APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0003968-96.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. BATISTA GONÇALVES
APELANTE: MARIA CONCEICAO BURANELLI SOARES
Advogado do(a) APELANTE: ANTONIO MARIO DE TOLEDO - SP47319-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0003968-96.2017.4.03.9999 RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. BATISTA GONÇALVES APELANTE: MARIA CONCEICAO BURANELLI SOARES Advogado do(a) APELANTE: ANTONIO MARIO DE TOLEDO - SP47319-N APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de recurso de apelação interposto pela parte exequente em face de sentença que julgou procedente o pedido formulado nos embargos à execução, para fixar o valor do débito em R$ 1.533,12, atualizado até outubro de 2015, fixando os honorários advocatícios em 10% do valor atualizado do débito, suspendendo a execução por força da gratuidade processual da parte exequente. Alega o recorrente, em síntese, que devem ser aplicados, no que tangue a correção monetária, os parâmetros constantes do Manual de Cálculos da Justiça Federal em vigor na data da elaboração, no caso em concreto a Resolução nº 267/2013, do C.JF, afastando, assim, a aplicação da Lei n. 11.960/09, em razão de sua inconstitucionalidade reconhecida. Requer, ainda, que sejam mantidos nos cálculos de liquidação, o período em que exerceu atividade laborativa, condenando o ente autárquico ao pagamento das verbas sucumbenciais. Com contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte. Em síntese, o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0003968-96.2017.4.03.9999 RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. BATISTA GONÇALVES APELANTE: MARIA CONCEICAO BURANELLI SOARES Advogado do(a) APELANTE: ANTONIO MARIO DE TOLEDO - SP47319-N APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: V O T O É sabido que o sistema processual civil brasileiro consagra o princípio da fidelidade ao título, conforme art. 475-G do CPC/1973 e art. 509, § 4º, do NCPC, segundo o qual a execução opera-se nos exatos termos da decisão transitada em julgado. Vide EDcl no AREsp nº 270.971-RS, DJE 28/11/2013; AResp nº 598.544-SP, DJE 22/04/2015. Assim, o Magistrado deve conduzir a execução nos limites do comando expresso no título executivo. No caso dos autos, verifica-se que o título exeqüendo, proferido aos 15/05/2015, assim dispôs quanto ao modo de incidência da correção monetária: “... A correção monetária das parcelas vencidas incide na forma das Súmulas 08 deste Tribunal, e 148 do STJ, bem como da Lei 6.899/81 e da legislação superveniente, descontando-se eventuais valores já pagos.” A tese sustentada pela embargante em relação à Lei nº 11.960/2009 e os questionamentos envolvendo o resultado das ADIs 4357 e 4.425 restaram superados. Vale lembrar ter sido declarada a inconstitucionalidade por arrastamento do art. 1º-F da Lei n.º 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, no que diz respeito à aplicação dos juros moratórios com base na TR em débitos de natureza tributária, bem como em relação à correção monetária pela TR apenas para atualização dos precatórios, isto é, quanto ao intervalo de tempo compreendido entre a inscrição do crédito e o efetivo pagamento, limitada à parte em que o texto legal estava vinculado ao art. 100, § 12, da Constituição Federal, incluído pela Emenda Constitucional n.º 62/2009. Posteriormente, o STF, nos autos do RE 870.947, reconheceu a existência de repercussão geral no tocante à questão da validade da correção monetária e dos juros moratórios incidentes sobre condenações impostas à Fazenda Pública, segundo os índices oficiais de remuneração básica da caderneta de poupança, Taxa Referencial - TR. De acordo com o assentado, "na parte em que rege a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública até a expedição do requisitório (i. e., entre o dano efetivo/ajuizamento da demanda e a condenação), o art. 1º-F da Lei nº 9494/97 ainda não foi objeto de pronunciamento expresso do Supremo Tribunal Federal quanto à sua constitucionalidade e, portanto, continua em pleno vigor". Vide RE n. 870.947, em 16/4/2015, Rel. Min. Luiz Fux. Em 20 de setembro de 2017, o STF procedeu ao julgamento do RE 870.947, definindo duas teses de repercussão geral sobre a matéria. A primeira tese aprovada, referente aos juros moratórios e sugerida pelo relator do recurso, ministro Luiz Fux, diz que "O artigo 1º-F da Lei 9.494/1997, com a redação dada pela Lei 11.960/2009, na parte em que disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, aos quais devem ser aplicados os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito tributário, em respeito ao princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º, caput); quanto às condenações oriundas de relação jurídica não-tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto no artigo 1º-F da Lei 9.494/1997 com a redação dada pela Lei 11.960/2009." Já a segunda tese, referente à atualização monetária, tem a seguinte dicção: "O artigo 1º-F da Lei 9.494/1997, com a redação dada pela Lei 11.960/2009, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina." Confira-se a ementa do acórdão, publicada no DJe-262 em 20/11/2017: "DIREITO CONSTITUCIONAL. REGIME DE ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA E JUROS MORATÓRIOS INCIDENTE SOBRE CONDENAÇÕES JUDICIAIS DA FAZENDA PÚBLICA. ART. 1º-F DA LEI Nº 9.494/97 COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI Nº 11.960/09. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DA UTILIZAÇÃO DO ÍNDICE DE REMUNERAÇÃO DA CADERNETA DE POUPANÇA COMO CRITÉRIO DE CORREÇÃO MONETÁRIA. VIOLAÇÃO AO DIREITO FUNDAMENTAL DE PROPRIEDADE (CRFB, ART. 5º, XXII). INADEQUAÇÃO MANIFESTA ENTRE MEIOS E FINS. INCONSTITUCIONALIDADE DA UTILIZAÇÃO DO RENDIMENTO DA CADERNETA DE POUPANÇA COMO ÍNDICE DEFINIDOR DOS JUROS MORATÓRIOS DE CONDENAÇÕES IMPOSTAS À FAZENDA PÚBLICA, QUANDO ORIUNDAS DE RELAÇÕES JURÍDICO-TRIBUTÁRIAS. DISCRIMINAÇÃO ARBITRÁRIA E VIOLAÇÃO À ISONOMIA ENTRE DEVEDOR PÚBLICO E DEVEDOR PRIVADO (CRFB, ART. 5º, CAPUT). RECURSO EXTRAORDINÁRIO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. O princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º, caput), no seu núcleo essencial, revela que o art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, os quais devem observar os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito; nas hipóteses de relação jurídica diversa da tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto legal supramencionado. 2. O direito fundamental de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII) repugna o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, porquanto a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina. 3. A correção monetária tem como escopo preservar o poder aquisitivo da moeda diante da sua desvalorização nominal provocada pela inflação. É que a moeda fiduciária, enquanto instrumento de troca, só tem valor na medida em que capaz de ser transformada em bens e serviços. A inflação, por representar o aumento persistente e generalizado do nível de preços, distorce, no tempo, a correspondência entre valores real e nominal (cf. MANKIW, N.G. Macroeconomia. Rio de Janeiro, LTC 2010, p. 94; DORNBUSH, R.; FISCHER, S. e STARTZ, R. Macroeconomia. São Paulo: McGraw-Hill do Brasil, 2009, p. 10; BLANCHARD, O. Macroeconomia. São Paulo: Prentice Hall, 2006, p. 29). 4. A correção monetária e a inflação, posto fenômenos econômicos conexos, exigem, por imperativo de adequação lógica, que os instrumentos destinados a realizar a primeira sejam capazes de capturar a segunda, razão pela qual os índices de correção monetária devem consubstanciar autênticos índices de preços. 5. Recurso extraordinário parcialmente provido." Por derradeiro, assinale-se que o STF, por maioria, nos termos do voto do Ministro Alexandre de Moraes, decidiu não modular os efeitos da decisão anteriormente proferida, rejeitando todos os embargos de declaração opostos, conforme certidão de julgamento da sessão extraordinária de 03/10/2019. Desse modo, considerando que o título exequendo determinou a incidência de correção monetária nos termos da legislação vigente à época, bem como a orientação fixada pelo STF, no sentido de que a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança revela-se inconstitucional, impõe-se a reforma do decisum impugnado, afastando a aplicação da Lei n. 11.960/09 da atualização do débito exequendo. Portanto, na atualização do débito, deve ser observado os termos do assentado pelo STF nos autos do RE 870.947, com a aplicação do Manual de Cálculos da Justiça Federal vigente à época. No tocante à controvérsia se é devido o abatimento, do montante a que faz jus, a título de benefício por incapacidade, dos valores referentes ao período em que a parte autora exerceu atividade remunerada, também assiste razão ao recorrente. É sabido que o sistema processual civil brasileiro consagra o princípio da fidelidade ao título, conforme artigo 475-G do CPC/1973 e artigo 509, § 4º, do NCPC, segundo o qual a execução opera-se nos exatos termos da decisão transitada em julgado. Vide EDcl no AREsp nº 270.971-RS, DJE 28/11/2013; AResp nº 598.544-SP, DJE 22/04/2015. Compulsando-se os autos, verifica-se que a parte autora teve reconhecido o direito ao benefício por incapacidade, nada estabelecendo a decisão acerca das prestações referentes ao período em que a parte autora exerceu atividade remunerada. A despeito de o INSS dispor, via CNIS, das informações relacionadas ao período de trabalho exercido pela segurada, contemporâneo ao curso da ação, quedou-se inerte, conformando-se com a decisão nos exatos termos em que proferida. Ora, é defeso o debate, em sede de execução, de matérias passíveis de suscitação na fase cognitiva, bem como reavivar temáticas sobre as quais se operou a coisa julgada. Nesse sentido, já decidiu a Terceira Seção desta Corte, conforme a ementa abaixo colacionada: 'PREVIDENCIÁRIO - PROCESSO CIVIL - EMBARGOS INFRINGENTES EM EMBARGOS À EXECUÇÃO - APOSENTADORIA POR INVALIDEZ - ATIVIDADE LABORATIVA - INCAPACIDADE RECONHECIDA - ESTADO DE NECESSIDADE. SUPRESSÃO DOS VALORES NO PERÍODO LABORADO. NÃO RECONHECIMENTO. RESPEITO À COISA JULGADA. 1. A execução deve limitar-se aos exatos termos do título que a suporta, não se admitindo modificá-los ou mesmo neles inovar, em respeito à coisa julgada. 2. A alegada atividade profissional incompatível é contemporânea ao curso da ação de conhecimento, ou seja, ocorreu até a competência de setembro/2008, antes do trânsito em julgado da decisão final da ação principal, ocorrido em 12 de dezembro de 2008. 3. Inadequada a via eleita para fins de questionar a supressão dos valores do benefício no período, eis que não autorizada no título executivo. 4. A permanência do autor no exercício das atividade s laborativa s, para o provimento das suas necessidades básicas, por si só não impede a concessão do benefício vindicado, razão pela qual não há se falar em desconto da execução do período no qual a parte embargada manteve vínculo empregatício." (Embargos Infringentes nº 0040325-22.2010.4.03.9999, Relator Desembargador Gilberto Jordan, publicado no DJE em 28/11/2016) Destarte, entendo ser indevido o desconto dos valores referentes ao período em que a parte autora exerceu atividade remunerada, uma vez que a execução deve respeitar o título judicial transitado em julgado, o qual, no caso concreto, não autoriza tal proceder. Diante da total sucumbência do ente autárquico, deve este arcar com os honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da diferença entre o cálculo acolhido e o valor pretendido pelo embargante, a teor do art. 85, §§ 2º e 3º, do NCPC. Ante o exposto, dou provimento ao recurso de apelação da parte exeqüente, para determinar a observância do assentado pelo STF nos autos do RE 870.947, no cômputo da correção monetária, com a aplicação do Manual de Cálculos da Justiça Federal vigente à época, bem como para determinar o prosseguimento da execução, com a manutenção nos cálculos, do período em que a parte exequente exerceu atividade laborativa, condenando o ente autárquico ao pagamento das verbas sucumbenciais, nos termos desta fundamentação. É como voto.
E M E N T A
EMBARGOS À EXECUÇÃO. NULIDADE AFASTADA. FIDELIDADE AO TÍTULO. MODIFICAÇÃO DOS CRITÉRIOS DE CORREÇÃO MONETÁRIA. IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DO ASSENTADO PELO STF NOS AUTOS DO RE 870.947. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. ATIVIDADE LABORATIVA. INCAPACIDADE RECONHECIDA. ESTADO DE NECESSIDADE. SUPRESSÃO DOS VALORES NO PERÍODO LABORADO. RESPEITO À COISA JULGADA. IMPOSSIBILIDADE. INSS SUCUMBENTE. RECURSO PROVIDO.
- É sabido que o sistema processual civil brasileiro consagra o princípio da fidelidade ao título, conforme art. 475-G do CPC/1973 e art. 509, § 4º, do NCPC, segundo o qual a execução opera-se nos exatos termos da decisão transitada em julgado. Vide EDcl no AREsp nº 270.971-RS, DJE 28/11/2013; AResp nº 598.544-SP, DJE 22/04/2015.
- A tese sustentada pela embargante em relação à Lei nº 11.960 /2009 resta superada. Por derradeiro, assinale-se que o STF, por maioria, nos termos do voto do Ministro Alexandre de Moraes, decidiu não modular os efeitos da decisão anteriormente proferida, vide, RE 870.947, rejeitando todos os embargos de declaração opostos, conforme certidão de julgamento da sessão extraordinária de 03/10/2019.
- Considera-se que, o título exequendo determinou a incidência de correção monetária nos termos da legislação vigente à época, bem como a orientação fixada pelo STF, no sentido de que a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança revela-se inconstitucional, impondo-se a reforma do decisum impugnado, observando-se os termos do assentado pelo STF nos autos do RE 870.947, com a aplicação do Manual de Cálculos da Justiça Federal vigente à época, na atualização do débito exequendo.
- É defeso o debate, em sede de execução, de matérias passíveis de suscitação na fase cognitiva, bem como reavivar temáticas sobre as quais se operou a coisa julgada.
- Deve o ente autárquico arcar com os honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da diferença entre o cálculo acolhido e o valor pretendido pelo embargante, a teor do art. 85, §§ 2º e 3º, do NCPC.
- Recurso da parte exeqüente provido.