AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5014263-29.2020.4.03.0000
RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO
AGRAVANTE: C. M. R.
REPRESENTANTE: VERA LUCIA BENEDITO RODRIGUES
AGRAVADO: MAGNO VICENTE RODRIGUES
OUTROS PARTICIPANTES:
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5014263-29.2020.4.03.0000 RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO AGRAVANTE: C. M. R. AGRAVADO: MAGNO VICENTE RODRIGUES OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO: Cuida-se de agravo de instrumento interposto por CARLOS MAGNO RODRIGUES, representado por sua mãe, VERA LUCIA BENEDITO RODRIGUES, contra decisão proferida nos autos da ação de alimentos que move contra MAGNO VICENTE RODRIGUES. A decisão agravada foi proferida nos seguintes termos: “Vistos em decisão. CARLOS MAGNO RODRIGUES (representada por sua mãe Vera Lucia Benedito Rodrigues), devidamente qualificado na inicial, propôs a presente ação de ALIMENTOS em face de MAGNO VICENTE RODRIGUES (...) A inicial veio acompanhada de documentos. Manifestação do MPF no ID 30978113. Manifestação da União no ID 31969203. Vieram os autos conclusos. É o relatório. Decido. É competente para as ações de alimentos decorrentes da aplicação do Decreto Legislativo n.º 10, de 13 de novembro de 1958, e Decreto n.º56.826, de 2 de setembro de 1965, o Juízo Federal da subseção judiciária em que reside o devedor. Não há razão de determinar que a demanda alimentícia de que trata o art. 26 da Lei n.º 5.478 /68 tramite perante a subseção da capital do estado. Sabe-se que, quando editada a Lei n.º 5.478 /68, a Justiça Federal possuía varas apenas nas capitais dos Estados. Assim, em havendo varas em diversas cidades do estado, o art.26 da aludida lei deve ser lido de forma a consagrar a intenção do legislador. É conveniente ao demandado e favorece a colheita da prova a tramitação desta ação de alimentos na subseção da residência do devedor. Ante o exposto, em razão da incompetência deste Juízo, DECLINO da competência e determino a remessa do feito à subseção de Mauá/SP, para livre distribuição. Entendendo não ser competente, caberá ao juiz que receber a ação suscitar o conflito, servindo esta decisão como informações, caso necessário. Dê-se baixa na distribuição. Intime-se” Sustenta o agravante, em síntese, que apresentou ação de alimentos fundada na Convenção sobre a Cobrança Internacional de Alimentos para Crianças e Outros Membros da Família e no Protocolo sobre a Lei Aplicável às Obrigações de Prestar Alimentos, firmados pela República Federativa do Brasil em Haia, em 23 de novembro de 2007, e internalizados por meio do Decreto nº 9.176, de 19 de outubro de 2017. Afirma que, por versar a questão sobre a aplicação detratados internacionais, a competência para o julgamento é da Justiça Federal, nos termos do art. 109, III, da CF/88. Acrescenta que, à luz dos mencionados tratados e da Lei nº 5.478/1968, a competência recai especificamente sobre o Juízo Federal da capital do Estado em que residir o devedor - o devedor reside em Mauá/SP, portanto é competente para a ação o Juízo Federal Cível de São Paulo/SP. Esclarece, ainda, que embora não haja regulamentação infraconstitucional relativa à possibilidade do ajuizamento das ações provenientes da Convenção da Haia de 2007 sobre Alimentos nos Juízos Federais das capitais dos estados brasileiros, há norma que regulamenta situação fática idêntica, proveniente de outro tratado internacional: a Lei nº 5.478, de 25 de julho de 1968, que, além de dispor sobre ação de alimentos no Brasil, estabelece que as ações de alimentos decorrentes da aplicação da Convenção de Nova York tramitarão perante o juízo federal da capital do Estado brasileiro em que reside o devedor. Destaca o teor do art. 4º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro e do art. 140 do Código de Processo Civil de 2015 e requer a fixação da competência do Juízo Federal da Capital. Foi recebida por esta Corte comunicação da 1ª. Vara da Justiça Federal em Mauá, informando ter suscitado Conflito Negativo de Competência nos autos de origem (Id. 137495985), nos termos da decisão que a seguir transcrevo, em parte: “(...)No âmbito da cooperação jurídica internacional para a execução das prestações de alimentos, tem-se que oBrasil é signatário da CONVENÇÃO SOBRE A PRESTAÇÃO DE ALIMENTOS NO ESTRANGEIRO, celebrada em Nova Iorque, em 20 de julho de 1956, e internalizada por meio do Decreto nº 56.826, de 2 desetembro de 1965, bem como da CONVENÇÃO SOBRE A COBRANÇA INTERNACIONAL DEALIMENTOS PARA CRIANÇAS E OUTROS MEMBROS DA FAMÍLIA E O PROTOCOLO SOBRE A LEI APLICÁVEL ÀS OBRIGAÇÕES DE PRESTAR ALIMENTOS, celebrada em Haia, em 23 de novembro de 2007, e internalizada pelo Decreto nº 9.176, de 19 de outubro de 2017. Verifica-se que a Convenção de Nova Iorque buscou a "solução para o problema humanitário surgido pela situação das pessoas sem recursos que dependem, para o seu sustento, de pessoas que vivem no estrangeiro”, enquanto que a Convenção de Haia visou a melhoria dos procedimentos de cooperação entre os Estados para a cobrança internacional de alimentos para crianças e outros membros da família, aproveitando-se das bases já sedimentadas pela convenção anterior. Regulamentando a atuação da instituição responsável pela intermediação da solução do conflito, a Lei nº5.478/1968 dispõe em seu artigo 26: "É competente para as ações de alimentos decorrentes da aplicação do Decreto Legislativo nº. 10, de 13 de novembro de 1958, e Decreto nº. 56.826, de 2 de setembro de 1965, o juízo federal da Capital da Unidade Federativa Brasileira em que reside o devedor, sendo considerada instituição intermediária, para os fins dos referidos decretos, a Procuradoria-Geral da República.” A despeito da questão da legitimidade da Defensoria Pública da União intermediar este tipo de conflito depender de deliberação conclusiva, há que se considerar, que, de acordo com o disposto no artigo 26 da Lei de Alimentos, a competência para processar e julgar a ação de alimentos nos moldes aqui pretendidos é do juízo federal da Capital da Unidade Federativa Brasileira em que reside o devedor. Não bastasse isso, a Defensoria Pública da União não detém atribuição para atuar na Subseção de Mauá, conforme informado pelo Ofício 52/2017 de 08.11.2017, esclarecendo que a abrangência da Defensoria Pública da União no ABC circunscreve-se apenas às Subseções Judiciárias de SãoBernardo e Santo André. Importa realçar que nem mesmo excepcionalmente a Defensoria atua em Subseções não contempladas, conforme a própria instituição destacou nos autos n. 0000066-38.2018.403.6140 (procedimento criminal). Nessas circunstâncias, mantidos os autos nesta Vara Federal, o alimentando careceria da assistência da Defensoria Pública da União, situação que poderia acarretar o descumprimento pela República Federativa do Brasil dos termos da Convenção por força da r. decisão que adotou entendimento a respeito da sua competência contrariamente aos termos do dispositivo legal precitado Diante do exposto, SUSCITO CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA entre este Juízo e o da1ª Vara Federal da Subseção Judiciária de São Paulo de acordo com os artigos 105, I ‘d’ da Constituição Federal e art. 66, II, do Código de Processo Civil, a fim de que seja firmada a competência do Juízo Suscitado para o processamento da causa. Forme-se o instrumento de conflito, instruindo-o com cópias das peças dos presentes autos, bem como desta decisão. (...)” Não foram apresentadas contrarrazões. O Ministério Público Federal manifestou-se pela reforma da decisão agravada, na medida em que se afigura incabível a declaração ex officio de incompetência relativa. É o relatório.
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5014263-29.2020.4.03.0000 RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO AGRAVANTE: C. M. R. AGRAVADO: MAGNO VICENTE RODRIGUES OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO: De fato, por ocasião da edição da Lei n.º 5.478/1968, como observado na decisão agravada, a Justiça Federal possuía apenas Varas nas Capitais dos Estados, situação bastante diversa na atualidade, sendo razoável perquirir acerca do melhor modo de interpretação do art. 26 da referida lei, de forma a consagrar a intenção do legislador. Em tese, revela-se conveniente ao demandado que a tramitação de ação de alimentos ocorra na subseção em que reside. Todavia, o demandado sequer foi citado nos autos de origem, sendo forçoso considerar, no caso dos autos, o que dispõem os artigos 112, 113, caput, e 114 do Código de Processo Civil: "Art. 112. Argui-se, por meio de exceção, a incompetência relativa. Parágrafo único. A nulidade da cláusula de eleição de foro, em contrato de adesão, pode ser declarada de ofício pelo juiz, que declinará de competência para o juízo de domicílio do réu". (negritos meus) "Art. 113. A incompetência absoluta deve ser declarada de ofício e pode ser alegada, em qualquer tempo e grau de jurisdição, independentemente de exceção." "Art. 114. Prorroga-se a competência, se o réu não opuser exceção declinatória de foro e de juízo, no caso e prazo legais". A leitura dos mencionados artigos da lei processual civil permite concluir que o reconhecimento de incompetência relativa deve ser precedido de alegação do réu, por meio de exceção de incompetência. Acerca do reconhecimento do caráter relativo da competência no caso dos autos, vale destacar: PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE ALIMENTOS. DECRETO LEGISLATIVO N.º 10/58. DECRETO N.º 56.826/65. LEI N.º 5.478/68, ART. 26. ALIMENTANDO RESIDENTE FORA DO PAÍS. ALIMENTANTE RESIDENTE NO TERRITÓRIO NACIONAL. COMPETÊNCIA DO FORO FEDERAL DA RESIDÊNCIA DO ALIMENTANTE. 1. É competente para as ações de alimentos decorrentes da aplicação do Decreto Legislativo n.º 10, de 13 de novembro de 1958, e Decreto n.º 56.826, de 2 de setembro de 1965, o juízo federal da subseção judiciária em que reside o devedor. Atualização do art. 26 da Lei n.º 5.478/68, à vista do fenômeno da interiorização da Justiça Federal. 2. A natureza das demandas é aferida primordialmente à luz da causa de pedir. Assim, é de natureza privada a ação de alimentos ajuizada pelo Ministério Público, em prol de incapaz com endereço fora do território nacional e em face de alimentante residente no Brasil. 3. Cuidando-se de demanda de natureza privada, as regras de competência são ditadas pela lei no interesse das partes e, portanto, são de natureza relativa, não comportando declinação de ofício pelo juiz. Aplicação da Súmula 33 do Superior Tribunal de Justiça. 4. Não há razão de ordem pública a determinar que a demanda alimentícia de que trata o art. 26 da Lei n.º 5.478/68 tramite perante o foro federal da capital do Estado. 5. Ao tempo em que editada a Lei n.º 5.478/68, a Justiça Federal possuía varas apenas nas capitais dos Estados. Atualmente, havendo varas no interior, o art. 26 da aludida lei deve ser lido de forma a consagrar a intenção do legislador. 6. É conveniente ao demandado e favorece a colheita da prova a tramitação, pelo foro federal da residência do devedor, da ação de alimentos de que cuidam o Decreto Legislativo n.º 10/58 e o Decreto n.º 56.826/65. 7. Conflito de competência julgado procedente. (TRF3. CC - CONFLITO DE COMPETÊNCIA - 10469 / SP - 0091106-77.2007.4.03.0000. Primeira Seção. Relator: Desembargador Federal NELTON DOS SANTOS. Data do Julgamento. 17/01/2008. Data da Publicação/Fonte: DJU DATA: 26/02/2008, p. 1021) – grifo nosso No caso dos autos, além da ausência de integração do polo passivo, merece ser ressaltada a maior conveniência da permanência do feito na Justiça Federal da Capital, ao menos até ulterior manifestação do réu ou decisão em contrário nos autos do Conflito de Competência, diante da ausência de assistência ao autor/agravante, menor autista, por parte da Defensoria Pública da União na Subseção de Mauá. Ante o exposto, DOU PROVIMENTO ao agravo de instrumento, com o fim de determinar a permanência dos autos na Justiça Federal da Capital, até decorrido o prazo para manifestação do réu ou até que ocorra determinação nos autos do conflito de competência instaurado a respeito da matéria. É o voto.
E M E N T A
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE ALIMENTOS. COMPETÊNCIA RELATIVA. RECURSO PROVIDO.
- Por ocasião da edição da Lei n.º 5.478/1968, como observado na decisão agravada, a Justiça Federal possuía apenas Varas nas Capitais dos Estados, situação diversa na atualidade, sendo razoável perquirir acerca do melhor modo de interpretação do art. 26 da referida lei, de forma a consagrar a intenção do legislador. Em tese, revela-se conveniente ao demandado que a tramitação de ação de alimentos ocorra na subseção em que reside.
- Todavia, o demandado sequer foi citado nos autos de origem, sendo forçoso considerar, no caso dos autos, o que dispõem os artigos 112, 113, caput, e 114 do Código de Processo Civil, daí porque o reconhecimento de incompetência relativa deve ser precedido de alegação do réu, por meio de exceção de incompetência.
- No caso dos autos, além da ausência de integração do polo passivo, merece ser ressaltada a maior conveniência da permanência do feito na Justiça Federal da Capital, ao menos até ulterior manifestação do réu ou decisão em contrário nos autos do Conflito de Competência, diante da ausência de assistência ao autor/agravante, menor autista, por parte da Defensoria Pública da União na Subseção de Mauá.
- Agravo de instrumento provido.