APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5000837-26.2019.4.03.6000
RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. WILSON ZAUHY
APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
APELADO: BANCO VOLVO (BRASIL) S.A
Advogado do(a) APELADO: FABIOLA BORGES DE MESQUITA - SP206337-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5000837-26.2019.4.03.6000 RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. WILSON ZAUHY APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL APELADO: BANCO VOLVO (BRASIL) S.A Advogado do(a) APELADO: FABIOLA BORGES DE MESQUITA - SP206337-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de apelação interposta pela UNIÃO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL e REMESSA NECESSÁRIA contra sentença proferida em mandado de segurança impetrado por BANCO VOLVO (BRASIL) S.A. objetivando a concessão da segurança para obter a liberação de dois veículos apreendidos (trator e semirreboque graneleiro). Deferida a liminar em 23/11/2016, verificou-se que o veículo se encontrava apreendido junto à Delegacia da Receita Federal de Campo Grande/MS, em virtude de suposta participação do financiado na prática de ilícitos tributários (contrabando e descaminho), segundo a interpretação dos agentes fiscais. Diz que o Delegado da Receita Federal em Cascavel/PR recusou-se a restituir os bens apreendidos (Num. 149679505). Indeferido o pedido de liminar (Num. 149679523). Informações prestadas pela autoridade impetrada (Num. 149679633). Em sentença datada de 23/09/2020, o Juízo de Origem concedeu a segurança para determinar à autoridade impetrada que entregue à impetrante o produto da alienação, em leilão, dos veículos apreendidos, devidamente atualizado, conforme os parâmetros estipulados no Manual de Cálculos da Justiça Federal, condenando a União a ressarcir as custas adiantadas pelo impetrante (Num. 149679641). A União Federal - Fazenda Nacional apela para ver denegada a segurança, sustentando a legalidade da aplicação da pena de perdimento do bem, fundada nos artigos 673 e 674 do Regulamento Aduaneiro (Decreto nº 6.759, de 5 de fevereiro de 2009) (Num. 149679649). Contrarrazões pela parte impetrante (Num. 149679653). Manifestação do Ministério Público Federal pelo regular processamento do feito (Num. 151499922). É o relatório.
Narra a impetrante em sua inicial que é proprietária fiduciária dos veículos em questão e que, em razão de inadimplemento contratual, ajuizou ação de busca e apreensão em face do devedor.
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5000837-26.2019.4.03.6000 RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. WILSON ZAUHY APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL APELADO: BANCO VOLVO (BRASIL) S.A Advogado do(a) APELADO: FABIOLA BORGES DE MESQUITA - SP206337-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Conforme a jurisprudência consagrada na Súmula 138 do extinto TFR: "A pena de perdimento de veículo utilizado em contrabando ou descaminho somente é aplicada se demonstrada a responsabilidade do proprietário na prática do delito". PROCESSUAL CIVIL. PENA DE PERDIMENTO. VEÍCULO TRANSPORTADOR. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AUSÊNCIA DE RESPONSABILIDADE DO PROPRIETÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES. RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO. APELAÇÃO. REMESSA NECESSÁRIA. TRIBUTÁRIO. PENA DE PERDIMENTO DE VEÍCULO ALIENADO FINANCEIRAMENTE. APLICAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. ANULAÇÃO DO ATO ADMINISTRATIVO DE APREENSÃO. INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA QUE OBRIGUE AO PAGAMENTO DE DESPESAS DE ARMAZENAGEM. RECURSO DESPROVIDO. No caso concreto, resta evidente que a parte impetrante - banco proprietário fiduciário dos bens em questão - não contribuiu de qualquer forma para os ilícitos imputados ao condutor dos veículos, não sendo possível que arque com o ônus de seu perdimento, portanto. E, considerando que a Receita Federal já alienou os bens em hasta pública, correta a sentença ao converter o dever de restituição em perdas e danos, mediante a entrega do produto da alienação à impetrante, com fundamento no artigo 499 do CPC/2015, ante a impossibilidade de concessão de tutela específica no caso concreto. Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação e à remessa necessária.
Este entendimento mantém-se firme na Jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça e desta Corte, como exemplificam os seguintes precedentes:
1. Cuida-se, na origem, de Mandado de Segurança impetrado por Gaplan Administradora de Consórcio Ltda., ora recorrida, contra o Delegado da Receita Federal do Brasil em Presidente Prudente - São Paulo, objetivando a concessão da ordem para que a autoridade impetrada lhe restitua veículos apreendidos e sobre o quais incidem decisão determinando o perdimento.
2. Afirma a impetrante que os veículos foram apreendidos por estarem trafegando com mercadorias introduzidas irregularmente no país. Argumenta que é a proprietária dos veículos, que não concorreu para a prática do delito e que é terceira de boa-fé.
3. O Juiz de 1º Grau concedeu a segurança e determinou que a autoridade impetrada devolva os veículos.
4. O Tribunal a quo negou provimento à Apelação do ora recorrente e assim consignou na sua decisão: "Deveras, quanto ao ponto especifico da insurgência, observo que inexistente a comprovação de envolvimento do proprietário do bem na pratica de infração passível de imposição de pena de perdimento, esta não há que ser aplicada." (fl. 262, grifo acrescentado).
5. A jurisprudência do STJ está assentada na impossibilidade de aplicação da pena de perdimento do veículo transportador quando não comprovada a responsabilidade e a má-fé do proprietário do veículo. Nesse sentido: REsp 1.243.170/PR, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 18/4/2013; AgRg no REsp 1331644/PA, Relator Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 25/10/2012, e REsp 1637846/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 19/12/2016.
6. Esclareça-se que, embora cabível a aplicação da pena de perdimento de veículo objeto de alienação fiduciária utilizado para o ingresso irregular de mercadorias no território nacional, é necessário, também, que seja comprovada a má-fé do proprietário fiduciário do veículo.
7. In casu, o Tribunal a quo afirmou que "não houve a comprovação efetiva da participação do proprietário do veículo nos alegados ilícitos praticados, nem de sua má-fé ou sequer da ciência de que o veículo alienado fiduciariamente estava sendo usado para fins ilícitos." (fl. 256, grifo acrescentado).
8. Portanto, não é possível a aplicação da pena de perdimento dos veículos.
9. No mais, modificar as razões que levaram o Tribunal de origem a concluir pela não aplicabilidade da sanção de perdimento ao caso sob exame, seria necessário revolver o contexto fático-probatório dos autos, o que é vedado pela Súmula 7 do STJ.
10. Recurso Especial não provido.
(STJ, REsp n° 1.646.654/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe: 19/04/2017) (destaquei).
1. Conforme a jurisprudência consagrada na Súmula 138 do extinto TFR: "A pena de perdimento de veículo utilizado em contrabando ou descaminho somente é aplicada se demonstrada a responsabilidade do proprietário na prática do delito". Ou seja, não havendo envolvimento da requerente no crime, não poderia ser decretado o perdimento do veículo em questão.
2. Resta a situação em que o simples emprego de veículo de terceiro em prática de contrabando/descaminho não pode gerar decreto de perda do bem em favor da União Federal, já que somente se aplica a pena de perdimento ao veículo que transportar mercadorias sujeitas a tal penalidade se o proprietário for seu condutor ou, não o sendo, quando demonstrada responsabilidade do dono na prática da infração (artigo 104, V, do Decreto-Lei 37/66).
3. Veículo alienado fiduciariamente em favor de instituição financeira não pode sofrer pena de perdimento por ato do devedor a que a garantia se presta , salvo se comprovada a participação da entidade no ato ilícito.
4. Correta a sentença que anulou o ato administrativo de apreensão do veículo e declarou a inexistência de relação jurídica que obrigue o autor ao pagamento de quaisquer despesas de armazenagem do veículo.
5. Apelação da União desprovida.
(TRF 3ª Região, Apelação/Remessa Necessária n° 0005388-09.2011.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal Hélio Nogueira, Primeira Turma, julgamento em 21/08/2020, e-DJF3: 27/08/2020) (destaquei).
Registro que, ao pretender estender automaticamente ao proprietário fiduciário a responsabilidade por ilícito tributário e/ou penal perpetrado com o uso, por terceiro, do veículo de sua propriedade fiduciária, o artigo 674, inciso II do Decreto n° nº 6.759, de 5 de fevereiro de 2009 (Regulamento Aduaneiro) extrapolou os limites do poder regulamentar, por se propor a criar hipótese de responsabilidade não prevista em lei, sendo evidentemente ilegal, portanto.
E M E N T A
DIREITO TRIBUTÁRIO, CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. VEÍCULO. IMPUTAÇÃO DE ILÍCITO FISCAL AO DEVEDOR FIDUCIÁRIO. APREENSÃO. PENA DE PERDIMENTO. INAPLICABILIDADE. PROPRIETÁRIO FIDUCIÁRIO QUE NÃO CONTRIBUIU PARA O POSSÍVEL ILÍCITO. DEVER DE RESTITUIÇÃO. ALIENAÇÃO EM HASTA PÚBLICA. CONVERSÃO EM PERDAS E DANOS. APELAÇÃO E REMESSA NECESSÁRIA NÃO PROVIDAS.
1. Conforme a jurisprudência consagrada na Súmula 138 do extinto TFR: "A pena de perdimento de veículo utilizado em contrabando ou descaminho somente é aplicada se demonstrada a responsabilidade do proprietário na prática do delito".
2. Este entendimento mantém-se firme na Jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça e desta Corte. Precedentes.
3. Ao pretender estender automaticamente ao proprietário fiduciário a responsabilidade por ilícito tributário e/ou penal perpetrado com o uso, por terceiro, do veículo de sua propriedade fiduciária, o artigo 674, inciso II do Decreto n° nº 6.759, de 5 de fevereiro de 2009 (Regulamento Aduaneiro) extrapolou os limites do poder regulamentar, por se propor a criar hipótese de responsabilidade não prevista em lei, sendo evidentemente ilegal, portanto.
4. Resta evidente que a parte impetrante - banco proprietário fiduciário dos bens em questão - não contribuiu de qualquer forma para os ilícitos imputados ao condutor dos veículos, não sendo possível que arque com o ônus de seu perdimento, portanto.
5. Considerando que a Receita Federal já alienou os bens em hasta pública, correta a sentença ao converter o dever de restituição em perdas e danos, mediante a entrega do produto da alienação à impetrante, com fundamento no artigo 499 do CPC/2015, ante a impossibilidade de concessão de tutela específica no caso concreto.
6. Apelação e remessa necessária não providas.