AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5009990-41.2019.4.03.0000
RELATOR: Gab. 09 - DES. FED. NELTON DOS SANTOS
AGRAVANTE: DANIELA PENO PAIVA
AGRAVADO: FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL
OUTROS PARTICIPANTES:
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5009990-41.2019.4.03.0000 RELATOR: Gab. 09 - DES. FED. NELTON DOS SANTOS AGRAVANTE: DANIELA PENO PAIVA AGRAVADO: FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de agravo de instrumento interposto por DANIELA PENO PAIVA, assistida pela Defensoria Pública da União (DPU), inconformada com a decisão de ID 16137187 que indeferiu o pedido de tutela de urgência nos autos da ação sob o procedimento comum de nº 5002372-87.2019.4.03.6000, em trâmite perante o Juízo da 4ª Vara Federal de Campo Grande. Transcreve-se o seguinte excerto da narrativa fática da exordial do feito de origem, ajuizado em face da FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL – FUFMS, para compreensão da questão debatida no presente recurso: “A autora é acadêmica do curso de Psicologia, na universidade requerida. Iniciou os seus estudos no curso na unidade de Corumbá, tendo sido transferida para a unidade de Campo Grande em virtude das dificuldades financeiras que enfrenta. Pelo mesmo motivo é que a demandante necessita do recebimento dos benefícios estudantis auxílio-alimentação; auxílio-permanência para despesas gerais; auxílio-moradia e auxílio-financeiros para participação de eventos; auxílio-financeiro para apoio pedagógico; e auxílio-emergencial. Ocorre que a demandada tem apresentado óbices para que a autora concorra ao recebimento dos benefícios estudantis auxílio permanência e auxílio-alimentação dos quais ela necessita, sob a alegação de que a demandante, por possuir diploma de ensino superior, não poderia ser agraciada com tais benesses, com escoro no inciso III do art. 42 da Resolução 135/2015 da própria UFMS. Não é a primeira vez que a restrição ao fornecimento de tais benefícios à demandante ocorre. No exercício de 2015, conforme consta do processo 0010289-87.2015.403.6000, que tramitou na 2ª Vara Federal (cuja sentença segue anexada), foi necessário o ajuizamento de ação judicial para se conferir o direito a tal recebimento, naquela ocasião, suspensos com fundamento nas Resoluções 64 e 65/2012. Naquela mesma demanda, foi proferida sentença deferindo-se o pagamento dos benefícios, então deferidos, à autora, por entender o juízo que a restrição da Resolução não estaria amparada na norma superior que regulamenta. O caso narrado nestes autos, se amolda à mesma situação apresentada naquela oportunidade, com a diferença de que, hoje, as limitações aos auxílios estão fundamentadas em resolução diversa e mais recente do que aquela declarada ilegal pela douta Juíza Federal, a Dra. Janete Lima Miguel, magistrada sentenciante no processo indigitado. Destarte, a autora moveu a ação 5001438-32.2019.403.6000 perante a 4ª Vara Federal e conseguiu o direito de participar do processo seletivo, tendo concorrido em igualdade perante os demais candidatos, independentemente da exigência de não possuir diploma de curso superior. (...) Ou seja, a autora não conseguiu ingressar com a inscrição na seleção de estudante dos cursos de graduação para assistência estudantil (auxílio permanência, auxílio moradia, auxílio alimentação), sendo impedida de solicitar tais benefícios, com a justificativa que os estudantes que já tem uma graduação não podem concorrer com os demais, conforme resolução nº 135, de 28 de dezembro de 2018. (...)” (ID nº 15883985 - Págs. 2/3, nos autos originários) O MM. Juízo “a quo” se manifestou nos seguintes termos: “(...) Pois bem. A autora foi inscrita no processo seletivo, mas teve o pedido de concessão de benefício indeferido por ser portadora de diploma de curso superior. Note-se que aquela decisão referiu-se apenas ao ato de inscrição, porquanto a Resolução n. 135/2015 mencionava apenas o ato de concessão do benefício. Outrossim, o pedido, naquele feito, era apenas destinado à inscrição para participação no certame. No caso destes autos, observa-se que a restrição imposta pela ré não extrapolou o poder regulamentar, já que a Lei e o Decreto mencionados delegaram à instituição de ensino a possibilidade de estipular outros requisitos para a concessão dos benefícios além daqueles já previstos nos atos normativos superiores. Outrossim, ao contrário do que defenda a autora, o critério de discriminação adotado parece apresentar correlação lógica com o fim pretendido, pois busca a autoridade administrativa atender aos estudantes mais necessitados, que não tenham como se manter durante o curso e também não tenham potencial para tanto, por não contarem com nenhuma qualificação profissional, ao contrário do que ocorre com aqueles que já contam com diploma de nível superior. Assim, não verifico a probabilidade do direito invocado. (...)” (PJe originário – ID 16137187 - Págs. 5/6, grifos no original) Em sede recursal (ID 54605430), sustenta a agravante que preenche os requisitos para a tutela de urgência, nos termos dos artigos 300 do CPC, diante da existência de probabilidade do direito e perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, lançando mão, em síntese, dos seguintes argumentos: a) “a determinação de não ser o candidato ao auxílio permanência, portador de diploma de nível superior, é exclusiva da UFMS. O dispositivo além de ser ilegal e flagrantemente inconstitucional"; b) “o auxílio permanência foi criado com o intuito de manter no curso os necessitados, possibilitando assim que tenham efetivas condições de findar seus estudos”; c) “a ratio levou à edição da dita norma foi impedir que pessoas abastadas pudessem usufruir do benefício de abono permanência e auxílio alimentação. Todavia, o critério utilizado para aferir a capacidade econômica do aluno (não ser portador de diploma superior) é deveras equivocada para o fim que almeja”; d) a agravante, de boa-fé, requereu o benefício em questão “pois, de fato, não possui condições econômicas de permanecer no curso de psicologia, sem o recebimento do abono de permanência e auxílio alimentação, uma vez que não trabalha na área de educação física”; e) “a exigência formal desse requisito, sem a necessária análise conjunta e sistemática dos demais, pode gerar situação de injustiça, pois o comportamento da parte ré obsta injustamente o acesso à educação da autora”. Pugna pela “concessão de tutela provisória de urgência para determinar que a UFMS proceda ao deferimento da inscrição da autora imediatamente na seleção de estudante dos cursos de graduação para assistência estudantil, para conceder os benefícios auxílio-permanência, auxílio-moradia, auxílio-alimentação”. Requer o total provimento ao recurso, com a reforma da decisão interlocutória recorrida. Intimada, a parte contrária apresentou contraminuta ao agravo de instrumento, pugnando pelo não acolhimento do recurso (ID 58847622). É o relatório.
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5009990-41.2019.4.03.0000 RELATOR: Gab. 09 - DES. FED. NELTON DOS SANTOS AGRAVANTE: DANIELA PENO PAIVA AGRAVADO: FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O Senhor Desembargador Federal Nelton dos Santos (Relator): Conforme estabelece o art. 300, do Código de Processo Civil de 2015, é possível a concessão de tutela de urgência, antecipada ou cautelar, desde que haja o convencimento da verossimilhança da alegação pelo juízo e exista fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação. No caso em tela, entendo que a r. decisão objurgada deve ser mantida. Vejamos. É cediço que o auxílio-permanência foi instituído pela Lei nº 12.155/2009 com o escopo de fomentar o desenvolvimento de atividades de ensino e extensão para acadêmicos matriculados em cursos de graduação. Preceituam os artigos 10 a 12 da referida Lei, in verbis: “Art. 10. Ficam as instituições federais de educação superior autorizadas a conceder bolsas a estudantes matriculados em cursos de graduação, para o desenvolvimento de atividades de ensino e extensão, que visem: (Regulamento) I - à promoção do acesso e permanência de estudantes em condições de vulnerabilidade social e econômica; e II - ao desenvolvimento de atividades de extensão universitária destinadas a ampliar a interação das instituições federais de educação superior com a sociedade. Art. 11. (VETADO) Art. 12. As bolsas previstas nos arts. 10 e 11 adotarão como referência os valores das bolsas correspondentes pagas pelas agências oficiais de fomento à pesquisa, bem como as condições fixadas em regulamento do Poder Executivo, que disporá, no mínimo, sobre: (Regulamento) I - os direitos e obrigações dos beneficiários das bolsas; II - as normas para renovação e cancelamento dos benefícios; III - a periodicidade mensal para recebimento das bolsas; IV - as condições de aprovação e acompanhamento das atividades, programas e projetos no âmbito das instituições de educação superior ou pesquisa; V - a avaliação das instituições educacionais responsáveis pelos cursos; VI - a avaliação dos bolsistas; e VII - a avaliação dos cursos e tutorias. Parágrafo único. O quantitativo de bolsas concedidas anualmente observará o limite financeiro fixado pelas dotações consignadas nos créditos orçamentários específicos existentes na respectiva lei orçamentária anual.” Com o objetivo de regulamentar a referida Lei, foi editado o Decreto nº 7.416, de 30 de dezembro de 2010, que preconiza, em seus artigos 3º e 4º, que: “Art. 3º Aplicam-se ao candidato às bolsas de permanência e de extensão os seguintes requisitos, sem prejuízo de outros específicos fixados pela instituição: I - estar regularmente matriculado em curso de graduação; II - apresentar indicadores satisfatórios de desempenho acadêmico, definidos pela instituição; III - ser aprovado em processo de seleção, que deve considerar critérios de vulnerabilidade social e econômica, no caso da bolsa permanência; IV - não receber qualquer outra bolsa paga por programas oficiais; e V - apresentar tempo disponível para dedicar às atividades previstas no edital de seleção, quando a modalidade exigir. § 1º Os editais dos processos de seleção deverão ser divulgados oficialmente, com antecedência mínima de oito dias de sua realização, incluindo informações sobre data, horário, local, critérios e procedimentos a serem utilizados. § 2º Poderão ser incluídos em um mesmo programa ou projeto bolsistas atendidos pelas modalidades previstas nos incisos I e II do art. 1º, bem como estudantes não bolsistas.” (grifei) “Art. 4º As bolsas de permanência e de extensão serão canceladas nos seguintes casos: I - conclusão do curso de graduação; II - desempenho acadêmico insuficiente; III - trancamento de matrícula; IV - desistência da bolsa ou do curso; V - abandono do curso; ou VI - prática de atos não condizentes com o ambiente universitário, nos termos da disciplina própria da instituição, garantida a ampla defesa e o contraditório.” Por seu turno, o artigo 42 da Resolução COUN 135, de 28 de dezembro de 2018, da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, dispõe que: “Art. 42. São critérios para concessão dos Auxílios de I a IV, com exceção da subvenção financeira dos Restaurantes Universitários, de que tratam estas Normas: I - estar regularmente matriculado em curso de graduação da UFMS; II - comprovar renda familiar per capita de até um salário mínimo e meio vigente, com a apresentação dos documentos solicitados, nos prazos definidos nos editais; III - não ter concluído curso de graduação em sua vida acadêmica ou profissional; e IV- não possuir penalidades administravas, graves ou gravíssimas, previstas no Regulamento Disciplinar do Estudante da UFMS, nos últimos seis meses.” (grifei) Colhe-se dos autos e da exegese das normas de regência que, na espécie, a instituição de ensino superior considerou com critérios para aferição de vulnerabilidade social e econômica: (i) comprovação de renda familiar per capita de até um salário mínimo e meio vigente; (ii) não ter o estudante concluído curso de graduação em sua vida acadêmica ou profissional. No caso em tela, vê-se que a restrição imposta pela FUFMS não extrapolou o poder regulamentar, visto que a Lei e o Decreto supracitados delegaram à IES a possibilidade de estabelecer outros requisitos e elencar os critérios para o deferimento dos benefícios estudantis, além daqueles já elencados nos atos normativos superiores que disciplinam a matéria. Em outras palavras, não se evidencia ilegalidade no ato da entidade de ensino superior, que, à primeira vista, não desbordou da legislação de regência. Desse modo, conforme bem pontuado pelo MM. Juízo de primeira instância, ao contrário do que defende a parte agravante, graduada em Educação Física, o critério de discriminação adotado pela IES parece estar logicamente correlacionado com a finalidade pretendida, tendo em vista que objetiva atender aos estudantes que mais necessitem, desprovidos de condições de se manter durante o curso universitário e que também não tenham potencial para tanto, por não possuírem qualquer qualificação profissional, ao contrário do que acontece com aqueles que já possuem formação de nível superior. Destarte, em sede de cognição sumária, própria do agravo de instrumento, verifica-se que não restou demonstrada a probabilidade do direito pela agravante. Enfim, ausentes os requisitos para a concessão neste instante da tutela de urgência pleiteada, não prosperando a pretensão recursal. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso. É como voto.
E M E N T A
AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONCESSÃO DE BENEFÍCIOS ESTUDANTIS. BOLSAS DE PERMANÊNCIA E DE EXTENSÃO. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. EXERCÍCIO DO PODER REGULAMENTAR PELA IES. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. TUTELA DE URGÊNCIA INDEFERIDA. RECURSO DESPROVIDO.
1. Conforme estabelece o art. 300, do Código de Processo Civil de 2015, é possível a concessão de tutela de urgência, antecipada ou cautelar, desde que haja o convencimento da verossimilhança da alegação pelo juízo e exista fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação.
2. Colhe-se dos autos e da exegese das normas de regência que, na espécie, a instituição de ensino superior considerou com critérios para aferição de vulnerabilidade social e econômica: (i) comprovação de renda familiar per capita de até um salário mínimo e meio vigente; (ii) não ter o estudante concluído curso de graduação em sua vida acadêmica ou profissional.
3. No caso em tela, vê-se que a restrição imposta pela FUFMS não extrapolou o poder regulamentar, visto que a Lei e o Decreto supracitados delegaram à IES a possibilidade de estabelecer outros requisitos e elencar os critérios para o deferimento dos benefícios estudantis, além daqueles já elencados nos atos normativos superiores que disciplinam a matéria.
4. Em outras palavras, não se evidencia ilegalidade no ato da entidade de ensino superior, que, à primeira vista, não desbordou da legislação de regência.
5. Desse modo, conforme bem pontuado pelo MM. Juízo de primeira instância, ao contrário do que defende a parte agravante, graduada em Educação Física, o critério de discriminação adotado pela IES parece estar logicamente correlacionado com a finalidade pretendida, tendo em vista que objetiva atender aos estudantes que mais necessitem, desprovidos de condições de se manter durante o curso universitário e que também não tenham potencial para tanto, por não possuírem qualquer qualificação profissional, ao contrário do que acontece com aqueles que já possuem formação de nível superior.
6. Destarte, em sede de cognição sumária, própria do agravo de instrumento, verifica-se que não restou demonstrada a probabilidade do direito pela agravante.
7. Inexistentes os requisitos para a concessão neste instante da tutela de urgência pleiteada, não prosperando a pretensão recursal.
8. Recurso desprovido.