Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000434-11.2020.4.03.6004

RELATOR: Gab. 03 - DES. FED. HELIO NOGUEIRA

APELANTE: DANILO MAGNO ESPINDOLA FILARTIGAS

Advogado do(a) APELANTE: LUCAS LEMOS NAVARROS - MS12914-A

APELADO: UNIÃO FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000434-11.2020.4.03.6004

RELATOR: Gab. 03 - DES. FED. HELIO NOGUEIRA

APELANTE: DANILO MAGNO ESPINDOLA FILARTIGAS

Advogado do(a) APELANTE: LUCAS LEMOS NAVARROS - MS12914-A

APELADO: UNIÃO FEDERAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

 

 

 

 

O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA (RELATOR):

 

Trata-se de Apelação interposta pelo autor, Delegado de Polícia Federal, contra sentença que ratificou a liminar e denegou a segurança, em que objetivava ordem para que seja autorizada a sua imediata promoção na à classe especial da carreira de Delegado da Polícia Federal, com efeitos financeiros retroativos à data de 06 de março de 2020.

 

Em suas razões recursais, o autor repisa a inicial e pretende seja considerado como tempo de efetivo exercício na carreira do Apelante o período anterior ao cumprimento da suspensão disciplinar acrescidos do tempo posterior para efeitos de promoções, aduzindo que:

a) a decisão proferida pela Autoridade Impetrada que indeferiu o pedido de promoção se pautou na Portaria Interministerial nº 23/98, que fixou em seu art. 9º como causa de interrupção do interstício legal previsto no decreto regulamentador n. 7.014/09, dentre outros, “o afastamento disciplinar ou preventivo”,  

b) pede seja reconhecida a ilegalidade da previsão contida na hipótese/causa de interrupção do prazo de interstício para fins de progressão funcional na carreira policial federal fixada pela portaria interministerial n. 23/98, que não detém competência ou reserva legal para fazê-lo, o que, certamente, violou o direito líquido e certo do impetrante à promoção que faz jus;

c) alega que a interpretação razoável do decreto regulamentador n. 7.014/09, seria que período de cumprimento da pena disciplinar de suspensão pelo apelante, ocorrida entre 03 e 06 de agosto de 2016, totalizando-se 4 (quatro) dias devem ser descontados do período referente ao prazo de interstício de 5 (cinco) anos necessários à progressão funcional pretendida;

d) sustenta ser incontroverso o preenchimento de todos os demais requisitos exigidos nos incisos II e III do art. 3º do decreto 7.014/09.

 

Com contrarrazões da União, os autos vieram a esta Corte Regional.

O Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento do apelo do autor.

Dispensada a revisão, nos termos regimentais.

 

É o relatório.

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000434-11.2020.4.03.6004

RELATOR: Gab. 03 - DES. FED. HELIO NOGUEIRA

APELANTE: DANILO MAGNO ESPINDOLA FILARTIGAS

Advogado do(a) APELANTE: LUCAS LEMOS NAVARROS - MS12914-A

APELADO: UNIÃO FEDERAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

 

 

 

O Exmo. Desembargador Federal HÉLIO NOGUEIRA (Relator):

 

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

 

A matéria devolvida ao exame desta Corte será examinada com base na fundamentação que passo a analisar topicamente.

 

Da progressão funcional

 

O autor, Delegado de Polícia Federal, postula seja considerado o período de cumprimento da penalidade disciplinar que lhe fora aplicada (suspensão de quatro dias) uma causa de suspensão do interstício para a progressão, e não causa interruptiva, de modo a ser possível o aproveitamento do lapso laboral anterior à aplicação da penalidade como tempo de efetivo exercício para fins de promoção na carreira.

 

A controvérsia instaurada nos autos encontra disciplina na Lei nº 9.266/1996, e alteração da redação dada pela Lei nº 11.095/2005, nos seguintes termos:

 

Art. 2° O ingresso nos cargos da Carreira Policial Federal far-se-á mediante concurso público, exigido o curso superior completo, em nível de graduação, sempre na 3ª (terceira) classe, observados os requisitos fixados na legislação pertinente. (Redação dada pela Lei n. 11.095, de 2005).

§ 1° O Poder Executivo disporá, em regulamento, quanto aos requisitos e condições de progressão e promoção na Carreira Policial Federal. (Renumerado com nova redação dada pela Lei n. 11.095, de 2005) (vide Decreto n. 7.014, de 2009).

§ 2° Além dos requisitos fixados em regulamento, é requisito para promoção nos cargos da Carreira Policial Federal a conclusão, com aproveitamento, de cursos de aperfeiçoamento, cujos conteúdos observarão a complexidade das atribuições e os níveis de responsabilidade de cada classe. (Incluído pela Lei n. 11.095, de 2005).

 

A regulamentação a que alude a referida Lei veio a ser editada por meio do Decreto n. 2.565/1998, que estabelecia:

 

Art. 1º Aos servidores integrantes da Carreira Policial Federal, instituída pelo art. 12 do Decreto-Lei nº 2.251, de 26 de fevereiro de 1985, e reorganizada pela Lei nº 9.266, de 15 de março de 1996, aplicar-se-á o instituto de progressão de acordo com as normas constantes neste Decreto.

Art. 2º A progressão consiste na mudança de classe em que esteja posicionado o servidor, para a imediatamente superior.

Art. 3º São requisitos cumulativos para a progressão na Carreira Policial Federal:

I - avaliação de desempenho satisfatório;

II - cinco anos ininterruptos de efetivo exercício na classe em que estiver posicionado.

§ 1º A progressão da Primeira Classe para a Classe Especial da Carreira Policial Federal depende ainda de conclusão, com aproveitamento, do curso Superior de Polícia para os ocupantes de cargos de Delegado de Polícia Federal, Perito Criminal Federal, Censor Federal, e do curso Especial de Polícia para os ocupantes dos cargos de Agente de Polícia Federal, Escrivão de Polícia Federal e Papiloscopista Policial Federal.

§ 2º A avaliação de que trata o inciso I será realizada pela chefia imediata do servidor e confirmada pela autoridade superior, anualmente, até 30 de outubro de cada ano, devendo contemplar, necessariamente, os resultados alcançados pelo servidor no desempenho do seu cargo ou função.

§ 3º Os cursos referidos no §1º deste artigo serão realizados pela Academia Nacional de Polícia ou por entidade oficial de ensino policial de graduação equivalente, nacional ou estrangeira, devidamente reconhecida pela Academia Nacional de Polícia.

§ 4º A avaliação do servidor ao final do interstício de cinco anos será apurada pela média dos resultados obtidos no período.

§ 5º O servidor que não atingir o desempenho satisfatório para a progressão permanecerá na mesma classe até que a média dos resultados dos últimos cinco anos de avaliação seja considerada satisfatória.

 

Registre-se que a partir de 24.11.2009, a promoção no âmbito da Polícia Federal passou a ser regulamentada pelo Decreto nº 7.014, in verbis:

 

Art. 2º  A promoção consiste na mudança de classe em que esteja posicionado o servidor para a classe imediatamente superior.

Art. 3º  São requisitos para promoção nos cargos da Carreira Policial Federal:

I -  exercício ininterrupto do cargo:

a) na terceira classe, por três anos, para promoção da terceira para a segunda classe;

b) na segunda classe, por cinco anos, para promoção da segunda para a primeira classe;

c) na primeira classe, por cinco anos, para promoção da primeira para a classe especial;

II - avaliação de desempenho satisfatória; e

III - conclusão, com aproveitamento, de curso de aperfeiçoamento.

Parágrafo único.  Interrompido o exercício, a contagem do interstício começará a correr a partir do retorno do servidor à atividade.

 

Por sua vez, a Portaria Interministerial n. 23, de 13.07.1998, ao definir critérios para avaliação de desempenho para fins de progressão, também estabeleceu em seu art. 9º, II, as hipóteses de interrupção do interstício para fins de progressão. Confira-se:

 

Art. 9º O interstício será interrompido em decorrência de:

I - licença a qualquer título sem remuneração;

II - afastamento disciplinar ou preventivo;

III - prisão.(...)

 

Da leitura dos excertos acima, verifica-se que a própria lei que rege a carreira do autor, Lei n. 9.266/96, no seu art. 2º, §1º, confere ao Poder Executivo, via regulamento, a legitimidade de normatizar os critérios de progressão funcional, porquanto não previu tais requisitos.

 

Esta regulamentação veio a ser feita por meio dos decretos e portaria acima referidos, de cuja leitura resta cristalina a interpretação de que a progressão funcional não é direito subjetivo do servidor, mas decorrente de procedimento completo que se inicia com o preenchido de diversos requisitos, dentre eles o interstício ininterrupto de tempo.

 

Portanto, não vislumbro qualquer ilegalidade no que tange à extrapolação de limites de competência.

 

Curial destacar, ainda, que tais regulamentos referem-se expressamente às hipóteses de interrupção. Note-se que a portaria interministerial suprarreferida é explícita quanto à interrupção causada por afastamento disciplinar.

 

Desse modo, interrompido o interstício em decorrência do afastamento disciplinar, a contagem do prazo para a progressão deve ter reinício quando do retorno do autor à atividade, não sendo permitido, neste caso, complementar o período de serviço anterior ao cumprimento da penalidade.

 

Nesse sentido:

 

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. POLÍCIA FEDERAL. PROMOÇÃO E PROGRESSÃO. DECRETO N. 7.014/2009. PENA DE SUSPENSÃO. INTERRUPÇÃO DO INTERSTÍCIO. ENCERRAMENTO DA PENALIDADE. RETOMADA DA CONTAGEM. PERÍODO ININTERRUPTO. DESCONSIDERAÇÃO TÃO SOMENTE DO LAPSO REFERENTE À PENALIDADE DE SUSPENSÃO. IMPOSSIBILIDADE 1. A Lei n. 9.266/96, que reorganiza as classes da Carreira Policial Federal dispõe acerca da progressão e promoção na Carreira da Polícia Federal e determina como um dos requisitos, a conclusão, com aproveitamento, de cursos de aperfeiçoamento cujos conteúdos observarão a complexidade das atribuições e responsabilidades de cada classe. 2. O Decreto n. 7.014/09 disciplinou os requisitos para promoção na Carreira Policial Federal e em seu artigo 3º, inciso I estabelece como um dos requisitos para a promoção, o exercício ininterrupto do cargo. 3. Ao prescrever que, no caso de interrupção do exercício, os prazos previstos no inciso I começam a contar a partir do retorno do servidor à atividade, o parágrafo único do artigo 3º do Decreto nº 7.014/09 previu a retomada da contagem do prazo a partir do momento em que a penalidade foi aplicada, desprezando o período anterior. 4. Inexistência de lei que desautorize esse Decreto, até porque os institutos da progressão e promoção pressupõem exercício funcional legítimo e com mérito e, atento a isso, o Decreto não fez mais que interpretar a norma ao prever a necessidade de exercício ininterrupto do cargo para obtenção da progressão. 5. Conformidade com os princípios da razoabilidade e da isonomia, visto que é razoável que o servidor punido disciplinarmente não obtenha promoção nas mesmas condições que aquele que não cometeu nenhum ilícito. 6. Apelação desprovida. Sentença mantida. A Turma, à unanimidade, negou provimento à apelação.

(AC 0003676-44.2012.4.01.3500, JUIZ FEDERAL CESAR AUGUSTO BEARSI, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, e-DJF1 DATA: 03/10/2018 PAGINA:.)

 

PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RETORNO DO STJ. ADMINISTRATAIVO. POLICIAL FEDERAL. PROGRESSÃO FUNCIONAL. PENALIDADE DE SUSPENÇÃO. INTERRUPÇÃO DO INTERSTÍCIO. 1. In casu, pode-se afirmar que houve a interrupção do exercício no cargo em razão de afastamento disciplinar, gerando nova contagem do interstício a partir do retorno do servidor à atividade, nos termos do parágrafo único do art. 3º do Decreto nº 7.014/09. 2. Com efeito, não há inconstitucionalidade em relação aos requisitos e condições previstos no Regulamento - Decreto nº 7.014/09-, uma vez que a Lei nº 9.266/96 o legitima, em face de não ter estabelecido requisitos para a progressão funcional, tendo apenas determinado ao Poder Executivo que dispusesse a esse respeito por meio de regulamento (§1.º do art. 2º da Lei nº 9.266/96). 3. Diante disso, considerando que os atos administrativos são atrelados aos ditames da lei, não seria exigível outra atitude da parte ré, em relação à interrupção do interstício de progressão funcional do autor, que foi penalizado com suspensão disciplinar de 4 (quatro) dias, razão pela qual não se trata de ato discricionário, sendo inquestionável a sua razoabilidade e/ou proporcionalidade. 4. De outra parte, o tratamento isonômico invocado pelo autor equivale à regra de tratamento igual àqueles que se encontram na mesma categoria, ou seja, aos que estejam nas mesmas condições. No presente caso, somente haveria ofensa ao princípio da isonomia se houvesse tratamento diferenciado, em detrimento do autor, que beneficiasse os demais que se encontram na mesma situação, o que não restou demonstrado no caso em tela. 5. Embargos parcialmente providos tão-somente para fins de esclarecimentos, sem efeitos infringentes.

(TRF4 5011787-25.2011.4.04.7107, TERCEIRA TURMA, Relator CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ, juntado aos autos em 11/06/2015)

 

Quanto ao tema, o Colendo Superior Tribunal de Justiça já se posicionou no sentido de que o interstício de progressão é interrompido em caso de imposição de penalidade de suspensão, reiniciando-se o prazo após o cumprimento da pena.

 

Essa a orientação ilustrada na recente decisão monocrática:

 

RECURSO ESPECIAL Nº 1.734.547 - SP (2018/0075030-8)

RELATOR: MINISTRO HERMAN BENJAMIN

RECORRENTE: UNIÃO

RECORRIDO: FABIANO FRANCO DO NASCIMENTO

ADVOGADO: KEYTHIAN FERNANDES DIAS PINHEIRO E OUTRO(S) - SP234886

DECISÃO

Trata-se de Recurso Especial contra acórdão do TRF da 3ª Região

assim ementado:

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. PROCESSAMENTO DO RECURSO DE APELAÇÃO NO DUPLO EFEITO. CONCESSÃO DE TUTELA ANTECIPADA. ART. 520, VII, DO CPC. POLÍCIA FEDERAL. PARTICIPAÇÃO EM CURSO DE APERFEIÇOAMENTO. PROMOÇÃO. DECRETO N. 7.014/09. PENA DE SUSPENSÃO. INTERRUPÇÃO DO INTERSTÍCIO. ENCERRAMENTO DA PENALIDADE. RETOMADA DA CONTAGEM. PERÍODO ININTERRUPTO. DESCONSIDERAÇÃO TÃO-SOMENTE DO LAPSO

REFERENTE À PENALIDADE DE SUSPENSÃO. 1. Em face do disposto no artigo 14 da Lei n. 13.105/2015, aplica-se a esse processo o CPC/73.

2. Recebimento do recurso, apenas no efeito devolutivo, tendo em vista o disposto no art. 520, VII, do CPC.

3. Cinge-se a controvérsia à legalidade do parágrafo único do artigo 3o, do Decreto n° 7.014/09 que, regulamentando a Lei n° 9.266/96, determinou que, para fins de promoção na carreira da Polícia Federal, não se admite interrupções na contagem do tempo de serviço.

4. A Lei 9.266/96 não previa essa nova contagem de prazo, no caso de interrupção do tempo de serviço. Essa inovação trazida pelo Decreto n.° 7.014/09 extrapolou os limites do seu poder regulamentar, trazendo prejuízos à esfera jurídica do apelado, uma vez que ampliou os efeitos da penalidade administrativa imposta.

5. O poder regulamentar foi além do conteúdo da lei, inovando no Ordenamento Jurídico, pelo que o Poder Judiciário tem o poder/dever de controle.

6. Apelação e Reexame Necessário improvidos.

A União interpõe o presente Recurso Especial alegando afronta ao art. 2º da Lei 9.266/1996 e art. 3º do Decreto 7.014/2009, que estabelecem regras para a promoção do servidor público da Carreira Policial Federal.

É o relatório.

Decido.

Cuida-se, na origem, de Ação Declaratória c/c Pedido de Tutela Antecipada proposta por servidor público federal contra a União com o objetivo de permitir sua participação em curso de aperfeiçoamento, requisito necessário a sua promoção no cargo público da Carreira Policial Federal.

Argumenta a ilegalidade do parágrafo único do art. 3º do Decreto 7.014/2009, que, ao fixar como condição na promoção na carreira o cumprimento de prazo de exercício ininterrupto, estabeleceu que, "interrompido o exercício, a contagem do interstício começará a correr a partir do retorno do servidor à atividade".

Segundo o entendimento da Administração, a aplicação da penalidade disciplinar de suspensão interrompe a contagem do interstício temporal necessário à promoção (3 ou 5 anos), devendo o servidor demonstrar o atendimento do período integral previsto na legislação para fins de promoção, após o término da sanção disciplinar, como previsto no decreto regulamentar (parágrafo único, art. 3º do Decreto 7.014/2009).

A sentença julgou procedente a ação para "declarar que deve ser considerado, para os fins almejados, o tempo de exercício do autor no cargo antes do início do cumprimento da penalidade administrativa imposta, retomando-se sua contagem a partir de quando findou a suspensão aplicada".

Argumenta a parte recorrente: não existe progressão automática pelo mero preenchimento do requisito temporal; o Decreto 7.014/2009 não ofende a Lei 9.266/1996; a promoção é condicionada à avaliação de desempenho satisfatória e 5 (cinco) anos ininterruptos de efetivo exercício; e, interrompido o exercício do cargo pela aplicação de penalidade disciplinar, é necessário o cumprimento do período integral previsto no decreto regulamentar para que o servidor se habilite a concorrer à promoção.

O Tribunal de origem negou provimento à Apelação aduzindo: "a Lei 9.266/1996 não previa essa nova contagem de prazo, no caso de interrupção do tempo de serviço. Essa inovação trazida pelo Decreto n.° 7.014/09 extrapolou os limites do seu poder regulamentar, trazendo prejuízos à esfera jurídica do apelado, uma vez que ampliou os efeitos da penalidade administrativa imposta".

Os §§ 1º e 2º do art. 2º da Lei 9.266/1996 estabelecem que "O Poder Executivo disporá, em regulamento, quanto aos requisitos e condições de progressão e promoção na Carreira Policial Federal" e que, "Além dos requisitos fixados em regulamento, é requisito para promoção nos cargos da Carreira Policial Federal a conclusão, com aproveitamento, de cursos de aperfeiçoamento, cujos conteúdos observarão a complexidade das atribuições e os níveis de responsabilidade de cada classe".

Já o Decreto 7.014/2009 detalhou as regras a serem atendidas para que o servidor da Carreira Policial Federal seja promovido, exigindo o exercício ininterrupto do cargo por 3 (três) ou 5 (cinco) anos, conforme o caso, avaliação de desempenho satisfatória e conclusão, com aproveitamento, de curso de aperfeiçoamento.

Decreto 7.014/2009:

Art. 1º Aos servidores integrantes da Carreira Policial Federal, instituída pelo art. 1º do Decreto-Lei no 2.251, de 26 de fevereiro de 1985, e reorganizada pela Lei no 9.266, de 15 de março de 1996, aplicar-se-ão os requisitos e condições de promoção de acordo com as normas constantes deste Decreto.

Art. 2º A promoção consiste na mudança de classe em que esteja posicionado o servidor para a classe imediatamente superior.

Art. 3º São requisitos para promoção nos cargos da Carreira Policial Federal:

I - exercício ininterrupto do cargo:

a) na terceira classe, por três anos, para promoção da terceira para

a segunda classe;

b) na segunda classe, por cinco anos, para promoção da segunda para

a primeira classe;

c) na primeira classe, por cinco anos, para promoção da primeira

para a classe especial;

II - avaliação de desempenho satisfatória; e

III - conclusão, com aproveitamento, de curso de aperfeiçoamento.

Parágrafo único. Interrompido o exercício, a contagem do interstício começará a correr a partir do retorno do servidor à atividade.

O parágrafo único do art. 3º do Decreto 7.014/2009 prescreve a necessidade de recontagem do prazo de exercício no cargo público para tornar o servidor interessado apto à promoção, nos casos em que seu exercício foi interrompido.

Decreto 7.014/2009:

Art. 3º São requisitos para promoção nos cargos da Carreira Policial Federal:

(...)

Parágrafo único. Interrompido o exercício, a contagem do interstício começará a correr a partir do retorno do servidor à atividade.

O Tribunal a quo entendeu ter havido, no caso da disciplina normativa da promoção dos servidores que integram o corpo funcional da Polícia Federal, exorbitância no poder regulamentar da União quando editou o Decreto 7.014/2009 e dispôs ser necessária a recontagem do período integral de exercício nos casos em que o servidor candidato à promoção tiver aplicada em seu desfavor penalidade disciplinar de suspensão.

Entendo que merece prosperar o Recurso Especial da União.

A disciplina normativa da promoção na carreira da polícia federal está regulamentada em Decreto regulamentar por força de autorização legislativa expressa da Lei 9.266/1996, a qual prescreve, no §1º do art. 2º, que a União disciplinará em regulamento os requisitos e condições de progressão e promoção na Carreira Policial Federal.

Lei 9.266/1996:

Art. 2º A Carreira Policial Federal é composta por cargos de nível superior, cujo ingresso ocorrerá sempre na terceira classe, mediante concurso público, de provas ou de provas e títulos, exigido o curso superior completo, em nível de graduação, observados os requisitos fixados na legislação pertinente. (Redação dada pela Lei nº 13.034, de 2014)

§ 1º O Poder Executivo disporá, em regulamento, quanto aos requisitos e condições de progressão e promoção na Carreira Policial Federal. (Renumerado com nova redação dada pela Lei nº 11.095, de 2005) (Vide Decreto nº 7.014, de 2009).

§ 2º Além dos requisitos fixados em regulamento, é requisito para promoção nos cargos da Carreira Policial Federal a conclusão, com aproveitamento, de cursos de aperfeiçoamento, cujos conteúdos observarão a complexidade das atribuições e os níveis de responsabilidade de cada classe. (Incluído pela Lei nº 11.095,

de 2005)

O legislador autorizou o Poder Executivo a disciplinar mediante decreto regulamentar o processo de promoção dos servidores da Carreira Policial Federal, não havendo exorbitância ou edição de ato normativo contra legem ou decreto autônomo sem sustentação legal.

Não entendo desarrazoada a previsão normativa do Decreto 7.014/2009

que estabeleceu, dentre os critérios necessários à promoção na carreira, o exercício contínuo e ininterrupto de 3 ou 5 anos no cargo público, exigindo-se o reinício da contagem do referido período caso tenha ocorrido qualquer fato suspensivo do exercício funcional, a exemplo da punição na esfera disciplinar.

Entendimento diverso, para permitir que, no caso concreto, a parte recorrida seja dispensada de comprovar o exercício efetivo e contínuo do período laboral, seria conferir-lhe posição funcional mais vantajosa em relação aos demais servidores públicos que, da mesma forma, deixaram de concorrer para a formação da lista de promoção.

O STJ já reconheceu a possibilidade da regulamentação da promoção de

servidores públicos mediante Decreto, complementando a disciplina normativa estabelecida em lei específica. A propósito:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. SERVIDOR PÚBLICO. ANCINE. PROMOÇÃO E PROGRESSÃO FUNCIONAL. ANUALIDADE. LEI 10.871/2004. DECRETO 6.530/2008. LEGALIDADE.

1. Examina-se, no Recurso Especial, se o Decreto 6.530/2008 teria extrapolado os limites da Lei 10.871/2004 ao regulamentar situação pretérita estabelecendo o reposicionamento de um padrão a cada 18 (dezoito) meses, em possível contrariedade à anualidade consagrada na Lei. 2. O desenvolvimento dos servidores, através de progressão e promoção funcionais, deverá obedecer ao princípio da anualidade, mas

somente de acordo com a "sistemática de avaliação de desempenho, capacitação e qualificação funcionais", a qual dependia de regulamento específico (art. 10, § 1º). 3. Durante o período em que não houve regulamentação da forma e dos critérios de avaliação, não era exigível progressão ou promoção automática. 4. Não há, pois, contraposição entre os termos do Decreto 6.530/2008 e da Lei 10.871/2004, mas apenas a regulamentação do período descoberto em função da demora na regulamentação exigida. 5. Recurso Especial não provido.

(REsp 1.669.409/RJ, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma,

julgado em 20/6/2017, DJe 30/6/2017)

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. PROMOÇÃO POR ESCOLARIDADE ADICIONAL. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. INOBSERVÂNCIA DOS REQUISITOS PREVISTOS EM RESOLUÇÃO. RECURSO NÃO PROVIDO.

1. Trata-se, na origem, de Mandado de Segurança contra ato do Governador do Estado de Minas Gerais e outro, que indeferiu requerimento de promoção por escolaridade adicional, uma vez que a

pós-graduação em "Direito Educacional no Processo Ensino-Aprendizagem" não tem relação com a natureza e a complexidade da carreira de Auditor Fiscal.

2. A Lei Estadual 15.464/2005 delegou ao Decreto 44.796/2008 a tarefa de regular a progressão ou promoção por escolaridade adicional. Tal decreto condiciona sua eficácia à publicação de resolução que defina critérios e procedimentos para a comprovação da escolaridade, análise da documentação, bem como modalidades de cursos e áreas de conhecimento e de formação aceitas, tal como fez a Resolução Conjunta 6.582/2008. Não há, a priori, violação do princípio da legalidade.

3. A referida resolução sujeita a promoção à prova de "formação superior à exigida para o nível de posicionamento na carreira, compatível com a natureza e atribuições específicas do cargo". Não é possível estabelecer, nos limites da cognição do Mandado de Segurança, correlação imediata entre a especialização em "Direito Educacional no Processo Ensino-Aprendizagem" e a atividade-fim de um auditor fiscal.

4. Seria necessária a manifestação de expert para cotejar o conteúdo programático do curso de pós-graduação em Direito Educacional com as atividades do auditor fiscal para apurar a representatividade dos créditos em estatística perante o todo, atividade incompatível com o trâmite do writ.

5. Agravo Regimental não provido.

(AgRg no RMS 39.018/MG, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda

Turma, julgado em 11/2/2014, DJe 7/3/2014)

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO. IDONEIDADE MORAL. REQUISITO PREVISTO NA LEGISLAÇÃO QUE DISCIPLINA A PROMOÇÃO DE PRAÇAS DA POLÍCIA MILITAR. PUNIÇÃO POR INSUBORDINAÇÃO. AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO.

1. A concessão da Segurança pressupõe a demonstração de direito

líquido e certo.

2. Hipótese em que o recorrente qualifica como ilegal o ato que indeferiu a promoção na carreira da Polícia Militar, ao argumento de que a punição (10 dias de detenção) por insubordinação não constitui obstáculo.

3. O art. 13 do Decreto estadual 2.468/2010, que regulamenta as promoções de Praças da Polícia Militar do Estado de Mato Grosso, estabelece como requisitos "estar no mínimo no comportamento bom" e

"ser considerado possuidor de idoneidade moral".

4. Nas instituições de caráter militar, a disciplina ("exato cumprimento dos deveres, rigorosa observância e acatamento integral das leis, regulamentos, normas e ordens", conforme o art. 24 da Lei Complementar 231/2005) é um dos elementos essenciais.

5. Nesse contexto, a punição por insubordinação afasta a existência de direito líquido e certo à promoção.

6. Recurso Ordinário não provido.

(RMS 41.188/MT, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 21/5/2013, DJe 24/5/2013)

ADMINISTRATIVO. MILITAR DO EXÉRCITO. EXCLUSÃO DO QUADRO DE ACESSO À PROMOÇÃO POR ANTIGUIDADE E MERECIMENTO. LEI Nº 5.821/72. DECRETO Nº 3.998/2001. LEGALIDADE DO ATO. OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA PRESUNÇÃO DA INOCÊNCIA, RESERVA LEGAL, CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. INOCORRÊNCIA. PRECEDENTES. ORDEM DENEGADA.

I - A promoção é direito dos militares, sendo certo que esta somente ocorrerá quando o oficial preencher os requisitos previstos na Lei nº 5.821/73, bem como no Decreto regulamentador. Na hipótese dos autos, o impetrante não preencheu os requisitos previstos na Lei de regência, motivo pelo qual foi excluído, temporariamente, do Quadro de Acesso.

II - A exclusão de militar do Quadro de Acesso às Promoções em face de indiciamento em Inquérito Policial Militar não configura violação ao princípio da presunção de inocência, insculpido no art. 5º, LIV da Constituição Federal. Precedentes do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça. Ainda, a referida exclusão não resulta de um processo administrativo destinado a examinar qualquer ato faltoso, mas apenas à análise de elementos objetivos, previstos na legislação, que determinam a inclusão ou exclusão do oficial na lista para a promoção, motivo pelo qual prescinde de contraditório e ampla defesa.

III - A aplicação do Decreto nº 3.998/2001 no caso dos autos não configura ofensa ao princípio da reserva legal, sendo certo que houve apenas explicitação de norma já constante na Lei nº 5.821/72. Ademais, ainda que se entendesse inaplicável o Decreto, a própria Lei em comento disciplinou os requisitos para o ingresso no Quadro de Acesso - artigo 15, bem como a possibilidade de exclusão de oficial que tenha sido nele incluído indevidamente - art. 35, § 3º. IV - Ordem denegada.

(MS 8.329/DF, Rel. Ministro Gilson Dipp, Terceira Seção, julgado em

12/11/2003, DJ 9/12/2003, p. 206)

Diante do exposto, dou provimento ao Recurso Especial da União.

Publique-se.

Intimem-se.

Brasília (DF), 18 de julho de 2018.

MINISTRO HERMAN BENJAMIN

Relator

(Ministro HERMAN BENJAMIN, 03/09/2018)

 

Logo não se vislumbra irregularidade ou excesso regulamentar na disciplina da lei pelos decretos mencionados, mormente no que se refere ao tratamento conferido ao servidor punido com pena disciplinar, para o cômputo de tempo visando à progressão na carreira, porquanto sua condição distingue-se, certamente, daqueles servidores que não sofreram punição no desempenho funcional, a inferir-se respeito ao princípio da isonomia.

 

 

Deste modo, irretorquível a sentença de primeira instância.

 

 

Dispositivo

 

Por estas razões, nego provimento à apelação.

Sem honorários, a teor das Súmulas 512/STF e 105/STJ, bem como do disposto no art. 25 da Lei n. 12.016/2009. Custas ex lege.

É o voto.

 

 

 

 



E M E N T A

 

 

 

ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO. MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO CIVIL. PROMOÇÃO FUNCIONAL. POLICIAL FEDERAL. LEI N. 9.266/96. DECRETO N. 7.014/09. PORTARIA INTERMINISTERIAL N. 23/98. IMPOSIÇÃO DE PENALIDADE. SUSPENSÃO. AFASTAMENTO DISCIPLINAR. INTERRUPÇÃO DO INTERSTÍCIO PARA PROMOÇÃO NA CARREIRA. APELAÇÃO DA DESPROVIDA.

1. Apelação interposta pelo autor, Delegado de Polícia Federal, contra sentença que ratificou a liminar e denegou a segurança, em que objetivava ordem para que seja autorizada a sua imediata promoção na à classe especial da carreira de Delegado da Polícia Federal, com efeitos financeiros retroativos à data de 06 de março de 2020.

2. A própria lei que rege a carreira do autor, Lei n. 9.266/96, no seu art. 2º, §1º, confere ao Poder Executivo, via regulamento, a legitimidade de normatizar os critérios de progressão funcional, porquanto não previu tais requisitos. Inexistência de qualquer ilegalidade no que tange à extrapolação de limites de competência.

3. Interrompido o interstício em decorrência do afastamento disciplinar, a contagem do prazo para a progressão deve ter reinício quando do retorno do autor à atividade, não sendo permitido, neste caso, complementar o período de serviço anterior ao cumprimento da penalidade. Precedentes.

4. Não se vislumbra irregularidade ou excesso regulamentar na disciplina da lei pelos decretos mencionados, mormente no que se refere ao tratamento conferido ao servidor punido com pena disciplinar, para o cômputo de tempo visando à progressão na carreira, porquanto sua condição distingue-se, certamente, daqueles servidores que não sofreram punição no desempenho funcional, a inferir-se respeito ao princípio da isonomia.

5. Apelação desprovida.

 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Primeira Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação, sem honorários, a teor das Súmulas 512/STF e 105/STJ, bem como do disposto no art. 25 da Lei n. 12.016/2009, e custas ex lege, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.