HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Nº 5003615-53.2021.4.03.0000
RELATOR: Gab. 15 - DES. FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW
IMPETRANTE: DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO
PACIENTE: IGOR MELO DE LIMA
IMPETRADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO/SP - 5ª VARA FEDERAL CRIMINAL
OUTROS PARTICIPANTES:
HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Nº 5003615-53.2021.4.03.0000 RELATOR: Gab. 15 - DES. FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW IMPETRANTE: DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO IMPETRADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO/SP - 5ª VARA FEDERAL CRIMINAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de habeas corpus impetrado pela Defensoria Pública da União em favor de Igor Melo de Lima, com pedido liminar, objetivando a revogação da prisão preventiva, com a concessão da liberdade provisória sem fiança, ou, alternativamente, a substituição por outras medidas cautelares ou prisão domiciliar, ou, subsidiariamente, seja determinado à autoridade impetrada a realização imediata da audiência de custódia, nos autos da ação penal n. 5000112-08.2021.4.03.6181, na qual foi denunciado pela prática do crime previsto no art. 157, §2º, II, c. c. art. 14, II, e art. 62, IV, todos do Código Penal. Alega-se, em síntese, o seguinte: a) o paciente foi preso em flagrante no dia 17.12.20, por ter, em tese, praticado o crime de roubo, na modalidade tentada; b) o feito tramitou perante o Juízo Estadual, momento em que a Defensoria Pública do Estado de São Paulo foi comunicada da prisão, deixando de atuar em razão da constituição de defensor pelo paciente, que apresentou pedido de concessão de liberdade provisória; c) o feito foi encaminhado ao Juízo Federal em razão do declínio de competência, momento em que a autoridade impetrada ratificou os atos praticados e manteve a decretação da prisão preventiva; d) as decisões proferidas pela autoridade impetrada não foram publicadas no Diário Oficial nem foi aberta vista à Defensoria Pública da União, que só teve conhecimento do feito quando foi intimada em 02.02.21 para apresentar resposta à acusação; e) o pedido realizado pela Defensoria Pública da União para concessão de liberdade provisória foi indeferido pela autoridade impetrada; f) não estão presentes os requisitos para a decretação da prisão preventiva, pois não há indicação de habitualidade de conduta criminosa, e a gravidade em abstrato do delito de roubo não constituiu fundamento idôneo para manutenção da custódia cautelar do acusado; g) não há elementos concretos que apontem risco de fuga e possível comprometimento à aplicação da lei penal, uma vez que o paciente possui residência fixa, com vínculos familiares sólidos, bem como trabalho lícito; h) a utilização de meio restritivo de direito, alternativo à prisão no cárcere, a exemplo da utilização de tornozeleira ou mesmo da prisão domiciliar, se demonstra justo e capaz de inibir qualquer tipo de tentativa de reiteração criminosa; i) a prisão é ilegal, pois a Defensoria Pública da União não foi comunicada da manutenção da prisão preventiva pela autoridade impetrada, conforme determina o art. 289-A, § 4º, do Código de Processo Penal; j) a audiência de custódia do preso não foi realizada até o momento, nem mesmo por videoconferência, conforme determina a Resolução n. 357/2020 do Conselho Nacional de Justiça que alterou a Resolução n. 329/2020; k) a Recomendação n. 62 do Conselho Nacional de Justiça não constitui motivação idônea para a dispensa da audiência de custódia do preso, tendo em vista a posterior edição da Recomendação n. 357/2020, sendo direito do preso ter o contato pessoal com o Juízo, imediatamente após a sua prisão; l) ao receber os autos do Juízo Estadual, a autoridade impetrada apenas ratificou as decisões, ou seja, também não apresentou qualquer fundamentação, minimamente lógica e razoável, para a dispensa da audiência de custódia do paciente; m) ainda que se admitisse a dispensa da audiência com base na Recomendação n. 62 do Conselho Nacional de Justiça, deveria ter sido cumprido o previsto no art. 8º, II, e no art. 8-A, V, com a realização do exame de corpo de delito complementado por registro fotográfico do rosto e corpo inteiro do preso, o que não ocorreu; n) considerando que já ultrapassado (e muito) o prazo previsto para realização da audiência de custódia, é de rigor o reconhecimento da ilegalidade da prisão; o) o paciente é primário e tem bons antecedentes criminais, residência fixa e trabalho lícito, sendo suficiente a adoção de medidas cautelares diversas da prisão, como o uso de dispositivo de monitoramento eletrônico; p) o paciente responde ao delito em sua forma tentada, de modo que, mesmo se condenado, certamente não será fixado o regime fechado de cumprimento de pena; q) o acusado está detido no CDP Osasco I que, atualmente, contém o dobro de sua capacidade, aumentando o risco de contágio por Covid-19, sendo recomendada a sua soltura conforme art. 4º, b, da Recomendação n. 62 do Conselho Nacional de Justiça; r) requer, liminarmente, a revogação da prisão preventiva, com a concessão da liberdade provisória sem fiança, ou, alternativamente, a substituição por outras medidas cautelares ou prisão domiciliar, ou, subsidiariamente, seja determinado à autoridade impetrada a realização imediata da audiência de custódia (Id n. 153081256). Foram juntados documentos. A Defensoria Pública da União foi intimada para promover a juntada de cópia do Inquérito Policial n. 1526359-10.2020.8.26.0228, que tramitou perante a Justiça Estadual e foi remetido à Justiça Federal após declínio de competência (Id. n. 153122913). Foram juntados novos documentos. A liminar foi indeferida (Id. n. 153660282). A autoridade impetrada prestou informações (Id. n. 154175921). A Ilustre Procuradora Regional da República, Dra. Cristina Marelim Vianna, manifestou-se em parecer pela denegação da ordem (Id. n. 154301370). É o relatório.
PACIENTE: IGOR MELO DE LIMA
HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Nº 5003615-53.2021.4.03.0000 RELATOR: Gab. 15 - DES. FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW IMPETRANTE: DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO IMPETRADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO/SP - 5ª VARA FEDERAL CRIMINAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Consta dos autos que o paciente foi preso em flagrante em 17.12.20 pela suposta prática do crime de roubo, na modalidade tentada, ao tentar subtrair uma motocicleta de propriedade da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos conduzida pelo carteiro Wagner Antonio de Paula (Id. n. 153574339, pp. 2/16). Em 18.12.20, o paciente requereu, por defensor constituído, a concessão da liberdade provisória (Id. n. 153574339, pp. 46/49). Na mesma data, a audiência de custódia foi dispensada em razão da pandemia do novo coronavírus e a prisão em flagrante foi homologada pelo Juízo Estadual e convertida em prisão preventiva no Auto de Prisão em Flagrante n. 1526359-10.2020.8.26.0228, por estarem preenchidos os requisitos do art. 312 do Código de Processo Penal, nos seguintes termos: No caso em apreço, a prova da materialidade e os indícios suficientes de autoria do(s) crime(s) de ROUBO CIRCUNSTANCIADO TENTADO (artigo 157, § 2º, II C/C ARTIGO 14, II do Código Penal) encontram-se evidenciados pelos elementos de convicção constantes das cópias do Auto de Prisão em Flagrante, com destaque para as declarações colhidas. (...) Com efeito, trata-se de crime extremamente grave, praticado mediante violência ou grave ameaça à pessoa, que vem trazendo enorme desassossego à sociedade brasileira, mostrando-se a prisão do indiciado necessária para garantia da ordem pública, sendo certo que o crime teria sido cometido, conforme relato do ofendido, mediante simulacro de arma de fogo e em concurso de pessoas, o que denota especial gravidade de sua conduta, tendo o autuado sido detido por policiais que estavam em patrulhamento. Ademais, a vítima reconheceu o autuado como um dos autores do roubo tentado (fls. 53). O crime em análise, em tese praticado pelo ora investigado, possui pena privativa de liberdade máxima superior a 04 (quatro) anos de reclusão, sendo, outrossim, a prisão dos investigados necessária para a correta e eficaz aplicação da lei penal, bem como para a instrução processual, permitindo, assim, a colheita da prova em Juízo sem qualquer tipo de intervenção no ânimo da vítima e testemunha, que poderão realizar o necessário reconhecimento judicial do acusado com a tranquilidade que o ato requer. Ressalto que a arguição de primariedade e de que as circunstâncias judiciais são favoráveis ao autuado (fls. 39) não é o bastante para recomendar a benesse pretendida. É que “o Superior Tribunal de Justiça, em orientação uníssona, entende que persistindo os requisitos autorizadores da segregação cautelar (art. 312, CPP), é despiciendo o paciente possuir condições pessoais favoráveis” (...). Não bastasse, NÃO há comprovação de endereço fixo que garanta a vinculação ao distrito da culpa, denotando que a cautela é necessária para a conveniência da instrução criminal e de eventual aplicação da lei penal, nem de atividade laboral remunerada, de modo que as atividades ilícitas porventura sejam fonte ao menos alternativa de renda (modelo de vida), pelo que a recolocação em liberdade neste momento (de maneira precoce) geraria presumível retorno às vias delitivas, meio de sustento. Ressalta-se que a presente conduta em pleno estado de pandemia por qual passa o mundo e, não obstante as recomendações das autoridades para que fiquem em sua casa, o indiciado saiu às ruas com o objetivo único de cometer crimes, o que denota a periculosidade concreta de sua conduta. A conduta em tese praticada se reveste de gravidade concreta. De sorte que a custódia preventiva é necessária para garantir a ordem pública e assegurar a aplicação da lei penal. Os demais elementos colacionados aos autos, a apreensão de chave de veículo em poder do autuado, de origem duvidosa, além da fuga do condutor da moto em que o autuado estava de garupa, evidenciam o seu envolvimento com o meio criminoso. Dessa forma, considerando a espécie do crime perpetrado e diante das circunstâncias concretas do delito em tela, bem como à vista das circunstâncias pessoais do investigado, afigura-se que nenhuma das cautelares previstas no artigo 319, do CPP, se mostra suficiente e adequada ao caso. Assim, de rigor a conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva. Ademais, o autuado não demonstrou fazer parte do grupo das pessoas considerada de risco para o COVID-19, tampouco que há risco real de que referido estabelecimento prisional em que se encontra e que o segrega do convício social cause maior risco do que o ambiente em que a sociedade está inserida, afastando-se, portanto, a necessidade de revogação da prisão preventiva e concessão de liberdade provisória fundada em risco à sua saúde. Deixo de converter o flagrante em prisão domiciliar porque ausentes os requisitos previstos no artigo 318 do Código de Processo Penal. Deixo, ainda, de aplicar qualquer das medidas previstas no artigo 319 do Código de Processo Penal, conforme toda a fundamentação acima (CPP, art. 282, § 6º). E não se trata aqui de decretação da prisão preventiva com a finalidade de antecipação de cumprimento de pena (CPP, art. 313, § 2º), mas sim de que as medidas referidas não têm o efeito de afastar o acusado do convívio social, razão pela qual seriam, na hipótese, absolutamente ineficazes para a garantia da ordem pública. (Id. n. 153574339, pp. 56/60). Na mesma data, ao ser intimado da decisão, o Ministério Público Estadual requereu a remessa dos autos à Justiça Federal em razão da incompetência do Juízo (Id. n. 153574339, pp. 72/74), o que foi deferido pelo Juízo Estadual em 07.01.21 (Id. n. 153574339, p. 75). Distribuído o feito no âmbito da Justiça Federal de São Paulo (SP) em 11.01.21, a autoridade impetrada, na mesma data, diante da regularidade e da presença dos requisitos e fundamentos legais, homologou e ratificou as decisões proferidas nos autos e manteve a prisão preventiva do investigado (Id. n. 153081258, p. 66). Intimado, o Ministério Público Federal ofereceu denúncia em face do ora paciente pela prática do crime previsto no art. 157, §2º, II, c. c. art. 14, II, e art. 62, IV, todos do Código Penal (Id. n. 153081258, pp. 63/65), que foi recebida pela autoridade impetrada em 22.01.21, ocasião em que novamente manteve a prisão preventiva por continuarem presentes os fundamentos que ensejaram a prisão cautelar, não sendo suficientes medidas cautelares diversas da prisão, sendo necessária, portanto, a manutenção de sua prisão preventiva como garantia da ordem pública, nos termos da decisão proferida em 18.12.20, ratificada em 11.01.21, a partir da qual não houve qualquer alteração do quadro fático e processual (Id. n. 153081258, pp. 57/60). Citado em 31.01.21, o acusado manifestou desejo de ser assistido pela Defensoria Pública da União (Id. n. 153081258, p. 48), razão pela qual a DPU foi intimada e, em 03.02.21, requereu a concessão de sua liberdade provisória ou a substituição por medidas cautelares (Id. n. 153081258, pp. 34/37). A autoridade impetrada indeferiu o pedido de liberdade provisória nos seguintes termos: O pleito da DPU comporta indeferimento, pelos seguintes fundamentos. Ao contrário do que alega a DPU, a Defensoria Pública foi sim comunicada da prisão de IGOR MELO DE LIMA, quando o feito tramitou inicialmente pela Justiça do Estado de São Paulo, conforme se verifica no ID 43946859, p. 25. Observa-se, ainda, que o acusado, assistido por advogado particular, requereu liberdade provisória perante o Juízo Estadual (ID 43946859, p. 46-49). Nota-se que o acusado, após ter apresentado pedido de liberdade provisória formulado por advogado particular, perante o Juízo Estadual, somente manifestou interesse em ser defendido pela DPU em 31/01/2021, na ocasião em que foi citado e intimado, por ordem deste Juízo Federal (ID 44848979), razão pela qual foi aberta vista à DPU, em 02/02/2021 (um dia após a juntada da diligência cumprida pelo Oficial de Justiça - ID 44848973). Quanto à não realização excepcional da audiência de custódia, verifica-se que o Juízo Estadual fundamentou sua decisão na Recomendação nº 62/2020 do Conselho Nacional de Justiça e no Provimento CSM nº 2545/2020. Nesse passo, importa transcrever o seguinte trecho da fundamentação da decisão do ID 43946859, p. 56-60: "Pelo que consta do APF, não há elementos que permitam concluir ter havido tortura ou maus tratos ou ainda descumprimento dos direitos constitucionais assegurados ao preso". Verifica-se que houve motivação idônea para a não realização de audiência de custódia, diante das circunstâncias daquele momento. Ademais, não havendo qualquer irregularidade na prisão em flagrante, foi esta homologada e convertida em prisão preventiva, também por fundamentação idônea e sem qualquer eiva de nulidade. Observe-se que, ainda que a prisão em flagrante fosse relaxada, ainda assim poderia ser decretada a prisão preventiva, pelos fundamentos bem lançados na decisão de ID 43946859, p. 56-60. Não obstante as argumentações sobre primariedade e bons antecedentes, o perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado é inegável, visto que ele foi reconhecido como um dos autores de outro roubo, ocorrido um dia antes de ser preso em flagrante, no mesmo bairro, conforme consta do ID 43946859, p. 32/34 e p. 50/53. Quanto à argumentação sobre endereço fixo, nota-se que o acusado, em seu interrogatório policial, afirmou estar desempregado há desempregado há três anos e quem o ajuda financeiramente é a sua família (ID 43946859, p. 13). Também em seu interrogatório policial, o acusado declarou residir na Rua Briteiros, nº 762, Capão Redondo, São Paulo, SP, tratando-se, portanto, de numeral diverso do declarado pela Sra. Valéria Batista de Jesus no ID 45194332, p. 1-2. Quanto à mesma declaração de Valéria Batista de Jesus e outra declaração no ID 45194332, p. 4, em nome de "Jomar Dias Ribeiro", afirmando que o acusado trabalha de terça a domingo em um lava-rápido, das 9:00 às 17:00 horas, tais afirmações vão de encontro com o registrado nos boletins de ocorrência constantes dos autos, indicando que, no dia anterior à sua prisão em flagrante, ou seja, numa quarta-feira, o roubo teria ocorrido às 11:00 horas, e que o roubo apurado nestes autos ocorreu numa quinta-feira, às 13:00 horas. Da análise dos documentos juntados no ID 43946859, p. 7-9, constata-se que o acusado não possui nenhuma comorbidade de grupo de maior risco de contaminação pela Covid-19. Nesse passo, vale ressaltar que eventual superlotação ou precárias condições de estabelecimentos prisionais não permitem, por si só, a concessão da liberdade provisória, especialmente quando a prisão estiver devidamente fundamentada por decisão judicial, proferida de acordo com o devido processo legal, como é o caso dos autos. Portanto, não sendo demonstrado qualquer prejuízo ao acusado nem havendo alteração do quadro fático processual que ensejou a prisão preventiva, INDEFIRO o pedido de liberdade provisória. (Id. n. 153081258, pp. 7/9). Liberdade provisória. Requisitos subjetivos. Insuficiência. É natural que seja exigível o preenchimento dos requisitos subjetivos para a concessão de liberdade provisória. Contudo, tais requisitos, posto que necessários, não são suficientes. Pode suceder que, malgrado o acusado seja primário, tenha bons antecedentes, residência fixa e profissão lícita, não faça jus à liberdade provisória, na hipótese em que estiverem presentes os pressupostos da prisão preventiva (STJ, HC n. 89.946-RS, Rel. Min. Felix Fischer, unânime, j. 11.12.07; RHC n 11.504-SP, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 18.10.01). A conversão do flagrante em prisão preventiva torna superada a alegação de nulidade relativamente à falta ou demora na realização da audiência de custódia (STJ, HC n. 2019.00.38910-0, rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, j. 03.12.19; STJ, HC n. 2019.01.57080-3, rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 13.08.19; TRF 3ª Região, RevCrim 5000027-72.2020.4.03.0000, rel. Des. Fed. André Nekatschalow, j. 30.04.20). No caso dos autos, a audiência de custódia do preso não foi realizada em razão da pandemia causada pelo novo coronavírus, sendo recomendável o cumprimento remoto dos atos processuais. O magistrado consignou não haver elementos que permitissem concluir ter havido tortura ou maus tratos, ou descumprimento dos direitos constitucionais assegurados ao preso e determinou o cumprimento do art. 8º, § 2º, III, da Recomendação do Conselho Nacional de Justiça n. 62/2020, ou seja, a realização do exame de corpo de delito, com registro fotográfico do rosto e corpo inteiro do preso (Id. n. 153574339, pp. 56/60). Na mesma data da prisão foi requisitada, pela autoridade policial, a realização do exame de corpo de delito (Id. n. 153574339, p. 22) e a Defensoria Pública do Estado de São Paulo e o Ministério Público do Estado de São Paulo foram comunicados da prisão em flagrante (Id. n. 153574339, p. 25). No prazo de 24 (vinte e quatro) horas, a prisão em flagrante do paciente foi convertida em prisão preventiva, pois o crime foi praticado mediante violência ou grave ameaça à pessoa, com simulacro de arma de fogo e em concurso de pessoas, não havendo comprovação de endereço fixo e de atividade laboral remunerada, havendo risco de reiteração delitiva. Ademais, foi apreendida em poder do paciente a chave de um veículo de origem suspeita (Id. n. 153574339, pp. 56/60). Não se verifica, de plano, a ilegalidade ou abuso na decisão que decretou a prisão preventiva do paciente, satisfatoriamente fundamentada no art. 312, do Código de Processo Penal, vale dizer, na prova da existência de crime punido com pena máxima superior a 4 (quatro) anos, em indícios suficientes de autoria e na necessidade de garantir a ordem pública, para assegurar a aplicação da lei penal e por conveniência da instrução criminal. Ressalte-se que, ainda que preenchidos os pressupostos subjetivos para a concessão de liberdade provisória, estão presentes os requisitos dos arts. 312 e 313 do Código de Processo Penal, sendo que a manutenção da custódia cautelar do paciente é necessária e as medidas cautelares diversas da prisão revelam-se inadequadas e insuficientes ao caso. Trata-se de crime cometido mediante violência ou grave ameaça à pessoa, com simulacro de arma de fogo e em concurso de agentes e, ainda que se trate de paciente primário e com bons antecedentes, não há comprovação de exercício de atividade lícita, além de haver indícios da utilização do veículo apreendido em seu poder, e adquirido em circunstâncias suspeitas, na prática de outros crimes de roubo, inclusive com reconhecimento pessoal do paciente por outra vítima como autor de um desses delitos ocorrido um dia antes de sua prisão (16.12.20), demonstrando reiteração delitiva. A defesa afirma que o paciente possui trabalho lícito e que, no momento dos fatos, estava em horário de almoço. Juntou duas declarações de próprio punho de pessoas diferentes, Aguinaldo Rodrigues (Id n. 153081257, p. 4) e Jomar Dias Ribeiro (Id. n. 153081258, p. 24), ambas com idêntico teor, informando que Igor trabalha informalmente em seu lava-rápido de veículos automotores. No entanto, não está devidamente comprovado que o paciente possui trabalho lícito, pois, no momento de sua prisão em flagrante, declarou, perante a autoridade policial, que estava desempregado há três anos, que é ajudado financeiramente por sua família e que “estava de bobeira como de costume”, na Rua Jorge Buoni, quando chegou Rogério pilotando uma moto e lhe convidou para “roubar uma moto de alguma empresa” (Id. n. Id. n. 153574339, p. 13). Ainda, consta dos autos que o paciente, no momento de sua prisão, estava com a chave de um automóvel no bolso, um Fiat Uno, placas BNU-5250, de propriedade de Katia Aparecida Portella dos Santos. O paciente informou ter comprado o carro pelo valor de R$ 1.500,00 (um mil e quinhentos reais) de um anunciante no Facebook na página “Feira do rolo do Capão Redondo”. A testemunha José Anderson Silva Pereira, Policial Militar, declarou perante a autoridade policial que, após a localização do veículo estacionado em via pública, foi alertado via COPOM que o veículo teria sido usado em diversos crimes de roubo pela região do Capão Redondo, em São Paulo (SP) – (Id. n. 153574339, p. 15). Verifica-se que referido veículo foi utilizado na prática de outro delito de roubo ocorrido na data anterior à prisão em flagrante do paciente, ou seja, em 16.12.20, às 11h00, do qual foi vítima Matheus Oliveira Fernandes, que teve sua motocicleta subtraída por três indivíduos mediante emprego de violência (Id. n. 153574339, pp. 50/51). Após a prisão em flagrante do paciente na posse do referido veículo, a vítima Matheus foi comunicada e compareceu à Delegacia, onde reconheceu pessoalmente o ora paciente como sendo um dos autores do crime do qual foi vítima (Id. n. 153574339, p. 52). Dessa forma, está demonstrada a possibilidade concreta de reiteração delitiva. A alegação de ausência de intimação da Defensoria Pública da União sobre a manutenção da prisão preventiva pela autoridade impetrada deve ser afastada, pois o paciente estava representado por defensor constituído que requereu a concessão da liberdade provisória (Id. n. 153574339, pp. 46/49). Apenas quando foi citado na ação penal subjacente é que o acusado manifestou desejo de ser assistido pela Defensoria Pública da União, motivo pelo qual a DPU foi imediatamente intimada. Quanto ao pedido de revogação da prisão preventiva com fundamento em questões humanitárias, à vista da pandemia de COVID-19, ressalto a premência da necessidade da adoção de medidas para fins de prevenção à infecção e à propagação do novo coronavírus, bem como de medidas para manutenção da saúde dos presos, conforme Recomendação n. 62, de 17.03.20, do Conselho Nacional de Justiça. No entanto, não há qualquer informação ou prova de que o paciente pertença ao denominado grupo de risco para a doença COVID-19. Também não há elementos que indiquem que na unidade prisional em que está recolhido não haja disponibilidade de serviços de saúde. Não há que se falar em ilegalidade da prisão no presente caso. Embora o laudo do exame de corpo de delito não tenha sido juntado aos autos, verifica-se que a sua realização foi requisitada pela autoridade policial, além de ter sido determinado pelo Juízo Estadual o cumprimento do art. 8º, § 2º, III, da Recomendação do Conselho Nacional de Justiça n. 62/2020 (Id. n. 153574339, p. 22). Ante o exposto, DENEGO a ordem de habeas corpus. É o voto.
PACIENTE: IGOR MELO DE LIMA
E M E N T A
PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. CRIME DE ROUBO TENTADO. LIBERDADE PROVISÓRIA. REQUISITOS SUBJETIVOS. INSUFICIÊNCIA. AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA. PRAZO DE 24 (VINTE E QUATRO) HORAS. CONVERSÃO DO FLAGRANTE EM PRISÃO PREVENTIVA. NULIDADE. INEXISTÊNCIA. PRISÃO PREVENTIVA. PROVA DA MATERIALIDADE. INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA. POSSIBILIDADE CONCRETA DE REITERAÇÃO DELITIVA. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DA DPU. NULIDADE. INEXISTÊNCIA. PANDEMIA. COVID-19. EXCEPCIONALIDADE. ORDEM DENEGADA.
1. É natural que seja exigível o preenchimento dos requisitos subjetivos para a concessão de liberdade provisória. Contudo, tais requisitos, posto que necessários, não são suficientes. Pode suceder que, malgrado o acusado seja primário, tenha bons antecedentes, residência fixa e profissão lícita, não faça jus à liberdade provisória, na hipótese em que estiverem presentes os pressupostos da prisão preventiva (STJ, HC n. 89.946-RS, Rel. Min. Felix Fischer, unânime, j. 11.12.07; RHC n 11.504-SP, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 18.10.01).
2. A conversão do flagrante em prisão preventiva torna superada a alegação de nulidade relativamente à falta ou demora na realização da audiência de custódia (STJ, HC n. 2019.00.38910-0, rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, j. 03.12.19; STJ, HC n. 2019.01.57080-3, rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 13.08.19; TRF 3ª Região, RevCrim 5000027-72.2020.4.03.0000, rel. Des. Fed. André Nekatschalow, j. 30.04.20).
3. Não se verifica, de plano, a ilegalidade ou abuso na decisão que decretou a prisão preventiva do paciente, satisfatoriamente fundamentada no art. 312, do Código de Processo Penal, vale dizer, na prova da existência de crime punido com pena máxima superior a 4 (quatro) anos, em indícios suficientes de autoria e na necessidade de garantir a ordem pública, para assegurar a aplicação da lei penal e por conveniência da instrução criminal.
4. Ainda que preenchidos os pressupostos subjetivos para a concessão de liberdade provisória, estão presentes os requisitos dos arts. 312 e 313 do Código de Processo Penal, sendo que a manutenção da custódia cautelar do paciente é necessária e as medidas cautelares diversas da prisão revelam-se inadequadas e insuficientes ao caso.
5. Trata-se de crime cometido mediante violência ou grave ameaça à pessoa, com simulacro de arma de fogo e em concurso de agentes e, ainda que se trate de paciente primário e com bons antecedentes, não há comprovação de exercício de atividade lícita, além de haver indícios da utilização do veículo apreendido em seu poder, e adquirido em circunstâncias suspeitas, na prática de outros crimes de roubo, inclusive com reconhecimento pessoal do paciente por outra vítima como autor de um desses delitos ocorrido um dia antes de sua prisão (16.12.20), demonstrando a possibilidade concreta de reiteração delitiva.
6. A alegação de ausência de intimação da Defensoria Pública da União sobre a manutenção da prisão preventiva pela autoridade impetrada deve ser afastada, pois o paciente estava representado por defensor constituído que requereu a concessão da liberdade provisória. Apenas quando foi citado na ação penal subjacente é que o acusado manifestou desejo de ser assistido pela Defensoria Pública da União, motivo pelo qual a DPU foi imediatamente intimada.
7. Não há qualquer informação ou prova de que o paciente pertença ao denominado grupo de risco para a doença COVID-19. Também não há elementos que indiquem que na unidade prisional em que está recolhido não haja disponibilidade de serviços de saúde.
8. Não há que se falar em ilegalidade da prisão no presente caso. Embora o laudo do exame de corpo de delito não tenha sido juntado aos autos, verifica-se que a sua realização foi requisitada pela autoridade policial, além de ter sido determinado pelo Juízo Estadual o cumprimento do art. 8º, § 2º, III, da Recomendação do Conselho Nacional de Justiça n. 62/2020.
9. Ordem denegada.