidiu o E. Superior Tribunal de Justiça: "PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO IRREGULARMENTE CONCEDIDO. RESTITUIÇÃO. DECRETO 5.699/2006. POSSIBILIDADE DE PARCELAMENTO. NORMA DE ORDEM PÚBLICA MAIS BENÉFICA. APLICAÇÃO IMEDIATA. DESCONTO DA INTEGRALIDADE. IMPOSSIBILIDADE. AFRONTA AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E DO CARÁTER SOCIAL DAS NORMAS PREVIDENCIÁRIAS. 1. De acordo com o art. 115 da Lei 8.213/91, havendo pagamento além do devido (hipótese que mais se aproxima da concessão irregular de benefício), o ressarcimento será efetuado por meio de parcelas, nos termos determinados em regulamento, ressalvada a ocorrência de má-fé. 2. A redação original do Decreto 3.048/99 determinava que a restituição de valores recebidos a título de benefício previdenciário concedido indevidamente em virtude de dolo, fraude ou má-fé deveria ser paga de uma só vez. Entretanto, a questão sofreu recente alteração pelo Decreto 5.699/2006, que passou a admitir a possibilidade de parcelamento da restituição também nestes casos, pelo que, sendo norma de ordem pública mais benéfica para o segurado, entende-se que tem aplicação imediata indistintamente a todos os beneficiários que estiverem na mesma situação. 3. Além disso, em vista da natureza alimentar do benefício previdenciário e a condição de hipossuficiência do segurado, torna-se inviável impor ao beneficiário o desconto integral de sua aposentadoria, uma vez que, ficando anos sem nada receber, estaria comprometida a sua própria sobrevivência, já que não teria como prover suas necessidades vitais básicas, em total afronta ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, bem como ao caráter social das normas previdenciárias, que prima pela proteção do Trabalhador Segurado da Previdência Social. 4. A fim de evitar o enriquecimento ilícito, reputo razoável o desconto de 30% sobre o valor do benefício, conforme requerido pelo segurado. 5. Recurso Especial improvido." (STJ, 5ª Turma, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, REsp 959209/MG, julgado em 16.08.2007. DJ 03.09.2007 p. 219). Desse modo, o impetrante deve restituir os valores ao INSS, os quais devem ser descontados do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição NB 42/140.546.908-8, no percentual máximo de 30% (trinta por cento). Nesse sentido, registre-se o julgado proferido nesta Corte: "PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. CONTROLE ADMINISTRATIVO. PAGAMENTO INDEVIDO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. PROCURADOR. FRAUDE. TEMPO DE SERVIÇO NÃO COMPROVADO. AUSÊNCIA DE BOA-FÉ OBJETIVA E SUBJETIVA. DESCONTO DEVIDO. ARTIGO 115, II, DA LEI 8.213/91. ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. PEDIDOS IMPROCEDENTES. SUCUMBÊNCIA RECURSAL. APELAÇÃO PROVIDA. - A Administração Pública tem o dever de fiscalização dos seus atos administrativos, pois goza de prerrogativas, entre as quais o controle administrativo, sendo dado rever os atos de seus próprios órgãos, anulando aqueles eivados de ilegalidade, bem como revogando os atos cuja conveniência e oportunidade não mais subsista. - Trata-se do poder de autotutela administrativo, enunciado nas Súmulas 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal, tendo como fundamento os princípios constitucionais da legalidade e supremacia do interesse público, desde que obedecidos os regramentos constitucionais do contraditório e da ampla defesa (artigo 5º, LIV e LV, da CF), além da Lei nº 9.784/99, aplicável à espécie. - O autor teve concedida sua aposentadoria por tempo de serviço, com DIB em 17/4/2002, tendo sido paga e mantida até 30/6/2010. Contudo, o INSS apurou a existência de irregularidade na concessão, por não haver comprovação das atividades supostamente exercidas nas empresas Gentil Valadares & Filho (entre 02/4/66 a 20/11/68), Silveira & Navarro Ltda (entre 20/5/71 a 30/9/72) e contribuições efetuadas mediante guia de recolhimento no lapso temporal de 01/7/75 a 30/9/75. - A parte autora foi notificada para se defender (f. 36). Exerceu o direito de defesa, inclusive interpondo recurso, ao qual foi negado provimento pelo 23º Junta de Recursos (f. 39 e seguintes). - Quando patenteado o pagamento a maior de benefício, o direito de a Administração obter a devolução dos valores é inexorável, ainda que tivessem sido recebidos de boa-fé, à luz do disposto no artigo 115, II, da Lei nº 8.213/91. - O direito positivo veda o enriquecimento ilícito (ou enriquecimento sem causa ou locupletamento). O Código Civil estabelece, em seu artigo 876, que, tratando-se de pagamento indevido, "Todo aquele que recebeu o que não era devido fica obrigado a restituir". Além disso, deve ser levado em conta o princípio geral do direito, positivado como regra no atual Código Civil, consistente na proibição do enriquecimento ilícito. Assim reza o artigo 884 do Código Civil: "Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários. Parágrafo único. Se o enriquecimento tiver por objeto coisa determinada, quem a recebeu é obrigado a restituí-la, e, se a coisa não mais subsistir, a restituição se fará pelo valor do bem na época em que foi exigido." - Mais recentemente, o Superior Tribunal de Justiça, em recurso repetitivo, consolidou o entendimento de que, em casos de cassação de tutela antecipada, a lei determina a devolução dos valores recebidos, ainda que se trate de verba alimentar e ainda que o beneficiário aja de boa-fé: REsp 995852 / RS, RECURSO ESPECIAL, 2007/0242527-4, Relator(a) Ministro GURGEL DE FARIA, Órgão Julgador, T5 - QUINTA TURMA, Data do Julgamento, 25/08/2015, Data da Publicação/Fonte, DJe 11/09/2015. - No caso tratado neste feito, a parte autora recebeu prestações do benefício de forma fraudulenta, porque concedido com base em documento viciado por falsidade ideológica. Assim sendo, considerando que foi o próprio segurado quem se beneficiou da falsidade, deve restituir os valores ao INSS. - A parte autora alega que as verbas não podem ser devolvidas, porquanto de natureza alimentar, porque não teria se utilizado de qualquer artimanha ou fraude contra a previdência social. Porém, tais alegações não se sustentam, à vista do conjunto probatório, afigurando-se inverossímil a alegação de boa-fé, pois o autor alega que agiu por intermédio de um procurador "o qual não lembra mais o nome" (sic). - De qualquer forma, como explicado acima, nem o artigo 884 do Código Civil, nem o artigo 115, II, da Lei nº 8.213/91 exigem - para a devolução do indevido - comprovação de dolo do beneficiado, ou mesmo condenação como coautor no processo criminal. Para além, em casos de comprovada falsidade, caberia ao segurado provar que dela não participou e dela não tinha ciência, pois o contexto lhe é desfavorável, presumindo-se a ciência dos atos praticados por seu procurador no procedimento de concessão de seu benefício. Caberá ao autor, querendo, ressarcir-se junto ao agente criminoso porquanto, à luz do direito, o ente público deve ser indenizado por quem se beneficiou da fraude. - No caso, a devolução é imperativa porquanto se apurou a ausência de boa-fé objetiva (artigo 422 do Código Civil). - O patrimônio público merece prioridade, no caso. Ademais, o princípio da moralidade administrativa, conformado no artigo 37, caput, da Constituição da República, obriga a autarquia previdenciária a efetuar a cobrança dos valores indevidamente pagos, na forma do artigo 115, II, da Lei nº 8.213/91. - Invertida a sucumbência, condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, já majorados em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 4º, III, do Novo CPC. Porém, fica suspensa a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do referido código, por ser beneficiária da justiça gratuita. - Apelação do INSS provida." (TRF - 3ª Região, Relator Juiz Convocado Rodrigo Zacharias, 9ª Turma, AC 0003867-32.2015.4.03.6183/SP, julgado em 31.07.2017, e-DJF3 Judicial 1 de 15.08.2017). Sem condenação em honorários advocatícios, consoante o disposto no art. 25 da Lei nº 12.016/2009 e nas Súmulas 105 do STJ e 512 do STF. Diante do exposto, não conheço da apelação do INSS, no termos do art. 932, III, do CPC/2015, e nego provimento à remessa necessária nos termos expostos. É como voto.
E M E N T A
MANDADO DE SEGURANÇA. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. FRAUDE. DESCONTO DEVIDO. LIMITE DE 30 POR CENTO. APELAÇÃO. RAZÕES DISSOCIADAS. REMESSA NECESSÁRIA DESPROVIDA.
1. As razões recursais não guardam sintonia com os fundamentos apresentados pela sentença recorrida, de modo que não merece ser conhecido o recurso.
2. Nos casos de concessão irregular de benefício previdenciário, o ressarcimento dos valores indevidamente recebidos poderá ser feito em parcelas, nos termos dos artigos 115, II, da Lei nº 8.213/91 e 154, §§ 2º e 3º, do Decreto nº 3.048 /99.
3. O impetrante deve restituir os valores indevidamente recebidos ao INSS, os quais devem ser descontados do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição do qual é titular atualmente, no percentual máximo de 30% (trinta por cento).
4. Consoante o disposto no art. 25 da Lei nº 12.016/2009 e nas Súmulas 105 do STJ e 512 do STF, não cabe condenação em honorários advocatícios em mandado de segurança.
5. Apelação do INSS não conhecida. Remessa necessária desprovida.