Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5264299-67.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA

APELANTE: LUCIANA APARECIDA DE ARAUJO

Advogado do(a) APELANTE: ELIAS SALES PEREIRA - SP304234-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5264299-67.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA

APELANTE: LUCIANA APARECIDA DE ARAUJO

Advogado do(a) APELANTE: ELIAS SALES PEREIRA - SP304234-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

­R E L A T Ó R I O

 

 

Demanda proposta objetivando a concessão de auxílio-doença, desde a data do requerimento administrativo (19/3/2019).

O juízo a quo julgou improcedente o pedido formulado.

A parte autora apela, pleiteando, preliminarmente, o reconhecimento do cerceamento de seu direito de defesa, na medida em que indeferido o pedido de realização da nova perícia médica, que reitera. Pleiteia, ao final, a reforma da sentença, sustentando, em síntese, o cumprimento dos requisitos legais à concessão pretendida.

Sem contrarrazões, subiram os autos.

É o relatório.

 

THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5264299-67.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA

APELANTE: LUCIANA APARECIDA DE ARAUJO

Advogado do(a) APELANTE: ELIAS SALES PEREIRA - SP304234-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

­V O T O

 

 

Preliminarmente, não procede a alegação de nulidade decorrente do indeferimento do pedido de realização de novo laudo médico pericial.

É notório que a incapacidade laborativa deva ser provada por laudo de perito médico.

O médico nomeado pelo juízo possui habilitação técnica para proceder ao exame pericial da parte requerente, de acordo com a legislação em vigência, que regulamenta o exercício da medicina, não sendo necessária a especialização para o diagnóstico de doenças ou para a realização de perícias.

O Superior Tribunal de Justiça já se manifestou nesse sentido, assim como este órgão julgador, conforme ementas transcritas a seguir:

 

“PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. ACIDENTE DO TRABALHO. PROVA PERICIAL. DEVIDO PROCESSO LEGAL. ARTIGO 145, § 2º DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. NOMEAÇÃO DE PERITO MÉDICO ESPECIALISTA COMO PRESSUPOSTO DE VALIDADE. NÃO CARACTERIZAÇÃO. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

1. A pertinência da especialidade médica, em regra, não consubstancia pressuposto de validade da prova pericial. A escolha do perito médico deve ser de livre nomeação do juiz.

2. Se o perito médico nomeado não se julgar apto à realização do laudo pericial, deverá escusar-se do encargo, pois comprometido com a ciência e a ética médica.

3. No presente caso, em que o autor alega incapacidades decorrentes de diversas patologias, o juiz nomeou médico radiologista, ato que se mostra razoável, considerando que foi garantido ao periciando nova prova pericial, caso indicada a necessidade de complementação.

4. Recurso especial conhecido e não provido.”

(REsp 1514268/SP, rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, 2.ª TURMA, julgado em 19/11/2015, DJe 27/11/2015)

 

“PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO-DOENÇA. LAUDO PERICIAL. AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE LABORAL. NOVA PERÍCIA. DESNECESSIDADE. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. BENEFÍCIOS INDEVIDOS.

- São requisitos para a concessão de benefícios por incapacidade: a qualidade de segurado, a carência de doze contribuições mensais – quando exigida, a incapacidade para o trabalho de forma permanente e insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (aposentadoria por invalidez) e a incapacidade temporária (auxílio-doença), bem como a demonstração de que o segurado não era portador da alegada enfermidade ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social.

- A ausência de incapacidade laboral do segurado para o exercício de atividades laborais habituais (temporária ou definitiva), atestada por meio de perícia médica judicial, bem como de outros elementos de prova que autorizem convicção em sentido diverso, afastam a possibilidade de concessão de benefício por incapacidade.

- A mera irresignação do segurado com a conclusão do perito ou a alegação de que o laudo é contraditório ou omisso, sem o apontamento de nenhuma divergência técnica justificável, não constituem motivos aceitáveis para a realização de nova perícia, apresentação de quesitos complementares ou realização de diligências.

- É desnecessária a nomeação de um perito especialista para cada sintoma alegado. Precedentes.

- Apelação não provida.”

(TRF3, 9ª Turma, Apelação Cível 5922051-79.2019.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA, julgado em 22/02/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 03/03/2020)

 

Neste processo, o laudo foi produzido por médico de confiança do juízo, que fez a devida anamnese do periciando e respondeu a todos os quesitos do juízo e das partes.

Além disso, conforme informou no laudo, foram analisados todos os exames e atestados médicos apresentados.

A perícia revelou-se suficiente para a formação do convencimento do juízo, revelando, a insurgência da parte autora, inconformismo insuficiente para gerar dúvidas quanto à integridade do documento médico produzido.

Eventual contradição entre o laudo pericial e os atestados médicos apresentados pela parte não pode motivar a nulidade de um ou outro documento médico.

Rejeita-se, portanto, a preliminar em questão.

Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.

 

DA APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E DO AUXÍLIO-DOENÇA A TRABALHADOR RURAL

Os requisitos da aposentadoria por invalidez encontram-se preceituados nos arts. 42 e seguintes da Lei n.° 8.213/91, consistindo, mais precisamente, na presença da qualidade de segurado, na existência de incapacidade total e permanente para o trabalho e na ocorrência do cumprimento da carência, quando exigida.

O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos art. 59 e seguintes do mesmo diploma legal, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária.

Excepcionalmente, com base em entendimento jurisprudencial consolidado, admite-se a concessão de tais benefícios mediante comprovação pericial de incapacidade parcial e definitiva para o desempenho da atividade laborativa, que seja incompatível com a ocupação habitual do requerente e que implique em limitações tais que restrinjam sobremaneira a possibilidade de recolocação no mercado de trabalho, diante das profissões que exerceu durante sua vida profissional (STJ: AgRg no AREsp 36.281/MS, rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, 6.ª Turma, DJe de 1.º/3/2013; e AgRg no AREsp 136474/MG, rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, 1.ª Turma, DJe de 29/6/2012).

Em casos específicos, em que demonstrada a necessidade de assistência permanente de outra pessoa, possível, ainda, com base no art. 45 da Lei de Benefícios, o acréscimo de 25% ao valor da aposentadoria por invalidez porventura concedida.

No tocante ao requisito da qualidade de segurado, cumpre reconhecer, nos termos do art. 11, inciso I, da Lei n.º 8.213/91, e considerando as particularidades do labor campesino, que o trabalhador rural que exerce sua atividade com subordinação e habitualidade, ainda que de forma descontínua, é qualificado como empregado.

Esse, inclusive, é o tratamento dispensado pelo próprio INSS, que, na Instrução Normativa INSS/DC nº 118, de 14/4/2005, considera como segurado, na categoria de empregado, o trabalhador volante.

Por outro lado, para a obtenção de benefícios previdenciários, se faz necessária a comprovação da atividade no campo e, consequentemente, o vínculo de segurado.

Em tal sentido, o § 3.º do art. 55, c/c o art. 106, ambos da Lei n.º 8.213/91, admite a comprovação de tempo de serviço em atividade rural desde que baseada em início de prova documental, sendo vedada a prova exclusivamente testemunhal.

Não se exige do trabalhador rural o cumprimento de carência (art. 26, inciso III), como o dever de verter contribuição por determinado número de meses.

Vale dizer: em relação às contribuições previdenciárias, é assente, desde sempre, o entendimento de serem desnecessárias, sendo suficiente a comprovação do efetivo exercício de atividade no meio rural (STJ, REsp n.º 207.425, 5.ª Turma, j. em 21/9/1999, v.u., DJ de 25/10/1999, p. 123, Rel. Ministro Jorge Scartezzini; e STJ, RESP n. 502.817, 5.ª Turma, j. em 14/10/2003, v.u., DJ de 17/11/2003, p. 361, Rel. Ministra Laurita Vaz).

Essa comprovação do labor rural, nos termos dos arts. 48 e 143 da Lei de Benefícios, dar-se-á por meio de prova documental, ainda que incipiente, e, nos termos do art. 55, § 3.º, da retrocitada Lei, corroborada por prova testemunhal.

Acrescente-se que a jurisprudência de longa data vem atentando para a necessidade dessa conjunção de elementos probatórios (início de prova documental e colheita de prova testemunhal), o que resultou até mesmo na edição do verbete n.º 149 da Súmula da Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:

 

"A prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".

 

DO CASO DOS AUTOS (AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE LABORATIVA)

A principal condição para deferimento do benefício não se encontra presente, eis que não comprovada a incapacidade para o trabalho.

Do que consta do laudo pericial anexado aos autos (Id. 133581732), o perito judicial afirmou que “Conforme informações colhidas no processo, anamnese com a periciada, documentos anexados ao processo, além de exame físico realizado no ato da perícia médica judicial, periciada não apresenta incapacidade para realizar atividades laborais. Acometida por um acidente vascular cerebral isquêmico, em 03/2019, com sequela de perda de visão no olho direito, a qual não está implicando em limitações ou reduzindo a sua capacidade laboral. No exame físico pericial não foram apuradas alterações clínicas capazes de incapacita-la, uma vez que periciada tem quadro clinico estável, não há exames oftalmológicos ou atestados de médico oftalmologista, assim como não há limitações para o seu trabalho habitual.”

Nem cabe argumentar que o juiz não se encontra vinculado ao laudo pericial, eis que não foram trazidos aos autos elementos hábeis a abalar as conclusões nele contidas.

Nesse contexto, “a mera irresignação do segurado com a conclusão do perito ou a alegação de que o laudo é contraditório ou omisso, sem o apontamento de nenhuma divergência técnica justificável, não constituem motivos aceitáveis para a realização de nova perícia, apresentação de quesitos complementares ou realização de diligências” (9.ª Turma, Apelação Cível 5897223-19.2019.4.03.9999, rel. Desembargadora Federal Daldice Santana, e - DJF3 Judicial 1 de 3/3/2020).

No mesmo sentido, precedentes desta Turma:

 

"PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE LABORAL NÃO CONSTATADA.

I- O laudo pericial foi devidamente apresentado, tendo sido respondidos os quesitos formulados pelas partes, restando esclarecida a questão referente à capacidade laboral do demandante.

II- Submetida a parte autora a perícia medica judicial, que concluiu pela ausência de incapacidade laboral, improcede o pedido de concessão do benefício (aposentadoria por invalidez ou auxílio doença).

III - Preliminar rejeitada. Apelação da parte autora desprovida."

(Apelação Cível 0020087-98.2018.4.03.9999, rel. Desembargador Federal David Dantas, j. 8/10/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:23/10/2018)

 

“PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO DOENÇA. REALIZAÇÃO DE NOVA PERÍCIA. DESNECESSIDADE. AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE.

I- A perícia médica foi devidamente realizada por Perito nomeado pelo Juízo a quo, tendo sido apresentado o parecer técnico devidamente elaborado, com respostas claras e objetivas, motivo pelo qual não merece prosperar o pedido de realização de nova prova pericial por médico especialista. Cumpre ressaltar que o magistrado, ao analisar o conjunto probatório, pode concluir pela dispensa de produção de outras provas, nos termos do parágrafo único do art. 370 do CPC.

II- Os requisitos previstos na Lei de Benefícios para a concessão da aposentadoria por invalidez compreendem: a) o cumprimento do período de carência, quando exigida, prevista no art. 25 da Lei n° 8.213/91; b) a qualidade de segurado, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios e c) a incapacidade definitiva para o exercício da atividade laborativa. O auxílio doença difere apenas no que tange à incapacidade, a qual deve ser temporária.

III- In casu, a alegada invalidez não ficou caracterizada pela perícia médica, conforme parecer técnico elaborado pelo Perito. Afirmou o esculápio encarregado do exame que a autora, nascida em 17/7/59, “salgadeira”, é portadora de episódio depressivo grave com sintomas psicóticos, transtorno de adaptação, escoliose lombar, espondilartrose lombar e transtorno do plexo lombossacral, concluindo que não há incapacidade para o trabalho. Esclareceu o esculápio que a autora é “portadora de patologias do sistema musculoesquelético, alterações multifatorial como fatores genéticos, degenerativos, traumas, má postura, onde pode surgir sintomas associados com quadro de inflamação, dores, desconforto e limitações. O tratamento é sugerido pelo médico especialista, tratamento conservador com fisioterapia, uso de medicações. Autora relata estar mantendo acompanhamento com especialista, e com programação de fisioterapia agendada, relata uso de medicações quando tem quadro de dores, e faz uso de medicações de uso contínuo para pressão arterial e estabilidade do humor. Mediante avaliação não constatado comprometimento físico que impeça de exercer suas atividades laborativas atuais” (ID 73285409, grifos meus).

IV- Preliminar rejeitada. No mérito, apelação improvida.” (grifos nossos)

(Apelação Cível 5787526-63.2019.4.03.9999, rel. Desembargador Federal Newton de Lucca, j. 6/11/2019, Intimação via sistema DATA: 8/11/2019)

 

Forçoso, portanto, o reconhecimento da improcedência do pedido.

Posto isso, rejeito a matéria preliminar e nego provimento à apelação.

É o voto.

 

THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora



E M E N T A

 

PREVIDENCIÁRIO. CERCEAMENTO DE DEFESA. NULIDADE DO LAUDO PERICIAL. INSUBSISTÊNCIA DA ALEGAÇÃO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA. AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE LABORATIVA. PRESTÍGIO DO LAUDO PERICIAL JUDICIAL. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.

- Insuficiência do inconformismo para gerar dúvidas quanto à integridade do documento médico produzido.

- Rejeição da matéria preliminar.

- Os requisitos à aposentadoria por invalidez, conforme preceituam os arts. 42 e seguintes da Lei n.° 8.213/91, consistem na presença da qualidade de segurado, na existência de incapacidade total e permanente para o trabalho e na ocorrência do cumprimento da carência, nas hipóteses em que exigida. O auxílio-doença, por sua vez, é concedido nos casos de incapacidade temporária.

- Constatada pela perícia médica a capacidade laborativa, resta indevida a concessão do benefício.

- Reconhecimento da improcedência do pedido formulado.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por unanimidade, decidiu rejeitar a matéria preliminar e negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.