APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0019859-93.2012.4.03.6100
RELATOR: Gab. 01 - DES. FED. VALDECI DOS SANTOS
APELANTE: ROQUE APARECIDO DE ALMEIDA CONCEICAO
Advogados do(a) APELANTE: JOSE CARLOS TINOCO SOARES - SP16497-A, LUIZ CARLOS SANCHEZ JIMENEZ - SP75847-A, JOSE CARLOS TINOCO SOARES JUNIOR - SP211237-A
APELADO: MARCIO ALEXANDRE CINCOTTO, INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL
Advogados do(a) APELADO: MAURICIO CARLOS DA SILVA BRAGA - SP54416-A, ROGERIO GOMES GIGEL - SP173541-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0019859-93.2012.4.03.6100 RELATOR: Gab. 01 - DES. FED. VALDECI DOS SANTOS APELANTE: ROQUE APARECIDO DE ALMEIDA CONCEICAO Advogados do(a) APELANTE: JOSE CARLOS TINOCO SOARES - SP16497-A, LUIZ CARLOS SANCHEZ JIMENEZ - SP75847-A, JOSE CARLOS TINOCO SOARES JUNIOR - SP211237-A APELADO: MARCIO ALEXANDRE CINCOTTO Advogados do(a) APELADO: MAURICIO CARLOS DA SILVA BRAGA - SP54416-A, ROGERIO GOMES GIGEL - SP173541-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de apelação interposta por ROQUE APARECIDO DE ALMEIDA CONCEICAO em face r. sentença que julgou procedente o pedido para determinar que o INPI proceda a retificação no registro de programa de computador n° 123542 ("Netdealer"), incluindo o nome do autor MÁRCIO ALEXANDRE CINCOTTO como coautor do referido programa. Ademais, condenou a parte ré ao reembolso das custas e ao pagamento dos honorários advocatícios em favor do autor e do INPI, que fixou em 15% do valor atualizado da causa para cada um. Em suas razões, a parte apelante sustenta, em síntese, a incompetência da Justiça Federal para julgar a matéria e requer a anulação integral da sentença e redistribuição do feito para a Justiça Estadual. No mérito, aduz que é indevido o registro, no INPI, da parte autora como coautor do programa de computador. Com contrarrazões. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0019859-93.2012.4.03.6100 RELATOR: Gab. 01 - DES. FED. VALDECI DOS SANTOS APELANTE: ROQUE APARECIDO DE ALMEIDA CONCEICAO Advogados do(a) APELANTE: JOSE CARLOS TINOCO SOARES - SP16497-A, LUIZ CARLOS SANCHEZ JIMENEZ - SP75847-A, JOSE CARLOS TINOCO SOARES JUNIOR - SP211237-A APELADO: MARCIO ALEXANDRE CINCOTTO, INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL Advogados do(a) APELADO: MAURICIO CARLOS DA SILVA BRAGA - SP54416-A, ROGERIO GOMES GIGEL - SP173541-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O A controvérsia dos autos consiste em apurar se é devida a inclusão da parte autora, como co-titular, no registro junto ao INPI, efetuado sob o n. 123542, referente ao programa de computador denominado "NETDEALER". O INPI, nos atos processuais em que se manifestou nos autos, ressaltou que não examina o mérito do registro do programa de computador, realizando tão somente a análise no aspecto formal e processando as informações que lhe foram fornecidas. Como o réu ROQUE efetuou o registro como de sua titularidade, não cabia ao INPI ter conhecimento ou analisar se a parte autora participou da criação e desenvolvimento do programa de computador que foi registrado. Nesse sentido, observa-se que a discussão no presente caso consiste em litígio de natureza privada sobre a co-titularidade da criação do programa de computador, restando inconteste que o INPI não tem legitimidade para figurar no polo passivo da ação, pois para o INPI é indiferente se o pedido da parte autora é procedente ou não, de forma que a sua inclusão no polo passivo é desnecessária, mormente porquanto se a ação judicial entre a parte autora e o réu ROQUE fosse julgada procedente, bastaria a determinação judicial para que o INPI incluísse o autor no registro realizado, sem necessidade de participação no feito. Cabe destacar, ainda, que a causa de pedir da ação evidencia que não houve nenhum vício ou falha nos atos administrativos efetuados pelo INPI, o que corrobora a sua ilegitimidade passiva. Nesse sentido: "AGRAVO INTERNO NO AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. DIREITO MARCÁRIO. INPI. LEGITIMIDADE PASSIVA. POSSIBILIDADE. 1. Não há ilegitimidade passiva do Instituto Nacional de Propriedade Industrial-INPI em ação que busca invalidar decisão administrativa proferida pela autarquia federal no exercício de sua atribuição de análise de pedidos de registro marcário, sua concessão e declaração administrativa de nulidade. Destarte, conclui-se que a Justiça Federal não detém competência para apreciar e julgar a matéria suscitada nos autos, ressaltando-se que a ilegitimidade passiva do INPI subtrai a sua competência, nos termos do artigo 109 da Constituição Federal, e atrai a competência da Justiça Estadual. No tocante aos honorários advocatícios, nesse momento, não há que se falar em condenação de pagamento de honorários advocatícios aos patronos de ROQUE APARECIDO DE ALMEIDA CONCEICAO, pois a ação prosseguirá na Justiça Estadual, mas é devida a condenação da parte autora ao pagamento de honorários advocatícios aos patronos do INPI, em razão do reconhecimento da sua ilegitimidade passiva e da sua exclusão dos autos. Para tanto, nos termos do artigo 85, parágrafos 2º e 3º, do CPC, fixa-se em 10% do valor atualizado da causa. Diante do exposto, dou provimento à apelação para reconhecer a ilegitimidade passiva do INPI, determinar a sua exclusão dos autos (condenando a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios aos patronos do INPI em 10% do valor atualizado da causa, nos termos do artigo 85, parágrafos 2º e 3º, do CPC), reconhecer a incompetência da Justiça Federal, anular a r. sentença e determinar a remessa dos autos à E. Justiça Estadual de São Paulo, na forma da fundamentação acima. É o voto.
2. Assim, quando a causa de pedir da ação de nulidade disser respeito a vício cometido pelo próprio INPI ao longo do processo administrativo, haverá legitimidade da autarquia para figurar no processo como litisconsorte passivo.
3. No caso concreto, conforme relatado pela Corte de origem, a pretensão autoral atribuiu responsabilidade ao INPI pela inscrição indevida do registro, isto é, amparou-se no argumento de vício praticado pela própria autarquia, situação que demonstra, de forma indene de dúvidas, a legitimidade passiva.
4. Agravo interno não provido.
(AgInt no AgInt no REsp 1493591/PR, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 15/08/2019, DJe 20/08/2019)" (g.n.)
Desembargador Federal Wilson Zauhy:
Peço vênia ao E. Relator para divergir de seu voto, pelas razões que passo a expor:
A presente demanda foi ajuizada por MÁRCIO ALEXANDRE CINCOTTO em face de ROQUE APARECIDO DE ALMEIDA CONCEIÇÃO objetivando a manutenção do nome do autor como coautor e cotitular do registro de programa de computador "Netdealer", n° 123542, concedido ao réu.
Julgado procedente o pedido, o réu Roque apela arguindo a incompetência absoluta desta Justiça Federal. Alternativamente, pede a reforma da sentença para ver o pedido julgado improcedente, sustentando, em síntese, que foi ele o único criador do programa de computador em comento.
Com efeito, vê-se que o objeto da demanda é o registro de um programa de computador junto ao INPI. O autor ajuizou a ação para ver seu nome mantido no registro, como coautor e cotitular do programa, enquanto o réu defende a exclusão do nome do requerente, alegando ter sido o seu único criador.
Assim dispõe a Lei n° 9.279/96 sobre a intervenção do INPI em ações anulatórias de registro:
Art. 175. A ação de nulidade do registro será ajuizada no foro da justiça federal e o INPI, quando não for autor, intervirá no feito.
§ 1º O prazo para resposta do réu titular do registro será de 60 (sessenta) dias.
§ 2º Transitada em julgado a decisão da ação de nulidade, o INPI publicará anotação, para ciência de terceiros.
Embora não se trate, propriamente, de uma ação anulatória, o pedido deduzido nestes autos diz diretamente com o registro de um programa de computador junto ao INPI, de sorte que é perfeitamente possível a sua intervenção no feito com fundamento no artigo 175 da Lei n° 9.279/96.
Neste ponto, registro que a Jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça tem firmado o entendimento de que, em se tratando de discussão acerca de vício inerente ao próprio processo de registro, deve a autarquia figurar no feito na qualidade de litisconsorte passivo necessário, e de assistente especial (intervenção sui generis) no caso em que se debate vício intrínseco ao objeto do registro.
Neste sentido, confira-se o seguinte precedente:
RECURSO ESPECIAL. DIREITO MARCÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. PRETENSÃO DE NULIDADE DE REGISTRO DE MARCA. ATUAÇÃO OBRIGATÓRIA DO INPI. ART. 175 DA LEI 9.279/96. POSIÇÃO PROCESSUAL. QUALIDADE DA INTERVENÇÃO. CAUSA DE PEDIR DA AÇÃO. LITISCONSORTE PASSIVO OU ASSISTENTE ESPECIAL (INTERVENÇÃO SUI GENERIS). HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS INDEVIDOS PELA ATUAÇÃO COMO ASSISTENTE ESPECIAL.
1. O art. 175 da Lei n. 9.279/96 prevê que, na ação de nulidade do registro de marca, o INPI, quando não for autor, intervirá obrigatoriamente no feito, sob pena de nulidade, sendo que a definição da qualidade dessa intervenção perpassa pela análise da causa de pedir da ação de nulidade.
2. O intuito da norma, ao prever a intervenção da autarquia, foi, para além do interesse dos particulares (em regra, patrimonial), o de preservar o interesse público, impessoal, representado pelo INPI na execução, fiscalização e regulação da propriedade industrial.
3. No momento em que é chamado a intervir no feito em razão de vício inerente ao próprio registro, a autarquia federal deve ser citada na condição de litisconsórcio passivo necessário.
4. Se a causa de pedir da anulatória for a desconstituição da própria marca, algum defeito intrínseco do bem incorpóreo, não havendo questionamento sobre o vício do processo administrativo de registro propriamente dito, o INPI intervirá como assistente especial, numa intervenção sui generis, em atuação muito similar ao amicus curiae, com presunção absoluta de interesse na causa.
5. No tocante aos honorários, não sendo autor nem litisconsorte passivo, mas atuando na condição da intervenção sui generis, não deverá o INPI responder pelos honorários advocatícios, assim como ocorre com o assistente simples.
6. Recurso especial provido.
(STJ, REsp n° 1.264.644/RS, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe 09/08/2016). (destaquei).
Recentemente, esta Primeira Turma teve a oportunidade de apreciar um caso envolvendo pedido de cotitularidade de registro de marca junto ao INPI, em demanda que envolveu a autarquia. Transcrevo a ementa do acórdão:
DIREITO EMPRESARIAL E PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. POSTERIOR HOMOLOGAÇÃO DE TRANSAÇÃO PELO JUÍZO DE ORIGEM. POSSIBILIDADE. DESISTÊNCIA DO RECURSO DE APELAÇÃO QUE INDEPENDE DA CONCORDÂNCIA DAS DEMAIS PARTES. RECURSO ADESIVO SUBORDINADO AO PRINCIPAL. PROPRIEDADE INDUSTRIAL. MARCA. COTITULARIDADE. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE VEDAÇÃO LEGAL. EXPRESSA REGULAMENTAÇÃO INFRALEGAL. HONORÁRIOS RECURSAIS. DESCABIMENTO. APELAÇÃO NÃO PROVIDA.
1. Ajuizada a presente ação com vistas à suspensão de requerimento de registro ou à anulação do registro de marca, se já concedido, e à abstenção das requeridas de usá-la, foi prolatada sentença de improcedência do pedido, contra a qual a parte autora interpôs recurso de apelação e o INPI interpôs recurso adesivo. Sobreveio notícia de transação havida entre as empresas autoras e uma das correqueridas, homologada em nova sentença proferida pelo Juízo de Origem, contra a qual se insurge a autarquia.
2. Em regra não é dado ao Juízo alterar a sentença após sua publicação fora das hipóteses previstas no artigo 494 do Código de Processo Civil de 2015. Nada obstante, muito embora tivesse a parte autora interposto recurso de apelação contra a sentença de improcedência de seu pedido, certo é que, antes mesmo do apelo ter sido recebido por esta Corte, a parte requereu a homologação de transação, hipótese que configura verdadeira desistência do recurso, ato este que independe da concordância das demais partes, nos termos do 998, caput, do CPC/2015.
3. O fato de o INPI ter interposto recurso adesivo em nada altera tais razões de decidir, eis que se trata de recurso subordinado ao principal, que não pode ser conhecido na hipótese de desistência daquele, consoante expressamente previsto no artigo 997, §§ 1º e 2º e inciso III, do CPC/2015.
4. Ao homologar a transação noticiada nos autos, o Juízo a quo deu concretude ao comando contido no § 2º do artigo 3º do CPC/2015, segundo o qual "O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos".
5. A Lei nº 9.279/1996 não veda, de forma alguma, a cotitularidade de registro de marca, o que seria suficiente para a manutenção da sentença homologatória, eis que admitir o contrário importaria em verdadeira restrição ao direito de propriedade das partes sem previsão legal.
6. Levando em consideração a adesão do país ao tratado internacional denominado Protocolo Referente ao Acordo de Madri Relativo ao Registro Internacional de Marcas (Decreto nº 10.033/2019), o próprio INPI editou a Resolução INPI/PR nº 245/2019, que passou a prever expressamente o regime de cotitularidade em registro de marca, de sorte que não há mais dúvidas acerca da possibilidade de o registro de marca ostentar mais de um titular.
7. Ausente condenação da apelante em honorários, deixo de aplicar a regra prevista no § 11 do artigo 85 do Código de Processo Civil de 2015 (STJ, EDcl no AgInt no RESP n° 1.573.573 RJ. Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze. Terceira Turma. DJe 08/05/2017).
8. Apelação não provida.
(TRF da 3ª Região, Apelação Cível n° 5002135-63.2018.4.03.6105/SP, Rel. Desembargador Federal Wilson Zauhy, Primeira Turma, julgamento em 14/09/2020, intimação via sistema em 18/09/2020).
Tanto numa quanto noutra hipótese está presente a legitimidade do INPI para intervir no feito, razão pela qual entendo que a presente demanda não versa, exclusivamente, sobre interesses particulares de autor e réu.
Entendimento diverso poderia implicar em cerceamento do direito de defesa da autarquia, que se veria impossibilitada de defender, em Juízo, a posição jurídica que entende mais adequada em relação ao registro público de programa de computador por ela mantido.
Ademais, poderia o INPI requerer seu ingresso na demanda perante o Juízo Estadual, pedido este que, se deferido, "redeslocaria" a competência para processar e julgar o feito para a Justiça Federal.
Divirjo, portanto, do voto do E. Relator para reconhecer a competência da Justiça Federal para processar e julgar o feito, com fundamento no artigo 109, I, da Constituição Federal.
Passo a analisar o mérito da causa.
De fato, a Lei n° 9.609/98, ao dispor sobre a proteção da propriedade intelectual de programa de computador e sua comercialização no País, previu a facultatividade do registro e estabeleceu duas figuras juridicamente distintas, a do autor do programa e do titular do registro, que podem ou não ser a mesma pessoa, além de estabelecer, como regra, que cabe ao empregador os direitos sobre o programa desenvolvido pelos seus empregados, nos seguintes termos:
Art. 2º O regime de proteção à propriedade intelectual de programa de computador é o conferido às obras literárias pela legislação de direitos autorais e conexos vigentes no País, observado o disposto nesta Lei.
§ 1º Não se aplicam ao programa de computador as disposições relativas aos direitos morais, ressalvado, a qualquer tempo, o direito do autor de reivindicar a paternidade do programa de computador e o direito do autor de opor-se a alterações não-autorizadas, quando estas impliquem deformação, mutilação ou outra modificação do programa de computador, que prejudiquem a sua honra ou a sua reputação.
§ 2º Fica assegurada a tutela dos direitos relativos a programa de computador pelo prazo de cinqüenta anos, contados a partir de 1º de janeiro do ano subseqüente ao da sua publicação ou, na ausência desta, da sua criação.
§ 3º A proteção aos direitos de que trata esta Lei independe de registro.
§ 4º Os direitos atribuídos por esta Lei ficam assegurados aos estrangeiros domiciliados no exterior, desde que o país de origem do programa conceda, aos brasileiros e estrangeiros domiciliados no Brasil, direitos equivalentes.
§ 5º Inclui-se dentre os direitos assegurados por esta Lei e pela legislação de direitos autorais e conexos vigentes no País aquele direito exclusivo de autorizar ou proibir o aluguel comercial, não sendo esse direito exaurível pela venda, licença ou outra forma de transferência da cópia do programa.
§ 6º O disposto no parágrafo anterior não se aplica aos casos em que o programa em si não seja objeto essencial do aluguel.
Art. 3º Os programas de computador poderão, a critério do titular, ser registrados em órgão ou entidade a ser designado por ato do Poder Executivo, por iniciativa do Ministério responsável pela política de ciência e tecnologia. (Regulamento)
§ 1º O pedido de registro estabelecido neste artigo deverá conter, pelo menos, as seguintes informações:
I - os dados referentes ao autor do programa de computador e ao titular, se distinto do autor, sejam pessoas físicas ou jurídicas;
II - a identificação e descrição funcional do programa de computador; e
III - os trechos do programa e outros dados que se considerar suficientes para identificá-lo e caracterizar sua originalidade, ressalvando-se os direitos de terceiros e a responsabilidade do Governo.
§ 2º As informações referidas no inciso III do parágrafo anterior são de caráter sigiloso, não podendo ser reveladas, salvo por ordem judicial ou a requerimento do próprio titular.
Art. 4º Salvo estipulação em contrário, pertencerão exclusivamente ao empregador, contratante de serviços ou órgão público, os direitos relativos ao programa de computador, desenvolvido e elaborado durante a vigência de contrato ou de vínculo estatutário, expressamente destinado à pesquisa e desenvolvimento, ou em que a atividade do empregado, contratado de serviço ou servidor seja prevista, ou ainda, que decorra da própria natureza dos encargos concernentes a esses vínculos.
§ 1º Ressalvado ajuste em contrário, a compensação do trabalho ou serviço prestado limitar-se-á à remuneração ou ao salário convencionado.
§ 2º Pertencerão, com exclusividade, ao empregado, contratado de serviço ou servidor os direitos concernentes a programa de computador gerado sem relação com o contrato de trabalho, prestação de serviços ou vínculo estatutário, e sem a utilização de recursos, informações tecnológicas, segredos industriais e de negócios, materiais, instalações ou equipamentos do empregador, da empresa ou entidade com a qual o empregador mantenha contrato de prestação de serviços ou assemelhados, do contratante de serviços ou órgão público.
§ 3º O tratamento previsto neste artigo será aplicado nos casos em que o programa de computador for desenvolvido por bolsistas, estagiários e assemelhados.
Registro, por oportuno, artigo 3° da referida lei veio a ser regulamentado pelo Decreto n° 2.556/1998, que atribuiu ao INPI o registro dos programas de computador, nos seguintes termos:
Art. 1º Os programas de computador poderão, a critério do titular dos respectivos direitos, ser registrados no Instituto Nacional da Propriedade Industrial - INPI.
Veja-se, portanto, que ao autor do programa de computador é conferido o direito de reivindicar a "paternidade" do programa e de se opor a determinadas modificações não autorizadas.
Portanto, a alegação recursal de que cabem ao réu os direitos morais sobre a criação do programa esbarra na regra prevista no § 1° do artigo 2° da Lei n° 9.609/1998, como visto até aqui.
O réu alega que ser o único criador do programa de computador em discussão, sustentando que o autor "não reúne qualquer capacidade técnica em linguagem de computação, nunca escreveu qualquer 'software', nunca estudou para esse mister, nunca prestou qualquer atendimento em suporte técnico aos clientes da XSIS, sendo que atuava como um mero instalador do programa NETDEALER nos clientes". Diz que os depoimentos pessoais coligidos aos autos demonstram isso (Num. 75948314 - pág. 19).
O autor, de outro modo, alegou que ele e o réu "criaram conjuntamente o programa de computador intitulado "NETDEALER", uma vez que eram sócios da empresa XSIS — Engenharia de Sistemas S/C Ltda., constituída em 01/12/1992" , e que "(r)eferido programa foi criado, pelo autor e pelo réu, na linguagem VB6 com a base de dados em ACCESS, sendo que o Autor ficou responsável também pelo módulo OPERADOR que rodava em um servidor da empresa (cliente) e tinha a finalidade de importar as tabelas do ERP, atualizar os usuários e capturar e disponibilizar as cotações e pedidos para serem processadas pelo ERP da empresa; enquanto que o réu Roque ficou responsável pelo desenvolvimento do módulo USUARIO, que é o programa instalado no micro do representante e tem a finalidade de receber as atualizações enviadas pelo OPERADOR, digitar os pedidos e enviar para o OPERADOR" (Num. 75948296 - pág. 06/07).
Em relação à autoria do programa de computador, a questão é a de saber quem, efetivamente, o criou.
Quanto a isto, registro, primeiramente, que é a efetiva criação do programa que confere a alguém a sua autoria, e não, propriamente, a sua formação acadêmica e/ou os seus conhecimentos técnicos.
Dito isto, verifico que foram colhidos os depoimentos pessoais do autor e do réu, gravados em mídia digital, que não foi digitalizada até o presente momento (fls. 505/509 dos autos físicos - Num. 75948306 - pág. 103/105).
Dado o teor da alegação trazida pelo apelante, de que os depoimentos pessoais corroborariam sua tese de que foi o único criador do programa em comento, alegação esta que se afigura bastante verossímil, tenho que não é possível prosseguir na análise do mérito da causa sem a devida apreciação do teor destes depoimentos.
Ante o exposto, divirjo do voto do E. Relator para reconhecer a competência da Justiça Federal para processar e julgar o feito, com fundamento no artigo 175 da Lei n° 9.279/96 e artigo 109, I, da Constituição Federal, e suscito a presente Questão de Ordem para suspender o julgamento da apelação e determinar a juntada, a este processo eletrônico, do teor dos depoimentos pessoais de autor e réu constantes de mídia digital juntada à fl. 509 dos autos físicos (Num. 75948306 - pág. 105), devendo o julgamento prosseguir em outra oportunidade.
E M E N T A
APELAÇÃO. DISCUSSÃO SOBRE CO-TITULARIDADE DE CRIAÇÃO DE PROGRAMA DE COMPUTADOR. INPI. ILEGITIMIDADE PASSIVA. LITÍGIO DE NATUREZA PRIVADA. AUSÊNCIA DE VÍCIOS OU FALHAS EM ATOS ADMINISTRATIVOS EFETUADOS PELO INPI. INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. REMESSA DOS AUTOS À JUSTIÇA ESTADUAL. RECURSO PROVIDO.
1. A controvérsia dos autos consiste em apurar se é devida a inclusão da parte autora, como co-titular, no registro junto ao INPI, efetuado sob o n. 123542, referente ao programa de computador denominado "NETDEALER".
2. O INPI, nos atos processuais em que se manifestou nos autos, ressaltou que não examina o mérito do registro do programa de computador, realizando tão somente a análise no aspecto formal e processando as informações que lhe foram fornecidas. Como o réu ROQUE efetuou o registro como de sua titularidade, não cabia ao INPI ter conhecimento ou analisar se a parte autora participou da criação e desenvolvimento do programa de computador que foi registrado.
3. Nesse sentido, observa-se que a discussão no presente caso consiste em litígio de natureza privada sobre a co-titularidade da criação do programa de computador, restando inconteste que o INPI não tem legitimidade para figurar no polo passivo da ação, pois para o INPI é indiferente se o pedido da parte autora é procedente ou não, de forma que a sua inclusão no polo passivo é desnecessária, mormente porquanto se a ação judicial entre a parte autora e o réu ROQUE fosse julgada procedente, bastaria a determinação judicial para que o INPI incluísse o autor no registro realizado, sem necessidade de participação no feito.
4. Cabe destacar, ainda, que a causa de pedir da ação evidencia que não houve nenhum vício ou falha nos atos administrativos efetuados pelo INPI, o que corrobora a sua ilegitimidade passiva. Precedente do C. STJ.
5. Destarte, conclui-se que a Justiça Federal não detém competência para apreciar e julgar a matéria suscitada nos autos, ressaltando-se que a ilegitimidade passiva do INPI subtrai a sua competência, nos termos do artigo 109 da Constituição Federal, e atrai a competência da Justiça Estadual.
6. Apelação provida.