Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 6225397-62.2019.4.03.9999

RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA

APELANTE: MARIA DE LOURDES MOREIRA DUARTE SILVA

Advogados do(a) APELANTE: JOSE APARECIDO COSTA DE MIRANDA - SP95036-N, JOSIANY KEILA MACENO DE MIRANDA BAGGIO - SP201043-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 6225397-62.2019.4.03.9999

RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA

APELANTE: MARIA DE LOURDES MOREIRA DUARTE SILVA

Advogados do(a) APELANTE: JOSE APARECIDO COSTA DE MIRANDA - SP95036-N, JOSIANY KEILA MACENO DE MIRANDA BAGGIO - SP201043-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

­R E L A T Ó R I O

 

Demanda proposta objetivando a concessão de aposentadoria por idade a trabalhadora rural, prevista no art. 143 da Lei n.º 8.213/91.

O juízo a quo julgou improcedente o pedido formulado.

A parte autora apela, pleiteando a reforma da sentença, sustentando, em síntese, o cumprimento dos requisitos legais necessários à concessão pretendida.

Sem contrarrazões, subiram os autos.

É o relatório.

THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 6225397-62.2019.4.03.9999

RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA

APELANTE: MARIA DE LOURDES MOREIRA DUARTE SILVA

Advogados do(a) APELANTE: JOSE APARECIDO COSTA DE MIRANDA - SP95036-N, JOSIANY KEILA MACENO DE MIRANDA BAGGIO - SP201043-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

­V O T O

 

Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.

APOSENTADORIA POR IDADE (RURAL)

O benefício de aposentadoria por idade a trabalhador rural encontra-se disciplinado nos arts. 39, inciso I; 48, §§ 1.º e 2.º; e 143 da Lei n.º 8.213/91.

Antes mesmo do advento da Lei de Benefícios, a Lei Complementar n.º 11, de 25 de maio de 1971, que instituiu o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural, em seu art. 4.º dispunha que a aposentadoria seria devida quando se completassem 65 anos de idade, cabendo a concessão do benefício apenas ao respectivo chefe ou arrimo de família (parágrafo único).

Por sua vez, de acordo com o art. 5.º da Lei Complementar n.º 16/73, o trabalhador rural deveria comprovar a sua atividade pelo menos nos três últimos anos anteriores à data do pedido do benefício.

Referidos dispositivos não foram recepcionados pela Constituição Federal de 1988, que passou para 60 anos, para homens, e 55, para mulheres, a idade mínima exigida para a concessão do benefício (art. 201, § 7.º, inciso II), excluindo a exigência da condição de chefe de família.

Além do requisito etário (60 anos, se homem, e 55 anos, se mulher), o trabalhador rural deve comprovar o exercício de atividade rural, mesmo que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do benefício.

O dispositivo legal citado deve ser analisado em consonância com o art. 142 da Lei de Benefícios.

Não se exige do trabalhador rural o cumprimento de carência (art. 26, inciso III), como o dever de verter contribuição por determinado número de meses, senão a comprovação do exercício laboral durante o período respectivo.

Vale dizer: em relação às contribuições previdenciárias, é assente, desde sempre, o entendimento de serem desnecessárias, sendo suficiente a comprovação do efetivo exercício de atividade no meio rural (STJ, REsp n.º 207.425, 5.ª Turma, j. em 21/9/1999, v.u., DJ de 25/10/1999, p. 123, Rel. Ministro Jorge Scartezzini; e STJ, RESP n. 502.817, 5.ª Turma, j. em 14/10/2003, v.u., DJ de 17/11/2003, p. 361, Rel. Ministra Laurita Vaz).

Noutro passo, com relação ao art. 143 da Lei n.º 8.213/91, a regra transitória assegurou aos rurícolas o direito de requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos, contados da vigência da referida Lei.

Assim, o referido prazo expiraria em 25/7/2006.

Entretanto, em relação ao trabalhador rural enquadrado como segurado empregado ou como segurado contribuinte individual, que presta serviços de natureza rural, em caráter eventual, a uma ou mais empresas, sem relação de emprego, o aludido prazo foi prorrogado por mais 2 (dois) anos, estendendo-se até 25/7/2008, em face do disposto na MP n.º 312/06, convertida na Lei n.º 11.368/06.

Posteriormente, a Medida Provisória n.º 410/07, convertida na Lei n.º 11.718/08, estabeleceu nova prorrogação para o prazo previsto no art. 143 da Lei n.º 8.213/91, ao determinar, em seu art. 2.º, que “Para o trabalhador rural empregado, o prazo previsto no art. 43 da Lei n.º 8.213/91, de 24 de julho de 1991, fica prorrogado até o dia 31 de dezembro de 2010” (art. 2.º) e, em seu art. 3.º, que “Na concessão de aposentadoria por idade do empregado rural , em valor equivalente ao salário mínimo, serão contados para efeito de carência: I - até 31 de dezembro de 2010, a atividade comprovada na forma do art. 143 da Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991; II - de janeiro de 2011 a dezembro de 2015, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 3 (três), limitado a 12 (doze) meses, dentro do respectivo ano civil; e III - de janeiro de 2016 a dezembro de 2020, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 2 (dois), limitado a 12 (doze) meses dentro do respectivo ano civil”.

É de observar-se que, para os empregados rurais e contribuintes individuais eventuais, a regra permanente do art. 48 da Lei n.º 8.213/91 continua a exigir, para concessão de aposentadoria por idade a rurícolas, apenas a comprovação do efetivo exercício de "atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido", consoante §§ 1.º e 2.º do referido dispositivo.

Essa comprovação do labor rural, nos termos dos arts. 48 e 143 da Lei de Benefícios, dar-se-á por meio de prova documental, ainda que incipiente, e, nos termos do art. 55, § 3.º, da retrocitada Lei, corroborada por prova testemunhal.

Acrescente-se que a jurisprudência de longa data vem atentando para a necessidade dessa conjunção de elementos probatórios (início de prova documental e colheita de prova testemunhal), o que resultou até mesmo na edição do verbete n.º 149 da Súmula da Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:”

"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".

DO CASO DOS AUTOS

O requisito etário restou satisfeito, pois a parte autora completou a idade mínima em 23/01/2013, devendo fazer prova do exercício de atividade rural por 180 meses.

Para demonstrar as alegações, juntou documentos, entre os quais destacam-se:

- certidão de casamento, celebrado em 15/09/1984, com ADILSON CARLOS DA SILVA – que, naquela ocasião, já exercia a profissão de trabalhador rural;

- cópia da CTPS da requerente, sem registro de vínculos empregatícios rurais ou urbanos;

- CTPS do Sr. ADILSON CARLOS DA SILVA,  expedida em 1985, com diversos registros de contratos de trabalhos rurais no período de 1985 em diante, na “FAZENDA VITÓRIA”, na “ESTÂNCIA PRIMAVERA”, na “ESTÂNCIA FRANCO”, no “SÍTIO SANTO ANTÔNIO”, no “SÍTIO N. S. APARECIDA”, no “SÍTIO SÃO JOSÉ”, na “FAZENDA N. S. APARECIDA”, no “SÍTIO DA VOVÓ CIDA” e na “ESTÂNCIA ANGRA DOS REIS” (com admissão em 2008 e sem data fim em CTPS) – todos estabelecimentos agrícolas e de agropecuária, no cargo de “trabalhador rural”, “serviços gerais de lavoura”, “auxiliar geral de agropecuária”, “trabalhador braçal” e “trabalhador rural polivalente”, respectivamente.

Consta dos autos o comprovante de que o benefício de aposentadoria por idade rural requerido pela autora em 07/04/2017 foi indeferido na esfera administrativa.

Da consulta atualizada ao Sistema CNIS da Previdência Social, em nome da autora, não constam registros de atividades laborativas, o que se coaduna com as alegações da requerente, de que sempre trabalhou sem registro.

Embora não conste do referido Sistema vínculo da demandante em atividade rural, também não há registros de atividades urbanas em seu nome.

Cumpre mencionar que, mesmo sendo o marido empregado rural com registro em CTPS, a jurisprudência admite a extensão da condição à esposa, no pressuposto de que o trabalho desenvolvido pela mulher, diante da situação peculiarmente difícil no campo, se dê em auxílio a seu cônjuge, visando aumento de renda para obter melhores condições de sobrevivência.

E é de sabença comum que, vivendo na zona rural, a família trabalha em mútua colaboração, reforçando a capacidade laborativa, de modo a alcançar superiores resultados, retirando da terra o seu sustento.

Nesse sentido, julgado da 8.ª Turma deste E. Tribunal, do qual se extrai:

“PREVIDENCIÁRIO. RURAL. APOSENTADORIA POR IDADE. PROVA DOCUMENTAL E TESTEMUNHAL SUFICIENTES. REQUISITOS SATISFEITOS. PERÍODO DE CARÊNCIA CUMPRIDO. DESNECESSIDADE DE CONTRIBUIÇÕES.

- Início de prova escrita corroborada pela prova testemunhal justifica o reconhecimento do exercício de atividade rural para efeito de aposentadoria por idade.

- Documentos de identificação da autora, nascida em 11.06.1961.

- Certidão de nascimento da autora em 11.06.1961, qualificando o pai e a mãe como lavradores.

- Certidão de casamento em 24.09.1990, qualificando o marido como lavrador.

- Certidão de nascimento do filho em 29.12.1982, qualificando o pai como agricultor. Anotado o óbito em 22.03.2005.

- Certidão de óbito do filho em 22.03.2005, qualificando o pai como lavrador.

- Certidões de nascimento dos outros filhos em 03.08.1991 e 14.09.1992, qualificando o marido como lavrador.

- CTPS do marido da autora, constando vínculos em atividade rural, nos períodos de 16.01.2002 a 17.11.2009, e a partir de 02.08.2010 (sem data de saída).

- Comunicado do indeferimento do pedido de aposentadoria por idade, segurado especial, formulado na via administrativa em 13.06.2016.

- A Autarquia juntou consulta efetuada ao sistema Dataprev, não constando vínculos empregatícios da autora, e que recebe pensão por morte desde 28.09.2005, ramo atividade comerciário. Em nome do marido da autora, consta que requereu aposentadoria rural por idade, que foi indeferida. Também trouxe a inicial de ação judicial da autora pleiteando pensão por morte do filho.

- As testemunhas conhecem a autora há muito tempo e confirmam seu labor rural.

- A orientação pretoriana é no sentido de que a qualificação de lavrador do marido, constante de certidão emitida pelo registro civil, é extensível à esposa, constituindo-se em início razoável de prova material da sua atividade rural.

- A autora juntou início de prova material de sua condição de lavradora, o que corroborado pelo depoimento das testemunhas, que são firmes em confirmar que sempre trabalhou no campo, justifica a concessão do benefício pleiteado.

- Não há qualquer notícia no sistema DATAPREV, que tenha desenvolvido atividade urbana.

- A autora apresentou registros cíveis que qualificam o marido como lavrador, e é possível estender à autora a condição de lavrador do marido, bem como dos testemunhos que confirmam seu labor no campo, comprovam a atividade rural pelo período de carência legalmente exigido.

- A autora trabalhou no campo, por mais de 15 anos. É o que mostra o exame da prova produzida. Completou 55 anos em 2016, tendo, portanto, atendido às exigências legais quanto à carência, segundo o art. 142 da Lei nº 8.213/91, por prazo superior a 180 meses.

- O termo inicial deve ser mantido na data da comunicação do indeferimento administrativo em 17.08.2016, conforme fixado na sentença. Entendimento de que o termo inicial deve ser fixado na data do requerimento administrativo (13.06.2016), pois representa o momento em que a Autarquia tomou conhecimento do pleito, não é possível no caso, pois não houve insurgência da parte autora.

- Com relação aos índices de correção monetária e taxa de juros de mora, deve ser observado o julgamento proferido pelo C. Supremo Tribunal Federal na Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947, bem como o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal em vigor por ocasião da execução do julgado.

- Nas ações de natureza previdenciária, a verba deve ser fixada em 10% do valor da condenação, até a sentença (Súmula nº 111 do STJ).

- Apelação do INSS parcialmente provida.”

(TRF3, AC 5038619-35.2018.4.03.9999, Rel. Des. Fed. DIVA MALERBI, 8.ª Turma, j. 07/05/2019).

Frise-se que o fato de o marido da autora ter exercido atividade urbana em curto período (apenas um vínculo em CTPS, de 04/04 a 10/05/1990 – na ocasião da entressafra) não afasta o direito da requerente ao benefício vindicado, eis que restou provada a predominância da atividade rural durante todo o período produtivo de exercício laboral. Cabe lembrar que tal vínculo ocorreu antes da carência do aludido benefício.

Nesse sentido, esta Corte assim vem decidindo:

“PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO LEGAL. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. DECISÃO FUNDAMENTADA.

(...) III - Não há que se considerar o registro em trabalho urbano do cônjuge, para descaracterizar a atividade rurícola alegada, porque se deu por período curto e muito provavelmente em época de entressafra, em que o trabalhador rural necessita buscar outra atividade que lhe garanta a subsistência.

IV - Vínculos empregatícios em atividade urbana, se deram de forma descontínua, por pequenos lapsos temporais.

V - A interpretação da regra contida no artigo 143 possibilita a adoção da orientação imprimida nos autos. É que a expressão "atividade rural, ainda que descontínua", inserta na norma, permite concluir que tal descontinuidade possa corresponder a tantos períodos quantos forem aqueles em que o trabalhador exerceu a atividade no campo. Mesmo que essa interrupção, ou descontinuidade se refira ao último período.

VI - Autor(a) trabalhou no campo por mais de 13 (treze) anos. É o que mostra o exame da prova produzida. Completou 60 anos em 2006, tendo, portanto, atendido às exigências legais quanto à carência, segundo o artigo 142 da Lei nº 8.213/91, por prazo superior a 150 meses.

VII - Não se exige, para efeito de aposentadoria por idade, que o trabalhador rural contribua para os cofres da Previdência, segundo preceito inserto nos referidos arts. 26, III, 39, I e 143, c.c.art. 55 § 2º.

VIII - Matéria dispensa maior digressão, estando comprovado o exercício da atividade no campo, com razoável início de prova documental.

IX - Agravo não provido.”

(TRF 3ªR, AC 200761230003146, Relatora JUIZA MARIANINA GALANTE, OITAVA TURMA -  DJF3 de 27/07/2010 -g.n.).

"PREVIDENCIÁRIO/PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. ATIVIDADE RURAL PELO PERÍODO DE CARÊNCIA COMPROVADA. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR CONFIGURADO. CARÊNCIA MINIMA E QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL CONFIRMADA. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA. SENTENÇA MANTIDA EM PARTE.

1. A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55 anos, se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de atividade rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei. De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material corroborado por prova testemunhal.

2. A parte autora pleiteia a aposentadoria por idade rural em regime de economia familiar, alegando o trabalho conjuntamente com seu marido na propriedade pertencente à família do marido e, para comprovar o alegado acostou aos autos cópias de sua certidão de casamento, contraído no ano de 1984 e certidões de nascimento dos filhos, nascidos respectivamente nos anos de 1991, 2002 e 1986, em cujas certidões a autora se declarou como sendo do lar e seu marido como lavrador; CTPS da autora constando um pequeno contrato de trabalho exercido como empregada doméstica no período compreendido entre o ano de 2004 e 2005; CTPS do marido constando apenas sua qualificação civil; formal de partilha e averbação quinhão de herança recebida pelo marido da autora no ano de 1993, constando uma área rural de 4,95 hectares de terras, ou seja, 2,04 alqueires; ITR em nome do genitor de seu marido; notas fiscais de venda de produtos no referido imóvel nos anos de 2010, 2012 e 2017 em nome de seu marido e fotografia da família da autora dos tempos de outrora.

3. Esses documentos demonstram que seu marido sempre exerceu atividade rural e em regime de economia familiar, seja com seus pais, seja com a autora, visto não constar nenhum documento que comprove o contrário, aliado ao fato de que em todos os documentos apresentados seu marido se apresenta como lavrador e, nesse sentido, é cediço que a extensão da qualidade de trabalhador rural só é possível quando o trabalho é exercido em regime de economia familiar, conforme o caso in tela.

4. Observo que a parte autora exerceu por um curto período, compreendido entre 31/05/2004 a 11/03/2005 atividade como empregada doméstica o que não desfaz sua condição de trabalhadora rural em regime de economia familiar juntamente com seu marido, visto se tratar de um pequeno período de trabalho e pelos depoimentos testemunhais que demonstraram de forma precisa que o trabalho da autora se deu sempre na companhia do marido no pequeno imóvel da família, plantando milho, feijão e outros cereais, conforme demonstram as notas fiscais apresentadas, em nome de seu marido nos anos de 2010, 2011 e 2017.

5. A prova material demonstra o trabalho rural da autora em regime de economia familiar pelo período de carência exigido, assim como seu labor rural no alegado regime de trabalho até a data do seu implemento etário, sendo corroborada pelas testemunhas ouvidas em juízo, sob o crivo do contraditório, as quais corroboraram as alegações da autora sendo ambas uníssonas em afirmar que a autora sempre trabalhou na lavoura prestando serviços a terceiros.

6. Os recolhimentos esparsos vertidos pela parte autora nos interstícios de outubro de 2013 a março de 2016 não desfaz sua condição de trabalhadora rural em regime de economia familiar, visto que estes apenas reforçam o direito da parte autora em receber um benefício previdenciário, não podendo ser prejudicada por verter contribuições a fim de preservar a garantida de seu direito à um benefício de aposentadoria que lhe garanta seu sustento e de sua família num futuro.

7. Do conjunto probatório apresentado, restou satisfatoriamente demonstrado o trabalho rural da autora no alegado regime de economia familiar, útil a subsidiar todo período de carência necessário para a concessão da aposentadoria por idade rural, devendo ser mantida a sentença de procedência do pedido, visto que presentes os requisitos necessários para seu deferimento.

8. No concernente ao termo inicial do benefício, mantendo o determinado na sentença, a partir do requerimento administrativo (13.12.2017), tendo em vista trata-se de um direito adquirido, embora tenha sido reconhecido tardiamente, não havendo reforma nesse sentido.

9. Quanto ao cálculo dos juros de mora e correção monetária, apliquem-se os critérios estabelecidos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta de liquidação, observando-se o decidido nos autos do RE 870947.

10. A verba honorária de sucumbência incide no montante de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, conforme entendimento desta Turma (artigo 85, §§ 2º e 3º, do Código de Processo Civil/2015), aplicada a Súmula 111 do C. superior Tribunal de Justiça, segundo a qual os honorários advocatícios, nas ações de cunho previdenciário, não incidem sobre o valor das prestações vencidas após a data da prolação da sentença.

11. Apelação do INSS parcialmente provida.

12. Sentença mantida em parte.” (g.n.)

(TRF 3ªR, AC 5481404-10.2019.4.03.9999, Relator Desembargador Federal TORU YAMAMOTO, SÉTIMA TURMA, v.u., j. 27.01.20, DJe 09.03.20)

No mesmo sentido, precedente do C. Superior Tribunal de Justiça:

PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. CONDIÇÃO DE RURÍCOLA. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE URBANA POR CURTOS PERÍODOS. POSSIBILIDADE.

1. O trabalhador rural, considerado segurado especial, deve comprovar o efetivo trabalho rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente ao requerimento do benefício.

2. A intercalação do labor campesino com curtos períodos de trabalho não rural não afasta a condição de segurado especial do lavrador.

3. Agravo regimental não provido.” (g.n.)

(AgRg no Ag nº 167.141, Primeira Turma, Relator Ministro Benedito Gonçalves, v.u., j. 25.06.13, DJe 02.08.13).

Cabe destacar a existência de prova oral. A audiência foi realizada no dia 07/12/2018 perante o MM. Juízo da 1.ª Vara da Comarca de Buritama, Estado de São Paulo. Os depoimentos foram gravados em mídia pelo sistema audiovisual.

As testemunhas declararam que conhecem a parte autora há bastante tempo e confirmam o alegado labor rural.

Da oitiva das mídias constantes do link indicado pelo Juízo de 1.º grau (ID n.º 148751484), é possível verificar que a testemunha NOÉ PEIXOTO NASCIMENTO afirmou que conhece a autora há cerca de 20 anos, pois foi seu vizinho pelo período de 1991 a 1994.

Informou que, nessa época em que conheceu a autora, o depoente trabalhou na roça do sítio em que a autora e seu marido moravam e trabalhavam. Afirmou que a autora "cuidava das criações pequenas" do referido sítio, enquanto que o marido da autora exercia o trabalho mais pesado (com o auxílio do depoente), fazendo cerca e contando gado, na FAZENDA DE DONA ERMINDA.

Ao ser perguntado se “o marido da autora era registrado como empregado rural desse sítio”, o depoente respondeu que “ele era registrado sim”. Indagado se “Dona Maria de Lourdes era registrada como empregada rural desse sítio”, o depoente respondeu que “ela não era registrada não”.

Acrescentou que o casal morava dentro da fazenda na qual trabalhava e que o depoente também residia nessa fazenda, só que o depoente morava na sede e a Dona Maria de Lourdes e seu marido moravam numa casinha no meio dessa roça. Declarou que "Dona Maria de Lourdes plantava na lavoura e que também cuidava da criação pequena da referida propriedade rural".

O depoente relatou que morou por três anos nessa fazenda e que depois saiu de lá, mas que Dona Maria de Lourdes e o marido continuaram morando e trabalhando na mencionada fazenda.

Questionado sobre "qual é o tipo de atividade que a Dona Maria de Lourdes faz atualmente", o depoente respondeu que, na ocasião da audiência, “a autora atualmente mora e trabalha em outra fazenda próxima a Araçatuba”. O depoente afirmou que o marido da autora está aposentado, mas ela não conseguiu aposentadoria, mas continua trabalhando nessa fazenda próxima à Araçatuba. Mencionou outros nomes de fazendas nas quais a autora trabalhou, a saber: na FAZENDA DO SR. ORLANDO CONTE, na FAZENDA DO DR. ASSIS e depois nessa fazenda próxima à Araçatuba.

Ao ser questionado sobre “se a autora já trabalhou na cidade”, o depoente respondeu que “não. Ela sempre trabalhou na lavoura e sempre morou na área rural, nos sítios e fazendas da região.”

Por sua vez, a testemunha LUIZ CARLOS MENDES declarou que conhece Dona Maria de Lourdes desde 1989/1990. Informou que, nessa época em que conheceu a autora, o depoente era funcionário da prefeitura e sempre passava pelo sítio do Sr. ARTUR FRANCO, no qual a autora e seu marido trabalhavam. Indagado se “o sítio era da autora e de seu marido”, o depoente respondeu que “não. A autora e seu marido (ADILSON CARLOS DA SILVA) eram funcionários desse sítio do Sr. ARTUR FRANCO.” Ao ser perguntado se “o marido da autora era registrado como empregado rural desse sítio”, respondeu que “não sei informar se ele era registrado”.

Acrescentou que a autora e seu marido faziam os diversos serviços rurais nessa propriedade e que, posteriormente, eles mudaram para o “SÍTIO DE DONA ERMINDA”. Depois, eles trabalharam no “SÍTIO ORLANDO CONTE” e iam mudando de propriedade em propriedade rural, mas o casal sempre trabalhou nos serviços da roça, nos sítios daquela região. Ao ser questionado sobre “se a autora já trabalhou na cidade”, o depoente respondeu que “não tem conhecimento de que Dona Maria de Lourdes tenha trabalhado na cidade”.

Indagado pelo Juízo a respeito do fato de autora ainda estar trabalhando na roça na ocasião da audiência, o depoente respondeu que “sim, atualmente, a autora reside e trabalha em um sítio próximo a Araçatuba”.

Por fim, o depoente afirmou que “acredita que o marido da autora se encontra aposentado, pelo fato de este ter sofrido um acidente quando caiu do cavalo no sítio em que trabalhava e fraturou uma vértebra”.

Diante dessas considerações, constata-se que, na presente hipótese, a prova testemunhal foi coesa e harmônica no que tange à prestação do trabalho rural da autora pelo interregno necessário à concessão do benefício requerido.

Insta salientar que a autora informou que se separou do Sr. ADILSON CARLOS DA SILVA, conforme certidão expedida em 19/06/2017. Todavia, importa observar que a separação do casal (decretada por sentença proferida pelo Juízo de Direito da Comarca de Buritama/SP) ocorreu após o registro do último vínculo empregatício constante da CTPS do ex-cônjuge da demandante – a saber: no cargo de “trabalhador rural”, para o empregador SÉRGIO OSMAR AGUIAR, com data de início em 04/09/2008 (sem data fim em CTPS) - na “ESTÂNCIA ANGRA DOS REIS” –estabelecimento agropecuário (ID n.º 109640397 - Pág. 7).

Ressalte-se que o Colendo Superior Tribunal de Justiça estabeleceu, no julgamento do RESP n.º 1.354.908/SP, sob a sistemática dos recursos representativos de controvérsia repetitiva, a necessidade da demonstração do exercício da atividade campesina em período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário.

No caso em tela, a carência para o benefício ora vindicado abrange o interregno compreendido entre janeiro de 1998 e janeiro de 2013, tendo em vista que a parte autora completou a idade mínima em 23/01/2013, devendo fazer prova do exercício de atividade rural por 180 meses.

Frise-se, ainda, que é dispensável que o início de prova material abranja todo o período de carência, contanto que a prova testemunhal amplie sua eficácia probatória. Assim:

"PREVIDENCIÁRIO – RECURSO ESPECIAL – RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL - PROVA TESTEMUNHAL CORROBORADA POR INÍCIO DE PROVA DOCUMENTAL.

- A exigência legal para a comprovação da atividade laborativa rural resulta na prova testemunhal, corroborada por um início razoável de prova documental, ainda que constituída por dados do registro civil, certidão de casamento, ou qualquer documento que mereça fé pública.

- No caso em exame, o autor apresentou certidão expedida pelo Registro de Imóveis da Comarca de Paulo de Faria, Estado de São Paulo (fls. 17/20), que comprova a existência da "Fazenda Figueira", e que se harmoniza com os depoimentos testemunhais demonstrando o exercício da atividade rurícola do autor, sem registro e contemporâneo ao período que pretende ver reconhecido.

- Precedentes desta Corte.

- Recurso conhecido e desprovido."

(REsp 422.095/SP, rel. Min. JORGE SCARTEZZINI, DJ de 23/09/2002 – g.n.)

De rigor, portanto, o deferimento do benefício, porquanto comprovado o exercício de atividade rural pelo período de carência legalmente exigido.

A aposentadoria corresponde ao valor de um salário-mínimo mensal, nos termos do art. 143 da Lei n.º 8.213/91.

O termo inicial do benefício previdenciário deve retroagir à data do requerimento administrativo, de acordo com a previsão contida no inciso II do art. 49 da Lei n.º 8.213/91. Na ausência de demonstração do requerimento, o termo inicial deve retroagir à data da citação, ocasião em que a autarquia tomou conhecimento da pretensão.

No caso, existe comprovação de requerimento, devendo o termo inicial ser nele fixado (07/04/2017).

Devida a gratificação natalina, nos termos preconizados no art. 7.º, inciso VIII, da Constituição da República.

Quer seja em relação aos juros moratórios, devidos a partir da citação, momento em que constituído o réu em mora; quer seja no tocante à correção monetária, incidente desde a data do vencimento de cada prestação, há que prevalecer tanto o decidido, sob a sistemática da repercussão geral, no Recurso Extraordinário n.º 870.947, de 20/9/2017, sob relatoria do Ministro Luiz Fux, quanto o estabelecido no Manual de Orientação de Procedimentos para Cálculos na Justiça Federal, em vigor por ocasião da execução do julgado, observada a rejeição dos embargos de declaração no âmbito do julgamento em epígrafe, em 03/10/2019.

Nos termos do art. 4.º, inciso I, da Lei Federal n.º 9.289/1996, o INSS está isento do pagamento de custas processuais nas ações de natureza previdenciária ajuizadas nesta Justiça Federal, assim como o está naquelas aforadas na Justiça do estado de São Paulo, por força do art. 6.º da Lei Estadual n.º 11.608/2003, c. c. o art. 1.º, § 1.º, da mesma Lei n.º 9.289/1996, circunstância que não o exime, porém, de arcar com as custas e as despesas processuais em restituição à parte autora, em decorrência da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.

Já no que diz respeito às ações propostas perante a Justiça do estado de Mato Grosso do Sul, as normativas que tratavam da aludida isenção (Leis Estaduais n.º 1.135/91 e n.º 1.936/98) restaram revogadas a partir da edição da Lei Estadual n.º 3.779/09 (art. 24, §§ 1.º e 2.º), pelo que, nos feitos advindos daquela Justiça Estadual, de rigor a imposição à autarquia previdenciária do pagamento das custas processuais, exigindo-se o recolhimento apenas ao final da demanda, caso caracterizada a sucumbência.

À vista do quanto disposto no art. 85 do Código de Processo Civil, sendo o caso de sentença ilíquida, o percentual da verba honorária deverá ser fixado na liquidação do julgado, com observância ao disposto no inciso II do § 4.º, c. c. o § 11, ambos do art. 85 do CPC, bem como no art. 86 do mesmo diploma legal.

Os honorários advocatícios incidem sobre as parcelas vencidas até a sentença de procedência (STJ, Súmula 111). Na hipótese em que a pretensão do segurado somente seja deferida em sede recursal, a verba honorária incidirá sobre as parcelas vencidas até a data da decisão ou acórdão, em atenção ao disposto no § 11 do art. 85 do CPC.

Posto isso, dou provimento à apelação, para reformar a sentença e julgar procedente o pedido formulado, fixando os critérios dos consectários e determinando a incidência de verba honorária nos termos da fundamentação, supra.

O benefício é de aposentadoria por idade de trabalhadora rural, no valor de um salário mínimo, com DIB em 07/04/2017.

É o voto.

 

 

THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora

 

 



E M E N T A

 

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE A TRABALHADORA RURAL. ART. 143 DA LEI N.º 8.213/91. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE DE RURÍCOLA NO PERÍODO ANTERIOR AO REQUERIMENTO. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.

- A atividade rural deve ser comprovada por meio de início de prova material, aliada à prova testemunhal.

- O conjunto probatório é suficiente para ensejar a concessão do benefício vindicado.

- Reconhecimento da procedência do pedido formulado.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por unanimidade, decidiu dar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.