APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 6214955-37.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: EVA DE FATIMA DO CARMO
Advogado do(a) APELADO: LUCIO AUGUSTO MALAGOLI - SP134072-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 6214955-37.2019.4.03.9999 RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: EVA DE FATIMA DO CARMO Advogado do(a) APELADO: LUCIO AUGUSTO MALAGOLI - SP134072-N OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Demanda proposta objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, desde a data da postulação do benefício de auxílio-doença (31/5/2017). O juízo a quo julgou procedente o pedido formulado, reconhecendo à parte autora o direito ao benefício de aposentadoria por invalidez, a partir da data do indeferimento administrativo. A parte autora apela, pleiteando a reforma da sentença, sustentando, em síntese, que a data de início do benefício deve corresponder a data do requerimento administrativo (31/5/2017), que os juros devem ser fixados com base no Manuela de Cálculos da Justiça Federal, bem como requer a majoração dos honorários advocatícios. O INSS apela, requerendo, preliminarmente, o recebimento do recurso em seu duplo efeito, bem como alega o cerceamento de defesa em razão de não ter sido oportunizada a complementação do laudo pericial. No mérito, sustenta, em síntese, o não cumprimento dos requisitos legais à concessão em questão. Com contrarrazões apenas da parte autora, subiram os autos. É o relatório. THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 6214955-37.2019.4.03.9999 RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: EVA DE FATIMA DO CARMO Advogado do(a) APELADO: LUCIO AUGUSTO MALAGOLI - SP134072-N OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Requer o INSS, em seu recurso de apelação, a concessão do efeito suspensivo, condicionando eventual implantação de benefício previdenciário após ocorrido o trânsito em julgado. A alegação veiculada pelo INSS, concernente ao recebimento da apelação no duplo efeito, não se coloca na hipótese dos autos. A regra geral prevista no caput do art. 1.012 do Código de Processo Civil, segundo o qual “a apelação terá efeito suspensivo”, é excepcionada no § 1.º desse mesmo dispositivo legal, cujo inciso V expressamente determina que, “além de outras hipóteses previstas em lei, começa a produzir efeitos imediatamente após a sua publicação a sentença que confirma, concede ou revoga tutela provisória”. Não impedem, os recursos, a eficácia da decisão, salvo disposição legal ou decisão em sentido diverso, "se da imediata produção de seus efeitos houver risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, e ficar demonstrada a probabilidade de provimento do recurso" (CPC, art. 995, parágrafo único). Neste caso, em que o recurso é interposto pelo INSS, não há nem urgência nem evidência para que se conceda o efeito suspensivo. Pelo contrário, a urgência serve à parte autora, já que o benefício previdenciário é considerado verba alimentar. Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução. Preliminarmente, não procede a alegação de nulidade decorrente do indeferimento do pedido complementação do laudo pericial. É notório que a incapacidade laborativa deva ser provada por laudo de perito médico. O médico nomeado pelo juízo possui habilitação técnica para proceder ao exame pericial da parte requerente, de acordo com a legislação em vigência, que regulamenta o exercício da medicina, não sendo necessária a especialização para o diagnóstico de doenças ou para a realização de perícias. Neste processo, o laudo foi produzido por médico de confiança do juízo, que fez a devida anamnese da pericianda e respondeu a todos os quesitos do juízo e das partes. Além disso, conforme informou no laudo, foram analisados todos os exames e atestados médicos apresentados. A perícia revelou-se suficiente para a formação do convencimento do juízo, revelando, a insurgência da parte autora, inconformismo insuficiente para gerar dúvidas quanto à integridade do documento médico produzido. Eventual contradição entre o laudo pericial e os atestados médicos apresentados pela parte não pode motivar a nulidade de um ou outro documento médico. Rejeita-se, portanto, a preliminar em questão. DA APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E DO AUXÍLIO-DOENÇA Os requisitos da aposentadoria por invalidez encontram-se preceituados nos arts. 42 e seguintes da Lei n.° 8.213/91, consistindo, mais precisamente, na presença da qualidade de segurado, na existência de incapacidade total e permanente para o trabalho e na ocorrência do cumprimento da carência, quando exigida. O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos art. 59 e seguintes do mesmo diploma legal, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária. Excepcionalmente, com base em entendimento jurisprudencial consolidado, admite-se a concessão de tais benefícios mediante comprovação pericial de incapacidade parcial e definitiva para o desempenho da atividade laborativa, que seja incompatível com a ocupação habitual do requerente e que implique em limitações tais que restrinjam sobremaneira a possibilidade de recolocação no mercado de trabalho, diante das profissões que exerceu durante sua vida profissional (STJ: AgRg no AREsp 36.281/MS, rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, 6.ª Turma, DJe de 01/03/2013; e AgRg no AREsp 136474/MG, rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, 1.ª Turma, DJe de 29/06/2012). Imprescindível, ainda, o preenchimento do requisito da qualidade de segurado, nos termos dos arts. 11 e 15, ambos da Lei de Benefícios. "Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições: I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício; II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração; III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória; IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso; V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar; VI - até (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo. § 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. § 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social. § 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social. § 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos." A perda da qualidade de segurado, portanto, ocorrerá no 16.º dia do segundo mês seguinte ao término do prazo fixado no art. 30, II, da Lei n.º 8.212/91, salvo na hipótese do § 1.º do art. 102 da Lei n.º 8.213/91 – qual seja, em que comprovado que a impossibilidade econômica de continuar a contribuir decorreu da incapacidade laborativa. Registre-se que, perdida a qualidade de segurado, imprescindível o recolhimento de, pelo menos, seis meses, para que seja considerado novamente filiado ao regime, nos exatos termos do art. 27-A da Lei de Benefícios. Por fim, necessário o cumprimento do período de carência, nos termos do art. 25 dessa mesma lei, a saber: “Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no artigo 26: I – auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 (doze) contribuições mensais;” Em casos específicos, em que demonstrada a necessidade de assistência permanente de outra pessoa, possível, ainda, com base no art. 45 da Lei de Benefícios, o acréscimo de 25% ao valor da aposentadoria por invalidez porventura concedida. DO CASO DOS AUTOS (INCAPACIDADE PARCIAL E PERMANENTE COM REPERCUSSÃO NEGATIVA SOBRE AS ATIVIDADES HABITUAIS) Objetivando comprovar a qualidade de segurada, a autora juntou extrato do Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS), do qual se infere que recolheu contribuições previdenciárias nos períodos de 1.º/4/1978 (sem registro de saída), 1.º/6/1989 a 26/7/1989 e procedeu recolhimentos como contribuinte individual entre 1.º/5/2012 a 31/12/2013, 1.º/2/2014 a 28/2/2015 e 1.º/4/2015 a 31/7/2017 (fl. 3, Id. 108866209). Assim, tornam-se desnecessárias maiores considerações a respeito desse requisito, restando demonstrada a inocorrência da perda da qualidade de segurado, nos termos do art. 15, inciso II, da Lei n.º 8.213/91, e tendo em vista o ajuizamento da ação em 28/9/2017. O requerimento administrativo foi apresentado em 31/5/2017 (fl. 16, Id. 108866209). Demonstrou, outrossim, ter atendido à exigência legal de recolhimento de 12 contribuições previdenciárias para ensejar direito à aposentadoria por invalidez (art. 25 da Lei n.° 8.213/91). No concernente à incapacidade, a perícia médica concluiu ser a autora portadora de espondiloartrose lombar (CID M47), hérnia discal lombar (CID M51) e esporão de calcâneo (CID M77.3). Considerou-a incapacitada totalmente para o trabalho habitual e parcialmente para demais atividades laborais, devido aos fatores como idade e grau de instrução concluiu pela incapacidade permanente, desde 20/11/2013 (Id. 108866272). A requerente acostou receituário médico, no qual consta realizar tratamento com reumatologista em razão do diagnóstico CID M150 e M797, datado de 15/2/2016, estudo de condução nervosa e eletromiografia, relatando polineuropatia periférica axonal sensitiva nos membros inferiores e reinervação crônica no território L5 esquerdo (radiculopatia lombar crônica), emitido em 17/5/2016, ressonância magnética da coluna lombossacra, relatando anterolistese grau I de L5 sobre S1, sem evidências de espondilólise, hipo-hidratação dos dicos intervertebrais lombares e alterações discogênicas Modic tipo II ao nos perfis vertebrais apostos de L5-S1, hipertrofia de interapofisárias de L4-L5 e L5-S1, pequenos cistos artrossinoviais nas faces externas das interapofisárias de L5-S1, datado de 20/2/2017, atestado médico indicando o diagnóstico CID M545, emitido em 30/5/2017(fls. 9/15, Id. 108866209). Não obstante a incapacidade se restrinja às atividades que demandem esforço físico, considerando a idade da autora (66 anos), as limitações que as patologias lhe impõem são grandes e restringem, em muito, a possibilidade de recolocação no mercado de trabalho, diante da profissão de cuidadora de idosos e serviços domésticos que sempre exerceu. Desse modo, o conjunto probatório restou suficiente à concessão de aposentadoria por invalidez. Quanto ao termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo, ocasião em que a Autarquia tomou conhecimento da pretensão. Quer seja em relação aos juros moratórios, devidos a partir da citação, momento em que constituído o réu em mora; quer seja no tocante à correção monetária, incidente desde a data do vencimento de cada prestação, há que prevalecer tanto o decidido, sob a sistemática da repercussão geral, no Recurso Extraordinário n.º 870.947, de 20/9/2017, sob relatoria do Ministro Luiz Fux, quanto o estabelecido no Manual de Orientação de Procedimentos para Cálculos na Justiça Federal, em vigor por ocasião da execução do julgado, observada a rejeição dos embargos de declaração no âmbito do julgamento em epígrafe, em 03/10/2019. À vista do quanto previsto no art. 85 do Código de Processo Civil, sendo o caso de sentença ilíquida, o percentual da verba honorária deverá ser fixado na liquidação do julgado, com observância ao disposto no inciso II do § 4.º, c. c. o § 11, ambos do art. 85 do CPC, bem como no art. 86 do mesmo diploma legal. Os honorários advocatícios incidem sobre as parcelas vencidas até a sentença de procedência (STJ, Súmula 111). Na hipótese em que a pretensão do segurado somente seja deferida em sede recursal, a verba honorária incidirá sobre as parcelas vencidas até a data da decisão ou acórdão, em atenção ao disposto no § 11 do art. 85 do CPC. Posto isso, rejeito a matéria preliminar, nego provimento à apelação da Autarquia ré e dou parcial provimento à apelação, para reformar a sentença e fixar o termo inicial do benefício na data do requerimento administrativo, nos termos da fundamentação, supra. É o voto. THEREZINHA CAZERTA
Não lhe assiste razão.
Desembargadora Federal Relatora
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. CERCEAMENTO DE DEFESA. NULIDADE DO LAUDO PERICIAL. INSUBSISTÊNCIA DA ALEGAÇÃO. MANUTENÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO. INCAPACIDADE PARCIAL E PERMANENTE RECONHECIDA. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
- Prevalência da regra geral prevista no caput do art. 1.012 do Código de Processo Civil, porquanto não configuradas as hipóteses previstas no § 1.º do mesmo dispositivo legal.
- A especialização médica não é necessária ao diagnóstico de doenças ou para a realização de perícias. Precedentes.
- Insuficiência do inconformismo para gerar dúvidas quanto à integridade do documento médico produzido.
- Rejeição da matéria preliminar.
- Satisfeitos os requisitos legais previstos no art. 42 da Lei n° 8.213/91 - quais sejam, qualidade de segurado, incapacidade total e permanente e cumprimento do período de carência (12 meses) - é de rigor a concessão de aposentadoria por invalidez.
- Necessária a contextualização do indivíduo para a aferição da incapacidade laborativa. Impossibilidade de exigir a reabilitação de trabalhador com baixo grau de instrução, para atividade diversa de sua habitual. Incapacidade total e permanente configurada. Precedentes do STJ.
- Reconhecimento da procedência do pedido formulado.