APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0007341-86.2008.4.03.6108
RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. WILSON ZAUHY
APELANTE: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL
Advogado do(a) APELANTE: JOSE ANTONIO ANDRADE - SP87317-A
APELADO: WANDERLEI FERNANDES
Advogado do(a) APELADO: ARMANDO PEDRO NETO - SP256093
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0007341-86.2008.4.03.6108 RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. WILSON ZAUHY APELANTE: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL Advogado do(a) APELANTE: JOSE ANTONIO ANDRADE - SP87317-A APELADO: WANDERLEI FERNANDES Advogado do(a) APELADO: ARMANDO PEDRO NETO - SP256093 OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de apelação interposta pela Caixa Econômica Federal contra sentença que julgou procedente o pedido de prestação de contas referente ao depósito efetuado em 6 de junho de 1967, no valor de NCr$ 37.280,00 (trinta e sete mil duzentos e oitenta cruzeiros novos), na conta nº 7973, série A, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, sob pena de não lhe ser lícito impugnar as que a parte autora apresentar, impondo à CEF, por fim, o pagamento de honorários advocatícios fixados em R$ 500,00 (quinhentos reais). Esclarece a apelante que o objeto do litígio é uma conta de depósitos populares que, após a vigência da Lei nº 4.380/1964, deveria ter sido encerrada pelos detentores, para que assim fosse aberto uma caderneta de poupança que teria uma remuneração anual de 6% e direito a correção monetária recém instituída, conforme determinação da resolução BACEN nº 114/1969, em seu item IV. Alega a impossibilidade de prestar tais contas, já que não foram encontrados documentos que informem sobre a existência dessa conta, pois à época da abertura ainda não existia legislação que regulava o arquivamento de dados bancários. Aponta sua ilegitimidade passiva, visto que conforme a Lei nº 9.526\1997 as contas de depósitos não recadastradas foram remetidas ao Banco Central do Brasil. Afirma que não se trata de conta poupança, mas sim de conta de depósitos populares, a qual era remunerada anualmente à taxa de 4,5% a 5,5%, capitalizados semestralmente, sem correção monetária, à luz do Decreto nº 575, de 10 de janeiro de 1.849, sendo que somente após a edição da Lei nº 4.380, em 31.08.64, haveria a obrigação de encerrar as contas de depósito e abrir conta de caderneta de poupança. Informa que não há interesse processual do apelado para a propositura da ação, pois a ação cabível para tal situação seria a cautelar de exibição de documentos. Pugna, ao final, pela improcedência do pedido considerando a falta de documentos que comprove o depósito, assim como a extinção da referida conta (fls. 208\213). Em contrarrazões o apelado argumenta que sendo CEF uma prestadora de serviço, que não contestou o depósito realizado na conta de débitos populares sob sua responsabilidade, deve-se prevalecer o dever da empresa em fornecer os documentos exigidos em sentença. Informa que não há ilegitimidade passiva, pois houve uma celebração de contrato entre as partes, assim subsiste a obrigação da CEF em fornecer as informações solicitadas, pois além da obrigação contratual existente o apelado não tem nenhuma ligação com o Banco Central ou a União Federal. No que tange alegação de indeferimento da inicial da apelante por falta de interesse processual, informa que devido ao contrato celebrado e a falta de respostas da CEF pelas vias administrativas, foi necessário tal medida judicial para ter conhecimento de informações requeridas. No mérito, informa que em razão do contrato estabelecido cabia a apelante a obrigação contratual de guardar e conservar os valores depositados, assim como agora é de seu encargo prestar contas. Requer assim que o recuso seja improvido (fls. 217/232). O Ministério Público Federal informa que não há motivo para ele intervir nesse feito, logo não oferece parecer (fls. 238\240). Negou-se monocraticamente o seguimento dessa apelação, visto que se encontrava em desacordo com a jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça e de outros Tribunais Regionais Federais (fls. 246\254). A CEF propôs agravo interno sobre a decisão monocrática, alegando a incompetência material da Terceira Turma da Segunda Seção para o julgamento de questões de direito privado, já que o presente recurso na verdade é de competência da Primeira Seção, pois essa é a responsável em analisar o assunto em questão que é de prestação de conta de depósito popular. Requer assim que seja reconhecida tal incompetência, sendo anulada tal decisão monocrática e devendo os autos ser remetidos a uma das Turmas que compõem a Primeira Seção. Salienta novamente que não encontrou nenhum documento com as informações exigidas, já que o detentor dessa conta não a encerrou e muito menos abriu a caderneta de poupança; subsidiariamente requer o provimento do recurso com a improcedência do pedido (fls.264\270). Tornou-se sem efeito a decisão às fls. 246\254, sendo os autos redistribuídos para a 1a Seção (fls. 274). É o relatório.
VOTO-VISTA O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL VALDECI DOS SANTOS: Trata-se de ação de prestação de contas ajuizada em face da Caixa Econômica Federal - CEF, visando à comprovação da existência do depósito no valor de NCr$ 37.280,00, efetuado na conta nº 7973, série A, em 06.06.1967. A r. sentença julgou procedente o pedido de prestação de contas, para condenar a parte ré a prestá-las no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, a teor do disposto no art. 915, § 2º, do CPC/73, bem como pagar honorários advocatícios fixados em R$ 500,00 (quinhentos reais). Em suas razões recursais, a Caixa Econômica Federal suscita as preliminares de ilegitimidade passiva e ausência de interesse de agir, sob o argumento de que a ação de prestação de contas não é o meio adequado para o pedido em questão e, no mais, sustenta a impossibilidade do cumprimento da obrigação de prestar contas, pois o depósito bancário fora extinto, com o recolhimento dos valores ao Tesouro Nacional, ante a inércia da parte autora, que não efetuou o recadastramento da conta, nos termos das Resoluções do Conselho Monetário Nacional nºs 2.025/93 e 2.078/94. Aduz, ainda, que a apelada não requereu o ressarcimento dos depósitos nos prazos estabelecidos pelas Leis nºs 9.526/97 e 9.814/99. Ao final, requer a reforma da r. sentença, a fim de que o pedido seja julgado totalmente improcedente. Após o voto do Relator no sentido de dar provimento à apelação da CEF, para reformar a r. sentença e julgar extinto o processo, com resolução do mérito, e do voto antecipado da Juíza Federal Convocada Adriana Taricco no sentido de negar provimento à apelação da CEF, vieram-me os autos com vista para melhor compreensão e análise dos fatos. Pois bem. Com a devida vênia, divirjo do E. Relator. Passo à análise da matéria tratada nos autos. De início, afasto a preliminar aventada pela Caixa Econômica Federal - CEF, de ausência de interesse de agir da parte autora. A ação de prestação de contas, ou a ação de exigir contas, encontra previsão nos artigos 914 e seguintes do Código de Processo Civil de 1973, vigente à época de interposição da ação, que guardam correspondência com os artigos 550 e seguintes do Código de Processo Civil de 2015. A ação ganha especial relevância em relações de consumo, nas quais a defesa da parte hipossuficiente impõe um dever de informação e transparência por parte do fornecedor. Ainda que não configurada a relação de consumo, o dever de informar e ser transparente, que pode ser exigido por meio da ação de prestação de contas, também ganha especial relevância em relações em que está presente uma grande disparidade de condições econômicas e jurídicas entre as partes. Esta é a hipótese de relações civis, como aquelas que envolvem prestação de serviços bancários, mesmo quando não destinados ao consumidor final, conforme se pode inferir do teor da Súmula 259 do STJ ao apontar que a ação de prestação de contas pode ser proposta pelo titular de conta-corrente bancária. A relação jurídica constituída entre as partes diz respeito à comprovação da existência do depósito no valor de NCr$ 37.280,00, efetuado na conta nº 7973, série A, em 06.06.1967. De acordo com a parte autora, a Caixa Econômica Federal assumiu o compromisso de zelar pela manutenção dos valores depositados, devidamente atualizados, e restituí-los, quando requeridos. Com efeito, resta afastada a preliminar de carência de ação, uma vez que a parte autora comprovou a abertura da mencionada conta (fls. 31/33), tendo legítimo interesse em obter a prestação jurisdicional. A corroborar tal entendimento, cito decisão do STJ proferida em regime de recurso especial representativo de controvérsia: PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS. SEGUNDA FASE. CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO EM CONTA CORRENTE. JUROS REMUNERATÓRIOS E CAPITALIZAÇÃO DOS JUROS. IMPOSSIBILIDADE DE REVISÃO DOS ENCARGOS CONTRATUAIS, QUE DEVEM SER MANTIDOS NOS TERMOS EM QUE PRATICADOS NO CONTRATO BANCÁRIO SEM PREJUÍZO DA POSSIBILIDADE DE AJUIZAMENTO DE AÇÃO REVISIONAL. 1. Tese para os efeitos do art. 543-C do Código de Processo Civil de 1973: - Impossibilidade de revisão de cláusulas contratuais em ação de prestação de contas. 2. O titular da conta-corrente bancária tem interesse processual para propor ação de prestação de contas, a fim de exigir do banco que esclareça qual o destino do dinheiro que depositou, a natureza e o valor dos créditos e débitos efetivamente ocorridos em sua conta, apurando-se, ao final, o saldo credor ou devedor. Exegese da Súmula 259. 3. O rito especial da ação de prestação de contas não comporta a pretensão de alterar ou revisar cláusula contratual, em razão das limitações ao contraditório e à ampla defesa. (...) 5. O contrato de conta-corrente com abertura de limite de crédito automático (cheque especial) é negócio jurídico complexo. Se o cliente não utiliza o limite de crédito, não há dúvida de que o banco está empregando o dinheiro do correntista na compensação dos cheques, ordens de pagamento e transferências por ele autorizadas. Havendo utilização do limite do cheque especial, concretiza-se contrato de empréstimo, cuja possibilidade era apenas prevista no contrato de abertura da conta. (...) 8. O contrato bancário que deve nortear a prestação de contas e o respectivo julgamento - sem que caiba a sua revisão no rito especial - não é o simples formulário assinado no início do relacionamento, mas todo o conjunto de documentos e práticas que alicerçaram a relação das partes ao longo dos anos. Esse feixe de obrigações e direitos não cabe alterar no exame da ação de prestação de contas. (...) 10. Recurso especial a que se dá parcial provimento para manter os juros remuneratórios e a capitalização nos termos em que praticados no contrato em exame, sem prejuízo da possibilidade de ajuizamento de ação revisional. (g.n.) (STJ, REsp 1497831/PR, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Rel. p/ Acórdão Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 14/09/2016, DJe 07/11/2016) Vale destacar que na ação de prestação de contas discute-se a própria transparência na gestão realizada pela instituição bancária, respeitados os marcos do contrato firmado entre as partes e demais normas que regulamentam a relação jurídica em questão. Na primeira fase desta ação o autor pretende a condenação da CEF à prestação de contas sobre o depósito realizado, e somente após o trânsito em julgado da sentença que reconhece a obrigação, tem início a segunda fase da ação, na qual serão apreciadas as contas apresentadas pela parte ré, inclusive o pedido de inclusão dos expurgos inflacionários. Assim, a ação de prestação de contas é o meio processual adequado para a parte autora compelir a instituição financeira a esclarecer a movimentação de sua conta, visando à comprovação da existência dos depósitos. Neste sentido já decidiram o Superior Tribunal de Justiça e o Tribunal de Regional Federal da 3ª Região: PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS. NEGATIVA DO DEVER DE PRESTAR CONTAS. PROCEDIMENTO BIFÁSICO. NECESSIDADE. CONCESSÃO DE PRAZO PARA O RÉU APRESENTAR AS CONTAS. PREVISÃO LEGAL. OBRIGATORIEDADE. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Inexiste afronta ao art. 535 do CPC/1973 quando o acórdão recorrido analisa todas as questões necessárias para uma adequada solução do litígio. O fato de a decisão ser contrária aos interesses da parte recorrente não configura negativa de prestação jurisdicional. 2. Segundo o rito previsto nos arts. 915 e seguintes do CPC/1973, quando negado o dever de prestar contas, a ação por meio da qual o interessado exige-as desdobra-se em duas fases: "[n]a primeira, o autor busca a condenação do réu na obrigação de prestar contas; na segunda, por sua vez, serão julgadas e apreciadas as contas apresentadas, fixando-se o saldo devido, se houver.' (REsp 707.646/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, DJe 14/12/2009). (...) 4. Recurso especial parcialmente provido. (g.n.) (STJ, REsp 1483855/PE, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 25/04/2017, DJe 26/05/2017) PROCESSO CIVIL. AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS. INÍCIO DA SEGUNDA FASE. INTIMAÇÃO PARA APRESENTAR CONTAS SOMENTE POSSÍVEL APÓS O TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA QUE PÕE FIM À PRIMEIRA FASE. NULIDADE. ALEGAÇÃO NO PRIMEIRA OPORTUNIDADE DE SE MANIFESTAR NOS AUTOS. INOCORRÊNCIA DE PRECLUSÃO. ART. 245, CPC. 1. A segunda fase da ação de prestação de contas só pode ter início após o trânsito em julgado da sentença que decide pela obrigação de apresentar contas. Precedente. 2. Segundo orientação contida no artigo 245 do Código de Processo Civil, se a parte aponta a nulidade na primeira oportunidade que teve de falar nos autos, não há falar em preclusão. 3. Recurso especial conhecido e provido. (g.n.) (STJ, REsp 1129498/PB, Rel. Ministro FERNANDO GONÇALVES, QUARTA TURMA, julgado em 13/04/2010, DJe 27/04/2010) AGRAVO LEGAL. AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS. LANÇAMENTOS EM CONTA CORRENTE. DIREITO DO CORRENTISTA SOLICITAR JUDICIALMENTE INFORMAÇÕES AO BANCO ACERCA DOS VALORES LANÇADOS. DÚVIDAS. APRESENTAÇÃO DE EXTRATOS. DOCUMENTOS APRESENTADOS PELO BANCO QUANDO DA CONTESTAÇÃO. INSUFICIÊNCIA EM VIRTUDE DA FALTA DE DISCRIMINAÇÃO PORMENORIZADA DOS ENCARGOS E LANÇAMENTOS COBRADOS. I - O correntista tem direito de solicitar informações acerca dos lançamentos realizados unilateralmente pelo banco em sua conta-corrente a fim de verificar a correção dos valores lançados, independentemente do fornecimento de extratos de movimentação financeira a ele enviados mensalmente. Entendimento cristalizado na Súmula 259/STJ. II - Um dos objetivos da ação de prestação de contas é exatamente esclarecer as dúvidas do cliente a respeito dos critérios aplicados pelo banco quando da cobrança do débito, uma vez que não é possível se exigir deste uma pormenorização rigorosa dos pontos que lhe apresentam duvidosos durante a relação mantida. III - A instituição financeira, quando da apresentação de sua contestação, trouxe aos autos documentos através dos quais sustentou ter satisfeito a prestação de contas. IV - A consulta resumida do débito da autora obtida junto ao "Sistema de Aplicações - Dados Gerais do Contrato" da ré, os extratos retirados de tela de computador da referida instituição financeira demonstrando, de maneira bastante resumida, a movimentação mensal da conta corrente do agravado nos meses de março/2007 a junho/2007 e agosto/2007, bem como os contratos celebrados entre as partes, com suas cláusulas gerais, não se prestam para satisfazer a prestação de contas, uma vez que não trazem em seu bojo, de maneira pormenorizada e explicativa, a discriminação dos lançamentos e encargos cobrados pela instituição financeira mês a mês. V - Meros apontamentos de valores unilaterais, sem qualquer esclarecimento acerca da forma como se chegou a tais valores, não se prestam para satisfazer a prestação de contas. VI - Condenação mantida para o fim de determinar que a ré preste contas, no prazo legal, sob pena de não lhe ser lícito impugnar as que o autor apresentar (art. 915, §2º do CPC). VII - Agravo legal improvido. (g.n.) (TRF 3ª Região, SEGUNDA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1337332 - 0019121-81.2007.4.03.6100, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL COTRIM GUIMARÃES, julgado em 04/09/2012, e-DJF3 Judicial 1 DATA:13/09/2012) No que concerne à alegação de ilegitimidade passiva da Caixa Econômica Federal - CEF, cabe salientar que na condição de depositária das quantias que lhe são entregues sob a sua confiança, tem o dever de zelar pela manutenção dos valores e restituí-los, quando solicitados, consoante o disposto no art. 629 do Código Civil. Desta forma, resta clara a legitimidade da Caixa Econômica Federal - CEF, para figurar no polo passivo da ação. Superada a matéria preliminar, passo ao exame do mérito. A Constituição Federal, em seu art. 5º, inciso XXII, garante o direito de propriedade, assegurando que ninguém será privado de seus bens sem o devido processo legal (art. 5º, inciso LIV). O contrato de depósito em dinheiro (depósitos populares), pactuado entre a parte autora e a Caixa Econômica Federal (fls. 27/34), constitui direito de propriedade pertencente ao seu titular, sendo insuscetível, portanto, à incidência da prescrição ou decadência, pois o mencionado direito não pode ser extinto pelo decurso de determinado prazo fixado em lei. Ademais, insta consignar que nos termos § 1º do art. 2º da Lei Federal nº 2.313/54, os depósitos populares são imprescritíveis. O depósito bancário, com remuneração, é um negócio jurídico de trato sucessivo, portanto, antes do seu encerramento não há início do prazo prescricional. Saliente-se, ainda, que a ausência de depósitos ou retiradas por parte do titular, mesmo durante longo período de tempo, não pressupõe a extinção da conta. A parte ré na qualidade de agente financeiro responsável pela administração do mencionado depósito, à época da celebração do contrato, se obrigou a gerir a conta da parte autora indefinitivamente, sem nenhum prazo estipulado, assegurando ao depositante o direito de retirar, em qualquer tempo, a quantia depositada e seus juros capitalizados (fl. 34, item 15). Com efeito, é inadmissível a expropriação dos depósitos em razão da ausência de recadastramento da conta num determinado lapso temporal fixado por norma infraconstitucional (Leis nºs 9.526/97 e 9.814/99), sob pena de ofensa ao direito de propriedade e ao princípio da dignidade da pessoa humana previsto no art. 1º, inciso III da Constituição Federal. Neste sentido, é a jurisprudência dominante do Colendo Superior Tribunal de Justiça e deste Egrégio Tribunal Regional Federal da 3º Região: CAUTELAR DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS. DEPÓSITOS POPULARES. CONTA POUPANÇA. PRESCRIÇÃO. ART. 2º, § 1º, DA Lei 2.313/54. 1 - A jurisprudência deste Tribunal Superior entende imprescritível a ação para reclamar os créditos dos depósitos de poupança, nos termos do artigo 2º da Lei nº 2.313/54, afastando-se a incidência dos Arts. 177 e 178, § 10, III, do CCB/1916. Neste sentido: REsp 710.471/SC, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, TERCEIRA TURMA, julgado em 21/11/2006, DJ 04/12/2006 p. 300; REsp. n. 686.438/RS, relator Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, DJ de 12.2.2007, entre outros. (g.n.) 2 - Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ, AgRn no Ag nº 640075/RS, Rel. Ministro VASCO DELLA GIUSTINA (Desembargador Convocado do TJ/RS), julgado em 27/10/2009, DJe 09/11/2009). "AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. DEPÓSITOS POPULARES. RESTITUIÇÃO DE VALORES. PRETENSÃO IMPRESCRITÍVEL. ART. 2º, § 1º, DA LEI N.º 2.313/64. NORMA ESPECÍFICA. INAPLICABILIDADE DO CÓDIGO CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO." (g.n.) (STJ, AgRg no REsp nº 1.162.326/RJ, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, julgado em 12/05/2012, DJe 21/05/2012). Contas de depósitos populares. Movimentação por caderneta. Restituição devida. Cômputo da correção monetária desde a lei que a instituiu. Ausência de prescrição nos termos da Lei n° 2.313/54. 1. O pedido de restituição de depósitos populares está coberto pelo § 1º do art. 2º da Lei nº 2.313/54, sendo, portanto, imprescritível. 2. Tratando-se de contas de depósitos populares com movimentação por caderneta, impõe-se a restituição dos valores depositados, computando-se a correção monetária desde a sua instituição pela Lei n° 4.357/64. 3. Recurso especial não conhecido. (g.n.) (STJ, REsp nº 726304/RS, Rel. Min. CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, julgado em 17/10/2006, DJe 17/10/2006). PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. SALDOS DE CONTA POUPANÇA NÃO RECADASTRADA. TRANSFERÊNCIA DO BANCO DEPOSITÁRIO PARA O BACEN. INTEGRAÇÃO AO TESOURO NACIONAL. LEI Nº 9.526/97. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. DIREITO À DEVOLUÇÃO INTEGRAL. ACRÉSCIMOS LEGAIS. HONORÁRIOS RECURSAIS: NÃO CABIMENTO. INVERÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS. 1. Cinge-se a questão sobre a devolução do valor depositado em conta poupança ao respectivo titular (espólio), de que foi privado em face de não atualização do cadastro desta, nos termos do disposto na Lei nº 9.526/97, sendo repassado este valor do banco depositário ao Tesouro Nacional na forma do estabelecido no artigo 2º da referida Lei. 2. Ocorre que, em 24 de agosto de 1999, foi editada a Lei nº 9.814, a qual, ao incluir o art. 4º-A na Lei nº 9.526/97, prorrogou o prazo para reclamação junto às instituições financeiras dos valores repassados ao Tesouro Nacional para 31 de dezembro de 2002, autorizando ao Banco Central do Brasil a debitar na conta do Tesouro Nacional os valores a serem repassados às instituições financeiras. (...) 5. Por outro aspecto, insta salientar que o não cumprimento do prazo para o recadastramento das contas não gera a presunção de ilicitude dos recursos, os quais foram apropriados pelo Tesouro Nacional tão somente porque seu titular deixou de se recadastrar, contrariando, assim, o princípio do devido processo legal. Precedentes. 6. Destarte, restou comprovada a existência de conta e saldo bancário, de titularidade do autor (espólio), bem como, o recolhimento do valor ao Tesouro Nacional. Assim, assiste razão ao autor (espólio) para reaver o numerário expropriado, devidamente corrigido nos moldes estabelecidos pelo Manual de Cálculo da Justiça Federal. (...) 8. Apelação provida. (TRF3, AC nº 0901151-14.2005.4.03.6100, DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA, julgado em 24/04/2018, D.E. 07/05/2018) DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL - DEPÓSITO EM CADERNETA DE POUPANÇA - RESTITUIÇÃO DO VALOR AO TITULAR - PRESCRIÇÃO AFASTADA - SENTENÇA MANTIDA - APELO IMPROVIDO. 1. Preliminar de prescrição do direito de restituição do valor depositado em conta poupança rejeitada, uma vez que os depósitos populares são imprescritíveis, nos termos do artigo 2º, § 1º, da Lei nº 2.313/54.2. 2. A instituição bancária deve restituir o valor depositado em caderneta de poupança - de que tinha a guarda e que desapareceu - e devidamente corrigido (Resp 583.360/RS). 3. Preliminar rejeitada. Apelação improvida. (g.n.) (TRF3, AC nº 0002298-24.2001.4.03.6106/SP, DESEMBARGADOR FEDERAL JOHONSOM, julgado em 16/11/2010, D.E. 29/11/2010) DIREITO PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO E ECONÔMICO. SALDOS DE CONTAS BANCÁRIAS NÃO RECADASTRADAS. TRANSFERÊNCIA DO BANCO DEPOSITÁRIO PARA O BACEN. INTEGRAÇÃO AO TESOURO NACIONAL. LEI Nº 9.526/97 E LEI Nº 9.814/99. PERDA DE OBJETO: SENTENÇA REFORMADA. LEGITIMIDADE PASSIVA DO BACEN E DA UNIÃO FEDERAL. TITULARIDADE DE SALDOS. INVALIDADE DA PRESUNÇÃO DE ABANDONO. USURPAÇÃO DE PROPRIEDADE PRIVADA. DIREITO À DEVOLUÇÃO INTEGRAL. ACRÉSCIMOS LEGAIS. APELAÇÃO PROVIDA. (...) 3. No mérito, é de manifesta procedência o pedido formulado pelos autores, pois houve apropriação de recursos financeiros privados por ato legislativo do Estado, com base apenas e tão-somente na suposição de abandono, pela falta de recadastramento das contas, fazendo recordar o triste episódio do bloqueio dos ativos financeiros pelo Plano Collor. Tal a evidência da usurpação ilegítima da propriedade privada que a própria Lei nº 9.526/97 previu mecanismos de restituição, pela via administrativa, cujos prazos foram fixados e prorrogados depois pela Lei nº 9.814/99, sem prejuízo da via judicial. 4. Os autores, depois de publicado edital pelo BACEN, na forma do texto originário da Lei nº 9.814/99, ingressaram em Juízo, no prazo, para pleitear a devolução dos valores usurpados de suas contas bancárias e, citados os réus, não puderam, por evidente, deduzir defesa de mérito capaz de demonstrar a validade do ato de apropriação. Ainda que o BACEN tenha buscado defender a validade da presunção legal de abandono, indicando que a legislação foi editada para combater "contas fantasmas", resta evidente que a previsão genérica da lei penalizou, inclusive, pessoas cujos recursos foram expropriados apenas porque não promoveram o recadastramento, porém sem qualquer outro motivo, e substancial, que pudesse justificar o ato de força praticado. Não se pode presumir a origem ilícita ou irregular dos recursos apenas porque descumprido o prazo ou mesmo a convocação para o recadastramento das contas; nem aplicar como pena, genérica e sem devido processo legal, a perda do patrimônio depositado em contas bancárias, para sujeitar os respectivos titulares a procedimento administrativo ou judicial de restituição, como ocorrido na espécie, prática que, sem dúvida alguma, contraria princípios fundamentais da ordem democrática. 5. Comprovado, pelo próprio edital publicado e outros documentos, que os autores possuíam contas e saldos bancários, que foram recolhidos das instituições financeiras pelo BACEN e enviados ao Tesouro Nacional, legítimo é, pois, o direito à restituição integral dos valores, acrescido o principal de correção monetária desde quando praticado o ato de apropriação; além de juros de mora contados da citação (e não do trânsito em julgado, pois a hipótese não é de repetição de indébito fiscal) e calculados, na forma do artigo 405 e 406 do NCC, de acordo com a taxa prevista para a mora fiscal, ou seja, com base na SELIC (artigo 13 da Lei nº 9.065/95) que não deve ser cumulada, desde quando computada, com outros índices, a título de correção monetária, sem prejuízo, porém, dos juros remuneratórios ou contratuais, como estipulados com a instituição financeira da qual resgatados os valores. Cabe, por fim, a condenação em verba honorária, que se fixa em 10% sobre o valor da condenação, nos termos do artigo 20, § 4º, do Código de Processo Civil. 6. Apelação provida. (g.n.) (TRF3, AC nº 2004.03.99.037443-1, DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS MUTA, julgado em 14/03/2007, D.E. 21/03/2007) No caso, verifica-se que foi comprovada a existência do depósito realizado junto à CEF, na conta nº 7973, série A, aberta em 06.06.1967, no valor de NCr$ 37.280,00, em nome da parte autora (fls. 27/34), restando, assim, demonstrado o fato constitutivo do seu direito. Desta feita, a Caixa Econômica Federal deverá prestar contas sobre o mencionado depósito, nos termos do art. 915, § 2º do CPC/73, vigente à época da propositura da ação, como bem decidiu o Juízo a quo. Ante o exposto, rejeito a matéria preliminar e nego provimento à apelação.
O Exmo. Desembargador Federal Carlos Francisco: Com a devida vênia, divirjo do voto do e.Relator para acompanhar a divergência apontada pelo e.Desembargador Federal Valdeci dos Santos.
Assim, rejeito a matéria preliminar e nego provimento à apelação.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0007341-86.2008.4.03.6108
RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. WILSON ZAUHY
APELANTE: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL
Advogado do(a) APELANTE: JOSE ANTONIO ANDRADE - SP87317-A
APELADO: WANDERLEI FERNANDES
Advogado do(a) APELADO: ARMANDO PEDRO NETO - SP256093
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Da decadência
A Lei 9.814/99 estabeleceu o seguinte em seu artigo 1º:
"Art. 1o A Lei no 9.526, de 8 de dezembro de 1997, passa a vigorar acrescida do seguinte dispositivo:
"Art. 4º-A. Os recursos existentes nas contas de depósito, de que trata o art. 1o desta Lei, ou que tenham sido repassados ao Tesouro Nacional, nos termos do seu art. 2o, poderão ser reclamados junto às instituições financeiras, nos termos dos respectivos contratos, até 31 de dezembro de 2002."
O artigo 1º da Lei 9.526/97 dispôs:
"Art. 1º Os recursos existentes nas contas de depósitos, sob qualquer título, cujos cadastros não foram objeto de atualização, na forma das Resoluções do Conselho Monetário Nacional nºs 2.025, de 24 de novembro de 1993, e 2.078, de 15 de junho de 1994, somente poderão ser reclamados, junto às instituições depositárias, até 28 de novembro de 1997."
Como se nota, de fato foram estabelecidos prazos para recadastramento de contas de depósito, bem como para reclamar os recursos junto às instituições financeiras.
O autor não mostrou ter reclamado a devolução dos depósitos nas contas perante a CEF no prazo fixado em lei, o que denota a ocorrência de decadência por consubstanciar ato constitutivo do seu direito em questão que foi extinto pela inércia do titular.
Ainda que à época do depósito o apelado fosse incapaz, antes do período determinado em lei já era maior e capaz para cumprimento de tal determinação.
Na mesma linha aqui adotada:
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. CADERNETA DE POUPANÇA. RECADASTRAMENTO PELA LEI 9.526/1997. INÉRCIA. TRANSFERÊNCIA DOS VALORES AO TESOURO NACIONAL. EXISTENCIA DE SALDOS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. DANOS INEXISTENTES.
1. A hipótese é de apelação interposta pela Caixa Econômica Federal contra a sentença que, em ação ordinária, julgou procedente os pedidos formulados pelo autor, fixando indenização por danos morais e materiais.
2. As Resoluções do Conselho Monetário Nacional 2025/93 e 2078/94 determinaram aos bancos instalados no país que recadastrassem todas as contas de depósito então existentes, inclusive com a confecção de novas fichas, exigindo a comprovação e preenchimento de dados antes não exigidos, com a presença do correntista na Agência para assinar as novas fichas, tudo objetivando impedir a "lavagem" de dinheiro e a evasão fiscal, com a adequada identificação dos titulares, atrelados ao respectivo CPF.
3. "A caderneta de poupança é um típico contrato de depósito, conceituado no campo do direito civil no artigo 627, obrigando-se aquele que detém a coisa a restituí-la ao depositante quando solicitado. Todavia, no depósito bancário há uma especialidade, pois ao contrário do instituto civil, nesta modalidade ocorre a transferência da propriedade dos valores para a instituição financeira, não sendo correto, por conseguinte, falar em confisco ou em violação ao direito constitucional de propriedade (art. 5º, XXII, CF)". Precedente: (TRF3, AC 00260065320034036100, Desembargadora Federal Cecilia Marcondes, - Terceira Turma, DJU: 30/05/2007).
4. Com a edição da Lei nº 9.526, de 08 de dezembro de 1997, resultado da conversão da MP nº 1.597/97, foi determinando aos titulares de conta-poupança que efetuassem o recadastramento nos bancos onde possuíam conta, dispondo a legislação que a inércia do titular da conta acarretaria o repasse dos valores ao Banco Central do Brasil, sendo oportunizado aos interessados prazo para que contestassem, caso contrário o BACEN repassaria os valores ao Tesouro Nacional. Precedente: TRF2, AC 200351020049534, Desembargador Federal Leopoldo Muylaert, Sexta Turma Especializada, E-DJF2R: 27/04/2010). 5. Conforme o art. 1º da Lei nº 9.526/97, os recursos existentes nas contas de depósitos, sob qualquer título, cujos cadastros não foram objeto de atualização, somente poderiam ter sido reclamados, junto às instituições depositárias, até 28 de novembro de 1997.
6. A Lei nº 9.526/97 determinou que os recursos existentes e que não fossem objetos de recadastramento, deveriam ser transferidos ao Banco Central do Brasil, que providenciaria a publicação de edital no Diário Oficial da União para que os interessados contestassem o recolhimento. Em não aparecendo os titulares, os valores seriam repassados à União Federal, que lhes daria a destinação prevista na lei (programas de reforma agrária, de natureza social e ao FGTS).
7. Nos temos do parágrafo parágrafo 3º do art. 1 da Lei nº 9.526/97, a medida em que os saldos não reclamados remanescentes fossem sendo recolhidos ao Banco Central do Brasil, este providenciaria a publicação no Diário Oficial da União de edital, estipulando prazo de trinta dias, contados da sua publicação, para que os respectivos titulares contestassem o recolhimento efetuado.
8. Com a publicação do edital, aos depositantes era concedido o prazo de 06 (seis) meses para reclamar judicialmente o direito sobre os valores. Posteriormente, o Art. 4o-A da Lei nº 9.526/97, incluído pela Lei nº 9.814/99, prorrogou o prazo para que os recursos existentes nas contas de depósito pudessem ser reclamados junto às instituições financeiras, até 31 de dezembro de 2002. Considerando-se que a ação foi proposta em 15/03/2012, mostra-se inevitável reconhecer ter ocorrido a prescrição.
9. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADI-MC nº 1715/DF, reconheceu a constitucionalidade da Lei nº 9.526/97, inclusive no que tange ao prazo prescricional.
10. Precedentes: (TRF2, AC 200551060014552, Desembargador Federal REIS FRIEDE, SÉTIMA TURMA ESPECIALIZADA, E-DJF2R: 27/08/2010; Processo 00819943320064036301, JUIZ(A) FEDERAL PETER DE PAULA PIRES, TRSP - 5ª Turma Recursal - SP, DJF3: 09/08/2011; TRF da 4ª Região. AC 200370010038039. DJ de 3.5.2006). 11. A Caixa Econômica Federal não cometeu conduta ilícita, ao contrário cumpriu os ditames previstos na Lei nº 9.526/97, de forma que o autor também não faz jus à indenização por danos morais.
12. A indenização decorrente de dano moral visa ressarcir a ofensa à honra, à imagem, a dor moral. O mero aborrecimento não pode ser alçado ao patamar de dano moral.
13. Deixa-se de fixar condenação em honorários advocatícios sucumbenciais, tendo em vista que foi deferida ao autor os benefícios da gratuidade judiciária. 14. Apelação provida.
(AC - Apelação Civel - 546583 0001641-38.2012.4.05.8500, Desembargador Federal Francisco Barros Dias, TRF5 - Segunda Turma, DJE - Data::18/10/2012 - Página::288.)
Portanto, a ausência do recadastramento implicou na perda do próprio direito material objeto da presente ação de prestação de contas.
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO à apelação para reformar a sentença recorrida para julgar extinto o processo, com resolução do mérito, com fundamento no artigo 487, inciso II, do Código de Processo Civil de 2015.
Condeno a parte autora/apelada ao pagamento de custas e horários advocatícios, estes arbitrados no importe de 10% sobre o valor da causa atualizado.
É o voto.
E M E N T A
APELAÇÃO. PROCESSUAL CIVIL. DEPÓSITOS BANCÁRIOS. AÇÃO DE EXIGIR CONTAS EM FACE DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. INTERESSE DE AGIR. LEGITIMIDADE PASSIVA DO BANCO DEPOSITÁRIO. DIREITO DE PROPRIEDADE. APELO DESPROVIDO.
1. A ação de prestação de contas, ou a ação de exigir contas, encontra previsão nos artigos 914 e seguintes do Código de Processo Civil de 1973, vigente à época de interposição da ação, que guardam correspondência com os artigos 550 e seguintes do Código de Processo Civil de 2015.
2. A relação jurídica constituída entre as partes diz respeito à comprovação da existência do depósito no valor de NCr$ 37.280,00, efetuado na conta nº 7973, série A, em 06.06.1967. De acordo com a parte autora, a Caixa Econômica Federal assumiu o compromisso de zelar pela manutenção dos valores depositados, devidamente atualizados, e restituí-los, quando requeridos.
3. Com efeito, resta afastada a preliminar de carência de ação, uma vez que a parte autora comprovou a abertura da mencionada conta (fls. 31/33), tendo legítimo interesse em obter a prestação jurisdicional. Precedente do C. STJ.
4. Vale destacar que na ação de prestação de contas discute-se a própria transparência na gestão realizada pela instituição bancária, respeitados os marcos do contrato firmado entre as partes e demais normas que regulamentam a relação jurídica em questão. Na primeira fase desta ação o autor pretende a condenação da CEF à prestação de contas sobre o depósito realizado, e somente após o trânsito em julgado da sentença que reconhece a obrigação, tem início a segunda fase da ação, na qual serão apreciadas as contas apresentadas pela parte ré, inclusive o pedido de inclusão dos expurgos inflacionários.
5. Assim, a ação de prestação de contas é o meio processual adequado para a parte autora compelir a instituição financeira a esclarecer a movimentação de sua conta, visando à comprovação da existência dos depósitos. Precedente do C. STJ e desta E. Corte.
6. No que concerne à alegação de ilegitimidade passiva da Caixa Econômica Federal - CEF, cabe salientar que na condição de depositária das quantias que lhe são entregues sob a sua confiança, tem o dever de zelar pela manutenção dos valores e restituí-los, quando solicitados, consoante o disposto no art. 629 do Código Civil. Desta forma, resta clara a legitimidade da Caixa Econômica Federal - CEF, para figurar no polo passivo da ação.
7. A Constituição Federal, em seu art. 5º, inciso XXII, garante o direito de propriedade, assegurando que ninguém será privado de seus bens sem o devido processo legal (art. 5º, inciso LIV). O contrato de depósito em dinheiro (depósitos populares), pactuado entre a parte autora e a Caixa Econômica Federal (fls. 27/34), constitui direito de propriedade pertencente ao seu titular, sendo insuscetível, portanto, à incidência da prescrição ou decadência, pois o mencionado direito não pode ser extinto pelo decurso de determinado prazo fixado em lei.
8. Ademais, insta consignar que nos termos § 1º do art. 2º da Lei Federal nº 2.313/54, os depósitos populares são imprescritíveis. O depósito bancário, com remuneração, é um negócio jurídico de trato sucessivo, portanto, antes do seu encerramento não há início do prazo prescricional. Saliente-se, ainda, que a ausência de depósitos ou retiradas por parte do titular, mesmo durante longo período de tempo, não pressupõe a extinção da conta.
9. A parte ré na qualidade de agente financeiro responsável pela administração do mencionado depósito, à época da celebração do contrato, se obrigou a gerir a conta da parte autora indefinitivamente, sem nenhum prazo estipulado, assegurando ao depositante o direito de retirar, em qualquer tempo, a quantia depositada e seus juros capitalizados.
10. É inadmissível a expropriação dos depósitos em razão da ausência de recadastramento da conta num determinado lapso temporal fixado por norma infraconstitucional (Leis nºs 9.526/97 e 9.814/99), sob pena de ofensa ao direito de propriedade e ao princípio da dignidade da pessoa humana previsto no art. 1º, inciso III da Constituição Federal. Precedentes do C. STJ e desta E. Corte.
11. Apelação a que se nega provimento.