Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000717-36.2018.4.03.9999

RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO

APELANTE: LUCINEI DE MOURA FAZAN

Advogado do(a) APELANTE: KAZUO ISSAYAMA - SP109791-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000717-36.2018.4.03.9999

RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO

APELANTE: LUCINEI DE MOURA FAZAN

Advogado do(a) APELANTE: KAZUO ISSAYAMA - SP109791-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):

 

Trata-se de apelação interposta por LUCINEI DE MOURA FAZAN, em ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez.

 

A r. sentença julgou improcedente o pedido. Condenada a parte autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC (ID 104169329, p. 154-157).

 

Em razões recursais, a parte autora pugna, preliminarmente, pela anulação da sentença, em virtude de cerceamento de defesa, pleiteando a realização de perícia médica específica para estes autos, pois o magistrado não se poderia valer de laudo elaborado em outra demanda na qual pleiteou benefício assistencial de prestação continuada. Alega que os requisitos de incapacidade e deficiência são distintos. No mérito, sustenta que preenche as condições para o deferimento do auxílio-doença ou da aposentadoria por invalidez (ID 104169329, p. 161-170).

 

O INSS apresentou contrarrazões (ID 104169329, p. 175-177).

 

Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.

 

Parecer do Ministério Público Federal (ID 104169329, p. 189-193), no sentido do desprovimento do apelo.

 

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000717-36.2018.4.03.9999

RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO

APELANTE: LUCINEI DE MOURA FAZAN

Advogado do(a) APELANTE: KAZUO ISSAYAMA - SP109791-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):

 

De início, quanto à impossibilidade de utilização de prova emprestada no caso dos autos, verifica-se que não assiste razão à demandante.

 

Embora a perícia objeto do pedido de nulidade tenha sido realizada em outra demanda (0000839-49.2018.4.03.9999), referida prova técnica merece total credibilidade, sendo admissível no caso em apreço como prova emprestada, visto que produzida em demanda envolvendo as mesmas partes, não havendo que se falar em ofensa ao contraditório. Atendeu, com efeito, o regramento específico para a prova emprestada, disposto no art. 372 do CPC.

 

Aliás, esta Colenda 7ª Turma tem admitido a prova emprestada, inclusive, em casos nos quais o INSS não participa da ação na qual foi produzido o exame pericial: AgL em AC n. 0027116-49.2011.4.03.9999/SP, Rel. Des. Fed. Toru Yamamoto, DJ 02/03/2015; AgL em ACReex n. 0010952-04.2014.4.03.9999/SP, Rel. Juiz Fed. Conv. Valdeci dos Santos, DJ 08/09/2014.

 

Assim, com mais razão, se mostra válida a utilização da perícia efetuada nos autos de número 0000839-49.2018.4.03.9999, cujo objeto era o pleito de ação de benefício assistencial.

 

Não se nega que o requisito incapacidade, exigido para a concessão de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez, não se confunde com o impedimento de longo prazo necessário para a benesse assistencial, todavia, há de se concordar com a similitude entre ambos. E mais: ressalta-se que as ações foram propostas em períodos próximos. Enquanto a presente demanda foi ajuizada em 01.09.2016 (ID 104169329, p. 02), o ajuizamento da outra ocorreu em 10.08.2016 (consulta ao sistema judicial eletrônico) e, por conseguinte, ambas se detém sobre o quadro de saúde da autora na mesma época.

 

Em assim sendo, foge à razoabilidade reabrir-se a instrução processual no presente caso, no qual existe prova pericial emprestada que analisou requisito semelhante ao ora sob escrutínio, situação que, em boa medida, desprestigiaria o princípio da duração razoável do processo, alçado, inclusive, a preceito constitucional.

 

Afastada a matéria preliminar, passo à análise do mérito.

 

A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.

 

Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência.

 

Ao passo que o auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).

 

No entanto, independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.

 

Cumpre salientar que, a patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime não impede o deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da moléstia.

 

Ademais, é necessário, para o implemento dos beneplácitos em tela, revestir-se do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios.

 

É de se observar, ainda, que o §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.

 

Por sua vez, o § 2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.

 

Por fim, saliente-se que, havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez.

 

Do caso concreto.

 

No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo mesmo Juízo desta demanda, porém, nos autos de número 000839-49.2018.4.03.9999, com base em exame pericial efetivado em 16 de dezembro de 2016 (ID 104169329, p. 109-114), quando a demandante possuía 48 (quarenta e oito) anos de idade, consignou o seguinte:

 

A autora é portadora de epilepsia e depressão. Ao exame clínico não apresentava sinais ou sintomas incapacitantes decorrentes de depressão, o que pode ser explicado pela boa resposta ao tratamento que está sendo realizado. Todavia, por ter epilepsia, não deve realizar atividades laborativas que exponham em risco sua integridade física e a de terceiros em caso de uma crise convulsiva, portanto não deve exercer ocupações e atividades consideradas impróprias para epilépticos: policiais, bombeiros, vigias solitários, instrutor de natação e salva-vidas, babás, enfermagem, cirurgia, dirigir veículos motorizados, controle de máquinas e/ou equipamentos, redes elétricas de alta tensão, serviços militares, trabalhos em altitude ou com uso de escadas.

 

A pericianda tem autonomia para realizar as atividades básicas e instrumentais da vida diária.

 

Conclusão

 

Na data do exame não foi caracterizada incapacidade laborativa para a atividade informada”.

 

Assevero que da mesma forma que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, a contrario sensu do que dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento motivado, a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que refoge à controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto. Atestados médicos, exames ou quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente pelas partes não possuem tal aptidão, salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se vislumbra no caso concreto. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010.

 

Saliente-se que a perícia médica foi efetivada por profissional inscrito no órgão competente, o qual forneceu diagnóstico com base na análise de histórico da parte e de exames complementares por ela fornecidos, bem como efetuando demais análises que entendeu pertinentes, e, não sendo infirmado pelo conjunto probatório, referida prova técnica merece confiança e credibilidade.

 

Não reconhecida a incapacidade para o trabalho habitual, requisito indispensável para a concessão dos benefícios de aposentadoria por invalidez e auxílio-doença, nos exatos termos dos já mencionados arts. 42 e 59 da Lei 8.213/91, de rigor o indeferimento do pedido.

 

Como se tanto não bastasse, a requerente também não conseguiu comprovar o implemento dos requisitos qualidade de segurado e carência legal, por meio do exercício da lide campesina.

 

O art. 55, § 3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal.

 

Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:

 

"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".

 

A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:

 

"AGRAVO LEGAL. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADORA RURAL. REQUISITOS NÃO DEMONSTRADOS. 1. (...). 3. Não se exige que a prova material se estenda por todo o período de carência, mas é imprescindível que a prova testemunhal faça referência à época em que foi constituído o documento.(...)" (APELREEX - APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO nº 0008835-06.2015.4.03.9999, Rel. Des. Fed. Paulo Domingues, j. 30/11/2015, e-DJF3 Judicial 1 DATA:07/12/2015 - grifos nossos).

 

"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. CÔMPUTO DE TEMPO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. ALTERAÇÃO DO JULGADO. SÚMULA 7/STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. ANÁLISE PREJUDICADA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. (...) 2) não é imperativo que o início de prova material diga respeito a todo período de carência estabelecido pelo artigo 143 da Lei 8.213/1991, desde que a prova testemunhal amplie sua eficácia probatória. (...)" (AgRg no AREsp 547.042/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/09/2014, DJe 30/09/2014 - grifos nossos).

 

Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.

 

Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.

 

No caso em apreço, para a comprovação do trabalho na condição de rurícola para terceiros, a autora não trouxe aos autos qualquer prova material que indicasse ser sua atividade profissional a de "lavradora".

 

A sua certidão de casamento indica apenas seu esposo, NIVALDO FAZAN, como rurícola, enquanto a sua atividade anotada é de “prendas domésticas” (ID 104169329, p. 18), idêntica àquela com a qual se qualificou na ação de benefício assistencial mencionada (autos 0000839-49.2018.4.03.9999).

 

De outro lado, não foi acostada sua CTPS, somente a de seu marido (ID 104169329, p. 30-35).

 

A extensão de efeitos em decorrência de documento de terceiro - familiar próximo - é viável apenas quando se trata de agricultura de subsistência, em regime de economia familiar, sendo que os depoimentos das testemunhas - JOÃO FERREIRA, JANETE ALVES DE SOUZA e ADHEMAR DE GRANDE JÚNIOR (ID 104169329, p. 101-108) -, que não encontram substrato material suficiente, se mostram aptos tão somente para comprovar o labor rural exercido pelo marido da demandante, e para terceiros.

 

Em suma, diante da ausência de substrato material mínimo do trabalho rural (Súmula 149 do STJ), tenho que a autora não comprovou a qualidade de segurado junto ao RGPS e o cumprimento da carência, restando inviabilizada a concessão de aposentadoria por invalidez e de auxílio-doença, também sob tal aspecto.

 

Ante o exposto, rejeito a matéria preliminar e, no mérito, nego provimento à apelação da parte autora, mantendo íntegra a r. sentença de 1º grau de jurisdição.

 

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

PROCESSUAL CIVIL. CIVIL. CERCEAMENTO DE DEFESA. PROVA EMPRESTADA. RESPEITO AO CONTRADITÓRIO. POSSIBILIDADE. ART. 372, CPC.  AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE PARA O TRABALHO. LAUDO MÉDICO. INTERPRETAÇÃO A CONTRARIO SENSU. ART. 479, CPC. ADOÇÃO DAS CONCLUSÕES PERICIAIS. MATÉRIA NÃO ADSTRITA À CONTROVÉRSIA MERAMENTE JURÍDICA. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS QUE INFIRMEM O PARECER DO EXPERTO. VALORAÇÃO DO CONJUNTO PROBATÓRIO. CONVICÇÕES DO MAGISTRADO.  TRABALHO NA CONDIÇÃO DE RURÍCOLA. NÃO COMPROVAÇÃO. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. DOCUMENTOS DE TERCEIRO. EXTENSÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO DE PARENTE PRÓXIMO. INVIABILIDADE. SÚMULA 149, STJ. PRELIMINAR REJEITADA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA DESPROVIDA. SENTENÇA MANTIDA. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE.

1 - Possibilidade de utilização de prova emprestada no caso dos autos. Embora a perícia objeto do pedido de nulidade tenha sido realizada em outra demanda (0000839-49.2018.4.03.9999), referida prova técnica merece total credibilidade, sendo admissível no caso em apreço como prova emprestada, visto que produzida em demanda envolvendo as mesmas partes, não havendo que se falar em ofensa ao contraditório. Atendeu, com efeito, o regramento específico para a prova emprestada, disposto no art. 372 do CPC.

2 - Aliás, esta Colenda 7ª Turma tem admitido a prova emprestada, inclusive, em casos nos quais o INSS não participa da ação na qual foi produzido o exame pericial: AgL em AC n. 0027116-49.2011.4.03.9999/SP, Rel. Des. Fed. Toru Yamamoto, DJ 02/03/2015; AgL em ACReex n. 0010952-04.2014.4.03.9999/SP, Rel. Juiz Fed. Conv. Valdeci dos Santos, DJ 08/09/2014.

3 - Assim, com mais razão, se mostra válida a utilização da perícia efetuada nos autos de número 0000839-49.2018.4.03.9999, cujo objeto era o pleito de ação de benefício assistencial.

4 - Não se nega que o requisito incapacidade, exigido para a concessão de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez, não se confunde com o impedimento de longo prazo necessário para a benesse assistencial, todavia, há de se concordar com a similitude entre ambos. E mais: ressalta-se que as ações foram propostas em períodos próximos. Enquanto a presente demanda foi ajuizada em 01.09.2016 (ID 104169329, p. 02), o ajuizamento da outra ocorreu em 10.08.2016 (consulta ao sistema judicial eletrônico) e, por conseguinte, ambas se detém sobre o quadro de saúde da autora na mesma época.

5 - Em assim sendo, foge à razoabilidade reabrir-se a instrução processual no presente caso, no qual existe prova pericial emprestada que analisou requisito semelhante ao ora sob escrutínio, situação que, em boa medida, desprestigiaria o princípio da duração razoável do processo, alçado, inclusive, a preceito constitucional.

6 - A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.

7 - Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência.

8 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).

9 - Independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.

10 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime não impede o deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da moléstia.

11 - Para o implemento dos beneplácitos em tela, necessário revestir-se do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios. O §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. Por sua vez, o § 2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.

12 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez.

13 - No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo mesmo Juízo desta demanda, porém, nos autos de número 000839-49.2018.4.03.9999, com base em exame pericial efetivado em 16 de dezembro de 2016 (ID 104169329, p. 109-114), quando a demandante possuía 48 (quarenta e oito) anos de idade, consignou o seguinte: “A autora é portadora de epilepsia e depressão. Ao exame clínico não apresentava sinais ou sintomas incapacitantes decorrentes de depressão, o que pode ser explicado pela boa resposta ao tratamento que está sendo realizado. Todavia, por ter epilepsia, não deve realizar atividades laborativas que exponham em risco sua integridade física e a de terceiros em caso de uma crise convulsiva, portanto não deve exercer ocupações e atividades consideradas impróprias para epilépticos: policiais, bombeiros, vigias solitários, instrutor de natação e salva-vidas, babás, enfermagem, cirurgia, dirigir veículos motorizados, controle de máquinas e/ou equipamentos, redes elétricas de alta tensão, serviços militares, trabalhos em altitude ou com uso de escadas. A pericianda tem autonomia para realizar as atividades básicas e instrumentais da vida diária. Conclusão: na data do exame não foi caracterizada incapacidade laborativa para a atividade informada”.

14 - Da mesma forma que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, a contrario sensu do que dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento motivado, a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que refoge à controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto. Atestados médicos, exames ou quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente pelas partes não possuem tal aptidão, salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se vislumbra no caso concreto. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010.

15 - Saliente-se que a perícia médica foi efetivada por profissional inscrito no órgão competente, o qual forneceu diagnóstico com base na análise de histórico da parte e de exames complementares por ela fornecidos, bem como efetuando demais análises que entendeu pertinentes, e, não sendo infirmado pelo conjunto probatório, referida prova técnica merece confiança e credibilidade.

16 - Não reconhecida a incapacidade para o trabalho habitual, requisito indispensável para a concessão dos benefícios de aposentadoria por invalidez e auxílio-doença, nos exatos termos dos já mencionados arts. 42 e 59 da Lei 8.213/91, de rigor o indeferimento do pedido.

17 - Como se tanto não bastasse, a requerente também não conseguiu comprovar o implemento dos requisitos qualidade de segurado e carência legal, por meio do exercício da lide campesina.

18 - O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça.

19 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela.

20 - Observa-se, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado. Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.

21 - No caso em apreço, para a comprovação do trabalho na condição de rurícola para terceiros, a autora não trouxe aos autos qualquer prova material que indicasse ser sua atividade profissional a de "lavradora".

22 - A sua certidão de casamento indica apenas seu esposo, NIVALDO FAZAN, como rurícola, enquanto a sua atividade anotada é de “prendas domésticas” (ID 104169329, p. 18), idêntica àquela com a qual se qualificou na ação de benefício assistencial mencionada (autos 0000839-49.2018.4.03.9999). De outro lado, não foi acostada sua CTPS, somente a de seu marido (ID 104169329, p. 30-35).

23 - A extensão de efeitos em decorrência de documento de terceiro - familiar próximo - é viável apenas quando se trata de agricultura de subsistência, em regime de economia familiar, sendo que os depoimentos das testemunhas - JOÃO FERREIRA, JANETE ALVES DE SOUZA e ADHEMAR DE GRANDE JÚNIOR (ID 104169329, p. 101-108) -, que não encontram substrato material suficiente, se mostram aptos tão somente para comprovar o labor rural exercido pelo marido da demandante, e para terceiros.

24 - Em suma, diante da ausência de substrato material mínimo do trabalho rural (Súmula 149 do STJ), tenho que a autora não comprovou a qualidade de segurado junto ao RGPS e o cumprimento da carência, restando inviabilizada a concessão de aposentadoria por invalidez e de auxílio-doença, também sob tal aspecto.

25 - Preliminar rejeitada. Apelação da parte autora desprovida. Sentença mantida. Ação julgada improcedente.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu rejeitar a matéria preliminar e, no mérito, negar provimento à apelação da parte autora, mantendo íntegra a r. sentença de 1º grau de jurisdição, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.