APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5347134-15.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: VERA LUCIA DOS SANTOS PEREIRA
Advogados do(a) APELANTE: RICARDO DA SILVA SERRA - SP311763-N, VALMIR DOS SANTOS - SP247281-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5347134-15.2020.4.03.9999 RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES APELANTE: VERA LUCIA DOS SANTOS PEREIRA Advogados do(a) APELANTE: RICARDO DA SILVA SERRA - SP311763-N, VALMIR DOS SANTOS - SP247281-N APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de ação objetivando a concessão de benefício assistencial de prestação continuada (LOAS) previsto pelo inciso V do artigo 203 da Constituição Federal à pessoa portadora de deficiência ou incapacitada para o trabalho. A sentença julgou improcedente o pedido de concessão do benefício de auxílio-doença, adotando as conclusões da perícia médica no sentido da inexistência de incapacidade da parte autora para as atividades laborais habituais. Apela a parte autora, arguindo preliminar de nulidade do laudo pericial, por ter sido elaborado por médico perito não especializado na área médica pertinente à patologia da autora. No mérito, sustenta a procedência do pedido inicial. Sem contrarrazões. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5347134-15.2020.4.03.9999 RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES APELANTE: VERA LUCIA DOS SANTOS PEREIRA Advogados do(a) APELANTE: RICARDO DA SILVA SERRA - SP311763-N, VALMIR DOS SANTOS - SP247281-N APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Impõe-se seja decretada ex officio a nulidade da sentença por julgamento extra-petita. No caso concreto, verifica-se que a sentença decretou a improcedência do pedido inicial, julgando não preenchidos os requisitos para a concessão de benefício previdenciário por incapacidade, quando a petição inicial veiculou pedido de concessão de benefício assistencial de amparo ao deficiente, incorrendo em julgamento extra petita. Verifica-se, assim, vício na sentença que afronta o disposto no art. 492 do CPC/2015, pelo que a declaro nula de ofício. Entretanto, estando o processo maduro para julgamento, é possível a aplicação do art. 1.013, §3º, II, do CPC/2015. Neste sentido confira-se a jurisprudência. "PROCESSUAL CIVIL. DECISÃO EXTRA PETITA. ANULAÇÃO. TEORIA DA CAUSA MADURA. ART. 515, §3º, DO CPC/1973. ART. 1.013, §3º, II, DO CPC/2015. APLICABILIDADE. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. LAUDO PERICIAL. INTERPRETAÇÃO A CONTRARIO SENSU. ART. 479, CPC. ADOÇÃO DAS CONCLUSÕES PERICIAIS. MATÉRIA NÃO ADSTRITA À CONTROVÉRSIA MERAMENTE JURÍDICA. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS QUE INFIRMEM O PARECER DO EXPERTO. VALORAÇÃO DO CONJUNTO PROBATÓRIO. CONVICÇÕES DO MAGISTRADO. INÍCIO DA INCAPACIDADE QUANDO NÃO ERA MAIS FILIADO AO RGPS. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PROVIDA. SENTENÇA ANULADA. ANÁLISE DO MÉRITO. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. REVOGAÇÃO DA TUTELA ANTECIPADA. VERBAS DE SUCUMBÊNCIA. DEVER DE PAGAMENTO SUSPENSO. GRATUIDADE DA JUSTIÇA. 1 - Fixados os limites da lide pela parte autora, veda-se ao magistrado decidir além (ultra petita), aquém (citra petita) ou diversamente do pedido (extra petita), consoante o artigo 460, do CPC/73, vigente à época de prolação da sentença (art. 492 do CPC/2015). Sentença extra petita anulada de ofício. 2 - O caso, entretanto, não é de remessa dos autos à 1ª instância, uma vez que a legislação autoriza expressamente o julgamento imediato do processo quando presentes as condições para tanto. É o que se extrai do art. 515, §3º, do CPC/1973, correspondente ao art. 1.013, § 3º, II, do CPC/2015. As partes se manifestaram sobre os benefícios efetivamente postulados e apresentaram as provas específicas, de forma que, diante do conjunto probatório e do regular exercício das garantias constitucionais, a causa encontra-se madura para julgamento. 3 - A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da Seguridade Social, no art. 201, I, da Constituição Federal. 4- A Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, preconiza que o benefício previdenciário da aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que tiver cumprido o período de carência exigido de 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para exercício da atividade que lhe garanta a subsistência. (...) 20 - Condenada a parte autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, os quais arbitro em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC/2015. 21 - Apelação da parte autora provida. Sentença anulada. Análise do mérito. Ação julgada improcedente. Revogação da tutela antecipada. Verbas de sucumbência. Dever de pagamento suspenso. Gratuidade da justiça. (Ap 00165677720114039999/Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1627704, Relator(a) DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO, TRF3, SÉTIMA TURMA, Fonte e-DJF3 Judicial 1 DATA:21/03/2018 ) Passo, portanto, à análise do mérito do pedido. Afasto a alegação de nulidade do processo por falta de especialização do perito médico. O laudo pericial foi elaborado com boa técnica e forneceu ao Juízo os elementos necessários à análise da demanda. Não se vislumbram no laudo as alegadas inconsistências. A conclusão desfavorável à parte autora não desqualifica, por si só, a perícia. Ademais, o médico perito responsável pela elaboração do laudo é especialista da área de saúde, com regular registro no Conselho Regional de Medicina. O fato de não ser especialista na área de cardiologia/ortopedia não leva, necessariamente, à conclusão de que não tem condições de avaliar adequadamente a capacidade laborativa da parte autora. Verifica-se que o perito nomeado pelo Juízo "a quo" procedeu ao exame da parte autora com boa técnica, submetendo-a a testes para avaliação das alegadas patologias e do seu consequente grau de limitação laborativa, respondendo de forma objetiva aos quesitos formulados, evidenciando conhecimento técnico e diligência, sendo desnecessária a realização de nova perícia. Cabe ainda ressaltar que em momento algum a parte autora demonstrou que a nomeação do perito deixou de observar o disposto no artigo 156, § 1º do Código de Processo Civil de 2015. Nesse sentido, observe-se a jurisprudência: "Não há de se falar em cerceamento de defesa, uma vez que o conjunto probatório do presente feito forneceu ao Juízo a quo os elementos suficientes ao deslinde da causa, nos termos do consagrado princípio da persuasão racional, previsto no artigo 131 do Código de Processo Civil. - A perícia realizada nos autos prestou-se a esclarecer, suficientemente, a matéria controversa, não havendo omissão ou inexatidão dos resultados a justificar a realização de nova perícia, nos termos dos artigos 437 e 438 do Código de Processo Civil."(AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1743754; Processo: 0016574-35.2012.4.03.9999/SP; 7ª Turma; Relatora Juíza Convocada CARLA RISTER; e-DJF3 Judicial 1 DATA:01/03/2013" Quanto à matéria de fundo, a questão vertida nos presentes autos diz respeito à exigência de comprovação dos requisitos legais para a obtenção do benefício assistencial previsto no artigo 203, V, da Constituição Federal. O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família, nos termos dos artigos 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93. Conforme cópia do documento de identidade de fls. 19, tendo a parte autora nascido em 24/10/1958, contava com 60 anos de idade no momento do ajuizamento do feito, e assim, o pleito baseia-se em suposta deficiência ou incapacidade da postulante. Para efeito de concessão do benefício assistencial, considera-se pessoa portadora de deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo, no mínimo de dois anos, de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas (Lei 12.470/2011, art. 3º). A respeito, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais editou a Súmula nº 29, que institui: "Para os efeitos do art. 20, § 2º, da Lei nº 8.742, de 1993, incapacidade para a vida independente não só é aquela que impede as atividades mais elementares da pessoa, mas também a impossibilita de prover ao próprio sustento" A autora, do lar, afirma que é portadora de obesidade e de problemas ortopédicos, de visão, diabetes, doença mental, dentre outros males, condição que a tornaria incapaz para o trabalho. Entretanto, a requerente não demonstrou a condição de pessoa portadora de deficiência no momento da perícia. O laudo médico pericial elaborado em 26.04.2019 (fls. 121) constatou que a autora apresenta opacidade da vista esquerda decorrente de quadro de Leucoma, negando a existência das demais patologias alegadas na inicial, não apresentando incapacidade para as atividades do lar ou para a vida diária. Em que pese a documentação médica apresentada pela parte autora, necessário observar que não possuem o condão de descaracterizar o laudo médico pericial. A perícia judicial é prova técnica produzida ante a existência de divergência entre as partes, nos termos das normas legais vigentes, por especialista da área de saúde de confiança do juízo, com regular registro no órgão de classe, equidistante das partes. Nota-se que a prova pericial foi elaborada com boa técnica, e forneceu ao Juízo os elementos necessários à análise da demanda, de forma que a conclusão desfavorável à parte autora não desqualifica, por si só, a perícia. Não demonstrada a existência de incapacidade/impedimento de longo prazo, torna-se desnecessário perquirir-se acerca da existência de miserabilidade/hipossuficiência, na medida em que o não preenchimento de um dos requisitos legais é suficiente para obstar a concessão do benefício assistencial. Nesse sentido, destaco o precedente desta C. Corte Regional Federal: "ASSISTENCIAL E CONSTITUCIONAL. AGRAVO LEGAL. ART. 557, § 1º, DO CPC. BENEFÍCIO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL. ART. 203, V, DA CF. LAUDO PERICIAL. AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE LABORATIVA. REQUISITOS LEGAIS NÃO PREENCHIDOS. 1. O magistrado deve decidir de acordo com sua convicção, apreciando livremente a prova, atendendo aos fatos e circunstâncias dos autos (art. 131 do CPC). As provas produzidas nos presentes autos são suficientes ao deslinde da causa. Cumpre ressaltar que o laudo médico pericial (51/55) analisou as condições físicas do autor e respondeu suficientemente aos quesitos das partes. (...)3. Considerando-se a ausência do requisito da incapacidade para a vida independente e para o trabalho, resta prejudicada a análise da hipossuficiência da parte Autora. 4. Agravo legal a que se nega provimento." (TRF3ª Reg., AC nº 1522135, Sétima Turma, Relator Des. Federal Fausto de Sanctis, j. 20/02/2013, v.u., e-DJF3 Judicial 1 01/03/2013). "PROCESSUAL CIVIL. INDEFERIMENTO DE PROVA. CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO CONFIGURADO. ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. DEFICIÊNCIA NÃO CONFIGURADA. - Cabe ao juiz determinar as provas necessárias à instrução do processo (art. 370, CPC), indeferindo diligências inúteis ou protelatórias (art. 370, p.u., CPC), de modo que, realizada a prova médica pericial, necessária à aferição da deficiência, e o estudo social, necessário à aferição da miserabilidade, não há qualquer irregularidade no indeferimento do pedido da autora de produção da prova testemunhal. - A Constituição garante à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprove não possuir meios de prover sua própria manutenção o pagamento de um salário mínimo mensal. Trata-se de benefício de caráter assistencial, que deve ser provido aos que cumprirem tais requisitos, independentemente de contribuição à seguridade social. - Para a concessão do benefício assistencial , necessária a conjugação de dois requisitos: alternativamente, a comprovação da idade avançada ou da condição de pessoa com deficiência e, cumulativamente, a miserabilidade, caracterizada pela inexistência de condições econômicas para prover o próprio sustento ou de tê-lo provido por alguém da família. (...) - O médico conclui que a autora tem "capacidade residual laboral", referindo, também, o fato de que tem ensino médico completo. - Não sendo possível extrair do conjunto probatório a existência de impedimentos de longo prazo, o quadro apresentado não se ajusta ao conceito de pessoa com deficiência, nos termos do artigo 20, § 2º, da Lei 8.742/93, com a redação dada pela Lei 12.435/2011. - Quanto à alegada hipossuficiência econômica, prejudicada sua análise. Para a concessão do benefício, comprova-se, alternativamente, o requisito etário ou a condição de pessoa com deficiência e, cumulativamente, a miserabilidade. - Preliminar afastada. Apelação da autora a que se nega provimento. (Acórdão Número 0010284-91.2018.4.03.9999 / 00102849120184039999, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2299957, Relator(a) DESEMBARGADOR FEDERAL LUIZ STEFANINI, TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO, OITAVA TURMA, Data 24/09/2018, Data da publicação 08/10/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:08/10/2018. Diante do exposto, decreto ex officio a nulidade da sentença, nos termos dos artigos 141 e 492 do Código de Processo Civil e, com fundamento no art. 1.013, §3º, II, do CPC/2015, JULGO IMPROCEDENTE o pedido da parte autora, nos termos da fundamentação exposta. Apelação prejudicada. É como VOTO.
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDENCIÁRIO. DECRETAÇÃO EX OFFICIO DA NULIDADE DA SENTENÇA. JULGAMENTO EXTRA PETITA. APLICAÇÃO DO ART. 1.013 §3º DO CPC/15. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL INDEVIDO. CONDIÇÃO DE DEFICIENTE NÃO CARACTERIZADA.
1. Reconhecimento ex officio da nulidade da sentença, por julgamento extra petita. Artigo 492 do CPC/15. A sentença é nula porquanto decidiu pretensão diversa daquela pleiteada nos autos
2. Causa madura. Julgamento da ação na forma do artigo 1.013, § 3º, II do CPC/15.
3. O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família, nos termos dos artigos 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93.
4. O conjunto probatório indica a existência de incapacidade laboral parcial e permanente que, todavia, não confere ao autor a condição de deficiente.
5. Sentença anulada. Apelação prejudicada. Aplicação do artigo 1.013, §3º, do CPC/15. Pedido inicial improcedente.