Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0560636-02.1998.4.03.6182

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

APELANTE: CAIXA ECONOMICA FEDERAL

APELADO: FEDERACAO PAULISTA DE FUTEBOL

Advogado do(a) APELADO: QUEILA CRISTIANE GIRELLI - SP130365

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0560636-02.1998.4.03.6182

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

Advogado do(a) APELANTE: JOSE CARLOS GOMES - SP73808-A

APELADO: FEDERACAO PAULISTA DE FUTEBOL

Advogado do(a) APELADO: ADAUTO CORREA MARTINS - SP50099-A

OUTROS PARTICIPANTES:

R E L A T Ó R I O

O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO (Relator): Trata-se de recurso de apelação interposta pela União Federal e remessa necessária em face de sentença que, em sede de embargos à execução fiscal, julgou insubsistente a execução fiscal em apenso, fundamentada no não reconhecimento do vínculo empregatício entre os árbitros de futebol e a Federação Paulista de Futebol.

Aduz a apelante, preliminarmente, que a inicial dos embargos deveria ter sido indeferida "vez que o embargante não juntou à inicial os documentos supostamente comprobatórios de recolhimentos do FGTS". No mérito, afirma que os débitos em cobro foram exaustivamente debatidos no procedimento administrativo, de forma que devem permanecer hígidos.

Sem contrarrazões, subiram os autos.

É o breve relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0560636-02.1998.4.03.6182

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

Advogado do(a) APELANTE: JOSE CARLOS GOMES - SP73808-A

APELADO: FEDERACAO PAULISTA DE FUTEBOL

Advogado do(a) APELADO: ADAUTO CORREA MARTINS - SP50099-A

OUTROS PARTICIPANTES:

V O T O

O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO (Relator): Inicialmente, tendo em vista que o objeto dos presentes embargos é justamente a desnecessidade de recolhimento dos valores ao FGTS, afasto a preliminar aventada pela apelante.

Quanto ao tema de mérito, lembro que, desde 2001, passaram a existir três contribuições ao FGTS: 1ª) com natureza de direito fundamental do trabalhador (prevista no art. 7º, III, da Constituição, e na Lei 8.036/1990), depositada pelo empregador na Caixa Econômica Federal – CEF, na proporção de 8% sobre o salário, cujo saldo poderá ser movimentado pelo empregado-titular da conta vinculada em casos específicos; 2ª) com natureza jurídica de tributo, na espécie contribuição social geral transitória (art. 1º da Lei Complementar 110/2001), recolhida aos cofres da União Federal por empregadores, à alíquota de 10% sobre o montante de todos depósitos nas contas vinculadas do FGTS, devida na hipótese de demissão sem justa causa; 3ª) também com natureza tributária de contribuição social geral transitória (art. 2º da Lei Complementar 110/2001), recolhida aos cofres da União Federal por empregadores, na ordem de 0,5% sobre os rendimentos. Atualmente, as imposições feitas nos moldes do art. 1º e do art. 2º da Lei Complementar 110/2001 estão extintas.

O caso dos autos cuida da contribuição ao FGTS com natureza de direito fundamental do trabalhador, a respeito do que o art. 7º, III, da Constituição não descreveu o campo material de incidência: 

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
....
III - fundo de garantia do tempo de serviço;
É verdade que discricionariedade possui limites jurídicos, mas também é certo que a inexistência de campo material de incidência descrito na Constituição dá ampla margem de escolha ao titular da competência para normatizar sobre FGTS. Nesses moldes, cabe ao legislador ordinário federal estabelecer os contornos dessa contribuição ao FGTS, caracterizada como direito fundamental do trabalhador.

Desde sua a criação pela Lei nº 5.107/1966, até a atual Lei nº 8.036/1990, os elementos da imposição do FGTS são essencialmente os mesmos: é ônus do empregador, que deve depositar mensalmente (atualmente, na Caixa Econômica Federal – CEF), em conta vinculada sob a titularidade de seu empregado, o correspondente a 8% sobre a remuneração paga. No prisma macroeconômico, a soma desses saldos depositados forma poupança nacional destinada a financiar múltiplas políticas públicas sociais, e no prisma microeconômico, esse saldo pode ser movimentado pelo empregado-titular da conta vinculada em casos taxativamente descritos em atos normativos de regência (p. ex., demissão sem justa causa) ou firmados pela jurisprudência.

O art. 15 da Lei nº 8.036/1990 (com alterações) contém os elementos básicos da imposição ao FGTS: 

Art. 15. Para os fins previstos nesta lei, todos os empregadores ficam obrigados a depositar, até o dia 7 (sete) de cada mês, em conta bancária vinculada, a importância correspondente a 8 (oito) por cento da remuneração paga ou devida, no mês anterior, a cada trabalhador, incluídas na remuneração as parcelas de que tratam os arts. 457 e 458 da CLT e a gratificação de Natal a que se refere a Lei nº 4.090, de 13 de julho de 1962, com as modificações da Lei nº 4.749, de 12 de agosto de  HYPERLINK "http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L4749.htm"1965.                (Vide Lei nº 13.189, de 2015) 
§ 1º Entende-se por empregador a pessoa física ou a pessoa jurídica de direito privado ou de direito público, da administração pública direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, que admitir trabalhadores a seu serviço, bem assim aquele que, regido por legislação especial, encontrar-se nessa condição ou figurar como fornecedor ou tomador de mão-de-obra, independente da responsabilidade solidária e/ou subsidiária a que eventualmente venha obrigar-se.
§ 2º Considera-se trabalhador toda pessoa física que prestar serviços a empregador, a locador ou tomador de mão-de-obra, excluídos os eventuais, os autônomos e os servidores públicos civis e militares sujeitos a regime jurídico próprio.
§ 3º Os trabalhadores domésticos poderão ter acesso ao regime do FGTS, na forma que vier a ser prevista em lei.
§ 4º  Considera-se remuneração as retiradas de diretores não empregados, quando haja deliberação da empresa, garantindo-lhes os direitos decorrentes do contrato de trabalho de que trata o art. 16.          (Incluído pela Lei nº 9.711, de 1998)
§ 5º  O depósito de que trata o caput deste artigo é obrigatório nos casos de afastamento para prestação do serviço militar obrigatório e licença por acidente do trabalho.             (Incluído pela Lei nº 9.711, de 1998)
§ 6º  Não se incluem na remuneração, para os fins desta Lei, as parcelas elencadas no § 9 HYPERLINK "http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8212cons.htm"º HYPERLINK "http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8212cons.htm" do art. 28 da Lei n HYPERLINK "http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8212cons.htm"º HYPERLINK "http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8212cons.htm" 8.212, de 24 de julho de 1991.         (Incluído pela Lei nº 9.711, de 1998)
§ 7o Os contratos de aprendizagem terão a alíquota a que se refere o caput deste artigo reduzida para dois por cento.     

Ainda que o conceito de "trabalhador", utilizado pelo art. 15, §2º, da Lei nº 8.036/1990 possa alcançar mais prestadores além dos empregados, por certo não abrange autônomos, eventuais e servidores públicos (civis e militares, sujeitos a regime próprio).

As verbas controvertidas nos presentes autos dizem respeito à incidência ou não de contribuições ao FGTS sobre os numerários pagos aos árbitros de futebol, sobre o que a jurisprudência firmou-se no sentido de inexistir vínculo empregatício entre os mesmos e as Federações de Futebol, caracterizando-os como trabalhadores autônomos: 

"RECURSO DE REVISTA - VÍNCULO DE EMPREGO – ÁRBITRO DE FUTEBOL – NÃO-CARACTERIZAÇÃO. É sabido que a atividade desempenhada pelo árbitro de futebol, em face da própria natureza do serviço, adquire cunho, eminentemente, autônomo, por não exercer a federação qualquer direção, controle ou aplicação de penas disciplinares na execução do trabalho, tão-somente o administra. O árbitro, no campo de futebol, é autoridade máxima no comando da partida de futebol, não recebendo ordens superiores da entidade desportiva, apenas devendo observar e fazer cumprir as regras do jogo, daí a conclusão pelo exercício da atividade com autonomia plena. Nesse contexto, torna-se inviável a constatação dos elementos fático-jurídicos caracterizadores da relação de emprego, sobretudo a subordinação jurídica, o que diferencia a figura do trabalhador autônomo do empregado. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-118340-84.1997.5.02.0014, 1ª Turma, Relator Ministro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, DEJT 06/10/2008).

"ÁRBITRO DE FUTEBOL. VÍNCULO DE EMPREGO COM A FEDERAÇÃO. Desconfigurado vínculo de emprego com auxiliar de árbitro de futebol, por ausência dos requisitos do art. 3º da CLT. Inexistência de afronta de preceito de lei e dissonância temática. Recurso de Revista não conhecido" (RR-664864-41.2000.5.02.5555, 2ª Turma, Relator Ministro Jose Luciano de Castilho Pereira, DEJT 01/04/2005).

"ÁRBITRO DE FUTEBOL. VÍNCULO EMPREGATÍCIO. INDEFERIMENTO. No caso sub judice, o autor, em interrogatório, admitiu a forma da prestação dos serviços: sem onerosidade para a ré em certos eventos; labor eventual; sem subordinação jurídica; sem pessoalidade. Soma-se a isto o fato de que o demandante optou autonomamente, sem prestar maiores esclarecimentos à reclamada (FPF), por não fazer mais parte do quadro de arbitragem paulista (a inscrição deve ser anual; e ele não renovou), sendo que o obreiro não possuía vinculação exclusiva com a ré, que não era sua única fonte de rendimentos. Assim, impõe-se a manutenção do indeferimento da sentença. Recurso do autor não provido". (ROT 1001382-18.2016.5.02.0083, 8ª Turma, Relator Juiz Celso Ricardo Peel Furtado de Oliveira, DEJT 24/10/2017).

No mesmo sentido, a Lei 9.615/1998 (Lei Pelé) dispôs que os árbitro e seus auxiliares não terão qualquer vínculo empregatício com as entidades desportivas diretivas onde atuarem. A redação do dispositivo é a seguinte:

Art. 88.  Os árbitros e auxiliares de arbitragem poderão constituir entidades nacionais, estaduais e do Distrito Federal, por modalidade desportiva ou grupo de modalidades, objetivando o recrutamento, a formação e a prestação de serviços às entidades de administração do desporto.                  (Redação dada pela Lei nº 12.395, de 2011).
Parágrafo único. Independentemente da constituição de sociedade ou entidades, os árbitros e seus auxiliares não terão qualquer vínculo empregatício com as entidades desportivas diretivas onde atuarem, e sua remuneração como autônomos exonera tais entidades de quaisquer outras responsabilidades trabalhistas, securitárias e previdenciárias. 

 Dessa forma, inexistindo relação empregatícia entre a Federação Paulista de Futebol e os árbitros, não há que incidir o débito fundiário.

Diante do exposto, nego provimento à apelação e à remessa necessária.

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

CONTRIBUIÇÃO AO FGTS. DIREITO FUNDAMENTAL DO TRABALHADOR. ÁRBITRO DE FUTEBOL. RELAÇÃO DE EMPREGO. FEDERAÇÃO DE FUTEBOL. DESCARACTERIZAÇÃO. RECURSO DESPROVIDO.

- Em razão da inexistência de delimitação material prevista no art. 7º, III, da Constituição, cabe ao legislador ordinário federal estabelecer os contornos da contribuição ao FGTS, caracterizada como direito fundamental do trabalhador, tema atualmente tratado no art. 15 da Lei nº 8.036/1990.

- Ainda que o conceito de "trabalhador", utilizado pelo art. 15, §2º, da Lei nº 8.036/1990 possa alcançar mais prestadores além dos empregados, por certo não abrange autônomos, eventuais e servidores públicos (civis e militares, sujeitos a regime próprio).

- As verbas controvertidas nos presentes autos dizem respeito à incidência ou não de contribuições ao FGTS sobre os numerários pagos aos árbitros de futebol, sobre o que a jurisprudência firmou-se no sentido de inexistir vínculo empregatício entre os mesmos e as Federações de Futebol, caracterizando-os como trabalhadores autônomos. No mesmo sentido, a Lei nº 9.615/1998 (Lei Pelé) dispôs que os árbitros e seus auxiliares não terão qualquer vínculo empregatício com as entidades desportivas diretivas onde atuarem.

- Remessa necessária e apelação desprovidas.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Segunda Turma decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação e à remessa necessária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.