Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5372002-57.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: MARY PANINI

Advogado do(a) APELADO: CASSIO APARECIDO MAIOCHI - SP214483-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5372002-57.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

APELADO: MARY PANINI

Advogado do(a) APELADO: CASSIO APARECIDO MAIOCHI - SP214483-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

­R E L A T Ó R I O

Demanda proposta objetivando a concessão de aposentadoria por idade a trabalhador rural, prevista no art. 143 da Lei n.º 8.213/91.

O juízo a quo julgou procedente o pedido formulado, reconhecendo à parte autora o direito ao benefício pretendido, a partir da data do requerimento administrativo.

O INSS apela, pleiteando a reforma da sentença, sustentando, em síntese, o não cumprimento dos requisitos legais necessários à concessão em questão. Se vencido, insurge-se com relação ao termo inicial, correção monetária e juros moratórios, bem como requer o reconhecimento da prescrição quinquenal. Ao final, prequestiona a matéria.

Com contrarrazões, subiram os autos.

É o relatório.

 

 

THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5372002-57.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

APELADO: MARY PANINI

Advogado do(a) APELADO: CASSIO APARECIDO MAIOCHI - SP214483-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

­V O T O

 

Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.

 

APOSENTADORIA POR IDADE (RURAL)

 

O benefício de aposentadoria por idade a trabalhador rural encontra-se disciplinado nos arts. 39, inciso I; 48, §§ 1.º e 2.º; e 143 da Lei n.º 8.213/91.

Antes mesmo do advento da Lei de Benefícios, a Lei Complementar n.º 11, de 25 de maio de 1971, que instituiu o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural, em seu art. 4.º dispunha que a aposentadoria seria devida quando se completassem 65 anos de idade, cabendo a concessão do benefício apenas ao respectivo chefe ou arrimo de família (parágrafo único).

Por sua vez, de acordo com o art. 5.º da Lei Complementar n.º 16/73, o trabalhador rural deveria comprovar a sua atividade pelo menos nos três últimos anos anteriores à data do pedido do benefício.

Referidos dispositivos não foram recepcionados pela Constituição Federal de 1988, que passou para 60 anos, para homens, e 55, para mulheres, a idade mínima exigida para a concessão do benefício (art. 201, § 7.º, inciso II), excluindo a exigência da condição de chefe de família.

Além do requisito etário (60 anos, se homem, e 55 anos, se mulher), o trabalhador rural deve comprovar o exercício de atividade rural, mesmo que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do benefício.

O dispositivo legal citado deve ser analisado em consonância com o art. 142 da Lei de Benefícios.

Não se exige do trabalhador rural o cumprimento de carência (art. 26, inciso III), como o dever de verter contribuição por determinado número de meses, senão a comprovação do exercício laboral durante o período respectivo.

Vale dizer: em relação às contribuições previdenciárias, é assente, desde sempre, o entendimento de serem desnecessárias, sendo suficiente a comprovação do efetivo exercício de atividade no meio rural (STJ, REsp n.º 207.425, 5.ª Turma, j. em 21/9/1999, v.u., DJ de 25/10/1999, p. 123, Rel. Ministro Jorge Scartezzini; e STJ, RESP n. 502.817, 5.ª Turma, j. em 14/10/2003, v.u., DJ de 17/11/2003, p. 361, Rel. Ministra Laurita Vaz).

Noutro passo, com relação ao art. 143 da Lei n.º 8.213/91, a regra transitória assegurou aos rurícolas o direito de requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos, contados da vigência da referida Lei.

Assim, o referido prazo expiraria em 25/7/2006.

Entretanto, em relação ao trabalhador rural enquadrado como segurado empregado ou como segurado contribuinte individual, que presta serviços de natureza rural, em caráter eventual, a uma ou mais empresas, sem relação de emprego, o aludido prazo foi prorrogado por mais 2 (dois) anos, estendendo-se até 25/7/2008, em face do disposto na MP n.º 312/06, convertida na Lei n.º 11.368/06.

Posteriormente, a Medida Provisória n.º 410/07, convertida na Lei n.º 11.718/08, estabeleceu nova prorrogação para o prazo previsto no art. 143 da Lei n.º 8.213/91, ao determinar, em seu art. 2.º, que “Para o trabalhador rural empregado, o prazo previsto no art. 43 da Lei n.º 8.213/91, de 24 de julho de 1991, fica prorrogado até o dia 31 de dezembro de 2010” (art. 2.º) e, em seu art. 3.º, que “Na concessão de aposentadoria por idade do empregado rural , em valor equivalente ao salário mínimo, serão contados para efeito de carência: I - até 31 de dezembro de 2010, a atividade comprovada na forma do art. 143 da Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991; II - de janeiro de 2011 a dezembro de 2015, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 3 (três), limitado a 12 (doze) meses, dentro do respectivo ano civil; e III - de janeiro de 2016 a dezembro de 2020, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 2 (dois), limitado a 12 (doze) meses dentro do respectivo ano civil”.

É de observar-se que, para os empregados rurais e contribuintes individuais eventuais, a regra permanente do art. 48 da Lei n.º 8.213/91 continua a exigir, para concessão de aposentadoria por idade a rurícolas, apenas a comprovação do efetivo exercício de "atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido", consoante §§ 1.º e 2.º do referido dispositivo.

Essa comprovação do labor rural, nos termos dos arts. 48 e 143 da Lei de Benefícios, dar-se-á por meio de prova documental, ainda que incipiente, e, nos termos do art. 55, § 3.º, da retrocitada Lei, corroborada por prova testemunhal.

Acrescente-se que a jurisprudência de longa data vem atentando para a necessidade dessa conjunção de elementos probatórios (início de prova documental e colheita de prova testemunhal), o que resultou até mesmo na edição do verbete n.º 149 da Súmula da Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:”

 

"A prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".

 

DO CASO DOS AUTOS

 

O requisito etário restou satisfeito, pois a parte autora completou a idade mínima em 08.12.2016, devendo fazer prova do exercício de atividade rural por 180 meses.

Para demonstrar as alegações, juntou documentos, entre os quais destacam-se:

- CTPS da própria autora, com registros de atividades em serviços rurais nos períodos de 10.07.1978 a 27.09.1978, 14.11.1980 a 05.01.1981, 19.10.1981 a 01.12.1981, 18.02.1982 a 19.02.1982, 21.05.1984 a 31.01.1985 e 10.06.1985 a 14.06.1986.

- Certidões de nascimento dos filhos da autora com o Sr. Noel Pereira Alves, registrados em 29.02.1988 e 11.05.1989, constando a qualificação deste último como “lavrador” e “agricultor”, respectivamente;

- Notas fiscais de comercialização da produção, em nome do Sr. Noel Pereira Alves, dos anos 2000 e 2014 e

- Declaração do ITR exercício 2010, referente ao Sítio São Roque, com área de 45,9 hectares, com 25% pertencendo na qualidade de condômino ao Sr. Noel Pereira Alves.

Cumpre mencionar que conforme informações do Sistema CNIS da Previdência Social, o Sr. Noel Pereira Alves possui os seguintes registros:

- Vínculo como Autônomo, nos períodos de 01.01.1985 a 31.03.1986, 01.10.1986 a 31.05.1989, 01.08.1989 a 31.08.1989, 01.10.1989 a 30.04.1990, 01.06.1990 a 31.03.1991, 01.05.1991 a 31.08.1992 e 01.10.1992 a 31.03.1996;

- PERÍODO DE ATIVIDADE DE SEGURADO ESPECIAL, Segurado Especial, a partir de 31.12.2007, sem data fim;

- APOSENTADORIA POR IDADE, com data de início em 04.03.2013.

Insta asseverar que o fato de o alegado companheiro da requerente possuir registro urbano, conforme acima mencionado, não altera a solução da causa, pois trata-se de época anterior à carência exigida em lei, eis que restou provada a predominância da atividade rural durante todo o período produtivo de exercício laboral.

Cabe ressaltar a existência de prova oral. As testemunhas declaram que conhecem a parte autora há bastante tempo e confirmam o alegado labor rural.

Conforme restou enfatizado pelo magistrado sentenciante, in verbis:

“Quanto à prova oral, toda ela é no sentido de que autora sempre exerceu suas atividades rurais, ajudando seu marido na propriedade de seu sogro, onde moram e trabalham acerca de trinta e cinco anos, perfazendo o período de carência exigido pela legislação de regência.

A depoente Elisabeth Aparecida dos Santos narrou em juízo que conhece a autora há mais de trinta e cinco anos e durante todo esse período sempre acompanhou seu trabalho no sítio São Roque. Enunciou que a autora ainda continua morando e trabalhando no mesmo sítio.

No mesmo sentido, foi o depoimento de Guerino Ernesto Breda, onde alegou que conhece a autora desde criança, e sempre viu-a trabalhando na propriedade seu marido, denominado Sítio São Roque, e afirma ser um sítio de pequeno porte, onde nunca tiveram empregados. Enunciou que a autora ainda continua tendo atividades agrícolas no sítio em que mora.

A testemunha Leonice Aparecida Ferreira Campos narrou em juízo que conhece a autora há mais de trinta anos, e durante todo esse período sempre a viu trabalhando na propriedade de seu marido, denominada como Sítio São Roque”.

 

É inconteste o valor probatório dos documentos de qualificação civil, dos quais é possível inferir a profissão exercida pela parte autora, à época dos fatos que se pretende comprovar.

E os documentos juntados constituem início de prova material, o que foi corroborado pela prova testemunhal, confirmando a atividade campesina da parte autora.

De rigor, portanto, o deferimento do benefício, porquanto comprovado o exercício de atividade rural pelo período de carência legalmente exigido.

A aposentadoria corresponde ao valor de um salário mínimo mensal, nos termos do art. 143 da Lei n.º 8.213/91.

O termo inicial do benefício previdenciário deve retroagir à data do requerimento administrativo, de acordo com a previsão contida no inciso II do art. 49 da Lei n.º 8.213/91. Na ausência de demonstração do requerimento, o termo inicial deve retroagir à data da citação, ocasião em que a autarquia tomou conhecimento da pretensão.

No caso, existe comprovação de requerimento, devendo o termo inicial ser nele fixado, conclusão que, por si só, indica não ter razão alguma a prejudicial de mérito trazida pelo INSS em seu recurso, concernente à alegada prescrição das parcelas vencidas anteriormente ao quinquênio que precede o ajuizamento da ação, nos termos do art. 103, parágrafo único, da Lei n. 8.213/91.

Devida a gratificação natalina, nos termos preconizados no art. 7.º, inciso VIII, da Constituição da República.

Quer seja em relação aos juros moratórios, devidos a partir da citação, momento em que constituído o réu em mora; quer seja no tocante à correção monetária, incidente desde a data do vencimento de cada prestação, há que prevalecer tanto o decidido, sob a sistemática da repercussão geral, no Recurso Extraordinário n.º 870.947, de 20/9/2017, sob relatoria do Ministro Luiz Fux, quanto o estabelecido no Manual de Orientação de Procedimentos para Cálculos na Justiça Federal, em vigor por ocasião da execução do julgado, observada a rejeição dos embargos de declaração no âmbito do julgamento em epígrafe, em 03/10/2019.

Nos termos do art. 4.º, inciso I, da Lei Federal n.º 9.289/1996, o INSS está isento do pagamento de custas processuais nas ações de natureza previdenciária ajuizadas nesta Justiça Federal, assim como o está naquelas aforadas na Justiça do estado de São Paulo, por força do art. 6.º da Lei Estadual n.º 11.608/2003, c. c. o art. 1.º, § 1.º, da mesma Lei n.º 9.289/1996, circunstância que não o exime, porém, de arcar com as custas e as despesas processuais em restituição à parte autora, em decorrência da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.

Já no que diz respeito às ações propostas perante a Justiça do estado de Mato Grosso do Sul, as normativas que tratavam da aludida isenção (Leis Estaduais n.º 1.135/91 e n.º 1.936/98) restaram revogadas a partir da edição da Lei Estadual n.º 3.779/09 (art. 24, §§ 1.º e 2.º), pelo que, nos feitos advindos daquela Justiça Estadual, de rigor a imposição à autarquia previdenciária do pagamento das custas processuais, exigindo-se o recolhimento apenas ao final da demanda, caso caracterizada a sucumbência.

Quanto ao prequestionamento suscitado, saliente-se inexistir contrariedade alguma a legislação federal ou a dispositivos constitucionais.

Posto isso, nego provimento à apelação.

É o voto.

 

 

THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora

 

 



E M E N T A

 

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE A TRABALHADOR RURAL. ART. 143 DA LEI N.º 8.213/91. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE DE RURÍCOLA NO PERÍODO ANTERIOR AO REQUERIMENTO. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.

- A atividade rural deve ser comprovada por meio de início de prova material, aliada à prova testemunhal.

- O conjunto probatório é suficiente para ensejar a concessão do benefício vindicado.

- Reconhecimento da procedência do pedido formulado.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.