Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0033883-10.2004.4.03.6100

RELATOR: Gab. 03 - DES. FED. HELIO NOGUEIRA

APELANTE: ARTUR AUGUSTO LEITE

Advogado do(a) APELANTE: ARTUR AUGUSTO LEITE - SP56493

APELADO: UNIÃO FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0033883-10.2004.4.03.6100

RELATOR: Gab. 03 - DES. FED. HELIO NOGUEIRA

APELANTE: ARTUR AUGUSTO LEITE

Advogado do(a) APELANTE: ARTUR AUGUSTO LEITE - SP56493

APELADO: UNIAO FEDERAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

O Exmo. Desembargador Federal HELIO NOGUEIRA (Relator):

Trata-se de Apelação interposta por ARTUR AUGUSTO LEITE contra sentença que julgou improcedente os pedidos iniciais de reconhecimento de nulidade do processo administrativo disciplinar que aplicou pena de demissão do cargo de Auditor Fiscal da Receita Federal, de reintegração no cargo público e de da remuneração vencida, condenando o autor ao pagamento de custas e honorários advocatícios no valor de R$ 4.665,30, corrigidos da data da sentença até o efetivo pagamento (fls. 1067/1073).

Em suas razões recursais (fls. 3191/3260), o autor requer o total provimento do pedido inicial alegando, em síntese:

a) nulidade da sentença por falta de apreciação das provas produzidas em juízo, acarretando ofensa ao contraditório e cerceamento de defesa;

b) necessidade de verificação, pelo Poder Judiciário, da legalidade para além do procedimento em si, apreciando a fundamentação, motivação, adequação, proporcionalidade e razoabilidade do ato administrativo, ante aos novos contornos do Direito Administrativo-Constitucional, em especial quanto aos elementos de prova produzidos no procedimento administrativo;

c) nulidades do processo administrativo disciplinar não apreciadas na sentença, consistentes em:

- ocorrência da prescrição prevista no art. 142 da Lei nº 8.112/90;

- prescrição intercorrente para a conclusão do procedimento disciplinar (artigo 152 da Lei nº 8.112/90);

- existência de sucessivas Comissões mediante diversas Portarias sem observância do artigo 169 da Lei n. 8.112/90;

- não apuração das provas produzidas no pad pela comissão e no processo judicial pela juíza, não tendo sido analisada a declaração do superior hierárquico, e que o autor não deixou de observar as normas legais, pois não havia disciplina da conduta a ser adotada, quando da inexistência de Contrato de Aforamento;

- usurpação da função jurisdicional pela Administração Pública sendo-lhe defeso a apreciação da improbidade administrativa, a qual somente poderia ser apreciada pelo Poder Judiciário;

d) no mérito, quanto ao motivo do ato administrativo de demissão, alega que:

- não praticou crime de corrupção e nem logrou proveito próprio, em detrimento da dignidade da função pública;

- ausência de proveito ilícito a terceiros, em detrimento da dignidade da função pública;

- ausência de prejuízo para a União;

- regularidade na emissão das certidões, tendo seguido a politica implantado pelo órgão central em sua época, não tendo deixado de observar as normas legais, e inexistência de norma a ser adotada quando da inexistência de contrato de aforamento.

Com as contrarrazões de fls. 3263/3282, subiram os autos a este E. Tribunal Regional.

O feito foi incluído na pauta de julgamento de 27/09/2011, adiado por indicação do Relator (fl. 3287) e julgado na sessão de julgamento de 20/03/2012 (fl. 3289).

Por meio da petição de fls. 3290/3294, o autor requereu o reconhecimento da nulidade do julgamento, porquanto entre a inclusão do feito em pauta e o efetivo julgamento decorreu lapso de sete meses, sem que a parte fosse intimada da nova data após o adiamento.

O autor opôs embargos de declaração alegado a ocorrência de erro material no acórdão (fls. 3346/3360).

O autor reiterou o pedido de nulidade do julgamento por meio da petição de fls. 3450/3453, considerado o lapso de sete meses entre a data da inclusão do feito em pauta e o efetivo julgamento do recurso da apelação, sem que tivesse sido intimado da nova data após o adiamento.

Na sessão de julgamento de 14/07/2012, a petição de fls. 3.450/3.453 foi recebida como embargos de declaração, os quais foram acolhidos à unanimidade para anular o julgamento realizado em 20.03.2012, determinando-se o retorno dos autos à conclusão para nova inclusão em pauta, considerando-se que "adiado o julgamento, sem data certa e por período longo (seis meses), seria necessária a publicação da inclusão do feito em pauta, de forma a preservar o direito de defesa das partes" (fls. 3455/3462).

O autor juntou diversos documentos (fls. 3466/3494 e 3505/3577), tendo a União opinou pela desconsideração da documentação apresentada, dada a extemporaneidade e a preclusão da fase instrutória (fls. 3498/3501 e 3583/3584).

Às fls. 3601/3612, o autor anexa novas decisões judiciais relativos ao Sítio Tamboré, requer a prioridade na tramitação do feito, nos termos do Estatuto do Idoso, e a concessão da Justiça Gratuita, argumentando que houve considerável diminuição de seus rendimentos.

Dispensada a revisão, nos termos regimentais.

É o relatório.

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0033883-10.2004.4.03.6100

RELATOR: Gab. 03 - DES. FED. HELIO NOGUEIRA

APELANTE: ARTUR AUGUSTO LEITE

Advogado do(a) APELANTE: ARTUR AUGUSTO LEITE - SP56493

APELADO: UNIAO FEDERAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

O Exmo. Desembargador Federal HELIO NOGUEIRA (Relator):

Do direito intertemporal.

Segundo as regras de direito intertemporal que disciplinam o sistema jurídico brasileiro no concernente à aplicação da lei no tempo, as inovações legislativas de caráter estritamente processual, como é a Lei n. 13.105/2015, devem ser aplicadas, de imediato, inclusive nos processos já em curso (art. 14).

Assim, aplica-se a lei nova aos processos pendentes, respeitados, naturalmente, os atos consumados e seus efeitos no regime do CPC de 1973.

Nesse sentido, restou editado o Enunciado Administrativo n. 2/STJ, de teor seguinte:

"Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas, até então, pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça".

 

Da admissibilidade da apelação

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso e passo à análise.

Do processo administrativo disciplinar

Trata-se de ação movida por servidor público federal, Auditor Fiscal da Receita Federal, em que pede o reconhecimento de nulidade do processo administrativo disciplinar n. 05026.001037-2001-70 que lhe impôs a pena de demissão, a reintegração no cargo público de Auditor-Fiscal da Receita Federal e o pagamento de todos os atrasados, inclusive gratificações, férias, 13º salário etc, devidamente atualizados.

Narra o autor que exerceu no período de 04/1992 a 12/1995 o cargo de Delegado do Patrimônio da União em São Paulo e que, por meio da Portaria n. 213/96 foi instaurada sindicância administrativa n. 10.880.027796/96-59 para apurar eventuais irregularidades na emissão/expedição de certidões de transferência de domínio útil de enfiteuse.

Em decorrência, foi instaurado o processo administrativo n. 05026.001037/2001-70 para apurar a responsabilidade do autor, enquanto no exercício de cargo em comissão de Delegado Regional do Patrimônio da União, na emissão de certidões para a transferência do domínio útil de enfiteuse localizada na região de Alphaville/Tamboré que não refletiam fielmente os registros cadastrais do órgão e/ou sem a prévia cobrança dos valores devidos (foros, diferenças de laudêmios e multas devidos em função das transferências de propriedade), em descumprimento aos preceitos legais e regulamentares pertinentes, com consequentes prejuízos ao erário, resultando ainda em benefícios ou prejuízos para terceiros, bem como pelo fato de ter obtido vantagem na aquisição de um imóvel, em razão da função exercida, incorrendo no crime de corrupção passiva.

O autor foi demitido por meio da Portaria n. 308, de 27.09.2002, publicada em 01.10.2002, por valer-se do cargo para lograr proveito a outrem, em detrimento da dignidade da função pública, e por improbidade administrativa, com restrição de retorno ao serviço público federal (fl. 1837).

Na presente ação, sustentou o autor, em síntese, a ocorrência da prescrição para a Administração rever seus atos, nulidade do processo administrativo por ofensa ao contraditório e ampla defesa, por excesso de prazo para a conclusão do pad e pela sucessiva constituição de comissão disciplinar e questiona a ausência de justa causa para a aplicação da penalidade aplicada.

O juiz a quo julgou improcedente o pedido ao ponderar pela regularidade do procedimento administrativo e da penalidade aplicada (fls. 3180/3186).

Apela o autor suscitando a preliminar de nulidade da sentença por não ter apreciado todos os seus questionamentos e reiterando as alegações da inicial.

Passo à análise do recurso de apelação.

 

Da preliminar de nulidade sentença pela negativa de prestação jurisdicional.

Alega o apelante que o Juízo a quo não se pronunciou sobre todas as questões suscitadas na petição inicial e nos embargos de declaração, sustentando a nulidade da sentença por ofensa ao artigo 93, IX, da CF.

Rejeito a preliminar.

O magistrado desincumbiu-se da tarefa de prestar jurisdição, resolvendo a questão que lhe foi posta. A sentença recorrida abordou, de modo claro e suficientemente fundamentado, as questões suscitadas pelas partes, não havendo que se falar em nulidade. Tendo o magistrado a quo encontrado fundamento suficiente para decidir a questão posta em Juízo, não se faz necessária a abordagem pontual de cada argumento aduzido pelas partes. Nesse sentido posiciona-se a jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça e desta Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região:

 

Compete ao magistrado fundamentar todas as suas decisões, de modo a robustecê-las, bem como afastar qualquer dúvida quanto a motivação tomada, tudo em respeito ao disposto no artigo 93, IX, da Carta Magna de 1988. Tal raciocínio não origina contudo, a obrigação de dar respostas a todas as questiúnculas formuladas em juízo, devendo ser considerada a conclusão lógico-sistemática adotada pelo decisum.

STJ, 5ª Turma, AgREsp 388834, Rel. Min. Gilson Dipp, DJ 13.05.2002, p. 223

HABEAS CORPUS - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO - OMISSÃO - INEXISTÊNCIA - RECURSO IMPROVIDO. 1. O julgador não está obrigado a examinar todas as questões suscitadas pelo embargante quando já possui motivação suficiente para fundamentar sua decisão. 2. A omissão que enseja a oposição dos declaratórios é a lacuna existente na conclusão do julgado, não a que se refere à rejeição implícita dos argumentos das partes, porquanto a revisão do julgado não se coaduna com a via dos embargos de declaração. Inexistência, portanto, de violação ao art. 619, do Código de Processo Penal. Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. 3. Inadmissibilidade de embargos de declaração infringentes (que, a pretexto de esclarecer ou completar o julgado anterior, na realidade, buscam alterá-lo), conforme reiterado entendimento jurisprudencial. 4. Embargos de declaração improvidos.

TRF 3ª Região, 1ª Turma, HC 200903000367000, Rel. Des.Fed. Johonsom di Salvo, j. 28/09/2010, DJe 08/10/2010

 

Da regularidade do processo administrativo disciplinar

A garantia do devido processo legal, com respeito aos princípios do contraditório e da ampla defesa constitui preceito constitucional (art. 5º, LV, CF), de observância obrigatória tanto nos processos judiciais quanto nos administrativos.

Referido ditame constitucional tem previsão legal específica para o processo administrativo disciplinar nos artigos 143 e 153, caput, da Lei n. 8.112/90.

Apela a parte autora sustentado a inobservância do princípio da legalidade por ofensa aos artigos 142, 145, 152 e 169 da lei 8.112/90, do princípio da ampla defesa por não especificar a conduta infracional e o dispositivo legal e regulamentar supostamente violado e a inocorrência de infração disciplinar.

Pela análise dos autos, em especial da cópia integral do processo administrativo e da sindicância, é possível verificar que a Administração Pública respeitou os princípios da legalidade, do contraditório e da ampla defesa, não havendo qualquer irregularidade a ser constatada.

Senão vejamos!

Da prescrição

Alega o autor a ocorrência de prescrição, ao argumento que as certidões de transferências foram expedidas e assinadas pelo apelante entre abril de 1992 a 31/12/1995; que a regularidade das certidões não foi questionada pela Administração dentro do prazo de 5 anos; que o termo inicial da contagem do prazo é a data da emissão da certidão; que as certidões; que prazo prescricional penal não se aplica ao caso, por nunca ter sido processado pelos crimes de falsidade ideológica, corrupção e improbidade administrativa.

Não assiste razão ao apelante.

Dispõe o artigo 142 da Lei nº 8.112/90:

 

"Art. 142. A ação disciplinar prescreverá:

I - em 5 (cinco) anos, quanto às infrações puníveis com demissão, cassação de aposentadoria ou disponibilidade e destituição de cargo em comissão;

II - em 2 (dois) anos, quanto à suspensão;

III - em 180 (cento e oitenta) dias, quanto à advertência.

§ 1o O prazo de prescrição começa a correr da data em que o fato se tornou conhecido.

§ 2o Os prazos de prescrição previstos na lei penal aplicam-se às infrações disciplinares capituladas também como crime.

§ 3o A abertura de sindicância ou a instauração de processo disciplinar interrompe a prescrição, até a decisão final proferida por autoridade competente.

§ 4o Interrompido o curso da prescrição, o prazo começará a correr a partir do dia em que cessar a interrupção."

 

É certo que o §2º do artigo 142 da Lei 8.112/90 determina a observância do prazo prescricional previsto na legislação penal nas hipóteses em que as infrações disciplinares também são capituladas também como crime.

Quanto ao ponto, registro que a jurisprudência se firmou no sentido de que caso não instaurado o processo penal para apuração e aplicação de pena quanto à conduta do servidor, que se diz similar ao ilícito penal, remanesce a regra da prescrição da esfera administrativa.

Nesse sentido:

 

"ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. PENA DE DEMISSÃO. PRAZO PRESCRICIONAL. NÃO-CONFIGURAÇÃO DE CRIME. LEI ESTADUAL 10.261/68. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA DO ESTADO. OCORRÊNCIA. RECURSO ORDINÁRIO PROVIDO.

1. É firme o entendimento no Superior Tribunal de Justiça no sentido de que, havendo cometimento por servidor público de infração disciplinar também tipificada como crime, somente se aplica o prazo prescricional previsto na legislação penal quando os fatos também forem apurados na esfera criminal. Precedentes.

2. Hipótese em que não houve apuração na esfera criminal dos fatos imputados ao recorrente, de modo que deve ser aplicado o prazo prescricional de cinco anos, conforme previsto no art. 261, II, da Lei Estadual 10.261/68.

3. In casu, quando publicado o ato de demissão do recorrente, em 14/6/2003, o prazo prescricional da pretensão punitiva do Estado já havia transcorrido, tendo em vista que a última interrupção do prazo deu-se em 10/2/98, com a instauração do processo disciplinar.

4. Recurso ordinário provido." (STJ - ROMS 19887/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 20/11/2006, DJ 11/12/2006, PG:00393).

 

"ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. PENA DE DEMISSÃO POR ABANDONO DE CARGO. PRAZO PRESCRICIONAL. LEI ESTADUAL N.º 10.261/68. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA DO ESTADO. OCORRÊNCIA.

1. A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça se firmou no sentido de que somente se aplica o prazo prescricional previsto na legislação penal quando os fatos também forem apurados na esfera criminal. No presente caso, não houve apuração na esfera criminal, devendo, portanto, ser aplicado o prazo prescricional previsto na legislação administrativa estadual.

2. Instaurado o processo administrativo disciplinar e aplicada a pena de demissão após o prazo de 05 (cinco) anos, previsto na Lei Estadual nº 10.261/68, contados do conhecimento de existência de falta pela autoridade, deve ser reconhecida a prescrição da pretensão punitiva do Estado.

3. Recurso ordinário conhecido e provido. Origem:" (STJ - ROMS 19087/SP, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 19/06/2008, DJ 04/08/2008).

 

"ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. PENA DE DEMISSÃO A BEM DO SERVIÇO PÚBLICO. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. LEI Nº 10.261/68. ESTATUTO DOS FUNCIONÁRIOS PÚBLICOS DO ESTADO DE SÃO PAULO. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. INTERRUPÇÃO DO PRAZO. INAPLICABILIDADE DA LEGISLAÇÃO PENAL. PRECEDENTES. RECURSO DESPROVIDO.

(...)

III - Consoante entendimento do Superior Tribunal de Justiça, a mera presença de indícios de crime, sem a devida apuração criminal, afasta a aplicação da legislação penal para o cômputo da prescrição, devendo ser aplicados os prazos administrativos. Precedentes.

IV - Recurso conhecido e desprovido." (STJ - ROMS 14497/SP, Rel. Min. Gilson Dipp, j. 05/08/2003, DJ 15/09/2003, PG:00331).

 

No caso em tela, o inquérito policial n. 2007.61.81.004152-9 instaurado para apurar suposta conduta criminosa do apelante aventada no processo administrativo disciplinar, tipificada nos artigos 299 e 317 do Código Penal (falsidade ideológica e corrupção passiva), foi arquivado em 15/06/2011 após o juízo acolher a promoção de arquivamento do MPF de que ocorrera a prescrição da pretensão punitiva pela pena em abstrato em relação aos dois delitos (fls. 3558/3562).

Assim, é de ser observado o prazo prescricional relativo à esfera administrativa.

A teor do § 1º do art. 142, da Lei 8.112/90, o prazo de prescrição começa a correr da data em que o fato se tornou conhecido. Considera-se conhecido o fato, se outro não lhe anteceder, qualquer ato oficial que demonstre inequivocamente a ciência da Administração.

Prosseguindo, necessário verificar acerca da interrupção do curso do prazo prescricional. Nos termos do art. 142, § 3º, da Lei 8.112/90, o prazo prescricional se interrompe na data da abertura da sindicância ou da instauração do processo administrativo disciplinar.

Quanto ao ponto, registro precedentes do STJ no sentido de que o prazo prescricional não é interrompido com a sindicância quando esta não tem caráter punitivo, e sim investigativo ou preparatório para o procedimento administrativo disciplinar, caso em que se considera como marco interruptivo a data da instauração do processo disciplinar:

 

MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. SERVIDORA PÚBLICO FEDERAL. ATO IMPUGNADO. PORTARIA. LEGITIMIDADE DO MINISTRO DE ESTADO RESPONSÁVEL PELA SUA EDIÇÃO. PENALIDADE DE SUSPENSÃO. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA ESTATAL. NÃO-OCORRÊNCIA. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. OBSERVÂNCIA DO PRAZO DE 140 DIAS PARA CONCLUSÃO.

INTERRUPÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL. SINDICÂNCIA. INTERRUPÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. TERMO DE INDICIAMENTO. VÍCIO.

AUSÊNCIA.

1. Tem legitimidade para figurar no polo passivo do writ o Ministro de Estado responsável pela edição da Portaria impugnada na inicial do mandamus.

2. É cabível a interrupção da prescrição, em face da instauração de sindicância, somente quando este procedimento sumário tiver caráter punitivo e não meramente investigatório ou preparatório de um processo disciplinar, pois, neste caso, dar-se-á a interrupção somente com a instauração do processo administrativo disciplinar, apto a culminar na aplicação de uma penalidade ao servidor.

3. De acordo com jurisprudência consolidada deste Superior Tribunal de Justiça, o prazo legal para término do processo administrativo disciplinar é de 140 (cento e quarenta) dias.

4. A contagem do prazo prescricional, após a interrupção prevista no art. 142, § 3º, da Lei nº 8.112/90, deve ser retomada, por inteiro, a partir do término do prazo de interrupção.

5. Afasta-se a ocorrência de prescrição da pretensão punitiva estatal se, no momento da aplicação da pena de suspensão, ainda não tiverem transcorridos dois anos, contados a partir do fim do prazo de interrupção previsto no 142, § 3º, da Lei nº 8.112/90.

7. Segurança denegada.

(STJ, MS 11.644/DF, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 27/10/2010, DJe 08/11/2010)

MANDADO DE SEGURANÇA. POLICIAL RODOVIÁRIO FEDERAL. PRÁTICA DE ATO ILÍCITO. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. APLICAÇÃO DE PENALIDADE. PRESCRIÇÃO. NÃO-OCORRÊNCIA.

1. A jurisprudência da Primeira e Terceira Seções do STJ é firme no sentido de que o lapso prescricional não é interrompido com a sindicância, pois esta não tem caráter punitivo, e sim investigativo.

2. Se observado o prazo prescricional de cinco anos entre a ciência dos fatos pela autoridade competente e a instauração do processo disciplinar, assim como entre os 140 dias da instauração desse procedimento e a aplicação da penalidade disciplinar, não há falar em prescrição da pretensão punitiva estatal. Precedentes do STJ.

3. Segurança denegada.

(STJ, MS 15.230/DF, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/02/2011, DJe 15/03/2011)

 

Em 10.06.1996, por meio do Memo/DPU/GAB/ N. 272/96, o então Delegado do Patrimônio da União, Jose Luiz Soalheiro, solicitou à Divisão de Receitas Patrimoniais informações sobre um imóvel localizado em Alphavile, relativa à certidão n. 489/95, datada de 06.04.1995 (fls. 2703/2704).

A Divisão de Receitas Patrimoniais informou ao Delegado por meio de fax datado de 11.06.1996 não ter localizado nos arquivos de certidões emitidas pela repartição cópia da certidão n. 489/95 nem contrato de compra e venda ou declaração respectiva, informou a incorreção do nome do aforado e constatou que há débitos de foro e laudêmio (fl. 2705).

Assim, a Delegacia do Patrimônio da União tomou ciência em 11.06.1996 acerca de possível irregularidade naquela Delegacia, consistente na emissão de certidão para transferência de imóvel sem o correspondente registro nos arquivos da Delegacia do Patrimônio da União e sem o recolhimento de foro e laudêmio (fl. 2705), tendo a Secretaria do Patrimônio da União determinando que o Delegado da Delegacia do Patrimônio da União instaurasse sindicância com vistas a apurar as origens das irregularidades detectadas (fl. 2146).

Assim, a sindicância administrativa n. 10.880.027796/96-59 foi instaurada por meio da Portaria n. 213/96, datada de 29.07.1966, publicada no Boletim de Pessoal da Delegacia da Administração do Ministério da Fazenda n. 31, de 02.08.1996 para apurar eventuais irregularidades na emissão/expedição de certidões de transferência de domínio útil de enfiteuse no âmbito da Delegacia do Patrimônio da União no Estado de São Paulo (fl. 2142).

Em 30.08.1996 foi elaborado relatório pela comissão de sindicância opinando pela instauração de inquérito administrativo para prosseguir na apuração das responsabilidades do ex-Delegado e dos demais servidores da Delegacia (fls. 2345/2352 - fls. 299/304 do processo de sindicância), em especial:

 

b) Artur Augusto Leite:

I - pela emissão de certidões:

- sem retratar fielmente os registros da Delegacia: art. 299, § único, do Código Penal;

- sem cobrar os débitos pendentes/laudêmios devidos (transferências): artigos 117, inciso IX, e 132, incisos IV e X, da Lei n. 8.112/90;

II - pelo constrangimento de pessoas que seriam necessariamente ouvidas pela Comissão (fls. 235 e 244): art. 344 do Código Penal.

 

Assim, a Secretaria do Patrimônio da União determinou em 16.07.1996 a instalação do processo administrativo, nos termos propostos pela comissão de sindicância (fls. 2355/2356).

A Comissão de Processo Administrativo Disciplinar foi designada por meio da Portaria n. 89, de 22.05.2001, da Secretaria do Patrimônio da União publicada no Boletim de Pessoa e Serviço n. 5.13, de 22.05.2001 (fl. 2389), para a apurar responsabilidade dos ex-servidores da Gerência Regional de Patrimônio da União no Estado de São Paulo (fl. 2389).

Quanto ao ponto, registro que o artigo 151 da lei n. 8.112/90 dispõe que processo administrativo disciplinar é composto de três fases, sendo a primeira a "instauração, com a publicação do ato que constituir a comissão":

 

Art. 151. O processo disciplinar se desenvolve nas seguintes fases:

I - instauração, com a publicação do ato que constituir a comissão;

II -inquérito administrativo, que compreende instrução, defesa e relatório;

III - julgamento.

 

Assim, para o caso em tela, o prazo prescricional, que se iniciou na data em que a administração tomou conhecimento acerca dos fatos em 11.06.1996 (fl. 2705), foi interrompido com a publicação da portaria de constituição da Comissão de Processo Administrativo Disciplinar em 22.05.2001 (fl. 2389)

 

Alega ainda o apelante ter decorrido mais de 120 dias entre a data que a Administração tomou ciência da infração disciplinar e a da aplicação da penalidade administrativa de demissão, ocorrendo a prescrição da pretensão punitiva da administração.

Rejeito a alegação de pretensão punitiva da administração, pois, conforme mencionado acima, o prazo inicia-se da data do conhecimento do fato pela autoridade competente para instaurar o processo administrativo disciplinar (§ 1º do art. 142), interrompendo-se com a abertura da sindicância ou a instauração do processo disciplinar, até a decisão final proferida por autoridade competente (§ 3º do art. 142).

No tocante ao §3º do artigo 142, registro que a sua interpretação é de ser feita de forma sistemática, no sentido de que o prazo prescricional é interrompido pela instauração do processo disciplinar, mas recomeça a correr quando decorrido o prazo legalmente previsto para o seu término. Em outras palavras, após 140 (cento e quarenta) dias da data de instauração do PAD (prazo máximo conferido pela Lei n. 8.122/90 para conclusão e julgamento do PAD), o prazo prescricional volta a correr por inteiro.

Nesse sentido, registro os precedentes dos Tribunais Superiores:

 

EMENTA Constitucional e Administrativo. Poder disciplinar. Prescrição. Anotação de fatos desabonadores nos assentamentos funcionais. Declaração incidental de inconstitucionalidade do art. 170 da Lei nº 8.112/90. Violação do princípio da presunção de inocência. Segurança concedida. 1. A instauração do processo disciplinar interrompe o curso do prazo prescricional da infração, que volta a correr depois de ultrapassados 140 (cento e quarenta) dias sem que haja decisão definitiva. (...)

(STF, MS 23262, Relator(a):  Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 23/04/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-213 DIVULG 29-10-2014 PUBLIC 30-10-2014)

 

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ADMINISTRATIVO. PROCESSO DISCIPLINAR. CASSAÇÃO DE APOSENTADORIA. LIMINAR NEGADA. AGRAVO REGIMENTAL. ALEGAÇÃO DE PRESCRIÇÃO. PRETENSÃO DE CONTAGEM COM BASE EM PROCESSO EXTINTO, COM FULCRO NO ART. 52 DA LEI N. 9.784/99.

IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE FUMUS BONI IURIS. INEXISTÊNCIA DE PERICULUM IN MORA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ALEGAÇÃO DE OMISSÃO.

EXISTÊNCIA. INTEGRAÇÃO DO ACÓRDÃO. AUSÊNCIA DE CONTRADIÇÃO.

I - A fundamentação do acórdão recorrido apresenta omissão, que passa a ser sanada.

II - De acordo com a jurisprudência desta Corte, o prazo prescricional interrompido volta a correr se passados 140 dias sem a conclusão do processo, o que não ocorreu no caso, uma vez que não houve conclusão, mas sim arquivamento por existência de outro processo sobre os mesmos fatos. Esgotados os 140 dias, o prazo prescricional volta a correr por inteiro (AgRg no MS 19.488/DF, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, primeira seção, julgado em 27/2/2013, DJe 6/3/2013).

III - O prazo prescricional tem início com o conhecimento dos fatos. A interrupção do prazo ocorreria uma única vez com a instauração do processo administrativo. Como o primeiro processo administrativo foi invalidado e arquivado, não se tratou de processo válido (fls. 120-121). A sua instauração não serve para ser considerada como marco interruptivo do prazo prescricional.

IV - O prazo prescricional, contado a partir do conhecimento dos fatos, foi interrompido uma única vez, em 30/11/2010, com a publicação da instauração do processo administrativo válido (fl. 40). A interrupção deveria se perpetuar até "decisão final" (art. 142, §3º, da Lei n. 8.112/91). Todavia, se a decisão final não for proferida no prazo de 140 dias após a instauração, passa a correr o prazo por inteiro. Não há, portanto, que se falar em mais de uma interrupção.

(...)

(STJ, EDcl no AgRg no MS 22.378/DF, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 13/12/2017, DJe 19/12/2017)

Assim, o prazo prescricional, que havia sido interrompido em 22.05.2001 com a edição da Portaria nº 89, voltou a correr após 140 dias, ou seja, em 11.10.2001, sendo aplicada a penalidade de demissão por meio da Portaria n. 308, de 27.09.2002, publicada 01.10.2002 (fls. 1837).

Dessa forma, não se consumou a prescrição administrativa, pois não transcorreram mais de cinco anos nem entre a data do conhecimento dos fatos pela Administração e a data da instauração do processo disciplinar, nem tampouco entre a data do término do prazo legal para conclusão do processo disciplinar e a aplicação da penalidade.

 

Da ausência justa causa para a instauração processo disciplinar

Sustenta o apelante a ausência de justa causa para instauração do pad, pois a comissão disciplinar enquadrou o autor em infrações disciplinares passíveis de penas de advertência e suspensão que já sabiam estarem prescritas; que a expedição de certidão tem previsão constitucional, tendo agido em estrito cumprimento de dever legal; que seguiu orientação do órgão central na emissão das certidões, o que foi confirmado pela autoridade superior hierárquica; que a ausência de processamento pelos crimes de falsidade ideológica, corrupção e improbidade administrativa na esfera criminal confirmam a regularidade de suas ações.

Não procede a alegação.

A Lei n. 8.1128/90 prevê a sindicância para apuração de irregularidade no serviço público (artigo 143), dela podendo resultar: arquivamento do processo; aplicação de penalidade de advertência ou suspensão de até 30 dias; e instauração do processo disciplinar (artigo 145). Quando o ilícito praticado pelo servidor ensejar a imposição de penalidade de suspensão por mais de 30 (trinta) dias, de demissão, cassação de aposentadoria ou disponibilidade, ou destituição de cargo em comissão, será obrigatória a instauração de processo disciplinar (artigo 146).

Já o artigo 148 da mesma lei dispõe que "o processo disciplinar é o instrumento destinado a apurar responsabilidade de servidor por infração praticada no exercício de suas atribuições, ou que tenha relação com as atribuições do cargo em que se encontre investido."

Conforme visto acima, a Delegacia do Patrimônio da União tomou ciência acerca de possível irregularidade naquela Delegacia, consistente na emissão de certidão para transferência de imóvel sem o correspondente registro nos arquivos da Delegacia do Patrimônio da União e sem o recolhimento de foro e laudêmio (fl. 2705), tendo a Secretaria do Patrimônio da União determinado a instauração de sindicância para apurar as origens das irregularidades detectadas (fl. 2146).

A comissão de sindicância constatou a prática de irregularidades passíveis de penalidade de demissão, opinando pela instauração de inquérito administrativo para prosseguir na apuração das responsabilidades do ex-Delegado e dos demais servidores da Delegacia (fls. 2345/2352):

Assim, foi lavrada a Portaria nº 89, de 22.05.2001 designando os membros da comissão para que apurassem a responsabilidade do servidor na emissão das certidões de transferência (fl. 2389).

Consoante relatório de fl. 2345/2347, as provas da infração disciplinar estavam nas documentações anexadas, nos depoimentos dos servidores.

Somente após a instrução do processo administrativo, assegurado o contraditório e ampla defesa, é que será avaliada se houve responsabilidade disciplinar ou não por parte do servidor na infração imputada.

 

Da duração razoável do processo e regularidade das comissões disciplinares

Sustenta o apelante o excesso de prazo para a conclusão do procedimento administrativo, tendo decorrido mais de 120 dias desde o inicio do pad, em afronta ao disposto no artigo 152 da Lei nº 8.112/90.

A Constituição Federal, no artigo 5º, inciso LXXVIII, assegura a todos, no âmbito judicial e administrativo, a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação, bem como, no artigo 37, elenca, entre os princípios da Administração Pública, o princípio da eficiência.

Contudo, a aferição do excesso de prazo para a conclusão do processo disciplinar não se realiza de forma puramente matemática, mas sim de acordo com um juízo de razoabilidade, no qual devem ser sopesados não apenas o decurso do prazo, mas também as peculiaridades da causa, sua complexidade, bem como quaisquer fatores que possam influir na tramitação do processo.

A renovação das prorrogações e o não cumprimento do prazo previsto no art. 152 da Lei n. 8.112/90 não é suficiente a caracterizar qualquer nulidade do procedimento, tendo em vista a previsão legal no sentido de que "o julgamento fora do prazo legal não implica nulidade do processo" (art. 169, § 1º, da Lei 8.112/90).

Nesse sentido é o entendimento dominante da jurisprudência:

EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. PENA DE DEMISSÃO. ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. EXCESSO DE PRAZO PARA A INSTRUÇÃO DO PAD. NÃO OCORRÊNCIA. NOVA INSTRUÇÃO PROCESSUAL APÓS O RELATÓRIO DA COMISSÃO PROCESSANTE. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE COISA JULGADA ADMINISTRATIVA. DESCRIÇÃO ADEQUADA DOS FATOS. AUSÊNCIA DE CERCEAMENTO DE DEFESA. AMPLA DEFESA GARANTIDA. PROPORCIONALIDADE DA PENA DE DEMISSÃO. RECURSO ORDINÁRIO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Ressalvada a hipótese de prescrição, não é necessariamente, de per se, nulo o processo administrativo disciplinar por causa do decurso do prazo máximo de 140 dias para sua conclusão. Precedentes. (...) 8. Recurso ordinário a que se nega provimento.

(STF, RMS 33666, Relator(a):  Min. MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão:  Min. EDSON FACHIN, Primeira Turma, julgado em 31/05/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-201 DIVULG 20-09-2016 PUBLIC 21-09-2016)

 

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. PUBLICIDADE DA PORTARIA DE INSTAURAÇÃO. QUALIFICAÇÃO DOS MEMBROS DA COMISSÃO. EXCESSO DE PRAZO. INOCORRÊNCIA DE DECADÊNCIA. 1. A autoridade que tiver ciência de irregularidade no serviço público é competente para promover a sua apuração na forma do art. 143 da Lei 8.112/90. 2. É válida a publicação da portaria que instaurou o procedimento de apuração no boletim informativo interno. Precedentes. 3. Comissão constituída por servidor de nível hierarquicamente igual ao do indiciado atende ao art. 149 da Lei 8.112/90. 4. O julgamento fora do prazo legal não implica nulidade do processo administrativo disciplinar. Precedentes. 5. Segurança indeferida.

(STF, MS 22127, Relator(a):  Min. ELLEN GRACIE, Tribunal Pleno, julgado em 30/06/2005, DJ 19-08-2005 PP-00005 EMENT VOL-02201-1 PP-00093 RTJ VOL-00195-01 PP-00036)

Registro também precedentes do STJ no sentido de que o descumprimento do prazo para o término do processo administrativo disciplinar, por si só, não acarreta em nulidade do processo, devendo ser demonstrado prejuízo à defesa do servidor, o que não se aplica ao caso em tela:

 

ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. PAD. SERVIDORES PÚBLICOS LOTADOS NA ALFÂNDEGA DE SANTOS/SP CONDENADOS PELA PRÁTICA DE ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA EM RAZÃO DE SUPOSTA EVOLUÇÃO PATRIMONIAL INCOMPATÍVEL COM OS RENDIMENTOS. PENA APLICADA: DEMISSÃO E CASSAÇÃO DE APOSENTADORIA. POSSIBILIDADE DE ANÁLISE APROFUNDADA DE PROVA DOCUMENTAL, DESDE QUE PRÉ-CONSTITUÍDA, EM MANDADO DE SEGURANÇA. CABE AO PODER JUDICIÁRIO SINDICAR AMPLAMENTE O ATO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. NULIDADES NÃO COMPROVADAS. AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. ORDEM DENEGADA, EM CONSONÂNCIA COM O PARECER MINISTERIAL, RESSALVADAS AS VIAS ORDINÁRIAS.

...

4. A ausência de termo de encerramento de volume e a extrapolação do prazo legal para conclusão do Procedimento Administrativo Disciplinar, por si só, não são causas de nulidade, devendo ser demonstrado o real prejuízo à defesa do servidor, o que, no caso, não ocorreu.

5. De acordo com o princípio pas de nullité sans grief, a nulidade do processo administrativo disciplinar somente pode ser declarada quando houver efetiva demonstração de prejuízo à defesa do servidor, o que, contudo, não se configura na hipótese dos autos.

6. Ordem denegada, em consonância com o parecer ministerial, com ressalva das vias ordinárias.

(MS 19.487/DF, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 13/09/2017, DJe 17/11/2017)

 

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA INDIVIDUAL. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. POLICIAL FEDERAL. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. PENA DE DEMISSÃO. ART. 43, INCISOS VIII, XVI E XLVIII, DA LEI N. 4.878/65. NULIDADE. EXCESSO DE PRAZO PARA A CONCLUSÃO DOS TRABALHOS DA COMISSÃO PROCESSANTE. PREJUÍZO. AUSÊNCIA. POSTERIOR MODIFICAÇÃO DA TIPIFICAÇÃO PELA AUTORIDADE ADMINISTRATIVA. IRRELEVÂNCIA. ALEGADA INSUFICIÊNCIA DO CONJUNTO PROBATÓRIO DO PAD. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. NECESSÁRIA DILAÇÃO PROBATÓRIA. PRECEDENTES. SEGURANÇA DENEGADA.

1. Não merece guarida a alegação de nulidade sob o fundamento de que houve excesso de prazo para a conclusão dos trabalhos da Comissão Processante, contrariando o disposto no art. 152 da Lei n. 8.112/90.

O excesso de prazo para conclusão do processo administrativo disciplinar não é causa de nulidade, quando não demonstrado nenhum prejuízo à defesa do servidor. Precedentes.

...

4. Segurança denegada.

(STJ, MS 20.747/DF, Rel. Ministro OG FERNANDES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/06/2015, DJe 18/06/2015)

 

Tal entendimento foi consagrado na Súmula nº. 592 do STJ, que dispõe que "o excesso de prazo para a conclusão do processo administrativo disciplinar só causa nulidade se houver demonstração de prejuízo à defesa".

No caso em tela, a Comissão Processante foi instalada em 22.05.2001 por meio da Portaria da Secretaria do Patrimônio da União n. 89 (fl. 2389) publicada no Boletim de Pessoa e Serviço n. 5.13, de 22.05.2001, tendo sido prorrogada por mais 60 dias por meio da Portaria n. 115, de 19.07.2001 (fl. 1015), publicada no Boletim de Pessoa e Serviço n. 7.8, de 20.07.2001.

Como não foram concluídas os trabalhos no prazo prorrogado, sobreveio a Portaria 155, de 19.09.2001, publicada no Boletim de Pessoa e Serviço n. 9.12, de 19.09.2001 (fl. 1174) constituindo nova comissão processante disciplinar, para dar continuidade à apuração, prorrogada por 60 dias pela Portaria 204, de 20.11.2001, publicada no Boletim de Pessoa e Serviço n. 11.11, de 20.11.2001 (fl. 1462).

A última comissão foi constituída pela Portaria 002, de 22.01.2002, publicada no Boletim de Pessoa e Serviço n. 1.14, de 22.01.2002 (fl. 1656) que concluiu os trabalhos.

O apelante foi citado e intimado para ser interrogado em 22.08.2001(fl.. 1107).

Após regular instauração e citação do apelante, procedeu-se à fase de inquérito administrativo (instrução, defesa e relatório), conforme previsão do art. 151 da Lei 8.112/90, com a colheita de provas documentais e testemunhais, os interrogatórios de todos os indiciados.

O despacho de indiciação foi proferido em 01.03.2002 (fls. 1665/1675).

O apelante foi devidamente citado para apresentar defesa em 11.03.2002, conforme preceitua o artigo 161, § 1º, da Lei 8.112/90 (fls. 1683) e apresentou a defesa em 21.03.2002 (fls. 1692/1711), instruída com diversos documentos.

Por fim, foi apresentado o relatório final da Comissão processante em 22.03.2002 (fls. 1758/1788).

Destarte, não houve excesso de prazo na conclusão do processo administrativo, tendo o processo administrativo sido concluído no prazo razoável, considerada a complexidade dos fatos, necessidade de oitiva de diversas testemunhas.

E a constituição da Comissão de Processo Administrativo Disciplinar foi efetivada pela autoridade competente (Secretária de Patrimônio da União) e tipificou de forma minuciosa as condutas imputadas ao apelante, respeitando as determinações do art. 161, caput, da Lei 8.112/90.

Considerado que os trabalhos da comissão anterior não foram concluídos no prazo prorrogado, foram constituídas novas comissões disciplinares para dar continuidade à apuração, não havendo que se falar em nulidade dos atos praticados pelas comissões anteriores.

 

Da nulidade no Processo Administrativo pela não apreciação de provas

Sustenta o apelante a nulidade do pad, pois foi respaldado em relatório da comissão de inquérito que deixou de apreciar diversas provas apresentadas, em ofensa à garantia do contraditório e ampla defesa.

A alegação de nulidade é de ser rejeitada.

Depreende-se dos itens VI a XI do Relatório Final que a Comissão de Inquérito apreciou minuciosamente todas as alegações suscitadas pela defesa do servidor, item por item (fls. 1772/1783).

Quanto à alegação de que o relatório da comissão de inquérito deixou de observar que era de praxe a emissão de certidão para transferência de partes e a substituição do contrato de aforamento pela certidão, e esse que comportamento era aceito e aprovado pelo órgão central, a Comissão de Inquérito assim se pronunciou (fl. 1775):

 

A afirmação constante no tem 16 é equivocada, pois não se tem conhecimento de que a certidão substitua o contrato, bem como não temos notícia de qualquer documento do órgão central autorizando a substituição desta por aquela.

 

Rejeito ainda a alegação de que a comissão deixou de observar as normas legais, pois não havia disciplina da conduta a ser adotada, quando da inexistência de Contrato de Aforamento. A comissão de inquérito refutou expressamente a alegação da defesa (fls. 1774/1775):

 

Afirma a defesa em seu item 11 que não houve a lavratura do contrato de aforamento, porém o público e notório acórdão de 1918 do Supremo Tribunal Federal reveste de legalidade o regime implantado na área em questão, a Fazenda Tamboré. Cabe ressaltar que a propriedade da mesma está garantida no Decreto-lei n. 9.760/46, mais precisamente em seu artigo 1º, e ainda na própria Constituição Federal, isto sem perder de vista que se as matriculas do cartório de registro imobiliário falam somente na transferência do domínio útil é porque esta representa 83% (oitenta e três por cento) do terreno, ficando os 17% (dezessete por cento) restante, ou seja, o domínio direto, com a União Federal.

Ademais, a lavratura do contrato, visando substituir contrato extraviado ou não elaborado à época própria, ode ocorrer a qualquer momento, e isto até por dever da autoridade que vier a tomar conhecimento desta circunstancia. Daí porque não se pode tomar a falta de instrumento de aforamento como justificadora para a prática de atos não previstos na legislação ou em dispositivos infralegais.

Quanto ao aventado item 12, não se pode concordar com tal afirmação na medida em que não foi a falta de contrato original que causou desassossego aos adquirentes de imóveis na região de Alphaville, e sim a ação intempestiva dos grandes empreendedores que parcelaram o solo e não regularizaram junto ao Serviço de Patrimônio da União - SPU na época própria.

(..) quanto ao item 15, no entender da comissão, as certidões devem refletir os registros o órgão e a real situação do foreiro. Desta forma, é totalmente ilícita a expedição de certidão pelos órgãos.

 

Da ausência de cerceamento de defesa no procedimento disciplinar

O processo administrativo disciplinar foi instaurado com fundamento nos arts. 145, III e 146, da Lei 8.112/90, pois a sindicância anteriormente promovida constatou a realização de conduta funcional apenada com sanção de demissão.

Durante o procedimento, o apelante teve acesso aos autos do procedimento, tendo inclusive recebido cópia integral do processo administrativo (fls. 1138).

As diligências requeridas pelo apelante ou foram devidamente realizadas ou foram indeferidas de forma motivada, conforme se verifica da "ata de deliberação" (fls. 1118/1122), tudo de acordo com a determinação do art. 156, § 1º, da Lei 8.112/90, não havendo, portanto, que se falar em arbitrariedade.

O interrogatório do apelante foi realizado depois da oitiva das testemunhas, conforme determina o art. 159 da mencionada lei (fls. 1478/1485).

A Comissão apresentou relatório conclusivo, com indicação do dispositivo legal no qual o servidor está incurso (art. 165, Lei 8.112/90).

Explicitou ainda, de forma minuciosa, as normas regulamentares e legais violadas pela conduta do apelante, em especial, os arts. 2º e 6º do Decreto 95.760/88, decreto 2.398/87 e art. 116, III c.c. 117, IX, Lei 8.112/90 (fls. 1782/1786).

Ademais, as conclusões da Comissão encontram-se supedaneadas pelos elementos dos autos do processo administrativo. É certo que o direito à prova não se limita apenas à sua produção, abrangendo as fases de indicação, produção e devida apreciação pelo órgão julgador. Entretanto, ao contrário do alegado pelo apelante, a Comissão apreciou todas provas dos autos, fundamentando de forma eficaz suas conclusões. O simples fato de o apelante não concordar com tais conclusões não corrobora a alegação de que as provas não foram devidamente apreciadas.

Conforme mencionado no relatório final da comissão de inquérito, sequer foram demonstrados os vícios no processo (fl. 1781):

 

A tentativa de demonstração de cerceamento de defesa e extremamente frágil e vem esculpida em meras e infundadas alegações.

A afirmação de que a citação não ofereceu possibilidade de defesa e ofendeu o princípio do contraditório por desrespeitar o dispositivo nos artigos 155 a 159 da lei 8.112/90 e os artigos 29 e 45 da lei n. 9.784/99, não aponta onde que tal instrumento estaria viciado. Não são apontadas as omissões e os excessos da comissão ou ainda qual o direito do indicado que restou violado.

Que a sindicância é mera peça informativa do processo administrativo e que aquilo que nela consta deve submeter-se ao crivo do contraditório é fato, e foi observado no caso, tanto que o indiciado foi, desde logo, citado para acompanhar os atos do processo conforme mandado de folha 514, em que pese as dificuldades por ele edificadas no sentido de obstar e comprometer o trabalho da comissão.

E tanto isso é verdade que arrolou testemunhas que foram ouvidas pela comissão, deduziu requisições e requereu a juntada de documentos, para depois, ser interrogado, e isto inclusive na presença de advogado.

 

A regularidade do processo administrativo também foi constatada tanto pelo parecer da Consultoria Jurídica do Ministério do Planejamento (fls. 1815/1823) quanto por aquele emanado do Ministério da Fazenda (fls. 1825/1832).

 

Assim, pelo aspecto formal, não restou demonstrado a existência de mácula no processo administrativo disciplinar, não havendo que se falar em inobservância aos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório.

 

Da análise da legalidade do processo administrativo disciplinar bem como de suas conclusões

Consolidou-se na jurisprudência pátria o entendimento de que o controle jurisdicional sobre o processo administrativo disciplinar limita-se à verificação da regularidade do procedimento e da legalidade do ato de demissão, sendo defeso ao Poder Judiciário adentrar no mérito administrativo, sob pena de violação do princípio constitucional da separação dos poderes.

Neste sentido os julgados do E. STJ:

 

"ADMINISTRATIVO. SERVIDORES PÚBLICOS. DEMISSÃO. NULIDADES NO PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. OFENSA AO DEVIDO PROCESSO LEGAL. INOCORRÊNCIA. REEXAME DE PROVAS PRODUZIDAS. IMPOSSIBILIDADE DE ANÁLISE PELO PODER JUDICIÁRIO DO MÉRITO ADMINISTRATIVO. AGRAVAMENTO DA PENA SUGERIDA PELA COMISSÃO PROCESSANTE. POSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE FUNDAMENTAÇÃO. ART. 168 DA LEI Nº 8.112/90. EXCESSO DE PRAZO. NÃO COMPROVAÇÃO DE PREJUÍZO. INDEPENDÊNCIA DAS ESFERAS ADMINISTRATIVA E PENAL. "WRIT" IMPETRADO COMO FORMA DE INSATISFAÇÃO COM O CONCLUSIVO DESFECHO DO PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. ORDEM DENEGADA. I - Em relação ao controle jurisdicional do processo administrativo, a atuação do Poder Judiciário circunscreve-se ao campo da regularidade do procedimento, bem como à legalidade do ato demissionário, sendo-lhe defesa qualquer incursão no mérito administrativo a fim de aferir o grau de conveniência e oportunidade. II - ... III - ... IV - ... V- ... VI - ... VII - Ordem denegada. (MS 9384 / DF, Rel. Ministro GILSON DIPP, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 23/06/2004, DJ 16/08/2004, p. 130)

 

"ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PENA DE DEMISSÃO. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. NULIDADES. INEXISTÊNCIA. AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. 1. Não se verifica nenhuma ilegalidade no procedimento administrativo o fato do Contencioso Administrativo - órgão de assessoramento e direção da Presidência - ter manifestado opinião por meio de parecer jurídico, máxime por estar em perfeita consonância com o Regulamento Interno do Tribunal de Justiça Estadual. 2. O processo administrativo, que culminou na aplicação da pena de demissão à Recorrente, teve regular processamento, com a estrita observância aos princípios do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório. 3. Em relação ao controle jurisdicional do processo administrativo, a atuação do Poder Judiciário circunscreve-se ao campo da regularidade do procedimento, bem como à legalidade do ato, sendo-lhe defesa qualquer incursão no mérito administrativo a fim de aferir o grau de conveniência e oportunidade. Dessa forma, mostra-se inviável a análise das provas constantes no processo administrativo. 4. Recurso desprovido." (RMS 19863 / SE, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 29/11/2007, DJ 17/12/2007, p. 224)

 

No mesmo sentido o entendimento deste E. Tribunal:

 

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO - AGRAVO LEGAL - ART. 557, § 1º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL - DIREITO ADMINISTRATIVO - SERVIDOR PÚBLICO - NULIDADE DO PROCESSO ADMINISTRATIVO QUE CULMINOU EM DEMISSÃO - PRETENDIDA REINTEGRAÇÃO NO CARGO - ATUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO RESTRITA AOS ASPECTOS DA LEGALIDADE DO ATO - OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO CONTRADITÓRIO E DA AMLPA DEFESA - AGRAVO LEGAL IMPROVIDO. 1. ... 2. ... 3. É vedado ao Poder Judiciário adentrar no mérito administrativo, sob pena de violação ao princípio da separação dos Poderes. A sua atuação é restrita aos aspectos de legalidade do ato. Assim, não é cabível o reexame do mérito das provas colhidas no corpo do procedimento administrativo, mas tão somente a análise formal de sua validade. 4. No decorrer do processo administrativo foram asseguradas à autora as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa, haja vista que formulou sua defesa e teve oportunidade de produzir as provas e contraprovas que achasse conveniente. 5. O processo administrativo que ensejou a demissão da recorrente está em estrita consonância com os princípios previstos na Constituição Federal e na Lei n° 9.784/99, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal. 6. Agravo legal improvido. (TRF 3ª Região, 1ª Turma, Agr. Legal em Apel. 94.03.105114-0/SP, Rel. Des. Fed. Johonsom di Salvo, j. 28.009.10)

 

CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. SERVIDOR PÚBLICO. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. PROCESSO ADMINISTRATIVO. NULIDADE. DEFESA TÉCNICA EM PROCESSO ADMINISTRATIVO. DESNECESSIDADE. SÚMULA VINCULANTE N.º 5 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. PENA DE DEMISSÃO. LEGALIDADE. INOVAÇÃO EM SEDE RECURSAL. NÃO CONHECIMENTO. 1. A adoção das razões de decidir expendidas em precedente não importa nulidade da sentença. 2. O recurso de apelação é instrumento processual que não se presta à introdução de fundamento novo, não deduzido na petição inicial. 3. Da mesma forma como ocorre no direito penal, no direito administrativo-disciplinar o acusado se defende dos fatos que lhe são imputados; e não da sua capitulação legal (STF, MS n.º 23.299-2/SP, rel. Min. Sepúlveda Pertence). 4. A falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição - Súmula Vinculante n.º 5 do Supremo Tribunal Federal. 5. Não é dado ao Poder Judiciário rediscutir o mérito do julgamento administrativo, mas tão-somente verificar a regularidade do processo. 6. Apelação parcialmente conhecida; na parte conhecida, desprovida. (TRF 3ª Região, 2ª Turma, AC 200061000056067, Rel. Des. Fed. NELTON DOS SANTOS, DJF3 DATA: 04/12/2008 PÁGINA: 821)

 

A análise da legalidade do processo administrativo e, em especial, do ato de demissão, não se limita à verificação da regularidade do procedimento, cabendo ao Poder Judiciário verificar se a Administração Pública respeitou os princípios da proporcionalidade e razoabilidade. Tal não configura qualquer invasão na análise do mérito administrativo, conforme vem entendendo o E. STJ:

 

RECURSO ESPECIAL. MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSO CIVIL E ADMINISTRATIVO. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. SERVIDOR PÚBLICO. DEMISSÃO. OFENSA AO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. EXAME DE LEGALIDADE. POSSIBILIDADE DE CONTROLE JUDICIAL, NA VIA DO MANDADO DE SEGURANÇA. AUSÊNCIA DE ANÁLISE DO MÉRITO ADMINISTRATIVO. PRETENSÃO DE ANULAÇÃO DO ATO DEMISSÓRIO. APLICAÇÃO PELA CORTE DE ORIGEM DA PENA DE SUSPENSÃO. JULGAMENTO ULTRA PETITA. OCORRÊNCIA. INTERPRETAÇÃO DE LEI LOCAL. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 280/STF. 1. (...). 2. Não há confundir a análise do mérito administrativo, que é de exclusividade da Administração por exigir juízo de valor acerca da conveniência e oportunidade do ato, com o exame de eventual ofensa ao princípio da proporcionalidade, que acarreta na ilegalidade e nulidade do ato e, portanto, é passível de ser examinada pelo Poder Judiciário. 3. (...). 4. (...). 5. (...). 6. Recurso especial provido em parte, para reconhecer a ocorrência de julgamento ultra petita e afastar a pena de suspensão aplicada pela Corte de origem, mantida a anulação do ato demissório e a conseqüente reintegração da recorrente ao cargo de agente da polícia civil. (STJ, 6ª Turma, RESP 200601772365, Rel. Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, DJE DATA:08/11/2010).

 

A verificação da legalidade do procedimento passa pela análise da existência de justa causa para a aplicação da penalidade disciplinar ao servidor, ou seja, cumpre ao Poder Judiciário verificar se os fatos imputados a ele de fato ocorreram.

Por tudo o que consta dos autos e pelos motivos que passo a expor, resta evidente o respeito, pela Administração Pública, ao princípio contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal no processamento da ação disciplinar, bem como ao principio da legalidade no ato administrativo, não havendo qualquer nulidade a ser verificada.

O apelante foi demitido através da Portaria nº 308, de 27 de setembro de 2002, publicada em 01 de outubro de 2002, que assim determinou (fl. 1834):

 

"O MINISTRO DE ESTADO DA FAZENDA INTERINO, no suso da atribuição que lhe confere o art. 87, parágrafo único, inciso IV, da Constituição Federal, de conformidade com o disposto no inciso I, doar. 1º do Decreto nº 3.035, de 27 de abril de 1999, com fundamento no artigo 132, incisos IV e XIII, e 137, parágrafo único, todos da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, e tendo em vista o que consta do Processo Administrativo Disciplinar nº 05026.001037/2001-70, resolve:

DEMITIR ARTUR AUGUSTO LEITE, Matrícula SIPE nº 17666, Auditor Fiscal da Receita Federal, do Quadro de Pessoal do Ministério da Fazenda, por valer-se do cargo para lograr proveito a outrem, em detrimento da dignidade da função pública, e por improbidade administrativa, com restrição de retorno ao serviço público federal."

 

O ato de demissão do apelante deu-se com fundamento no artigo 132, incisos IV e XIII, da Lei nº 8.112/90, por ter se valido do cargo para lograr proveito a outrem, em detrimento da dignidade da função pública, e por improbidade administrativa, aplicando-se a restrição contida no parágrafo único do artigo 137, da mesma lei.

Analisando os fundamentos da pena:

"Art. 132. A demissão será aplicada nos seguintes casos:

(...)

IV - improbidade administrativa;

(...)

XIII - transgressão dos incisos IX a XVI do art. 117."

 

Do art. 117, extrai-se:

"Art. 117. Ao servidor é proibido:

...

IX - valer-se do cargo para lograr proveito pessoal ou de outrem, em detrimento da dignidade da função pública;..."

 

E quanto ao artigo 137, transcrevo:

"Art. 137. A demissão ou a destituição de cargo em comissão, por infringência do art. 117, incisos IX e XI, incompatibiliza o ex-servidor para nova investidura em cargo público federal, pelo prazo de 5 (cinco) anos.

Parágrafo único. Não poderá retornar ao serviço público federal o servidor que for demitido ou destituído do cargo em comissão por infringência do art. 132, incisos I, IV, VIII, X e XI. "

 

Fixada, assim, a conduta que, em conclusão final, foi imputada ao apelante: "por ter se valido do cargo para lograr proveito a outrem, em detrimento da dignidade da função pública", e "por improbidade administrativa".

O apelante foi processado como incurso em referidos dispositivos legais pelo fato de ter expedido certidões em que estariam inseridas informações diversas das reais bem como sem a cobrança de valores referentes a foro ou laudêmio, favorecendo a terceiros.

Na longa defesa apresentada pelo apelante, tanto no processo administrativo quanto em juízo, em nenhum momento ele contesta que as certidões foram emitidas em disparidade com as informações existentes nos registros do Serviço de Patrimônio da União.

Toda sua argumentação tem por objetivo justificar tal conduta, como bem ressaltado pelo parecer da Consultoria Jurídica do Ministério do Planejamento:

 

"Em sede de sua defesa escrita, o acusado não nega a emissão das certidões com dados inexistentes ou divergentes dos constantes dos registros da SPU, justificando a sua prática como sendo costumeira no âmbito da Delegacia Regional do Patrimônio da União, no Estado de São Paulo" (fls. 1819).

 

A mesma constatação é feita pelo parecer do Ministério da Fazenda:

 

"No mérito, quanto à emissão de certidões, não negou os fatos. Apenas procurou justificar a forma como agiu, com base nos preceitos legais e regulamentares aplicáveis." (fls. 1828).

 

Alega o apelante que apenas seguiu prática reiterada do órgão público, tendo por base eventual "política do órgão central".

Se havia uma política de atuação, algum ato normativo emanado deste órgão central deveria existir para corroborar tal alegação. É princípio básico da Administração Pública, que esta só age se existe lei fundamentando tal atuação. Se ao indivíduo o princípio da legalidade garante-lhe a liberdade de fazer tudo o que a lei não proíbe, para a Administração, referido princípio tem outra interpretação, qual seja, a Administração só pode fazer o que a lei permite.

Se assim o é, cumpria ao apelante trazer aos autos algum texto legal, ato normativo ou mesmo documento oficial do Serviço de Patrimônio da União corroborando sua alegação.

O simples depoimento de seu superior hierárquico sem qualquer outro elemento hábil a afastar a irregularidade na emissão das certidões não é suficiente para comprovar a legitimidade de sua atuação.

Nem se diga, como pretende o apelante, que teria agido amparado pela excludente da obediência hierárquica. Primeiro porque deveria o apelante, como agente público, ter se precavido com uma conduta zelosa e cautelosa, buscando fundamentos normativos para sua prática habitual. Segundo, porque de acordo com o depoimento de seu próprio superior hierárquico, a forma de executar referida "política" deveria ser determinada regionalmente, sendo de responsabilidade do apelante, quem de fato subscrevia as certidões.

Assim esclareceu o superior hierárquico do apelante, Sr. Rubens Yoshieiti Yonamine, Secretário de Patrimônio da União no período de 1991 a 1994:

 

"que não ordenou a emissão de certidões sem o pagamento de quaisquer tributos pendentes; que o depoente não ordenou a abertura de novos RIPs, sendo isto incumbência da Delegacia ou Gerência Regional" (fls. 1458/1459).

 

Cumpre ainda ressaltar que a ilicitude da conduta do apelante não está na simples emissão das certidões autorizando a transferência do domínio útil dos imóveis, mas sim sua emissão com a inclusão de informações que não se encontravam nos cadastros.

Como constatado pela Comissão de Sindicância bem como pela Comissão do Processo Administrativo, das ditas certidões constava como foreiros pessoas que não tinham tal qualidade nos registros do Serviço de Patrimônio da União, ou seja, o foreiro regularmente inscrito era distinto daquele que constava da certidão.

Ao contrário do alegado pelo apelante, tal conduta não foi autorizada pelo art. 33 da Lei n. 9.636/98, diploma legal que sequer vigia à data dos fatos. E ainda que fosse aplicável tal disposição legal, esta não dá qualquer respaldo para a atitude do apelante em emitir certidões com conteúdo diverso daquilo que constava nos registros do órgão público.

A legislação em vigor à época dos fatos, qual seja, o Decreto nº 95.760/88, determina expressamente, em seu art. 2º, que "o alienante, foreiro ou ocupante, regularmente inscrito, efetuará a transferência sem prévia autorização do Serviço de Patrimônio da União - SPU" (grifo não original). Ou seja, a transferência só poderia ser efetivada por quem estivesse regularmente inscrito no Serviço de Patrimônio da União.

Assim, todas as certidões das quais constavam como titulares do domínio útil pessoas distintas das que estavam registradas no SPU foram minuciosamente identificadas nos autos da sindicância, confirmando, portanto, a conduta irregular do apelante.

 

O fato de ter ocorrido o arquivamento de inquérito policial fundado em uma das certidões emitidas e assinadas pelo apelante também não induz à genérica afirmação de que todas as demais certidões, objeto da sindicância e do processo administrativo, são verdadeiras e autênticas.

Importa ressaltar que referido inquérito policial n. 97.0106561-1 foi instaurado contra um particular e não contra o apelante, enquanto agente público. Ademais, o representante do Ministério Público entendeu pela veracidade da certidão levando em consideração tão-somente o fato de ter sido emitida por quem de direito, não havendo qualquer ponderação com relação ao fato de a certidão apresentar ou não dados ideologicamente falsos (fls. 341).

Elucidativa a conclusão do relatório da Comissão sobre esse aspecto:

 

"Deste modo, o arquivamento do inquérito policial instaurado para investigar o uso de documento falso por determinada pessoa não alcança o responsável pela emissão de documento ideologicamente falso, além do que a certidão objeto do inquérito policial não é a única abarcada pelo presente procedimento administrativo disciplinar" (fls. 1779).

 

A inexistência de crime praticado pelo particular (tipos penais dos arts. 297 e 304, do CP) não conduz inexoravelmente à conclusão de que o apelante, agente público, não cometeu o crime de falsidade ideológica. Ainda que assim o fosse, não se pode olvidar a independência das esferas penal, civil e administrativa.

Assim já se decidiu:

 

MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSO DISCIPLINAR. DISCRICIONARIEDADE. INOCORRÊNCIA. PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA AUSENTE. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. ORDEM DENEGADA. I - (...). II - (...). III - (...). IV - (...). V - A decisão que determinou o trancamento de ação penal, pendente o trânsito em julgado, não vincula, necessariamente, a decisão administrativa disciplinar. Seja como for, a revisão administrativa poderá ser provocada desde que preenchidos os requisitos para tanto. Ordem denegada, sem prejuízo das vias ordinárias. (STJ, 3ª Seção, MS 200701488568, Rel. Min. FELIX FISCHER, DJ DATA:12/02/2008 PG:00001)

 

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. CUNHO POLÍTICO-PARTIDÁRIO. AUSÊNCIA DE PROVA PRÉ CONSTITUÍDA. IMPOSSIBILIDADE DE AFERIÇÃO DO ALEGADO DIREITO LÍQUIDO E CERTO. IMPOSSIBILIDADE DE ANÁLISE PELO PODER JUDICIÁRIO DO MÉRITO ADMINISTRATIVO. INDEPENDÊNCIA DAS ESFERAS ADMINISTRATIVA E PENAL. ART. 147 DA LEI 8.112/90. AFASTAMENTO DO SERVIDOR. MOTIVAÇÃO DO ATO. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA ADMINISTRATIVA. INOCORRÊNCIA. ART. 142 DA LEI 8.112/90. PRECEDENTES. ORDEM DENEGADA. I- (...). II- (...). III - A sanção administrativa é aplicada para salvaguardar os interesses exclusivamente funcionais da Administração Pública, enquanto a sanção criminal destina-se à proteção da coletividade. Consoante entendimento desta Corte, a independência entre as instâncias penal, civil e administrativa, consagrada na doutrina e na jurisprudência, permite à Administração impor punição disciplinar ao servidor faltoso à revelia de anterior julgamento no âmbito criminal, ou em sede de ação civil, mesmo que a conduta imputada configure crime em tese. IV - (...). V- (...). IV - Ordem denegada. (STJ, 3ª Seção, MS 200300512818, Rel. Min. GILSON DIPP, j. DJ DATA:09/12/2003 PG:00207)

 

Registro ainda que o inquérito policial n. 2007.61.81.004152-9 instaurado para apurar eventual prática dos delitos tipificados nos artigos 299 e 317 do Código Penal (falsidade ideológica e corrupção passiva) pelo apelante, apuradas no processo administrativo disciplinar, foi arquivado em 15/06/2011 após o juízo acolher a promoção de arquivamento do MPF, à vista da prescrição da pretensão punitiva pela pena em abstrato em relação aos delitos (fls. 3558/3562).

Dessa forma, não há que se falar em negativa de autoria ou em ausência dos crimes de falsidade ideológica e de corrupção, que sequer foram investigado à vista do reconhecimento da prescrição.

Registre-se ainda que, no tocante ao crime de corrupção, permaneceu a incerteza quanto à real data da aquisição do imóvel, que não pôde ser investigada na esfera criminal por conta da prescrição acima mencionada.

Destarte, a comissão de inquérito ponderou que a cópia, sem autenticação, de instrumento particular não registrado e sem o reconhecimento de firma, não é capaz de desconstituir a certidão de registro de imóveis, dotada de fé pública (fl. 1876):

 

XI.h

Naquilo que se refere às circunstancias pelas quais se deu a aquisição do imóvel constante da matricula n. 89.126 do cartório de Registro de Imóveis de Barueri-SP pelo indiciado, através do que se imputou as condutas de corrupção, conforme previsão no art. 317, §1º, do Código Penal, e o ato de improbidade administrativa que importa em enriquecimento ilícito, de acordo com o art. 9º, I, da Lei n. 8.426/92, a defesa limita-se a sustentar a aquisição pretérita à época em que ocupou o cargo de Delegado de Patrimônio da União, juntando, para tanto, cópia, sem autenticação, de instrumento particular não registrado e sem o reconhecimento de qualquer forma.

A prova coligida é insuficiente para desconstituir aquela que decorre da certidão do próprio Cartório de Registro de Imóveis, revestida de fé pública, e da qual se extrai quase que a totalidade dos elementos de convicção que conduzem à conclusão demonstrada na indicação, que deve, portanto, prevalecer.

 

Já o parecer da consultoria jurídica do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão ponderou que no processo administrativo não restou comprovado se houve fraude na aposição de data retroativa no documento que demonstraria a anterioridade da aquisição do imóvel, devendo os fatos serem investigados na esfera criminal (fl. 1822):

 

30. Analise-se que, embora seja possível que os documentos acostados pela defesa, que comprovam a anterioridade da aquisição do imóvel em relação à época em que o indicado esteve à frente do órgão patrimonial, tenham sido produzidos com fraude, mediante a aposição de data retroativa, esta circunstância não esta provada, e, sequer, foi apreciada pela Comissão, razão pela qual não há como não afastar a acusação de corrupção passiva, pelo menos neste momento processual, o que não impede que os autos sejam encaminhados ao Ministério Público Federal, para que o parquet possa inicial a persecução criminal se for o caso.

 

Registro ainda que a aquisição do referido imóvel não foi sopesada na fundamentação da pena de demissão do apelante, conforme se observa dos pareceres do Ministério do Planejamento (fl. 1822) e do Ministério da fazenda (fl. 1829/1830).

 

Quanto à alegação de que o autor não deixou de observar as normas legais, pois não havia disciplina da conduta a ser adotada quando da inexistência de Contrato de Aforamento, e que o cadastramento administrativo foi feito de acordo com a realidade cadastral da Delegacia do Patrimônio da União, registro que a comissão de inquérito concluiu pela prática das infrações disciplinares pelo servidor, apontando as formalidades legais e regulamentares que foram violados pelo servidor (fls. 1758/1788):

 

XI

Adentrando-se ao mérito propriamente dito da defesa, impõe-se, na esteira do indiciamento, o confronto com os argumentos da oposição lançada pelo indiciado, razão pela qual, para melhor fixação, serão adiante examinandos um a um.

Xl.a

A imputação de descumprimento do artigo 116, inciso I, e 117, inciso XV, ambos da Lei n° 8.112/90, concomitantemente com o delito de falsidade ideológica, previsto no artigo 299, parágrafo único, do Código Penal, decorre de dois prismas distintos da mesma conduta, em que pese a boa argumentação em torno da pretensa contradição dos comportamentos descritos, ou seja, na emissão das certidões acostadas nos anexos do processo de sindicância n° 10880.027796/96-59 em apenso com dados ausentes no sistema cadastral informatizado (SIAPA) quanto aos Registros Imobiliários Patrimoniais (RIP'S) listados e referenciados em quadro específico no indiciamento e no preâmbulo deste relatório.

O primeiro aspecto a ser observado restringe-se à certidão em si, que, por omitir declaração que dela devia constar, ou nela inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, caracteriza o tipo penal apontado na medida em que sua utilização acabou prejudicando direito, criou obrigação e alterou a verdade sobre fato juridicamente relevante. Tem-se aí o comportamento doloso do indiciado que está sobejamente provado com a precisa indicação das certidões e do constante nos assentos da repartição.

Tal conduta, por sua vez, também produziu reflexos na repartição, na medida em que implicou na total desorganização dos serviços futuramente prestados pela Regional da Secretaria do Patrimônio da União, eis que foreiros que não estavam regularmente inscrito passaram a ser tidos como se estivessem, o que caracteriza descumprimento do artigo 116, inciso I, e 117, inciso XV, ambos da Lei n° 8.112/90.

Como se vê, a mesma conduta intencional de emitir certidões divorciadas dos registros da repartição acarreta a desorganização dos serviços do órgão, que não era um objetivo do indiciado, mas que se consumou como conseqüência de suas atitudes.

É inútil neste aspecto invocar a rotina dos procedimentos legais e infralegais para transferência da enfiteuse, os quais, já anteriormente analisados nesta peça, não possuem o condão de justificar a emissão das certidões sem qualquer lastro em relação aos registros do órgão.

E muito menos o grande número de certidões emitidas de forma correta e a implementação da arrecadação tida como produto da atuação do indiciado se prestam a justificar a emissão de certidões irregulares que prejudicaram direitos e alteraram a verdade de fatos juridicamente relevantes.

Assim sendo, não logrou o indiciado desincumbir-se do ônus probatório que lhe competia para afastar a imputação que, deste modo, persiste incólume.

Xl.b

A emissão de certidões que permitiram aos foreiros alienantes que não estavam regularmente inscritos no Serviço de Patrimônio da União a transferência onerosa do domínio útil de terrenos da União foram claramente demarcadas, não só com a indicação precisa das mesmas, como também pela própria admissão do indiciado quando de seu interrogatório.

Que esta conduta caracteriza o tipo previsto no artigo 299 do Código Penal, além do comportamento inscrito no artigo 11, inciso I, da Lei n° 8.429/92, não restam dúvidas.

O mesmo se pode dizer em relação ao artigo 117, inciso IX, da Lei n° 8.112/90, que traz a proibição do servidor em: "valer-se do cargo para lograr proveito pessoal ou de outrem, em detrimento da dignidade da função pública." A emissão das certidões foi promovida a partir da condição de Delegado do indiciado, e o proveito, pelo menos de outrem, ou seja, dos foreiros que não estavam regularmente inscrito no órgão, é inequívoco. A ofensa à dignidade da função pública, por s inerente a tal comportamento.

A inobservância das normas legais e regulamentares, esculpida entre os deveres do servidor elencados no artigo 116 da Lei n° 8.112/90, mais precisamente em seu inciso III, mostra-se inconteste quando perfilada a conduta e o que dispõe o artigo 2° do Decreto n° 95.760/88.

Impossível tentar sustentar na espécie a legitimidade da conduta do indiciado afirmando que seus atos se deram com amparo da lei, pois se assim foi, deveria ele demonstrar qual o ordenamento que os respaldava.

A Comissão, ao contrário, dignou-se a apontar aqueles dispositivos transgredidos.

Neste sentido, pelo próprio argumento da defesa verifica-se que sem a certidão o interessado não estava apto a obter a escritura. Logo, se a certidão emitida não condizia coma realidade, ou seja, o foreiro regularmente inscrito no SPU era distinto do que constava na certidão. Este documento ideologicamente falso permitiu a efetivação da transação levando o tabelião a erro.

Apenas insistir que não foi demonstrada a transgressão da lei é insuficiente para abalar a formação da culpa resultante da instrução e consubstanciada no indiciamento de forma clara e precisa, circunstância que, por isso, dispensa maiores comentários.

Xl.c

A emissão de certidão contrariando o disposto no artigo 6° do Decreto n° 95.760/88 se dá justamente porque a certidão ali citada se presta só a ocupação.

Inexiste em nosso ordenamento jurídico previsão para substituição do contrato de aforamento por certidão.

As certidões emitidas pelo indiciado apenas atestavam que alguém era foreiro, quando, na verdade, não estava cadastrado a repartição como tal.

Portanto, como já exaustivamente demonstrado, as certidões expedidas pelo acusado são ideologicamente falsas, como resulta demonstrado à saciedade na peça de indiciamento e, também, pelas mesmas razões acima expostas.

XI.d

Ao abordar a imputação constante da alínea "d" da indiciação na qual a emissão de certidões que possibilitaram as transferências parciais de propriedade, confunde-se a defesa no que diz respeito à transferência de propriedade que se dá no âmbito do cartório de Registro de Imóveis com a transferência das obrigações enfitêuticas.

Como já foi exaustivamente demonstrado no bojo do processo, inclusive na peça de indiciação, com as respectivas remessas para as folhas que continham provas contundentes, verifica-se que a multiplicação citada na realidade trouxe enorme prejuízo para o erário, já que, ao certificar pessoas que não se encontravam regularmente inscrita, abria mão do recebimento de foros atrasados, diferenças de laudêmios e multas de transferência e perdia a oportunidade de estabelecer o novo foro para as partes desmembradas prevista no artigo 8° do Decreto 95.760/88.

Xl.e

Quanto a emissão de certidão sem a prévia cobrança dos tributos devidos prevista no item "e" do termo de indiciamento, tal conduta está devidamente pormenorizada, com todas as provas precisamente indicadas.

A defesa, por sua vez, não abala a imputação efetuada neste sentido, limitando-se a repetir as evasivas utilizadas em outros pontos.

Neste caso específico, tratam-se de débitos consolidados, cuja é obrigação de cobrança é do administrador e, caso qualquer certidão viesse a ser emitida, deveria mencionar os débitos existentes, já que sua omissão poderia trazer prejuízo a terceiros de boa fé, o que não se coaduna com a previsão contida no Decreto-lei n° 2.398/87.

Desta maneira, não assiste razão ao acusado quando tenta enveredar-se pelo campo do cerceamento de defesa .

Xl.f

No que diz respeito às certidões, o indiciado não possuía competência e/ou poderes para certificar o constante dos assentos do Cartório de Registro de Imóveis, competência esta exclusiva do Oficial do próprio Registro, conforme previsto na legislação própria, ou seja, a Lei n° 6.015/73, também denominada de Lei de Registros Públicos.

Deste modo, não há que se subverter a questão falando das normas previstas no Decreto-lei n° 2.398/87, posto que totalmente divorciadas da questão em particular.

XI.g

O que a defesa traz para resistir ao enquadramento do indiciado na previsão no artigo 117, inciso VI, da Lei n° 8.112/90, ou seja, de cometer a pessoa estranha à repartição, fora dos casos previstos e lei, o desempenho de atribuição que seja de sua responsabilidade ou de seu subordinado, não sobrevive à cabal demonstração, a partir de informação do Serviço Federal de Processamento de Dados - SERPRO no sentido de que a repartição onde atuava o servidor não dispunha de equipamentos, ou seja, impressoras, que possibilitassem a confecção destes documentos por meio de jato de tinta ou laser.

A tentativa de desviar o cerne deste tópico da acusação é inútil. Não se trata de distinguir o ato de elaborar a certidão daquilo que ela contém. Seu conteúdo é alvo das imputações anteriores. Aqui a questão refere-se não só ao ato de confeccionar o documento, como também a condição daquele que a elaborou e o local onde isto se deu que, com certeza, não foi no âmbito do próprio órgão.

A situação reclama explicações que a defesa não trouxe, resultando na manutenção deste item do indiciamento.

 

Quanto à alegação de prescrição das infrações disciplinares passíveis de penalidades diversas de demissão, consoante parecer n. 3088/2002 da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, estariam absorvidas pelo delito de "valer-se do cargo" e de "improbidade".

Consta ainda do parecer que restou comprovado que o servidor se valeu de seu cargo para lograr proveito pessoal ou de outrem, em detrimento da dignidade da função pública, agindo com improbidade administrativa, conduta essa que se enquadra nos artigos 117, IX (valer-se do cargo), e 132, IV (improbidade administrativa), e XIII, da Lei n° 8.112/90: (fls. 1830/1831):

 

24. Persistiu, assim, a capitulação proposta pela Comissão para demissão do indiciado, por inobservância de dever funcional, violação de proibições e pela prática de ato de improbidade, "... consistente na emissão de certidões com dados alterados ou inexistentes nos cadastros patrimoniais da União, com elisão de receita fiscal e sem o cumprimento das formalidades legais e regulamentares, o que causou elevados prejuízos ao Erário".

(...)

26. Diante desse percuciente exame do processo, cumpre-nos manifestar nossa concordância com o entendimento firmado, acrescentando mais o seguinte.

27. Em suma, resultou sobejamente comprovado que o servidor se valeu de seu cargo para lograr proveito pessoal ou de outrem, em detrimento da dignidade da função pública, agindo com improbidade administrativa, como assinala a Comissão no Relatório, às fls. 1.170:

"O mesmo se pode dizer em relação ao artigo 117, inciso IX, da Lei n° 8.112/90, que traz a proibição do servidor em: "valer-se do cargo para lograr proveito pessoal ou de outrem, em detrimento da dignidade da função pública." A emissão das certidões foi promovida a partir da condição de Delegado do indiciado, e o proveito, pelo menos de outrem, ou seja, dos foreiros que não estavam regulamente inscritos no órgão, é inequívoco. A ofensa à dignidade da função pública, por sua vez é inerente a tal comportamento."

28. Por isso que nos parece dispensável aqui o uso das disposições da Lei nº 8.429/92, pois a conduta do servidor, por si só, caracteriza ato de desonestidade, sendo bastante o conceito genérico de improbidade administrativa constante do art. 132, IV, da Lei nº 8.112/90.

29. De igual modo, dispensável a tipificação em dispositivos da Lei n° 8.112/90, como o artigo 116, incisos I (exercer com zelo as atribuições do cargo), IH (observar normas legais e regulamentares), IX (manter conduta compatível com a moralidade administrativa), que infligem penalidades diversas da demissão, e que, não obstante terem de fato sido descumpridos pelo acusado, encontram-se absorvidos no delito de "valer-se do cargo" e de "improbidade".

30. Dessa forma, o enquadramento da conduta do servidor, resumidamente identificada no Relatório da Comissão tipificada nos arts. 116, I, III e IX, 117, VI, IX, XII e XV da Lei n° 8.112/90, deve cingir-se aos artigos 117, IX (valer-se do cargo), e 132, IV (improbidade administrativa), e XIII, da Lei n° 8.112/90.

 

Como se observa, a decisão administrativa atacada está devidamente lastreada, impedindo a pretensão colocada pelo servidor.

 

Da ausência de proveito ou vantagem econômica

 

Alega o apelante que para a configuração da infração disciplinada no inciso IX do artigo 117 da Lei nº 8.112/90, é necessário que se demonstre o proveito ou a vantagem adquirida.

Aduz que a acusação de que obteve proveito próprio foi retirada por ter sido concluído que não praticou corrupção (parecer conjur 1012-33/2002, f. 1815/1823), sequer tendo sido processado criminalmente por crime de corrupção.

Não procedem as alegações.

O artigo 117, IX, da Lei nº 8.112/90 não restringe a conduta infracional à utilização do cargo para obtenção de proveito do próprio servidor, mas também quando há obtenção de proveito de outrem ("IX -valer-se do cargo para lograr proveito pessoal ou de outrem, em detrimento da dignidade da função pública").

No caso em tela, restou demonstrado no procedimento administrativo que terceiros se beneficiaram com a conduta do servidor, ainda que não tenha sido demonstrado o recebimento de vantagem ilícita, conforme mencionado no parecer n. 3088/2002 da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (fls. 1830):

27. Em suma, resultou sobejamente comprovado que o servidor se valeu de seu cargo para lograr proveito pessoal ou de outrem, em detrimento da dignidade da função pública, agindo com improbidade administrativa, como assinala a comissão no relatório às fls. 1170:

"O mesmo se pode dizer em relação ao artigo 117, inciso IX, da Lei nº 8.112/90, que traz a proibição do servidor em: 'valer-se do cargo para lograr proveito pessoal ou de outrem, em detrimento da dignidade da função pública'. A emissão das certidões foi promovida a partir da condição de Delegado do indiciado, e o proveito, pelo menos de outrem, ou seja, dos foreiros que não estavam regularmente inscritos no órgão, é inequívoco. A ofensa à dignidade da função pública, por sua vez é inerente a tal comportamento."

28. Por isso que nos parece dispensável aqui o uso das disposições da Lei n. 8.426/92, opis a conduta do servidor, por si só, caracteriza ato de desonestidade, sendo bastante o conceito genérico de improbidade administrativa, constante do art. 132, IV, da Lei 8.112/90.

 

Da ausência de prejuízo à União

 

Não prospera também a alegação do apelante no sentido de que a emissão das certidões não acarretou qualquer prejuízo à União, ao argumento que as certidões não eram de quitação de dívidas e que foram emitidas com a ressalva do direito da Fazenda Nacional cobrar eventuais créditos, e de que as certidões apenas permitiam ao cidadão regularizar sua situação perante o Registro de Imóveis, tendo incrementado a arrecadação em sua gestão.

O aumento de arrecadação em sua gestão em favor da União não é suficiente para amparar a adoção de conduta não fundamentada em determinação legal.

O Decreto nº n. 95.760/88 determina expressamente que a transferência só pode ocorrer desde que cumpridas algumas formalidades, entre elas o "recolhimento do laudêmio ao Tesouro Nacional" (art. 2º, I). Ou seja, a certidão para a transferência do domínio útil só poderia ser emitida se comprovado o pagamento do laudêmio.

Ademais, a partir do momento em que a Administração Pública emitia uma certidão afirmando ser foreiro pessoa que não estava regularmente inscrita como tal, abria mão de cobrar novo foro para as partes desmembradas, como prevê o art. 8º do Decreto nº 95.760/88.

As certidões deveriam ao menos mencionar de forma minuciosa os débitos relativos ao terreno e não apenas inserir expressão genérica "fica ressalvado o direito da fazenda nacional de inscrever e cobrar as dívidas que venham a ser apuradas". Isto porque não se tratavam de débitos a serem apurados, mas sim de dívidas já existentes que, por isso mesmo, deveriam ser cobradas no momento oportuno.

Patente, portanto, o prejuízo aos cofres da União em decorrência da emissão de certidões pelo ora apelante.

 

Registre-se ainda que o apelante cita diversos julgados pretendendo demonstrar a regularidade das certidões por ele emitidas entre 1992 e 1995.

No entanto, considerar a validade da certidão para que a Administração possa proceder a regularização dos foros e a revisão dos laudêmios não elide a conduta infracional praticada, consistente na emissão de certidões autorizando a transferência do domínio útil dos imóveis, com a inclusão de informações diversas das reais, bem como sem a cobrança de valores referentes a foro ou laudêmio, conforme exaustivamente demonstrado no processo administrativo disciplinar.

 

Como consabido, é possível o reexame do ato administrativo à luz da razoabilidade, mas não cabe ao Poder Judiciário, como pretende a parte autora, imiscuir-se no juízo e discricionariedade administrativos, reapreciando provas administrativamente apresentadas e devidamente rebatidas, uma vez que não se trata de ato ilegal ou de abuso de poder, em respeito ao princípio da separação de poderes.

De fato, ao Judiciário não cabe apreciar o mérito administrativo discricionário, mas tão somente a legalidade dos atos e eventuais excessos nas escolhas, sob pena de invasão de competência. Pelo relatado nos autos, não há manifesta, inequívoca ou objetiva violação de direitos e de garantias fundamentais de servidores, inviabilizando o controle do mérito da decisão administrativa atacada. Logo, pelos argumentos trazidos pelo apelante, não vislumbro motivos para infirmar a r. sentença, razão pela qual impõe-se a sua manutenção.

 

Da ausência de usurpação da função jurisdicional

 

A Lei de Improbidade Administrativa dispõe expressamente que:

 

"Art. 12. Independentemente das sanções penais, civis e administrativas, previstas na legislação específica , está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações: [...]"

 

No mesmo sentido, a Lei 8.112/90, que prevê in verbis:

 

"Art. 125. As sanções civis, penais e administrativas poderão cumular-se, sendo independentes entre si."

 

Embora possam se originar do mesmo fato, a apuração de falta disciplinar realizada pela Administração Pública através de processo administrativo disciplinar (PAD) não se confunde com a ação de improbidade administrativa, esta processada perante o Poder Judiciário, a quem cabe a imposição das sanções previstas nos incisos do art. 12 da Lei n.º 8.429/92.

A legislação aplicável, no caso, foi a Lei n.º 8.112/90, que dispõe:

 

"Art. 132. A demissão será aplicada nos seguintes casos:

(...)

IV - improbidade administrativa;"

 

Por isso, a interpretação sistemática do arcabouço jurídico aplicável ao tema não induz à conclusão apresentada pelo apelante no sentido de que a pena de demissão só poderia ser aplicada pelo Poder Judiciário. Pelo contrário, constitui dever indeclinável da Administração apurar e, eventualmente, punir os servidores que vierem a cometer ilícitos de natureza disciplinar, a teor da Lei n.º 8.112/90:

 

"Art. 143. A autoridade que tiver ciência de irregularidade no serviço público é obrigada a promover a sua instauração imediata, mediante sindicância ou processo administrativo disciplinar, assegurada ao acusado a ampla defesa."

 

É este o entendimento que vem predominando no E. STJ:

 

AGRAVO REGIMENTAL. MANDADO DE SEGURANÇA. LIMINAR INDEFERIDA. ANALISTA DE PLANEJAMENTO E ORÇAMENTO. PROCESSO ADMINISTRATIVO. DEMISSÃO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. NÃO INCLUSÃO DO IMPETRANTE NO PÓLO PASSIVO DA AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA E AÇÃO PENAL AJUIZADAS PELO MPF. AGRAVO REGIMENTAL PROVIDO. LIMINAR DEFERIDA SEM QUALQUER ANTECIPAÇÃO DO MÉRITO, APENAS PARA SUSPENDER O PAD INSTAURADO PELA PORTARIA 214/CGU/PR/2008 EM RELAÇÃO AO IMPETRANTE, ATÉ O JULGAMENTO FINAL DO PRESENTE WRIT. 1. ... 2. ... 3. Não obstante a conhecida independência das esferas administrativa e penal, bem como o atual entendimento da jurisprudência pátria de que a aplicação da pena de demissão em casos de improbidade administrativa não é exclusividade do Judiciário, a falta de elementos mínimos a autorizar a persecução civil e penal contra o impetrante demonstra o fumus boni iuris da pretensão aqui requerida, máxime a não inclusão do impetrante nas ações judiciais em curso. 4. ... (STJ, 3ª Seção, AgRg no MS 15054/DF, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, j. 28.04.10, DJe 18/05/2010)

 

ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO. ATO DE DEMISSÃO. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. PROPORCIONALIDADE DA SANÇÃO. OBSERVÂNCIA. 1... 2... 3... 4... 5. O processo administrativo disciplinar e a ação de improbidade, embora possam acarretar a perda do cargo público, possuem âmbitos de aplicação distintos, mormente a independência das esferas civil, administrativa e penal. Logo, não há óbice para que a autoridade administrativa apure a falta disciplinar do servidor público independentemente da apuração do fato no bojo da ação por improbidade administrativa. Precedentes. 6. Não há desproporcionalidade na sanção demissão, uma vez que a conduta apurada administrativamente é de natureza gravíssima, podendo caracterizar, inclusive, ilícito de natureza penal. 7. Ordem denegada. (STJ, 1ª Seção, MS 15951/DF, Rel. Min. CASTRO MEIRA, j. 14.09.11, DJe 27/09/2011)

 

Da proporcionalidade da penalidade aplicada

 

Não há que se falar em ofensa ao princípio da proporcionalidade, razoabilidade ou da motivação na aplicação da pena de demissão. Demonstrada a prática das condutas tipificadas no atrigo 132, incisos IV e XIII, c.c. o artigo 117, inciso IX, da Lei nº 8.112/90, a única reprimenda cabível para a hipótese é a demissão, não havendo para o administrador discricionariedade na aplicação de pena diversa. Nesse sentido:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS INFRINGENTES. POSICIONAMENTO MAJORITÁRIO DO TRIBUNAL DE ORIGEM. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AUDITOR FISCAL DA RECEITA FEDERAL. COMPORTAMENTO INCOMPATÍVEL COM O CARGO. ACÓRDÃO QUE CONCLUIU PELA EXISTÊNCIA DE PROVAS SUFICIENTES PARA A DEMISSÃO. ARTS. 117, IX E X, 128 E 132, IV, DA LEI 8.112/90. CONTROVÉRSIA RESOLVIDA, PELO TRIBUNAL E ORIGEM, À LUZ DAS PROVAS DOS AUTOS. IMPOSSIBILIDADE DE REVISÃO, NA VIA ESPECIAL. SÚMULA 7/STJ. PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE NA APLICAÇÃO DA PENA DE DEMISSÃO. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO. (...)

V. Segundo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, "assentado o cometimento de infração punível exclusivamente com a demissão, não cabe ao órgão censor aplicar sanção diversa ao servidor, dado que o comando do art. 132 da Lei n. 8.112/1990 se apresenta como norma vinculante para a autoridade administrativa julgadora. Como já decidido em hipótese análoga, 'Acerca da proporcionalidade e razoabilidade na aplicação da pena de demissão, é firme o entendimento desta Corte Superior de Justiça de que, caracterizada conduta para a qual a lei estabelece, peremptoriamente, a aplicação de determinada penalidade, não há para o administrador discricionariedade a autorizar a aplicação de pena diversa' (MS 14.667/DF, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, TERCEIRA SEÇÃO, DJe 17/12/2014); ainda no STJ e no mesmo sentido, MS 16.105/DF, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, Primeira Seção, Dje 02/02/2017; já no STF, RMS 33.911/DF, Rel.ª Ministra CÁRMEN LÚCIA, Segunda Turma, Dje 20/06/2016" (STJ, MS 17.868/DF, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA SEÇÃO, Dje de 23/03/2017). (....)

(STJ, AgInt no Resp 1533097/PR, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, julgado em 01/03/2018, Dje 08/03/2018)

 

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. OFENSA AO ART. 535 DO CPC/1973 NÃO CONFIGURADA. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. PENA DE DEMISSÃO. PROPORCIONALIDADE. AUDITOR FISCAL DO TESOURO NACIONAL.

FACILITAÇÃO NO DESPACHO DE BAGAGENS. ALEGAÇÃO DE NULIDADE DE PROVA.

AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ.

OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. INOVAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ. 1. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC/1973.

2. Trata-se, na origem, de Ação Ordinária com o objetivo de obter a reintegração de servidor público demitido pela prática de facilitação no despacho de bagagens ilegais, contribuindo para a prática de descaminho.

3. A constatação de conduta enquadrável nas previsões legais de demissão (art. 132 da Lei 8.112/1990) é ato vinculado, já que inarredável impor a citada sanção se verificada uma das respectivas hipóteses. Nesse sentido: MS 18.122/DF, Rel. Ministro Humberto Martins, Primeira Seção, Dje 20.2.2013; MS 15.437/DF, Rel. Ministro Castro Meira, Primeira Seção, Dje 26.11.2010).

4. Não se está negando vigência ao art. 128 da Lei 8.112/1990 ("Na aplicação das penalidades serão consideradas a natureza e a gravidade da infração cometida, os danos que dela provierem para o serviço público, as circunstâncias agravantes ou atenuantes e os antecedentes funcionais"), pois tais critérios de dosimetria são direcionados para as hipóteses em que a própria lei dá margem discricionária, o que não é o caso das hipóteses de demissão (art.

132 da Lei 8.112/1990).

5. Houve motivação suficiente e adequada para subsumir a conduta constatada ao tipo infracional ensejador da pena de demissão, que no caso foi o art. 132, incisos IV e XIII, da Lei 8.112, de 1990, adotado para aplicar a pena de demissão.

6. É inadmissível Recurso Especial quanto a questão que, a despeito da oposição de Embargos Declaratórios, não foi apreciada pelo Tribunal de origem. Incidência da Súmula 211/STJ.

7. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nessa parte, não provido.

(Resp 1685571/RJ, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/10/2017, Dje 16/10/2017)

 

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. DESTITUIÇÃO DE CARGO EM COMISSÃO. IMPUTAÇÃO DE VALIMENTO DO CARGO EM DETRIMENTO DA DIGNIDADE DA FUNÇÃO PÚBLICA.

(...)

6. Os antecedentes funcionais do impetrante não são suficientes para impedir a aplicação da penalidade porque "A Administração Pública, quando se depara com situações em que a conduta do investigado se amolda nas hipóteses de demissão ou cassação de aposentadoria, não dispõe de discricionariedade para aplicar pena menos gravosa por tratar-se de ato vinculado" (MS 15.517/DF, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, Dje 18.2.2011).

Segurança denegada.

(STJ, MS 17.811/DF, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 26/06/2013, Dje 02/08/2013)

 

Da justiça gratuita

A Carta Magna consagra o amplo acesso à justiça e a inafastabilidade jurisdicional como princípios constitucionais, que se enquadram entre as garantias fundamentais elencadas no rol do art. 5º, especificamente em seu inciso XXXV: "A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito".

O mesmo dispositivo constitucional, em seu inciso LXXIV, dispõe sobre a prestação aos hipossuficientes de assistência judiciária gratuita.

Ademais, é noção cediça que o deferimento do pedido de justiça gratuita dá-se à vista de simples afirmação de que a parte não reúne condições para arcar com as custas processuais e verba honorária (art. 4º, caput, da Lei nº 1.060/50 - então vigente à época da interposição do presente recurso).

Nesse contexto, vem à lembrança o estatuído no §1º do citado artigo 4º, segundo o qual é presumivelmente pobre, até prova em contrário, quem afirmar esta condição, sob pena de pagamento até o décuplo das custas judiciais.

Ou seja, a concessão do benefício não está condicionada à comprovação da miserabilidade do requerente, mas, sim, à impossibilidade de ele arcar com os custos e as despesas do processo (inclusive a verba honorária), sem prejuízo ao atendimento de necessidades básicas próprias ou de sua família.

Entendimento diverso acabaria por mitigar de forma desarrazoada a garantia de acessibilidade, prevista expressamente na CRFB (artigo 5º, XXXV).

A respeito do tema, Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery (Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante. 10. ed. São Paulo: RT, 2007, p. 1.428) assim discorrem:

 

"A CF, 5°, LXXIV, que garante a assistência judiciária integral aos necessitados que comprovarem essa situação, não revogou a LAJ 4º. Basta a simples alegação do interessado para que o juiz possa conceder-lhe o benefício da assistência judiciária. Essa alegação constitui presunção juris tantum de que o interessado é necessitado."

 

Exatamente por isso, descabem critérios outros (como a faixa de isenção do imposto de renda ou o valor da renda mensal líquida percebida pelo pretendente) para infirmar a presunção legal de pobreza.

Como se vê, para o deferimento dos benefícios da assistência judiciária gratuita basta a declaração da parte requerente no sentido de que não possui condições de arcar com os ônus processuais, restando à contraparte a comprovação em sentido contrário.

Não cabe, pois, ao julgador, estabelecer critérios mais restritivos do que a própria previsão contida no mencionado artigo 4º, da Lei n. 1.060/50, que estabelece como requisito para a concessão do benefício tão-somente a declaração firmada pela parte requerente.

Assim, a concessão do benefício da gratuidade da justiça depende tão somente da declaração da parte (dos embargantes, no caso concreto) acerca de sua carência de condições para arcar com as despesas processuais sem prejuízo ao atendimento de suas necessidades básicas, levando em conta não apenas o valor dos rendimentos mensais, mas também seu comprometimento com aquelas despesas essenciais.

Com efeito, não se pode tomar a profissão, a remuneração ou mesmo o patrimônio do indivíduo como fatores que, por si só, excluam a situação de necessitado, devendo ser considerado não apenas o rendimento mensal do requerente, mas também o comprometimento das despesas.

Esse é o entendimento consolidado do STJ, consoante acórdãos assim ementados:

 

ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. INDEFERIMENTO PELO JUÍZO A QUO. INVERSÃO DA PRESUNÇÃO DE POBREZA. OCORRÊNCIA. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. A decisão agravada, ao dar parcial provimento ao recurso especial, não adentrou o exame de matéria fática, limitando-se a concluir que o Juiz a quo, ao indeferir o pedido de justiça gratuita formulado pelos agravados tão somente com base na remuneração auferida por estes últimos, importou em indevida inversão da presunção de pobreza prevista na Lei 1.060/50. Nesse sentido: REsp 1.251.505/RS, Min. HERMAN BENJAMIN, Segunda Turma, DJe 31/8/11. 2. Agravo regimental não provido.

(STJ, AGARESP 201301880352, Relator Min. ARNALDO ESTEVES LIMA, DJE 11/06/2014)

 

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO. MILITAR. DIÁRIA DE ASILADO. CONVERSÃO EM AUXÍLIO-INVALIDEZ. PEDIDO DE GRATUIDADE DE JUSTIÇA. OMISSÃO VERIFICADA. NECESSIDADE DE SANEAMENTO DO VÍCIO. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. 1. A jurisprudência deste Tribunal Superior é no sentido de que a gratuidade de justiça pode ser requerida em qualquer fase do processo, ante a imprevisibilidade de infortúnios financeiros que podem atingir as partes, sendo suficiente para a sua obtenção a simples afirmação do estado de pobreza, a qual goza de presunção juris tantum. Outrossim, os efeitos da concessão do benefício são ex nunc, ou seja, não retroagem. 2. Embargos de declaração acolhidos para deferir o pedido de assistência judiciária gratuita.

(STJ, EAERES 200901275268, Rel. Min. MARCO AURÉLIO BELLIZZE, DJE 13/08/2013)

 

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. SÚMULA 284/STF. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. DECLARAÇÃO DE POBREZA. PRESUNÇÃO RELATIVA. 7/STJ. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO OPOSTOS NA ORIGEM. MULTA DO ART. 538 DO CPC. DESCABIMENTO. SÚMULA 98/STJ. 1. Ao alegar violação ao art. 535 CPC, deve o recorrente indicar com precisão em que consiste a omissão, contradição ou obscuridade do julgado. Aplica-se a Súmula 284/STF quando forem genéricas as alegações. 2. Para a concessão do benefício da justiça gratuita basta a apresentação de declaração de pobreza pela parte requerente, admitindo-se, em razão de sua presunção relativa, prova em contrário. 3. Inviável recurso especial quando necessária análise do contexto fático-probatório (Súmula 7/STJ). 4. Os embargos de declaração opostos com intuito de prequestionamento não podem ser classificados como protelatórios. Afastamento da multa do art. 538 do CPC. 5. Recurso especial conhecido em parte e provido.

(STJ, REsp 1372157/SE, Relatora Ministra ELIANA CALMON, DJE 17/09/2013)

 

Nesse sentido, os precedentes desta Corte Regional:

 

AGRAVO DE INSTRUMENTO - EXECUÇÃO FISCAL - JUSTIÇA GRATUITA - LEI Nº 1.060/50 - DEFERIMENTO - PRESCRIÇÃO - LANÇAMENTO DE OFÍCIO - NOTIFICAÇÃO DO CONTRIBUINTE - CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO - LC 118/2005 - VIGÊNCIA - ART. 174, CTN - DESPACHO CITATÓRIO - RECURSO IMPROVIDO. 1. A assistência judiciária é garantia constitucional, prevista no art. 5.º, LXXIV, da Magna Carta, no qual se confere o dever do Estado de proporcionar a o acesso ao Judiciário todos, até mesmo aos que comprovarem insuficiência de recursos. 2. A Lei n.º 1060/50, recepcionada pela Constituição Federal, regulou a assistência judiciária concedida aos necessitados, entendidos como aqueles cuja situação econômica não lhes permita pagar as custas do processo e os honorários advocatícios, sem prejuízo do sustento próprio ou da família. Uma simples petição do requerente declarando sua situação basta para o reconhecimento do estado precário, vigorando a presunção relativa sobre sua necessidade, podendo ser impugnada pela parte contrária. 3. O Superior Tribunal de Justiça tem entendido que, para a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, basta a declaração, feita pelo interessado, de que sua situação econômica não permite vir a juízo sem prejuízo de seu sustento e de sua família. 4.Essa é uma presunção iuris tantum, remetendo à parte contrária o ônus de provar o contrário do alegado (art. 7º da Lei nº 1.060/50). 5.Cabível a benesse requerida, que resta, portanto, deferida. 6.A lei que dispõe sobre a assistência judiciária gratuita - art. 4.º, § 1.º,da Lei n.º 1060/50 - prevê penalidade para aquele que se diz pobre, desprovido de recursos, quando for provado justamente o oposto. 7. Quanto ao mérito, alega o agravante a prescrição da CDA 80 1 11 000444-16, somente em relação ao débito vencido em 28/4/2006 (fl.9) e eventualmente dos demais. 8. Diversamente do alegado pelo agravante, trata-se de cobrança de crédito decorrente de lançamento de ofício, com a lavratura de auto de infração, cuja notificação do contribuinte se deu em 29/10/2010, conforme o próprio título executivo acostado. 9. A constituição definitiva do crédito tributário, nesta hipótese, ocorreu 30 (trinta) dias após a data da notificação, uma vez que não há notícia de impugnação administrativa. 10. Tendo em vista que a execução foi proposta em 15/9/2011 (fl.7), quando já em vigor a LC n° 118/2005, que alterou o artigo 174, parágrafo único, I, do Código Tributário Nacional, os créditos não estão prescritos, pois o despacho que ordenou a citação se deu em 23/9/2011 (fl. 23). 11. Os créditos em cobro não se encontram prescritos. 12. Benefícios da justiça gratuita deferidos e agravo de instrumento improvido.

(TRF3, AI 00208137220134030000, Rel. Des. Fed. NERY JUNIOR, e-DJF3 Judicial 1 DATA 16/05/2014)

 

AGRAVO DE INSTRUMENTO. GRATUIDADE DA JUSTIÇA. CABIMENTO. A Lei nº 1.060/50 estabelece normas para a concessão de assistência judiciária gratuita, estatuindo as hipóteses para sua concessão. No art. 4º da referida lei encontra-se disciplinada a forma pela qual deve-se pleitear o benefício, vale dizer, "mediante simples afirmação na própria petição inicial, de que não está em condições de pagar as custas do processo e os honorários do advogado, sem prejuízo próprio ou de sua família". Trata-se de presunção "juris tantum", cabendo à parte contrária impugná-la, mediante a apresentação de provas aptas à sua desconstituição. A intenção do legislador foi a de simplificar o requerimento, para possibilitar a gratuidade judiciária àqueles que não têm condições de pagar as custas do processo e os honorários do advogado, independentemente de outras formalidades. É certo que cabe ao magistrado afastar o requerimento de benefício de justiça gratuita, desde que haja elementos suficientes a descaracterizar a alegação de hipossuficiência. O alto custo dos remédios, exames e uso contínuo e diário de oxigênio torna o agravado incapaz de arcar com as custas e honorários advocatícios, em prejuízo de seu sustento e de sua família. Agravo a que se nega provimento.

(TRF3, AI 00253877520124030000, Relatora Desembargadora Federal MARLI FERREIRA, e-DJF3 Judicial 1 DATA 24/05/2013)

 

Assim, cumprido o requisito legal, pois a parte autora afirmou não ter condições de arcar com o custo do processo, e inexistindo prova capaz de infirmar a presunção legal de hipossuficiência, merece ser acolhido o pedido do autor.

Importa anotar, no entanto, que os efeitos da concessão do benefício da justiça gratuita, em sede de apelação, não retroagem, ou seja, só compreendem os atos posteriores ao momento de sua obtenção, aplicando-se somente às despesas processuais supervenientes.

Conforme esclareceu o Min. Luis Felipe Salomão, em voto proferido no julgamento do REsp. 904.289/MS (DJe 10/05/2011):

"(...) os benefícios da assistência judiciária compreendem todos os atos desde o momento de sua obtenção até a decisão final, em todas as instâncias, sendo inadmissível a retroação.

Isso não apenas pelo caráter precário em que se constitui a justiça gratuita (art. 12 da Lei 1.060/50), mas pela situação de insegurança a que estaria sujeita a outra parte, que, repentinamente, ver-se-ia na contingência legal de ter frustrado o seu direito de reembolso de despesas processuais, se vencedora. (ZANON, Artemio. Da Assistência Judiciária Integral e Gratuita: Comentários à Lei da Assistência Judiciária. São Paulo, Saraiva, 1990, p. 149)

Destarte, ao contrário do que pretende o recorrente, a concessão da gratuidade, no caso vertente, não implica suspensão automática da exigibilidade dos ônus sucumbenciais."

 

No mesmo sentido:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 460 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. DECISÃO EXTRA-PETITA. NÃO-OCORRÊNCIA. AGRAVO DESPROVIDO.

1. A decisão ora agravada, encontra-se estritamente dentro dos limites em que a lide lhe fora colocada à apreciação, não ensejando a alegada extrapolação do julgado.

2. Os efeitos do benefício da justiça gratuita devem ser ex nunc, vale dizer, não podem retroagir para alcançar atos processuais anteriormente convalidados, mormente se o pedido da concessão do benefício tiver o propósito de impedir a execução dos honorários advocatícios que foram anteriormente fixados no processo de conhecimento, no qual a parte litigou sem o benefício da Justiça Gratuita.

3. Agravo regimental desprovido.

(STJ, AgRg no REsp 839.168/PA, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 19/09/2006, DJ 30/10/2006, p. 406)

 

De rigor, portanto, o deferimento dos benefícios da justiça gratuita à parte autora, operando-se efeitos ex nunc.

 

Dos honorários recursais

Considerando que o recurso foi interposto sob a égide do CPC/1973, deixo de aplicar o artigo 85 do Novo Código de Processo Civil, porquanto a parte não pode ser surpreendida com a imposição de condenação não prevista no momento em que recorreu, sob pena de afronta ao princípio da segurança jurídica.

Ressalte-se, ainda, que, nos termos do Enunciado Administrativo nº 7, elaborado pelo Superior Tribunal de Justiça para orientar a comunidade jurídica acerca da questão do direito intertemporal, tratando-se de recurso interposto contra decisão publicada anteriormente a 18/03/2016, não é possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do artigo 85, § 11, do CPC/2015:

Enunciado administrativo número 7

Somente nos recursos interpostos contra decisão publicada a partir de 18 de março de 2016, será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do artigo 85, § 11, do novo CPC.

 

Dispositivo

Por estas razões, rejeito a preliminar de nulidade, no mérito, nego provimento à apelação da parte autora, e de ofício, defiro os benefícios da justiça gratuita ao autor, operando-se efeitos ex nunc.

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

VOTO VISTA

 

O DESEMBARGADOR WILSON ZAUHY:

Pedi vista dos autos para melhor compreensão da discussão aqui posta e, feito isto, peço vênia ao E. Relator para divergir parcialmente de seu voto, para o fim de reconhecer a prescrição da pretensão punitiva administrativa, pelas razões que passo a expor:

 
 

Inicialmente, comungo do entendimento do Relator no sentido de que, "caso não instaurado o processo penal para apuração e aplicação de pena quanto à conduta do servidor, que se diz similar ao ilícito penal, remanesce a regra da prescrição da esfera administrativa" (fl. 3670), conforme entendimento firmado na Jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça:

 
 

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. INFRAÇÃO DISCIPLINAR. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. PRETENSÃO DE INCIDÊNCIA DA REGRA DO ART. 142, § 2°, DA LEI 8.112/1990. PRESCRIÇÃO DA LEI PENAL. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE APURAÇÃO DA INFRAÇÃO NA ESFERA CRIMINAL. ACÓRDÃO RECORRIDO EM SINTONIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 83/STJ. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.

 
 

1. É firme o entendimento no âmbito do Superior Tribunal de Justiça no sentido que incide a regra do art. 142, § 2º, da Lei 8.112/90 apenas nas hipóteses em que as infrações administrativas cometidas pelo servidor público for objeto de apuração na esfera criminal, sendo insuficiente a mera presença de indícios de crime, sem a devida apuração na esfera penal.

 
 

2. Precedentes: MS 17.535/DF, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, julgado em 10/09/2014, DJe 15/09/2014; MS 13.926/DF, Rel. Ministro Og Fernandes, Terceira Seção, julgado em 27/02/2013, DJe 24/04/2013; MS 14.159/DF, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Terceira Seção, julgado em 24/08/2011, DJe 10/02/2012; MS 15.437/DF, Rel. Ministro Castro Meira, Primeira Seção, julgado em 27/10/2010, DJe 26/11/2010; MS 14.320/DF, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Terceira Seção, julgado em 28/04/2010, DJe 14/05/2010.

 
 

3. Agravo regimental não provido.

 
 

(STJ, AgRg no AREsp n° 681.345/RJ, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe: 27/05/2015) (destaquei).

 
 

 

 
 

ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. PENA DE DEMISSÃO POR ABANDONO DE CARGO. PRAZO PRESCRICIONAL. LEI ESTADUAL N.º 10.261/68. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA DO ESTADO. OCORRÊNCIA.

 
 

1. A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça se firmou no sentido de que somente se aplica o prazo prescricional previsto na legislação penal quando os fatos também forem apurados na esfera criminal. No presente caso, não houve apuração na esfera criminal, devendo, portanto, ser aplicado o prazo prescricional previsto na legislação administrativa estadual.

 
 

2. Instaurado o processo administrativo disciplinar e aplicada a pena de demissão após o prazo de 05 (cinco) anos, previsto na Lei Estadual nº 10.261/68, contados do conhecimento de existência de falta pela autoridade, deve ser reconhecida a prescrição da pretensão punitiva do Estado.

 
 

3. Recurso ordinário conhecido e provido.

 
 

(STJ, RMS n° 19.087/SP, Rel. Min. Laurita Vaz, Quinta Turma, DJe: 04/08/2008) (destaquei).

 
 

No caso concreto, o inquérito policial instaurado para apuração criminal dos fatos foi arquivado em 15/06/2011, em razão de ter o Ministério Público Federal requerido o seu arquivamento por entender que teria havido a prescrição da pretensão punitiva pela pena em abstrato em relação a dois crimes imputados ao autor (fl. 3670-verso), de sorte que, sendo as infrações disciplinares discutidas nestes autos puníveis com a pena de demissão, certo é que se aplica ao caso o prazo prescricional quinquenal previsto no art. 142, I da Lei n° 8.112/90, que transcrevo:

 
 

Art. 142.  A ação disciplinar prescreverá:

 
 

I - em 5 (cinco) anos, quanto às infrações puníveis com demissão, cassação de aposentadoria ou disponibilidade e destituição de cargo em comissão;

 
 

 

 
 

Do mesmo modo, acompanho o Relator quanto ao entendimento de que apenas a sindicância de caráter punitivo, e não aquela meramente investigativa ou preparatória, tem o condão de interromper o prazo prescricional, consoante se tem pacificamente admitido na Jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça:

 
 

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. APLICAÇÃO AO SERVIDOR DA PENALIDADE DE SUSPENSÃO POR 45 DIAS. PRAZO PRESCRICIONAL INTERROMPIDO PELA INSTAURAÇÃO DE SINDICÂNCIA DE CARÁTER PUNITIVO. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA DISCIPLINAR CONFIGURADA. AGRAVO REGIMENTAL DA UNIÃO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

 
 

1. O termo inicial da prescrição para apuração disciplinar é contado da data do conhecimento do fato pela autoridade administrativa (Art. 142, § 1o. da Lei 8.112/90). A prescrição é interrompida com a instauração do referido procedimento (art. 142, § 3o. da Lei 8.112/90), não sendo definitiva, visto que após o prazo de 140 dias - prazo máximo para conclusão e julgamento (art. 152 c/c art. 167 da Lei 8.112/90) - o prazo prescricional recomeça a correr por inteiro. Precedentes: AgRg no MS 13.977/DF, Rel. Min. NEFI CORDEIRO, DJe 2.10.2015; MS 12.153/DF, Rel. Min. ERICSON MARANHO, DJe 8.9.2015.

 
 

2. O ponto que restou controvertido está relacionado à natureza que teve a Sindicância que precedeu o Processo Administrativo Disciplinar ensejador da penalidade, defendendo o Impetrante que o procedimento foi punitivo e, portando, marco interruptivo para a prescrição. Já a Autoridade Coatora, ora Agravante, afirma ter sido o procedimento meramente investigatório, pelo que a prescrição só teria restado interrompida com a instauração posterior do PAD.

 
 

3. De partida, deve-se destacar que os objetos, para serem apreendidos pelo Direito, devem ser analisados por seus caracteres essenciais e indecomponíveis, e não a partir dos nomes de que se revestem. Em filosofia jurídica, que se estabelece sob o signo de prescrever condutas, o essencialismo, caracterísitca do real, se sobrepõe ao puro nominalismo, porque a simples atribuição de rótulos às coisas não tem o condão de tomar aquilo que é pelo que não é.

 
 

4. Nestes termos, embora a jurisprudência desta Corte afirme que somente a sindicância instaurada com caráter punitivo tem o condão de interromper o prazo prescricional, e não aquelas meramente investigatórias ou preparatórias de um processo disciplinar (precedente: MS 12.153/DF, Rel. Min. ERICSON MARANHO, DJe 8.9.2015), é inadmissível admitir que a nomenclatura conferida à Sindicância tenha o condão de alterar a sua natureza.

 
 

5. Toda sindicância é promovida com objetivo de justificar a abertura do processo disciplinar punitivo, com intenção de investigar possíveis condutas irregulares praticadas por Servidores. De certo, nem sempre o resultado final da Sindicância resultará em abertura de Processo Administrativo, mas seu resultado em nada desnatura a sua finalidade, que é a investigação para possível punição de Servidor infrator.

 
 

6. A mesma conclusão sobre o caráter punitivo do procedimento advém da própria condução da Sindicância com concessão de ampla defesa e contraditório, onde se verifica que não há mera apuração dos fatos, mas, sim, a averiguação de fatos que poderão levar ao indiciamento do Servidor, com abertura de prazo para a apresentação de Defesa, a oferta de Defesa Prévia, a oitiva de testemunhas e a efetivação de diligências requeridas pela Defesa, culminando a instrução com relatório conclusivo da Comissão Sindicante para fins de abertura de Processo Administrativo Disciplinar.

 
 

7. No caso dos autos, a Portaria que efetivamente instaurou a Sindicância se valeu de expressões amplas e genéricas, que não indicaram a natureza do procedimento; contudo a feição punitiva é evidenciada pelas manifestações que subsidiaram a instauração, expressas ao concluir pela instalação de sindicância punitiva, considerando a natureza dos fatos e entendendo não ser necessária a colheita prévia de informações.

 
 

8. Assim, no caso concreto, a prescrição começou a correr com o conhecimento dos fatos pela Administração, dado em 2.8.2007, sendo interrompida pela instauração da Sindicância de caráter punitivo em 25.9.2007. Considerando que o julgamento da Sindicância ocorreu tão só em 22.7.2008, o recomeço da contagem do prazo prescricional interrompido se deu antes, com o escoamento do prazo legal para a conclusão do procedimento - máximo de 140 dias.

 
 

9. Tendo em vista que a penalidade ao final imputada ao Servidor foi a suspensão, cuja aplicação se encontra na legislação - prazo prescricional de 2 anos -, conclui-se, em forma simplificada de cálculo, que a Administração tinha 2 anos e 140 dias a partir de 25.9.2007 para aplicar a penalidade, prazo extrapolado, já que a Portaria punitiva foi exarada somente em 31.3.2010 e publicada em 1º.4.2010, operando-se assim a prescrição.

 
 

10. Agravo Regimental da UNIÃO desprovido.

 
 

(STJ, AgRg no MS n° 15.280/DF, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Seção, DJe: 19/12/2018) (destaquei).

 
 
 
 
 

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO EM MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. AGENTE ADMINISTRATIVO DO QUADRO DE PESSOAL DO EX-TERRITÓRIO DO AMAPÁ. DEMISSÃO. ART. 117, IX, C/C ART. 132, XIII, DA LEI 8.112/90. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. ALEGAÇÕES DA IMPETRANTE DE OCORRÊNCIA DE PRESCRIÇÃO ADMINISTRATIVA, DE INAPLICABILIDADE DO PRAZO DE PRESCRIÇÃO PENAL, NO PRESENTE CASO, E DE NÃO DEFLAGRAÇÃO DE AÇÃO CRIMINAL, EM SEU DESFAVOR. AUSÊNCIA DO INTEIRO TEOR DO PAD E DE DOCUMENTOS QUE COMPROVEM AS ALEGAÇÕES CONSTANTES DA INICIAL. DILAÇÃO PROBATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. ORDEM DENEGADA. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO.

 
 

I. Agravo interno aviado contra decisão que denegou o Mandado de Segurança, por inadequação da via eleita, ante a necessidade de dilação probatória.

 
 

II. In casu, trata-se de Mandado de Segurança, impetrado por Ana Lilia Castro de Aquino, contra suposto ato ilegal do Ministro de Estado do Planejamento, Orçamento e Gestão, consubstanciado na Portaria 73, de 31/03/2017, que lhe aplicou a pena de demissão, à alegação de "nulidade do ato coator vinculado ao Processo Administrativo Disciplinar nº 12100.000050/2014-51", em face da ocorrência de prescrição da ação disciplinar, de inaplicabilidade do prazo de prescrição penal, no presente caso, e de não deflagração de ação criminal em desfavor da impetrante.

 
 

III. É firme o entendimento desta Corte no sentido de que, à luz da Lei 8.112/90, o termo inicial da prescrição é a data do conhecimento do fato pela autoridade competente para instaurar o Processo Administrativo Disciplinar - PAD (art. 142, § 1º). A prescrição é interrompida desde a publicação do primeiro ato instauratório válido, seja a abertura de sindicância acusatória ou a instauração de processo disciplinar, até a decisão final proferida pela autoridade competente (art. 142, § 3º). Por outro lado, caso o ilícito disciplinar praticado seja também capitulado como crime, a prescrição segue o disposto na legislação penal, o que, à primeira vista, parece a hipótese dos autos, haja vista a existência do oferecimento de denúncia (STJ, MS 21.682/DF, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 21/06/2017; MS 17.536/DF, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 20/04/2016).

 
 

IV. Sendo assim, o exame da alegada prescrição da pretensão punitiva disciplinar exige a juntada de documento apto a comprovar a data do conhecimento da irregularidade pela autoridade competente para instauração da persecução disciplinar - no caso o Corregedor-Geral do Ministério da Fazenda, na forma do art. 4º-B do Decreto 7.482/2011 -, a fim de apurar-se se, entre essa data e a instauração do PAD, em 04/07/2014, decorreu lapso temporal superior àquele previsto no art. 142, § 2º, da Lei 8.112/90 c/c art. 109 do Código Penal, haja vista a existência de Ação Penal em curso (Ação Penal 0016236-83.2014.4.01.3400, da 4ª Vara Federal da Seção Judiciaria do Estado do Amapá), com denúncia oferecida em 18/12/2014, sendo irrelevante o fato de a denúncia só ter sido recebida em momento posterior à aplicação da penalidade disciplinar. Destaque-se que o Memo 11/2006, encaminhado à Chefe da Divisão de Pessoal da Gerência Regional de Administração do Ministério da Fazenda no Estado do Amapá, em 28/12/2006, por não ter sido dirigido à autoridade competente para a instauração do PAD, não tem o condão de dar início ao curso do prazo prescricional em questão, como busca fazer crer a parte ora impetrante.

 
 

V. É pacífica a jurisprudência desta Corte no sentido de que "o Mandado de Segurança detém entre seus requisitos a demonstração inequívoca de direito líquido e certo pela parte impetrante, por meio da chamada prova pré-constituída, inexistindo espaço para dilação probatória na célere via do mandamus" (STJ, RMS 45.989/PB, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 06/04/2015).

 
 

VI. O caso dos autos requer, imprescindivelmente, a juntada da íntegra do processo administrativo disciplinar e de documentos que comprovem as alegações da impetrante de ocorrência de prescrição da ação disciplinar, de inaplicabilidade do prazo de prescrição penal, no presente caso, e de não deflagração de ação criminal, em desfavor da impetrante.

 
 

VII. Recente entendimento foi adotado pela Primeira Seção do STJ, acerca da aplicação do art. 142, § 2º, da Lei 8.112/90, no sentido de que "o lapso prescricional não pode variar ao talante da existência ou não de ação penal, justamente pelo fato de a prescrição estar relacionada ao vetor da segurança jurídica" (STJ, EDv nos EREsp 1.656.383/SC, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 05/09/2018).

 
 

VIII. Não obstante a ausência de cópia do PAD 12100.000050/2014-51, pelo que se pode depreender dos autos, os mesmos fatos apurados administrativamente ensejaram o oferecimento de denúncia, que se encontra em andamento nos autos da Ação Penal 00162-36.2014.4.01.3100/AP, deixando evidente que a conduta da impetrante também é capitulada como crime, sendo prescindível, para a Administração, na linha do precedente da Primeira Seção acima invocado, a deflagração da ação penal, para efeito de incidência do prazo prescricional da pretensão punitiva administrativa. De qualquer sorte, quando aplicada a penalidade de demissão à impetrante, em 31/03/2017, estava ela respondendo, pelos mesmos fatos, a processo criminal pelo art. 171, § 3º, do Código Penal, tendo apresentado a defesa prévia, prevista no art. 514 do CPP, em 28/04/2017.

 
 

IX. Agravo interno improvido.

 
 

(STJ, AgInt no MS n° 23.565/DF, Rel. Min. Assusete Magalhães, Primeira Seção, DJe: 30/04/2019).

 
 

Tal entendimento culminou na edição do enunciado da Súmula n° 635 do C. Superior Tribunal de Justiça, que transcrevo:

 
 

Os prazos prescricionais previstos no art. 142 da Lei n. 8.112/1990 iniciam-se na data em que a autoridade competente para a abertura do procedimento administrativo toma conhecimento do fato, interrompem-se com o primeiro ato de instauração válido - sindicância de caráter punitivo ou processo disciplinar - e voltam a fluir por inteiro, após decorridos 140 dias desde a interrupção.

 
 

 

 
 

Pois bem.

 
 

No caso dos autos, vê-se que foi imputada ao autor a conduta de emitir certidões "sem retratar fielmente os registros da Delegacia", "sem cobrar os débitos pendentes/laudêmios devidos (transferências)", bem como constranger "pessoas que seriam necessariamente ouvidas pela Comissão" (fls. 3671/3672).

 
 

Sendo assim, resta evidente que, ao tempo da instauração da sindicância administrativa, a Administração Pública já dispunha de elementos suficientes para aferir a autoria das infrações disciplinares e sua materialidade, de tal sorte que já lhe era possível a instauração de processo administrativo destinado à aplicação das sanções disciplinares cabíveis ao requerente. Se, em vez disso, optou-se pela instauração de sindicância administrativa, certo é que referido procedimento tem natureza nitidamente punitiva, pouco importando, para fins de interrupção do prazo prescricional, que se lhe tenha denominado como meramente investigativo.

 
 

Tanto isto é verdade que a sindicância instaurada por portaria publicada em 02/08/1996 culminou em relatório elaborado no dia 30 daquele mesmo mês. Mesmo o processo administrativo, posteriormente instaurado por portaria publicada em 22/05/2001, teve breve tramitação, vindo a culminar em aplicação da pena de demissão por portaria publicada em 01/10/2002, tudo a demonstrar a simplicidade fática das infrações disciplinares imputadas ao autor.

 
 

Ademais, há, no caso dos autos, um elemento a mais a evidenciar a indisfarçável inércia da Administração Pública, que é o grande lapso entre a determinação da Secretaria do Patrimônio da União - SPU de instauração do processo administrativo, em 16/07/1996, e a efetiva designação da comissão de processo administrativo disciplinar, por portaria de 22/05/2001 (fl. 3672).

 
 

Desta forma, de rigor concluir que, no caso concreto, o termo inicial do prazo prescricional se deu em 11/06/1996, com a ciência dos fatos pela autoridade competente para instauração do processo administrativo, e se interrompeu em 02/08/1996, com a publicação de portaria de instauração de sindicância administrativa de caráter punitivo, como visto até aqui; decorridos 140 dias, o prazo prescricional voltou a correr, por inteiro, a partir de 23/12/1996. Tendo a sanção disciplinar sido aplicada em desfavor do autor tão somente em 01/10/2002, de se ver que a pretensão punitivo-administrativa já havia sido fulminada pela prescrição, eis que decorrio o prazo prescricional quinquenal.

 
 

Por conseguinte, declaro a nulidade do ato administrativo que importou na sua demissão, bem como determinar a reintegração da requerente no cargo antes por ela ocupado, com ressarcimento de todas as vantagens, nos termos do art. 28 da Lei n° 8.112/90:

 
 

Art. 28.  A reintegração é a reinvestidura do servidor estável no cargo anteriormente ocupado, ou no cargo resultante de sua transformação, quando invalidada a sua demissão por decisão administrativa ou judicial, com ressarcimento de todas as vantagens.

 
 

 

 
 

Com o provimento de seu recurso para se reconhecer a ocorrência da prescrição, a parte autora passa a se sagrar integralmente vencedora na demanda, não lhe cabendo arcar com custas processuais nem honorários advocatícios. Sendo assim, condeno a União Federal ao pagamento de honorários advocatícios que ora fixo, por equidade, em R$ 5.000,00, nos termos do art. 20, § 4º do Código de Processo Civil de 1973, vigente ao tempo da publicação da sentença.

 
 

Por fim, acompanho o E. Relator quanto à concessão dos benefícios da gratuidade da justiça ao autor, com efeitos ex nunc, pelas razões bem expostas em seu voto.

 
 

Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação para reconhecer a ocorrência da prescrição da pretensão punitiva disciplinar e, por conseguinte, declaro a nulidade do ato administrativo que importou na sua demissão, bem como determinar a reintegração da requerente no cargo antes por ela ocupado, com ressarcimento de todas as vantagens, nos termos do art. 28 da Lei n° 8.112/90, condenando a União ao pagamento de honorários advocatícios que ora fixo, por equidade, em R$ 5.000,00.

VOTO-VISTA

 

O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL VALDECI DOS SANTOS: Trata-se de ação ordinária movida por Artur Augusto Leite, em face da União Federal, visando à anulação do Processo Administrativo Disciplinar que aplicou a pena de demissão do cargo de Auditor Fiscal da Receita Federal, bem como a sua reintegração no cargo.

A r. sentença julgou improcedente o pedido.

Em suas razões recursais, a parte apelante sustenta a ocorrência da prescrição intercorrente para a conclusão do procedimento disciplinar, assim como a prescrição prevista no art. 142 da Lei nº 8.112/90 e, no mais, pugna pela reforma da sentença, a fim de que o pedido seja julgado totalmente procedente.

Após o voto do Relator no sentido de rejeitar a preliminar de nulidade e, no mérito, negar provimento à apelação da parte autora, e do voto do Desembargador Federal Wilson Zauhy no sentido de dar provimento à apelação para reconhecer a ocorrência da prescrição da pretensão punitiva disciplinar e, por conseguinte, declarar a nulidade do ato administrativo que importou na demissão do requerente, bem como determinar a sua reintegração no cargo antes ocupado, vieram-me os autos com vista para melhor compreensão e análise da matéria.

Pois bem.

Inicialmente, deve ser rejeitada a alegação de ausência de fundamentação da r. sentença, pois conforme se depreende do artigo 489 do CPC, tudo o que for relevante para a decisão deve constar do relatório e ser analisado na fundamentação, sendo destacados os efeitos decorrentes em seu dispositivo, resolvendo-se, assim, todas as questões que foram suscitadas pelas partes.

Portanto, considerando a fundamentação jurídica da sentença, não se vislumbra a ausência da análise de qualquer questão relevante no decisum, que traz em seu bojo o necessário para a compreensão dos fundamentos que levaram o Juízo monocrático a decidir pela improcedência do pedido.

Neste sentido, já se pronunciaram o E. Supremo Tribunal Federal e C. Superior Tribunal de Justiça:

 

"A Constituição não exige que a decisão seja extensamente fundamentada. O que se exige é que o juiz ou tribunal dê as razões de seu convencimento."

(STF, 2ª Turma, Rel. Min. Carlos Velloso, AI 162.089-8/DF, j. 12.12.95, DJU 15.03.96, p. 7.209)

"A função judicial é prática, só lhe importando as teses discutidas no processo enquanto necessárias ao julgamento da causa. Nessa linha, o juiz não precisa, ao julgar procedente a ação, examinar-lhe todos os fundamentos. Se um deles é suficiente para esse resultado, não está obrigado ao exame dos demais."

(STJ, 2ª Turma, Rel. Min. Ari Pargendler, Resp 15.450/SP, j. 01.04.96, DJU 06.05.96, p. 14.399)

 

No mais, aduz o apelante que não fora respeitado o prazo para conclusão do PAD, considerando que decorreu mais de 120 dias desde a sua instauração.

Entretanto, conforme jurisprudência pacífica dos Tribunais Superiores e da Súmula nº 592 do STJ, somente haverá a decretação de nulidade em razão da dilação do prazo para a conclusão do PAD, quando restar demonstrado o efetivo prejuízo à defesa do servidor, em razão do princípio pas de nullité sans grief.

 

Súmula 592 - O excesso de prazo para a conclusão do processo administrativo disciplinar só causa nulidade se houver demonstração de prejuízo à defesa.

“MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR DO INSS. PAD. CONCESSÃO IRREGULAR DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS (ART. 117, IX DA LEI 8.112/1990). PENA APLICADA: DEMISSÃO. DECISÃO FUNDAMENTADA. PENALIZAÇÃO COERENTE COM OS POSTULADOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA O QUE, CONTUDO, É DEFESO NA VIA DO MANDADO DE SEGURANÇA. NULIDADE DA PORTARIA INAUGURAL. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO MINUCIOSA DOS FATOS INVESTIGADOS E CAPITULAÇÃO. POSSIBILIDADE DE PRORROGAÇÃO DOS MEMBROS DA COMISSÃO PROCESSANTE. PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO PELA DENEGAÇÃO DA ORDEM. ORDEM DENEGADA.

1. O indiciado se defende dos fatos que lhe são imputados e não de sua classificação legal, de sorte que a posterior alteração da capitulação legal da conduta, não tem o condão de inquinar de nulidade o Processo Administrativo Disciplinar; a descrição dos fatos ocorridos, desde que feita de modo a viabilizar a defesa do acusado, afasta a alegação de ofensa ao princípio da ampla defesa.

2. O art. 55 da Lei 4.878/1965 autoriza a prorrogação dos mandatos da comissão processante, razão pela qual esta Corte fixou a orientação de que a dilação do prazo para conclusão dos trabalhos pela Comissão Processante não consubstancia nulidade suscetível de comprometer a apuração de atos ilegais quando não demonstrado efetivo prejuízo à defesa do servidor. Aplicação do princípio pas de nullité sans grief.

3. Em face dos princípios da proporcionalidade, dignidade da pessoa humana e culpabilidade, aplicáveis ao regime jurídico disciplinar, não há juízo de discricionariedade no ato administrativo que impõe sanção disciplinar a Servidor Público, razão pela qual o controle jurisdicional é amplo, de modo a conferir garantia aos servidores públicos contra eventual excesso administrativo, não se limitando, portanto, somente aos aspectos formais do procedimento sancionatório.

4. Entretanto, em virtude do seu perfil de remédio constitucional de eficácia prontíssima contra ilegalidades e abusos, o Mandado de Segurança não comporta instrução ou dilação probatória, por isso a demonstração objetiva e segura do ato vulnerador ou ameaçador de direito subjetivo há de vir prévia e documentalmente apensada ao pedido inicial, sem o que a postulação não poderá ser atendida na via expressa do writ of mandamus.

5. In casu, a leitura da peça inaugural e dos documentos carreadas aos autos não foram suficientes para comprovar de plano as alegações de irregularidades no PAD, neste contexto, da análise dos documentos acostados aos autos, pode-se verificar que o impetrante efetivamente exerceu seu direito de defesa, apresentando documentos, defesa escrita e prestando declarações.

6. O material probatório colhido no decorrer do Processo Administrativo Disciplinar autoriza - do ponto de vista estritamente formal - a aplicação da sanção de demissão, uma vez que decorreu de atividade administrativa disciplinar a qual aparenta regularidade procedimental, não se evidenciando desproporcional ou despida de razoabilidade a punição aplicada, sem embargo de sua ulterior avaliação em sede processual de largas possibilidades instrutórias.

7. Ordem denegada, com ressalva das vias ordinárias. ”

(MS 22.200/DF, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 28/08/2019, DJe 06/09/2019)

 

Dessa forma, não prosperam os argumentos do apelante, tendo em vista que não ocorreu prejuízo para a sua defesa.

Ademais, insta consignar que o processo administrativo disciplinar não apresenta irregularidades que ensejariam nulidade, pois, desde a instauração até a sua conclusão, teve regular processamento, em consonância com os princípios do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório. Observa-se, ainda, a regularidade na produção das provas, bem como o respeito à hierarquia e à competência das autoridades que conduziram os trabalhos, em conformidade com os artigos 141, 143, 148 e 149 da Lei nº 8.112/90.

Por seu turno, considerando as infrações identificadas na conduta de Artur Augusto Leite, durante o exercício de suas funções como Delegado Regional do Patrimônio da União, ou seja, emissão de certidão para a transferência do domínio útil de enfiteuse que não correspondiam aos registros cadastrais do órgão, e sem o respectivo recolhimento de foro e laudêmio, ocasionando prejuízos ao erário, a pena de demissão mostra-se proporcional, nos moldes do artigo 132, incisos IV e XIII, c.c. o artigo 117, inciso IX, da Lei nº 8.112/90, tendo sido devidamente fundamentada e aplicada em consonância com a legislação vigente à época dos fatos.

No tocante a prescrição do processo administrativo disciplinar, o art. 142, da Lei nº 8.112/90, assim dispõe:

 

Art. 142.  A ação disciplinar prescreverá:

I - em 5 (cinco) anos, quanto às infrações puníveis com demissão, cassação de aposentadoria ou disponibilidade e destituição de cargo em comissão;

 II - em 2 (dois) anos, quanto à suspensão;

 III - em 180 (cento e oitenta) dias, quanto à advertência.

§ 1o  O prazo de prescrição começa a correr da data em que o fato se tornou conhecido.

§ 2o  Os prazos de prescrição previstos na lei penal aplicam-se às infrações disciplinares capituladas também como crime.

§ 3o  A abertura de sindicância ou a instauração de processo disciplinar interrompe a prescrição, até a decisão final proferida por autoridade competente.

§ 4o  Interrompido o curso da prescrição, o prazo começará a correr a partir do dia em que cessar a interrupção.

 

No caso dos autos, por meio das informações enviadas pela Divisão de Receitas Patrimoniais à Delegacia de Patrimônio da União (10.06.1996), em resposta ao Memo/DPU/GAB/N. 272/96, constatou-se irregularidades na emissão de certidões de transferência de domínio útil de enfiteuse, no âmbito da Delegacia de Patrimônio da União de São Paulo.

Por conseguinte, em 29/07/1996, foi editada a Portaria nº 213/SPU, constituindo a sindicância administrativa nº 10.880.027796/96-59 para apuração desses fatos. Em 30.08.1996, a comissão sindicante, em seu relatório final, se manifestou pela necessidade de instauração de inquérito administrativo, a fim de avançar nas investigações de eventuais responsabilidades do ex-Delegado da SPU/SP, ora apelante, pela emissão de certidões, que não retratavam precisamente os registros cadastrais do órgão, e sem o respectivo recolhimento de foro e laudêmio.

A Portaria nº 89/SPU, de 22/05/2001, constituiu a Comissão de Processo Administrativo Disciplinar, nos termos da orientação firmada pela comissão de sindicância.

Por fim, através da Portaria nº 308, de 27.09.2002, publicada em 01.10.2002, foi aplicada a pena de demissão à parte autora, por valer-se do cargo para obter proveito a outrem, em detrimento da dignidade da função pública, e por improbidade administrativa.

Desta feita, tem-se que a ciência do ato infracional pela autoridade se deu em 10.06.1996, momento em que teve início a contagem do prazo prescricional. O Processo Administrativo Disciplinar foi instaurado em 22.05.2001 e a decisão, que aplicou a penalidade administrativa de demissão, foi publicada em 01.10.2002.

Assim, considerando que a transgressão disciplinar apenada com demissão prescreve em 05 (cinco) anos, conforme disposto no artigo 142, inciso I, da Lei nº 8.112/90, não há que se falar em prescrição da ação disciplinar, pois entre a data de conhecimento dos fatos pela autoridade competente e a data da instauração do Processo Administrativo Disciplinar não decorreu prazo superior a 05 (cinco) anos.

No que concerne à prescrição da pretensão punitiva, cabe salientar que a sua incidência se mostra admissível na esfera administrativa, havendo entendimento jurisprudencial assente nas Cortes Superiores no sentido de que o prazo prescricional se interrompe com a instauração do processo disciplinar, recomeçando a sua contagem, por inteiro, decorridos 140 (cento e quarenta) dias, prazo legal para encerramento do processo administrativo disciplinar.

Nesse sentido:

 

"ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO. TÉCNICO DA RECEITA FEDERAL. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. DEMISSÃO. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. NÃO CONFIGURAÇÃO. ART. 142 DA LEI 8.112/90. PRAZO QUINQUENAL. INTERRUPÇÃO. REINÍCIO DA CONTAGEM.

PORTARIA INAUGURAL. PRESCINDIBILIDADE DA DESCRIÇÃO MINUCIOSA DA IMPUTAÇÃO. OBSERVÂNCIA DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA.

DISPENSABILIDADE NO PROCEDIMENTO PRELIMINAR. ALEGAÇÃO DE NULIDADE QUE EXIGE A DEMONSTRAÇÃO DE EVENTUAL PREJUÍZO. PRODUÇÃO DE PROVAS.

VIA INADEQUADA AO REEXAME. INCURSÃO NO ART. 117, IX, DA LEI N.

8.112/90. DEMISSÃO. VINCULAÇÃO. AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO.

1. O termo inicial do lustro prescricional para a apuração do cometimento de infração disciplinar é a data do conhecimento do fato pela autoridade competente para instaurar o Processo Administrativo Disciplinar. A contagem da prescrição interrompe-se tanto com a abertura de sindicância quanto com a instauração de processo disciplinar. Após o decurso de 140 dias (prazo máximo conferido pela Lei n. 8.122/90 para conclusão e julgamento do PAD), o prazo prescricional recomeça a correr integralmente.

2. No que toca à sindicância, firmou-se nesta Corte Superior entendimento no sentido de que, diante de seu caráter meramente investigatório (inquisitorial) ou preparatório de um processo administrativo disciplinar (PAD), é dizer, aquela que visa a apurar a ocorrência de infrações administrativas sem estar dirigida, desde logo, à aplicação de sanção ao servidor público, é dispensável a observância das garantias do contraditório e da ampla defesa, sendo prescindível a presença obrigatória do investigado (MS 20.647/DF, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe 19/12/2016).

3. A Portaria de instauração do Processo Administrativo Disciplinar dispensa a descrição minuciosa da imputação, exigida tão somente após a instrução do feito, na fase de indiciamento, o que é capaz de viabilizar o exercício do contraditório e da ampla defesa.

Precedentes.

4. O STJ entende que as irregularidades apontadas no processo disciplinar devem afetar as garantias do devido processo legal para justificarem a anulação deste, dependendo, portanto, da efetiva demonstração de prejuízos à defesa do servidor, segundo o princípio da instrumentalidade das formas (pas de nullité sans grief).

5. A ação mandamental não constitui via adequada para o reexame das provas produzidas em processo administrativo disciplinar, tampouco à revisão do juízo de valor que a autoridade administrativa faz sobre elas, ressalvada a avaliação do grau de proporcionalidade da pena aplicada (MS 13.771/DF, Rel. Ministro Rogerio Schietti Cruz, Terceira Seção, DJe 02/06/2015).

6. Conforme a jurisprudência desta Corte Superior, uma vez incurso o servidor público no art. 117, IX, da Lei n. 8.112/90, não resta à autoridade competente para a aplicação da penalidade no âmbito administrativo qualquer juízo de discricionariedade a autorizar pena diversa da demissão.

7. Ordem denegada." (RO nos EDcl nos EDcl no MS 11.493/DF, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 25/10/2017, DJe 06/11/2017)

 

Dessa forma, na data da instauração do Processo Administrativo Disciplinar (22.05.2001), interrompeu-se o prazo prescricional por 140 (cento e quarenta) dias, recomeçando a correr integralmente em 11.10.2001.

Sendo assim, conclui-se que a pretensão punitiva da Administração não prescreveu, pois não se observa o decurso de prazo superior a 05 (cinco) anos, entre o reinício do prazo prescricional (11.10.2001), e a data da publicação da decisão que aplicou a penalidade de demissão (01.10.2002).

Com efeito, o prazo legal para a conclusão do processo administrativo disciplinar foi respeitado, não sendo atingido pela prescrição.

Quanto ao mérito administrativo, cumpre ressaltar que o controle jurisdicional sobre o processo administrativo disciplinar limita-se à verificação da regularidade do procedimento e da legalidade do ato de punição, se houver, sendo defeso ao Poder Judiciário adentrar no mérito administrativo, sob pena de violação do princípio constitucional da separação dos poderes.

Neste sentido os julgados do C. Superior Tribunal de Justiça:

 

"ADMINISTRATIVO. SERVIDORES PÚBLICOS. DEMISSÃO. NULIDADES NO PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. OFENSA AO DEVIDO PROCESSO LEGAL. INOCORRÊNCIA. REEXAME DE PROVAS PRODUZIDAS. IMPOSSIBILIDADE DE ANÁLISE PELO PODER JUDICIÁRIO DO MÉRITO ADMINISTRATIVO. AGRAVAMENTO DA PENA SUGERIDA PELA COMISSÃO PROCESSANTE. POSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE FUNDAMENTAÇÃO. ART. 168 DA LEI Nº 8.112/90. EXCESSO DE PRAZO. NÃO COMPROVAÇÃO DE PREJUÍZO. INDEPENDÊNCIA DAS ESFERAS ADMINISTRATIVA E PENAL. "WRIT" IMPETRADO COMO FORMA DE INSATISFAÇÃO COM O CONCLUSIVO DESFECHO DO PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. ORDEM DENEGADA.

I - Em relação ao controle jurisdicional do processo administrativo, a atuação do Poder Judiciário circunscreve-se ao campo da regularidade do procedimento, bem como à legalidade do ato demissionário, sendo-lhe defesa qualquer incursão no mérito administrativo a fim de aferir o grau de conveniência e oportunidade.

(...)

VII - Ordem denegada."

(MS 9384 / DF, Rel. Ministro GILSON DIPP, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 23/06/2004, DJ 16/08/2004, p. 130)

"ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PENA DE DEMISSÃO. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. NULIDADES. INEXISTÊNCIA. AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO.

1. Não se verifica nenhuma ilegalidade no procedimento administrativo o fato do Contencioso Administrativo - órgão de assessoramento e direção da Presidência - ter manifestado opinião por meio de parecer jurídico, máxime por estar em perfeita consonância com o Regulamento Interno do Tribunal de Justiça Estadual.

2. O processo administrativo, que culminou na aplicação da pena de demissão à Recorrente, teve regular processamento, com a estrita observância aos princípios do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório.

3. Em relação ao controle jurisdicional do processo administrativo, a atuação do Poder Judiciário circunscreve-se ao campo da regularidade do procedimento, bem como à legalidade do ato, sendo-lhe defesa qualquer incursão no mérito administrativo a fim de aferir o grau de conveniência e oportunidade. Dessa forma, mostra-se inviável a análise das provas constantes no processo administrativo."

4. Recurso desprovido." (RMS 19863 / SE, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 29/11/2007, DJ 17/12/2007, p. 224)

 

No mesmo sentido o entendimento deste E. Tribunal:

 

"CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO - AGRAVO LEGAL - ART. 557, § 1º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL - DIREITO ADMINISTRATIVO - SERVIDOR PÚBLICO - NULIDADE DO PROCESSO ADMINISTRATIVO QUE CULMINOU EM DEMISSÃO - PRETENDIDA REINTEGRAÇÃO NO CARGO - ATUAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO RESTRITA AOS ASPECTOS DA LEGALIDADE DO ATO - OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO CONTRADITÓRIO E DA AMLPA DEFESA - AGRAVO LEGAL IMPROVIDO.

(...)

3. É vedado ao Poder Judiciário adentrar no mérito administrativo, sob pena de violação ao princípio da separação dos Poderes. A sua atuação é restrita aos aspectos de legalidade do ato. Assim, não é cabível o reexame do mérito das provas colhidas no corpo do procedimento administrativo, mas tão somente a análise formal de sua validade.

4. No decorrer do processo administrativo foram asseguradas à autora as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa, haja vista que formulou sua defesa e teve oportunidade de produzir as provas e contraprovas que achasse conveniente.

5. O processo administrativo que ensejou a demissão da recorrente está em estrita consonância com os princípios previstos na Constituição Federal e na Lei n° 9.784/99, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal.

6. Agravo legal improvido."

(TRF 3ª Região, 1ª Turma, Agr. Legal em Apel. 94.03.105114-0/SP, Rel. Des. Fed. Johonsom di Salvo, j. 28.009.10)

 

"CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. SERVIDOR PÚBLICO. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. PROCESSO ADMINISTRATIVO. NULIDADE. DEFESA TÉCNICA EM PROCESSO ADMINISTRATIVO. DESNECESSIDADE. SÚMULA VINCULANTE N.º 5 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. PENA DE DEMISSÃO. LEGALIDADE. INOVAÇÃO EM SEDE RECURSAL. NÃO CONHECIMENTO.

1. A adoção das razões de decidir expendidas em precedente não importa nulidade da sentença.

2. O recurso de apelação é instrumento processual que não se presta à introdução de fundamento novo, não deduzido na petição inicial.

3. Da mesma forma como ocorre no direito penal, no direito administrativo-disciplinar o acusado se defende dos fatos que lhe são imputados; e não da sua capitulação legal (STF, MS n.º 23.299-2/SP, rel. Min. Sepúlveda Pertence).

4. A falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição - Súmula Vinculante n.º 5 do Supremo Tribunal Federal.

5. Não é dado ao Poder Judiciário rediscutir o mérito do julgamento administrativo, mas tão-somente verificar a regularidade do processo.

6. Apelação parcialmente conhecida; na parte conhecida, desprovida." (TRF 3ª Região, 2ª Turma, AC 200061000056067, Rel. Des. Fed. NELTON DOS SANTOS, DJF3 DATA: 04/12/2008 PÁGINA: 821)

 

De outra banda, conforme leciona Celso Antônio Bandeira de Mello, em Capítulo dedicado à discricionariedade administrativa e controle judicial, in verbis:

 

"É princípio assente em nosso Direito - e com expresso respaldo na Lei Magna - que nenhuma lesão ou ameaça a direito poderá ser subtraída à apreciação do Poder Judiciário (art. 5°, XXXV). Nem mesmo a lei poderá excepcionar este preceito, pois, a tanto, o dispositivo mencionado opõe insuperável embargo. Segue-se que um ato gravoso, provenha de quem provier, pode ser submetido ao órgão judicante a fim de que este afira sua legitimidade e o fulmine se reputar configurada ofensa a um direito." (in Curso de Direito Administrativo. 32ª ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 986).

 

E no tocante à questão atinente ao limite da cognição judicial em relação ao mérito administrativo, o eminente administrativista desenvolve valioso ensinamento, in verbis:

 

"Não se suponha que haveria nisto invasão do chamado ‘mérito’ do ato, ou seja, do legítimo juízo que o administrador, nos casos de discrição, deve exercer sobre a conveniência ou oportunidade de certa medida. Deveras, casos haverá em que, para além de dúvidas ou entredúvidas, qualquer sujeito em intelecção normal, razoável, poderá depreender (e assim também, a fortiori, o Judiciário) que, apesar de a lei haver contemplado discrição, em face de seus próprios termos e da finalidade que lhe presidiu a existência, a situação ocorrida não comportava senão uma determinada providência ou, mesmo comportando mais de uma, certamente não era a que foi tomada. Em situações quejandas, a censura judicial não implicaria invasão do mérito do ato. (Idem, p. 992)."

 

Neste cenário, adentrando ao caso concreto não se vislumbra qualquer ilegalidade no ato de punição a justificar a reanálise do mérito.

A Comissão Processante, em seu relatório final, opinou pela demissão do servidor Artur Augusto Leite, nos seguintes termos, in verbis:

 

“O referido processo de sindicância definiu a conduta de cada acusado nos seguintes termos:

(...)

b) Artur Augusto Leite: - pela emissão de certidões: O sem retratar fielmente os registros da Delegacia: artigo 299, § único, do Código Penal; sem cobrar os débitos pendentes/laudêmios devidos (transferências): artigos 117, inciso IX, e 132, incisos IV e X, da Lei 8.112/90; II - pelo constrangimento de pessoas que seriam necessariamente ouvidas pela Comissão (folhas 235 e 240): artigo 344 do Código Penal;

(...)

No indiciamento do servidor Artur Augusto Leite como incurso nas hipóteses dos artigos 116, incisos 1, III e IX, 117, incisos VI, IX, XII e XV, todos da Lei n° 8.112/90, combinados ainda com os artigos 299, parágrafo único, e 317, § 1°, ambos do Código Penal, e os artigos 9°, inciso 1, 10, inciso X, e 11, inciso 1, todos da Lei n° 8.429/93, foi colocado que este encontra-se sujeito à penalidade do artigo 132, na forma dos incisos 1, IV, X, Xl e XIII, da mencionada Lei n°8.112/90.

(...)

Desta forma, cotejando o ato de indiciação consubstanciado no respectivo termo com a defesa e os documentos apresentados em oposição à imputação acima examinados, tem-se que o indiciado Artur Augusto Leite encontra-se sujeito à penalidade de demissão prevista no artigo 132, na forma dos incisos IV, X, XI e XIII, da Lei n°8.112/90.

Sem embargo do que foi colocado, e considerando que algumas das infrações capituladas configuram crime, impõe-se registrar que, nos termos do artigo 171 da Lei n°8.112/90, em sede de julgamento, deve o presente feito, salvo melhor juízo, ser encaminhado ao Ministério Público Federal, para eventual instauração da ação penal, permanecendo traslado do mesmo no órgão matriz.” (fls. 1758/1759 e 1786/1787).

 

Seguindo os trâmites, a conclusão proposta no relatório final da Comissão Processante foi submetida à apreciação do Ministro de Estado da Fazendo Interino, após parecer da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (fls. 1825/1832).

 

O Parecer PGFN/CJU/Nº 3088/2002 foi conclusivo no sentido da aplicação da penalidade de demissão ao servidor público (fl. 1831).

Por conseguinte, o Processo Administrativo Disciplinar nº 05026.001037/2001-70 foi submetido à apreciação do Ministro de Estado da Fazendo Interino, que julgou o servidor Artur Augusto Leite incurso na pena de demissão “com fundamento no artigo 132, incisos IV e XIII, da Lei 8.112, de 11 de dezembro de 1990, por ter se valido do cargo para lograr proveito a outrem, em detrimento da dignidade da função pública, e por improbidade administrativa, aplicando-se-lhe a restrição contida no parágrafo único do artigo 137, da mesma Lei.” (fl. 1833). A Portaria nº 308 que efetiva a demissão do servidor foi publicada em 01.10.2002 (fl. 1835).

 

Desta feita, neste cenário, não se observa ilegalidade no ato administrativo de punição do servidor público Artur Augusto Leite.

Ante o exposto, acompanho o e. Relator.

É o voto.

 

 

 

 

 

 


E M E N T A

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. PENA DE DEMISSÃO. PRESTAÇÃO JURISIDICIONAL. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. EXCESSO DE PRAZO PARA A CONCLUSÃO DO PROCESSO. INOCORRÊNCIA. PROCESSO ADMINISTRATIVO E SINDICÂNCIA. RESPEITO AO CONTRADITÓRIO E À AMPLA DEFESA. MÉRITO DO ATO ADMINISTRATIVO. VEDAÇÃO AO PODER JUDICIÁRIO. SEPARAÇÃO DOS PODERES. PENALIDADE. PROPORCIONALIDADE À CONDUTA PRATICADA. CONCESSÃO DOS BENEFÍCIOS DA JUSTIÇA GRATUITA. EFEITOS EX NUNC. POSSIBILIDADE. APELAÇÃO DESPROVIDA.
 
 
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. PENA DE DEMISSÃO. PRESTAÇÃO JURISIDICIONAL. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA.
 
 
1. Apelação interposta pelo autor contra sentença que julgou improcedente os pedidos iniciais de reconhecimento de nulidade do processo administrativo disciplinar que aplicou pena de demissão do cargo de Auditor Fiscal da Receita Federal, de reintegração no cargo público e de pagamento da remuneração vencida, condenando o autor ao pagamento de custas e honorários advocatícios no valor de R$ 4.665,30, corrigidos da data da sentença até o efetivo pagamento.
 
 
2. Aplica-se a Lei n. 13.105/2015 aos processos pendentes, respeitados, naturalmente, os atos consumados e seus efeitos no regime do CPC de 1973. Nesse sentido, restou editado o Enunciado Administrativo n. 2/STJ.
 
 
3. O magistrado desincumbiu-se da tarefa de prestar jurisdição, resolvendo a questão que lhe foi posta. A sentença recorrida abordou, de modo claro e suficientemente fundamentado, as questões suscitadas pelas partes, não havendo que se falar em nulidade. Tendo o magistrado a quo encontrado fundamento suficiente para decidir a questão posta em Juízo, não se faz necessária a abordagem pontual de cada argumento aduzido pelas partes. Precedentes.
 
 
4. A garantia do devido processo legal, com respeito ao contraditório e à ampla defesa (art. 5º, LV, CF), é de observância obrigatória tanto nos processos judiciais quanto nos administrativos. O referido ditame constitucional tem previsão legal específica para o processo administrativo disciplinar nos arts. 143 e 153, caput, Lei 8.112/1990.
 
 
5. É certo que o §2º do artigo 142 da Lei 8.112/90 determina a observância do prazo prescricional previsto na legislação penal nas hipóteses em que as infrações disciplinares também são capituladas também como crime.
 
 
6. Quanto ao ponto, registro que a jurisprudência se firmou no sentido de que caso não instaurado o processo penal para apuração e aplicação de pena quanto à conduta do servidor, que se diz similar ao ilícito penal, remanesce a regra da prescrição da esfera administrativa.
 
 
7. Ao teor do § 1º do art. 142, da Lei 8.112/1990, o prazo de prescrição começa a correr da data em que o fato se tornou conhecido. Considera-se conhecido o fato, se outro não lhe anteceder, qualquer ato oficial que demonstre inequivocamente a ciência da Administração. E nos termos do art. 142, § 3º, da Lei 8.112/1990, o prazo prescricional se interrompe na data da abertura da sindicância ou da instauração do processo administrativo disciplinar, mas esse prazo não é interrompido com a sindicância quando esta não tem caráter punitivo, e sim investigativo ou preparatório para o procedimento administrativo disciplinar, caso em que se considera como marco interruptivo a data da instauração do processo disciplinar. Precedentes do STJ.
 
 
8. A interpretação do referido § 3º do art. 142 da Lei nº 8.112/1990 é de ser feita de forma sistemática, no sentido de que o prazo prescricional é interrompido pela instauração do processo disciplinar, mas recomeça a correr quando decorrido o prazo legalmente previsto para o seu término. Precedentes do STF e STJ.
 
 
9. Não se consumou a prescrição administrativa, pois não transcorreram mais de cinco anos nem entre a data do conhecimento dos fatos pela Administração e a data da instauração do processo disciplinar, nem tampouco entre a data do término do prazo legal para conclusão do processo disciplinar e a aplicação da penalidade.
 
 
10. A Lei n. 8.1128/90 prevê a sindicância para apuração de irregularidade no serviço público (artigo 143), dela podendo resultar: arquivamento do processo; aplicação de penalidade de advertência ou suspensão de até 30 dias; e instauração do processo disciplinar (artigo 145). Quando o ilícito praticado pelo servidor ensejar a imposição de penalidade de suspensão por mais de 30 (trinta) dias, de demissão, cassação de aposentadoria ou disponibilidade, ou destituição de cargo em comissão, será obrigatória a instauração de processo disciplinar (artigo 146).
 
 
11. Já o artigo 148 da mesma lei dispõe que "o processo disciplinar é o instrumento destinado a apurar responsabilidade de servidor por infração praticada no exercício de suas atribuições, ou que tenha relação com as atribuições do cargo em que se encontre investido."
 
 
12. A comissão de sindicância constatou a prática de irregularidades passíveis de penalidade de demissão, opinando pela instauração de inquérito administrativo para prosseguir na apuração das responsabilidades do ex-Delegado e dos demais servidores da Delegacia.
 
 
13. Consoante relatório da comissão de sindicância, as provas da infração disciplinar estavam nas documentações anexadas, nos depoimentos dos servidores. Somente após a instrução do processo administrativo, assegurado o contraditório e ampla defesa, é que será avaliada se houve responsabilidade disciplinar ou não por parte do servidor na infração imputada.
 
 
14. A Constituição Federal, no artigo 5º, inciso LXXVIII, assegura a todos, no âmbito judicial e administrativo, a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação, bem como, no artigo 37, elenca, entre os princípios da Administração Pública, o princípio da eficiência.
 
 
15. Contudo, a aferição do excesso de prazo para a conclusão do processo disciplinar não se realiza de forma puramente matemática, mas sim de acordo com um juízo de razoabilidade, no qual devem ser sopesados não apenas o decurso do prazo, mas também as peculiaridades da causa, sua complexidade, bem como quaisquer fatores que possam influir na tramitação do processo.
 
 
16. O não cumprimento do prazo previsto no art. 152 não é suficiente a caracterizar qualquer nulidade do procedimento, tendo em vista a previsão legal no sentido de que "o julgamento fora do prazo legal não implica nulidade do processo" (art. 169, § 1º, da Lei 8.112/90), devendo ser demonstrado prejuízo à defesa do servidor, o que não se aplica ao caso em tela. Inteligência da Súmula nº. 592 do STJ.
 
 
17. O processo administrativo disciplinar foi instaurado com fundamento nos arts. 145, III e 146, da Lei 8.112/90, pois a sindicância anteriormente promovida constatou a realização de conduta funcional apenada com sanção de demissão.
 
 
18. Durante o procedimento, o apelante teve acesso aos autos do procedimento, tendo inclusive recebido cópia integral do processo administrativo. As diligências requeridas pelo apelante ou foram devidamente realizadas ou foram indeferidas de forma motivada, conforme se verifica da "ata de deliberação", tudo de acordo com a determinação do art. 156, § 1º, da Lei 8.112/90, não havendo, portanto, que se falar em arbitrariedade. O interrogatório do apelante foi realizado depois da oitiva das testemunhas, conforme determina o art. 159 da mencionada lei. A Comissão apresentou relatório conclusivo, com indicação do dispositivo legal no qual o servidor está incurso. Explicitou ainda, de forma minuciosa, as normas regulamentares e legais violadas pela conduta do apelante, em especial, os arts. 2º e 6º do Decreto 95.760/88, decreto 2.398/87 e art. 116, III c.c. 117, IX, Lei 8.112/90.
 
 
19. As conclusões da Comissão encontram-se supedaneadas pelos elementos dos autos do processo administrativo. É certo que o direito à prova não se limita apenas à sua produção, abrangendo as fases de indicação, produção e devida apreciação pelo órgão julgador. Entretanto, ao contrário do alegado pelo apelante, a Comissão apreciou todas provas dos autos, fundamentando de forma eficaz suas conclusões. O simples fato de o apelante não concordar com tais conclusões não corrobora a alegação de que as provas não foram devidamente apreciadas.
 
 
20. O controle jurisdicional sobre o processo administrativo disciplinar limita-se à verificação da regularidade do procedimento e da legalidade do ato administrativo, sendo defeso ao Poder Judiciário adentrar no mérito administrativo, sob pena de violação do princípio constitucional da separação dos poderes.
 
 
21. A análise da legalidade do processo administrativo e, em especial, do ato de demissão, não se limita à verificação da regularidade do procedimento, cabendo ao Poder Judiciário verificar se a Administração Pública respeitou os princípios da proporcionalidade e razoabilidade. Tal não configura qualquer invasão na análise do mérito administrativo.
 
 
22. A verificação da legalidade do procedimento passa pela análise da existência de justa causa para a aplicação da penalidade disciplinar ao servidor, ou seja, cumpre ao Poder Judiciário verificar se os fatos imputados a ele de fato ocorreram. A decisão administrativa atacada está devidamente lastreada, impedindo a pretensão colocada pelo servidor.
 
 
23. É possível o reexame do ato administrativo à luz da razoabilidade, mas não cabe ao Poder Judiciário, como pretende a parte autora, imiscuir-se no juízo e discricionariedade administrativos, reapreciando provas administrativamente apresentadas e devidamente rebatidas, uma vez que não se trata de ato ilegal ou de abuso de poder, em respeito ao princípio da separação de poderes.
 
 
24. De fato, ao Judiciário não cabe apreciar o mérito administrativo discricionário, mas tão somente a legalidade dos atos e eventuais excessos nas escolhas, sob pena de invasão de competência. Pelo relatado nos autos, não há manifesta, inequívoca ou objetiva violação de direitos e de garantias fundamentais de servidores, inviabilizando o controle do mérito da decisão administrativa atacada. Logo, pelos argumentos trazidos pelo apelante, não vislumbro motivos para infirmar a r. sentença, razão pela qual impõe-se a sua manutenção.
 
 
25. Embora possam se originar do mesmo fato, a apuração de falta disciplinar realizada pela Administração Pública através de processo administrativo disciplinar (PAD) não se confunde com a ação de improbidade administrativa, esta processada perante o Poder Judiciário, a quem cabe a imposição das sanções previstas nos incisos do art. 12 da Lei n.º 8.429/92.
 
 
26. A interpretação sistemática do arcabouço jurídico aplicável ao tema não induz à conclusão apresentada pelo apelante no sentido de que a pena de demissão só poderia ser aplicada pelo Poder Judiciário. Pelo contrário, constitui dever indeclinável da Administração apurar e, eventualmente, punir os servidores que vierem a cometer ilícitos de natureza disciplinar, a teor da Lei n.º 8.112/90.
 
 
27. Não há que se falar em ofensa ao princípio da proporcionalidade, razoabilidade ou da motivação na aplicação da pena de demissão. Demonstrada a prática das condutas tipificadas no atrigo 132, inciso XIII, c.c. o artigo 117, incisos, X, XI e XVIII, da Lei nº 8.112/90, a única reprimenda cabível para a hipótese é a demissão, não havendo para o administrador discricionariedade na aplicação de pena diversa.
 
 
28. Cumprido o requisito legal, pois a parte afirmou não ter condições de arcar com o custo do processo, e inexistindo prova capaz de infirmar a presunção legal de hipossuficiência, merece provimento, nesse ponto, o pedido do autor.
 
 
29 Importa anotar, no entanto, que os efeitos da concessão do benefício da justiça gratuita, em sede de apelação, não retroagem, ou seja, só compreendem os atos posteriores ao momento de sua obtenção, aplicando-se somente às despesas processuais supervenientes. Precedentes.
 
 
30. De rigor, portanto, o deferimento dos benefícios da justiça gratuita ao autor, operando-se efeitos ex nunc.
 
 
31. Rejeitada a matéria preliminar, e, no mérito, negado provimento ao recurso de apelação.

  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, prosseguindo no julgamento, nos termos do artigo 942 do Código de Processo Civil, a Primeira Turma, por maioria, rejeitou a preliminar de nulidade e, no mérito, negou provimento à apelação da parte autora, e de ofício, deferiu os benefícios da justiça gratuita ao autor, operando-se efeitos ex nunc, nos termos do voto do senhor Desembargador Federal relator, acompanhado pelos votos dos senhores Desembargadores Federais Valdeci dos Santos, Cotrim Guimarães e Carlos Francisco; vencido o senhor Desembargador Federal Wilson Zauhy que dava provimento à apelação para reconhecer a ocorrência da prescrição da pretensão punitiva disciplinar e, por conseguinte, declarava a nulidade do ato administrativo que importou na sua demissão, bem como determinava a reintegração da requerente no cargo antes por ela ocupado, com ressarcimento de todas as vantagens, nos termos do art. 28 da Lei n° 8.112/90, condenando a União ao pagamento de honorários advocatícios que ora fixo, por equidade, em R$ 5.000,00, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.