APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5694877-79.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: JOAO FERNANDES DA SILVA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: EMERSON BARJUD ROMERO - SP194384-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, JOAO FERNANDES DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: EMERSON BARJUD ROMERO - SP194384-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5694877-79.2019.4.03.9999 RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA APELANTE: JOAO FERNANDES DA SILVA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS Advogado do(a) APELANTE: EMERSON BARJUD ROMERO - SP194384-N APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, JOAO FERNANDES DA SILVA Advogado do(a) APELADO: EMERSON BARJUD ROMERO - SP194384-N OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Demanda proposta objetivando a concessão de aposentadoria por idade a trabalhador rural, prevista no art. 143 da Lei n.º 8.213/91. O juízo a quo julgou parcialmente procedente o pedido formulado, reconhecendo à parte autora o direito ao benefício pretendido, “desde a citação.” Concedeu a tutela antecipada, determinando a implantação da aposentadoria, no prazo de cinco dias. O INSS apela, requerendo, preliminarmente, o recebimento do recurso no duplo efeito. No mérito, pleiteia a reforma da sentença, sustentando, em síntese, o não cumprimento dos requisitos legais necessários à concessão em questão. Ao final, prequestiona a matéria. A parte autora também apela, pugnando pela reforma parcial da sentença, a fim de modificar a data de início do benefício aposentadoria por idade rural, para a data do requerimento administrativo. Pleiteou, outrossim, a condenação do instituto réu “ao pagamento da verba de sucumbência a ser fixada nos termos do §2.º do artigo 85 do Código de Processo Civil correspondente a todo proveito econômico obtido com a demanda, o qual deverá ser apurado na fase de liquidação de sentença (art. 85, §4º, II do CPC)”, bem como “a majoração da verba honorária nos termos do §11 do art. 85 do CPC”. Ao final, prequestiona a matéria. Com contrarrazões da parte autora, subiram os autos. É o relatório. THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5694877-79.2019.4.03.9999 RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA APELANTE: JOAO FERNANDES DA SILVA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS Advogado do(a) APELANTE: EMERSON BARJUD ROMERO - SP194384-N APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, JOAO FERNANDES DA SILVA Advogado do(a) APELADO: EMERSON BARJUD ROMERO - SP194384-N OUTROS PARTICIPANTES: V O T O A alegação veiculada pelo INSS, concernente ao recebimento da apelação no duplo efeito, não se coloca na hipótese dos autos, ante a prevalência da regra geral prevista no caput do art. 1.012 do Código de Processo Civil, segundo o qual a apelação terá efeito suspensivo, e a circunstância de não se estar a tratar, aqui, de nenhuma das situações previstas no § 1.º desse mesmo dispositivo legal do CPC, a que se fez menção. Tempestivos os recursos e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução. APOSENTADORIA POR IDADE (RURAL) O benefício de aposentadoria por idade a trabalhador rural encontra-se disciplinado nos arts. 39, inciso I; 48, §§ 1.º e 2.º; e 143 da Lei n.º 8.213/91. Antes mesmo do advento da Lei de Benefícios, a Lei Complementar n.º 11, de 25 de maio de 1971, que instituiu o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural, em seu art. 4.º dispunha que a aposentadoria seria devida quando se completassem 65 anos de idade, cabendo a concessão do benefício apenas ao respectivo chefe ou arrimo de família (parágrafo único). Por sua vez, de acordo com o art. 5.º da Lei Complementar n.º 16/73, o trabalhador rural deveria comprovar a sua atividade pelo menos nos três últimos anos anteriores à data do pedido do benefício. Referidos dispositivos não foram recepcionados pela Constituição Federal de 1988, que passou para 60 anos, para homens, e 55, para mulheres, a idade mínima exigida para a concessão do benefício (art. 201, § 7.º, inciso II), excluindo a exigência da condição de chefe de família. Além do requisito etário (60 anos, se homem, e 55 anos, se mulher), o trabalhador rural deve comprovar o exercício de atividade rural, mesmo que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do benefício. O dispositivo legal citado deve ser analisado em consonância com o art. 142 da Lei de Benefícios. Não se exige do trabalhador rural o cumprimento de carência (art. 26, inciso III), como o dever de verter contribuição por determinado número de meses, senão a comprovação do exercício laboral durante o período respectivo. Vale dizer: em relação às contribuições previdenciárias, é assente, desde sempre, o entendimento de serem desnecessárias, sendo suficiente a comprovação do efetivo exercício de atividade no meio rural (STJ, REsp n.º 207.425, 5.ª Turma, j. em 21/9/1999, v.u., DJ de 25/10/1999, p. 123, Rel. Ministro Jorge Scartezzini; e STJ, RESP n. 502.817, 5.ª Turma, j. em 14/10/2003, v.u., DJ de 17/11/2003, p. 361, Rel. Ministra Laurita Vaz). Noutro passo, com relação ao art. 143 da Lei n.º 8.213/91, a regra transitória assegurou aos rurícolas o direito de requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos, contados da vigência da referida Lei. Assim, o referido prazo expiraria em 25/7/2006. Entretanto, em relação ao trabalhador rural enquadrado como segurado empregado ou como segurado contribuinte individual, que presta serviços de natureza rural, em caráter eventual, a uma ou mais empresas, sem relação de emprego, o aludido prazo foi prorrogado por mais 2 (dois) anos, estendendo-se até 25/7/2008, em face do disposto na MP n.º 312/06, convertida na Lei n.º 11.368/06. Posteriormente, a Medida Provisória n.º 410/07, convertida na Lei n.º 11.718/08, estabeleceu nova prorrogação para o prazo previsto no art. 143 da Lei n.º 8.213/91, ao determinar, em seu art. 2.º, que “Para o trabalhador rural empregado, o prazo previsto no art. 43 da Lei n.º 8.213/91, de 24 de julho de 1991, fica prorrogado até o dia 31 de dezembro de 2010” (art. 2.º) e, em seu art. 3.º, que “Na concessão de aposentadoria por idade do empregado rural , em valor equivalente ao salário mínimo, serão contados para efeito de carência: I - até 31 de dezembro de 2010, a atividade comprovada na forma do art. 143 da Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991; II - de janeiro de 2011 a dezembro de 2015, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 3 (três), limitado a 12 (doze) meses, dentro do respectivo ano civil; e III - de janeiro de 2016 a dezembro de 2020, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 2 (dois), limitado a 12 (doze) meses dentro do respectivo ano civil”. É de observar-se que, para os empregados rurais e contribuintes individuais eventuais, a regra permanente do art. 48 da Lei n.º 8.213/91 continua a exigir, para concessão de aposentadoria por idade a rurícolas, apenas a comprovação do efetivo exercício de "atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido", consoante §§ 1.º e 2.º do referido dispositivo. Essa comprovação do labor rural, nos termos dos arts. 48 e 143 da Lei de Benefícios, dar-se-á por meio de prova documental, ainda que incipiente, e, nos termos do art. 55, § 3.º, da retrocitada Lei, corroborada por prova testemunhal. Acrescente-se que a jurisprudência de longa data vem atentando para a necessidade dessa conjunção de elementos probatórios (início de prova documental e colheita de prova testemunhal), o que resultou até mesmo na edição do verbete n.º 149 da Súmula da Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:” "A prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário". DO CASO DOS AUTOS O requisito etário restou satisfeito, pois a parte autora completou a idade mínima em 23/06/2007, devendo fazer prova do exercício de atividade rural por 156 meses. Para demonstrar as alegações, juntou documentos, entre os quais destacam-se: - cópia da certidão de nascimento do requerente, em 23/06/1947, sem a qualificação dos genitores (Sr. JOÃO RODRIGUES CORDEIRO e MARCELINA FERNANDES DA SILVA); - cópia da certidão de nascimento, em 22/01/1979, de CLAUDETE FERNANDES DA SILVA - filha do requerente, qualificado como “lavrador” e de CARMELITA FERREIRA DA SILVA; - cópia da carteira de membro do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Jacarezinho/MG, comprovando que o requerente é lavrador filiado àquele sindicato desde 1980; - cópia da certidão de nascimento, em 29/04/1987, de VALMIR FERNANDES DA SILVA - filho do requerente, qualificado como “lavrador” e de CARMELITA FERREIRA DA SILVA; - cópia da certidão de nascimento, em 27/07/1991, de RENATO FERNANDES DA SILVA - filho do requerente, qualificado como “lavrador” e de CARMELITA FERREIRA DA SILVA; - cópia da Carteira de Trabalho e Previdência Social do autor, de onde se extraem diversos vínculos empregatícios rurais, desde 1972 até 2002 (ID n.º 65593499 - Págs. 17 a 26); - cópia da decisão de indeferimento, na esfera administrativa, do benefício de aposentadoria por idade rural requerido pela autora em 25/01/2016. A consulta atualizada ao Sistema CNIS confirma apenas alguns dos vínculos empregatícios constantes da referida CTPS apresentada nos autos. Não se pode perder de vista que o fato de alguns desses vínculos empregatícios indicados na CTPS do autor não constarem do Sistema CNIS da Previdência Social em nada impede o reconhecimento da veracidade de tais registros. Frise-se que as anotações em CTPS gozam de presunção de veracidade juris tantum, devendo o INSS demonstrar a ocorrência de eventual irregularidade para desconsiderá-las. Vale dizer, à autarquia previdenciária cabe provar a falsidade das declarações inseridas na carteira de trabalho do autor, ou, em outras palavras, demonstrar a inexistência dos vínculos empregatícios nela constantes. Nesse sentido, já decidiu o Tribunal Regional do Trabalho da 2.ª Região: "Conquanto diga o Enunciado n.° 12 do C. TST que as anotações apostas pelo empregador na carteira profissional do empregado não geram presunção "iure et iure", mas apenas "iures tantum", menos certo não é que anotada a carteira profissional do reclamante, inverte-se o ônus da prova incumbindo à reclamada, que reconhece a anotação, fazer prova das alegações da defesa." (TRT/SP - RO Processo n.º 95.02950368365; Relator: Desembargador BRAZ JOSÉ MOLLICA; 1.ª Turma; DJ: 27.02.97). "...CTPS. Anotações. Valor probante. A presunção de relatividade quanto aos registros em carteira de trabalho não pode ser dissociada do princípio da condição mais benéfica (...) Se é certo que o erro de fato não gera direito, quando provado, não menos certo é que a condição anotada em CTPS e não infirmada reveste-se do caráter de direito adquirido." (TRT/SP - RO Processo n.º 20000587430; Relatora: Desembargadora WILMA NOGUEIRA DE ARAUJO VAZ DA SILVA; 8.ª Turma; DJ: 20.08.2002) E levando-se em conta que, nos termos da alínea "a" do inciso I do art. 30 da Lei n.º 8.212/91, compete à empresa arrecadar as contribuições previdenciárias dos segurados empregados a seu serviço, descontando-as da respectiva remuneração e repassando-as ao INSS, a que incumbe a fiscalização do devido recolhimento, é de se admitir como efetuadas as arrecadações relativas ao período de trabalho registrado em CTPS, visto que o empregado não pode ser prejudicado por eventual desídia do empregador e da autarquia, se estes não cumpriram as obrigações que lhes eram imputadas. Na linha do exposto é o entendimento firmado nesta Corte tanto pela 8.ª quanto pela 9ª Turma (ApCiv n.º 0003132-07.2014.4.03.6127 – Relator: Desembargador Federal DAVID DANTAS – Publicado em 23/01/2018; ApCiv n.º 6090125-96.2019.4.03.9999 – Relatora: Desembargadora Federal DALDICE SANTANA – Publicado em 26/03/2020; ApCiv n.º 5876105-84.2019.4.03.9999 – Relator: Desembargador Federal GILBERTO JORDAN – Publicado em 24/03/2020 e ApCiv n.º 5196569-73.2019.4.03.9999 – Relatora: Juíza Federal Convocada VANESSA MELLO – Publicado em 11/02/2020). Da consulta atualizada ao CNIS/DATAPREV, verifica-se que o autor recebeu benefício de “auxílio-doença” nos períodos de 28/08/2000 a 11/09/2002, de 17/03/2003 a 17/04/2003, de 27/07/2003 a 13/09/2007 e de 11/01/2008 a 01/05/2008. Nos termos do art. 29, § 5.º e do art. 55, II, ambos da Lei n.º 8.213/1991, in verbis: “Art. 29 - O salário-de-benefício consiste: (...) § 5.º - Se, no período básico de cálculo, o segurado tiver recebido benefícios por incapacidade, sua duração será contada, considerando-se como salário-de-contribuição, no período, o salário-de-benefício que serviu de base para o cálculo da renda mensal, reajustado nas mesmas épocas e bases dos benefícios em geral, não podendo ser inferior ao valor de 1 (um) salário mínimo.” (...) Art. 55 - O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento, compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado: (...) II - o tempo intercalado em que esteve em gozo de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez;” Conforme estabelecia o inciso III do art. 60 do Decreto n.º 3.048/1999 (revogado pelo Decreto nº 10.410/2020, mas aplicável ao presente caso, em virtude do princípio tempus regit actum), in verbis: “Art. 60 - Até que lei específica discipline a matéria, são contados como tempo de contribuição, entre outros: (...) III - o período em que o segurado esteve recebendo auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, entre períodos de atividade;” Nesse contexto, as expressões "tempo intercalado" (art. 55, inciso II, da Lei n.º 8.213/1991) ou "entre períodos de atividade" (art. 60, inciso III do Decreto n.º 3.048/1999) conduzem ao entendimento de que o lapso temporal em que o autor esteve em gozo de benefício por incapacidade poderá ser contabilizado para integrar a carência legalmente exigida na espécie (de 180 meses, nos termos do art. 142 da Lei n.º 8.213/91) se houver comprovação do retorno ao trabalho, ainda que por curto período. Confira-se o entendimento do Colendo Superior Tribunal de Justiça: “PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR IDADE. PERÍODO DE GOZO DE AUXÍLIO-DOENÇA. CÔMPUTO DO TEMPO PARA FINS DE CARÊNCIA. INEXISTÊNCIA DE CONTRIBUIÇÃO EM PERÍODO INTERCALADO. IMPOSSIBILIDADE. ACÓRDÃO EM CONSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. 1. É firme no Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que é possível a consideração dos períodos em que o segurado esteve em gozo de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez como carência para a concessão de aposentadoria por idade, se intercalados com períodos contributivos, o que não ocorreu na espécie. 2. Tem-se que o acórdão recorrido está em consonância com a orientação do STJ, incidindo na pretensão recursal, pois, o óbice da Súmula 83/STJ. 3. Ademais, não há como infirmar as conclusões do Tribunal de origem sem arredar as premissas fático-probatórias sobre as quais se assentam, o que é vedado nos termos da Súmula 7/STJ. 4. Recurso Especial não conhecido.” (STJ, REsp 1709917/SP, Segunda Turma, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, DJe 16/11/2018 - g.n.). "PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. CONVERSÃO DA APOSENTADORIA POR INVALIDEZ EM APOSENTADORIA POR IDADE. REQUISITO ETÁRIO PREENCHIDO NA VIGÊNCIA DA LEI 8.213/1991. DESCABIMENTO. CÔMPUTO DO TEMPO PARA FINS DE CARÊNCIA. INEXISTÊNCIA DE CONTRIBUIÇÃO EM PERÍODO INTERCALADO. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES. RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO. 1. A Lei 8.213/1991 não contemplou a conversão de aposentadoria por invalidez em aposentadoria por idade. 2. É possível a consideração dos períodos em que o segurado esteve em gozo de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez como carência para a concessão de aposentadoria por idade, se intercalados com períodos contributivos. 3. Na hipótese dos autos, como não houve retorno do segurado ao exercício de atividade remunerada, não é possível a utilização do tempo respectivo. 4. Recurso especial não provido." (STJ, REsp 1422081/SC, Segunda Turma, Relator: Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, DJe 02/05/2014 - g.n.). No mesmo sentido, a jurisprudência desta Corte: “PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE (...) CÔMPUTO DE PERÍODO EM QUE RECEBEU BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE COMO CARÊNCIA. POSSIBILIDADE. SITUAÇÃO NÃO CONFIGURADA NO PROCESSADO. APELAÇÃO DO INSS PROVIDA. 1. Para a percepção de Aposentadoria por Idade, o segurado deve demonstrar o cumprimento da idade mínima de 65 anos, se homem, e 60 anos, se mulher, e número mínimo de contribuições para preenchimento do período de carência correspondente, conforme artigos 48 e 142 da Lei 8.213/91. 2. Coerente com as disposições do art. 29, § 5º, e art. 55, II, ambos da Lei 8.213/1991, os incisos III e IX do art. 60 do Decreto 3.048/1999, asseguram, até que lei específica discipline a matéria, que são contados como tempo de contribuição o período em que o segurado esteve recebendo auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez (entre períodos de atividade), bem como o período em que o segurado esteve recebendo benefício por incapacidade por acidente do trabalho (intercalado ou não). 3. Mas, não é essa a hipótese dos autos, pois a parte autora, após ter iniciado a percepção de diversos benefícios previdenciários por incapacidade, não voltou a exercer qualquer outra atividade laborativa de forma intercalada entre tais percepções, realizando, ao final, apenas uma contribuição previdenciária de forma facultativa, razão pela qual o longo período em que recebeu os benefícios previdenciários não pode ser computado para fins de carência. 4. Apelação do INSS provida.” (TRF 3.ª Região, SÉTIMA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL 0001172-98.2018.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal TORU YAMAMOTO, e-DJF3 Judicial 07/05/2018 - g.n.). Convém notar que há comprovação nos autos (anotações em CTPS), confirmada pela consulta atualizada ao CNIS, de que o referido benefício de auxílio doença foi classificado como "espécie 31" - ramo de atividade: "rural", o que enseja à conclusão de que antes da percepção do auxílio-doença, o requerente exercia atividade rural. Nesse aspecto, o Enunciado n.º 188 FONAJEF: “O benefício concedido ao segurado especial, administrativamente ou judicialmente, configura início de prova material válida para posterior concessão aos demais integrantes do núcleo familiar, assim como ao próprio beneficiário” (Aprovado no XIV FONAJEF – g.n.). À luz das informações contidas no extrato do CNIS do autor, não há registro de qualquer atividade urbana, o que se coaduna com as alegações do requerente e com os dados constantes da CTPS. Também há registro de que o requerente recolheu como segurado facultativo de 01/07/2010 a 31/07/2010. Tenha-se presente que o recolhimento como contribuinte facultativo constante da consulta ao CNIS teve por fim preservar a qualidade de segurada do requerente, não impedindo a concessão do benefício ora pleiteado. Esclareça-se que o art. 39, II, da Lei n.º 8.213/91 autoriza o segurado especial a realizar recolhimentos previdenciários, na condição de segurado facultativo, o que não afasta a sua condição de trabalhador rural (9.ª Turma: APELAÇÃO CÍVEL / SP 5651025-05.2019.4.03.9999 – Relatora: Desembargadora Federal MARISA FERREIRA DOS SANTOS – eDJF3 Judicial 02/03/2020; APELAÇÃO CÍVEL/SP 5002327-30.2017.4.03.6105 – Relator: Juiz Federal Convocado RODRIGO ZACHARIAS – eDJF3 Judicial 12/07/2019). Cabe destacar a existência de prova oral. A audiência foi realizada no dia 28/06/2018 perante o MM. Juízo da 1.ª Vara da Comarca de Mogi Mirim, Estado de São Paulo. O áudio e vídeo de todos os depoimentos foram captados e gravados em arquivo na mídia. As testemunhas declararam que conhecem a parte autora há bastante tempo e confirmam o alegado labor rural. Embora não haja transcrição dos depoimentos nos autos, da oitiva das mídias constantes do PJ-e, é possível verificar que a testemunha GERALDO TAVARES afirmou conhecer o autor há 25/27 anos; que desde que eles se conheceram, o Sr. João trabalhava na lavoura de tomate. Informou que presenciou o Sr. João, trabalhando na lavoura por mais de 20 anos consecutivos, pois eles trabalharam juntos nas lavouras da região para os mesmos patrões. Ao ser questionado pelo Juízo, o depoente mencionou nomes de diversas propriedades rurais nas quais o demandante exerceu o labor campesino. Ao ser indagado se “o autor trabalhou na cidade”, o depoente respondeu que “não, pois ele só trabalhou na roça, na lavoura, e nunca se dedicou a atividade urbana.” Por sua vez, a testemunha GERALDO DIAS MELERO declarou conhecer o autor há mais de 20 anos e que ele sempre trabalhou e morou na roça. Informou que conhece a família do requerente e que pode afirmar que eles moram e trabalham juntos no sítio da família. Por fim, a testemunha ANTONIA MANTOVANI DIAS conhecer o autor “há 25 anos”. Relatou que a testemunha é proprietária de uma loja na região e que o Sr. João adquire produtos em sua loja há mais de 20 anos e que ele sempre declarou perante o cadastro da referida loja o endereço no sítio da família, bem como a profissão de trabalhador e que sempre se vestiu como um lavrador. Ao ser indagada se “o autor já trabalhou na cidade”, a depoente respondeu que “não. O Sr. João trabalhou na roça a vida inteira. Ele nunca trabalhou em atividade urbana, pois sempre morou e trabalhou no sítio; ele é muito simples, uma pessoa da roça. Ele, seus filhos, sua esposa – todos são da roça.” Da análise do conjunto probatório e conforme corroboram os depoimentos das testemunhas ouvidas, infere-se que também há comprovação de que o autor, mesmo após o recebimento de auxílio-doença (como rural) continuou exercendo atividade rural, em regime de economia familiar, ao lado de sua esposa e de seus filhos, a fim de contribuir para a subsistência da família. Diante dessas considerações, constata-se que, na presente hipótese, a prova testemunhal produzida favorece o pleito autoral, sendo coesa e harmônica no que tange à prestação do trabalho rural pelo interregno necessário à concessão do benefício requerido. Como bem ressaltou o Juízo a quo, in verbis: "No caso em voga a petição inicial veio instruída com carteira de membro do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Jacarezinho/MG, com certidões de nascimento dos filhos do autor (onde constam sua profissão como de lavrador), com sua Carteira de Trabalho e Previdência Social, donde se extraem apenas vínculos rurais. Confiram-se, a propósito, os documentos encartados a fls. 23/38. Note-se, também, que o CNIS encartado pelo réu a fls. 56/57, bem demonstra vínculos rurais (a exemplo de Companhia Agrícola Usina Jacarezinho e Companhia Canavieira de Jacarezinho) com contribuições vertidas ao Regime Geral da Previdência Social. A despeito do judicioso entendimento esposado na contestação, relembro que o início de prova material, exigido pelo parágrafo 3o do artigo 55 da Lei n. 8.213/91, não significa que o segurado deverá demonstrar mês a mês, ano a ano, por intermédio de documentos, o exercício de atividade na condição de rurícola, pois isto importaria em se exigir que todo o período de trabalho fosse comprovado documentalmente, sendo de nenhuma utilidade a prova testemunhal para a demonstração do labor rural. As testemunhas ouvida durante a instrução, ademais, cuidaram de confirmar o trabalho na lavoura por prazo deveras superior àquele estampado no artigo 142 da Lei n.º 8.213/91. A prova testemunhal, nessas circunstâncias, revela-se meio idôneo para a demonstração do tempo de trabalho, mormente porque colhida com observância das regras processuais pertinentes e sob o crivo do contraditório, além de rigorosamente consentânea com os documentos trazidos pela autora, rectius, início de prova material. (...) Não se deslembre, outrossim, a inexistência de fomento legal para a pretendida hierarquização da prova documental sobre a testemunhal. Ambas produzem os mesmos efeitos, como ressabido. Conclusão diversa, ademais, traduziria verdadeira violação do princípio da persuasão racional da prova, regente do processo Civil brasileiro. Confira-se, a propósito, o preceito contido no art. 371 do Novo Código de Processo Civil. Por outro lado, já se deu o atingimento da idade mínima inerente ao benefício reclamado, pois que o autor nasceu em 23/06/1947. Conta, portanto, com mais de 60 (sessenta) anos de idade." (ID n.º 65593537 - Págs. 2 e 3). Esclareça-se que o fato de o requerente ter recebido o benefício de amparo social ao idoso (de 04/08/2014 a 30/04/2019 – conforme consulta ao CNIS em 04/02/2021) não afasta seu direito ao benefício vindicado, tendo em vista que se deu posteriormente ao implemento do requisito etário (em 2007). De rigor, portanto, a manutenção da sentença para deferimento do benefício, porquanto comprovado o exercício de atividade rural pelo período de carência legalmente exigido. Ressalte-se que a aposentadoria corresponde ao valor de um salário-mínimo mensal, nos termos do art. 143 da Lei n.º 8.213/91. O termo inicial do benefício previdenciário deve retroagir à data do requerimento administrativo, de acordo com a previsão contida no inciso II do art. 49 da Lei n.º 8.213/91. Na ausência de demonstração do requerimento, o termo inicial deve retroagir à data da citação, ocasião em que a autarquia tomou conhecimento da pretensão. No caso, existe comprovação de requerimento, devendo o termo inicial ser nele fixado (25/01/2016), compensando-se os valores recebidos a título de benefício de amparo social ao idoso e observando-se ser devida a gratificação natalina, nos termos preconizados no art. 7.º, inciso VIII, da Constituição da República. À vista do quanto disposto no art. 85 do Código de Processo Civil, sendo o caso de sentença ilíquida, o percentual da verba honorária deverá ser fixado na liquidação do julgado, com observância ao disposto no inciso II do § 4.º, c. c. o § 11, ambos do art. 85 do CPC, bem como no art. 86 do mesmo diploma legal. Os honorários advocatícios incidem sobre as parcelas vencidas até a sentença de procedência (STJ, Súmula 111). Quanto ao prequestionamento suscitado, saliente-se inexistir contrariedade alguma a legislação federal ou a dispositivos constitucionais. Posto isso, rejeito a matéria preliminar e, no mérito, nego provimento à apelação do INSS e dou parcial provimento à apelação do autor para fixar o termo inicial do benefício na data do requerimento administrativo (25/01/2016), compensando-se os valores recebidos a título de benefício de amparo social ao idoso, bem como para estabelecer que os honorários advocatícios serão fixados por ocasião da liquidação do julgado, nos termos da fundamentação, supra. É o voto. THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE A TRABALHADOR RURAL. ART. 143 DA LEI N.º 8.213/91. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE DE RURÍCOLA NO PERÍODO ANTERIOR AO REQUERIMENTO. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
- Prevalência da regra geral prevista no caput do art. 1.012 do Código de Processo Civil, porquanto não configuradas as hipóteses previstas no § 1.º do mesmo dispositivo legal.
- A atividade rural deve ser comprovada por meio de início de prova material, aliada à prova testemunhal.
- O conjunto probatório é suficiente para ensejar a concessão do benefício vindicado.
- Reconhecimento da procedência do pedido formulado.
- O termo inicial do benefício previdenciário deve retroagir à data do requerimento administrativo, de acordo com a previsão contida no inciso II do art. 49 da Lei n.º 8.213/91. Na ausência de demonstração do requerimento, o termo inicial deve retroagir à data da citação, ocasião em que a autarquia tomou conhecimento da pretensão. No caso, existe comprovação de requerimento, devendo o termo inicial ser nele fixado.
- À vista do quanto previsto no art. 85 do Código de Processo Civil, sendo o caso de sentença ilíquida, o percentual da verba honorária deverá ser fixado na liquidação do julgado, com observância ao disposto no inciso II do § 4.º, c. c. o § 11, ambos do art. 85 do CPC, bem como no art. 86 do mesmo diploma legal. Os honorários advocatícios incidem sobre as parcelas vencidas até a sentença de procedência (STJ, Súmula 111).
- Apelação do autor parcialmente provida. Apelação do INSS improvida.