Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5011394-30.2019.4.03.0000

RELATOR: Gab. 01 - DES. FED. VALDECI DOS SANTOS

AGRAVANTE: LUSITANO INDUSTRIA E COMERCIO DE EMBALAGENS PLASTICAS EIRELI, ANSELMO ASSAD ALCICI FILHO, JULIANA ALCICI, SUELI APARECIDA PEREIRA DE MORAES

Advogado do(a) AGRAVANTE: CARLOS ROBERTO DENESZCZUK ANTONIO - SP146360-A
Advogado do(a) AGRAVANTE: CARLOS ROBERTO DENESZCZUK ANTONIO - SP146360-A
Advogado do(a) AGRAVANTE: CARLOS ROBERTO DENESZCZUK ANTONIO - SP146360-A
Advogado do(a) AGRAVANTE: CARLOS ROBERTO DENESZCZUK ANTONIO - SP146360-A

AGRAVADO: CAIXA ECONOMICA FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5011394-30.2019.4.03.0000

RELATOR: Gab. 01 - DES. FED. VALDECI DOS SANTOS

AGRAVANTE: LUSITANO INDUSTRIA E COMERCIO DE EMBALAGENS PLASTICAS EIRELI, ANSELMO ASSAD ALCICI FILHO, JULIANA ALCICI, SUELI APARECIDA PEREIRA DE MORAES

Advogado do(a) AGRAVANTE: CARLOS ROBERTO DENESZCZUK ANTONIO - SP146360-A
Advogado do(a) AGRAVANTE: CARLOS ROBERTO DENESZCZUK ANTONIO - SP146360-A
Advogado do(a) AGRAVANTE: CARLOS ROBERTO DENESZCZUK ANTONIO - SP146360-A
Advogado do(a) AGRAVANTE: CARLOS ROBERTO DENESZCZUK ANTONIO - SP146360-A

AGRAVADO: CAIXA ECONOMICA FEDERAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

Trata-se de embargos de declaração opostos pela parte agravante contra o v. acórdão assim ementado:

 

AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. SUSPENSÃO. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. AVALISTAS. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO DESPROVIDO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO PREJUDICADOS

1. O C. STJ já decidiu, sob a sistemática dos recursos repetitivos que “não há falar em suspensão da execução direcionada a codevedores ou devedores solidários pelo só fato de o devedor principal ser sociedade cuja recuperação foi deferida, pouco importando se o executado é também sócio da recuperanda ou não, uma vez não se tratar de sócio solidário”.

2. Agravo de instrumento a que se nega provimento. Embargos de declaração prejudicados.

 

A parte embargante alega, em síntese, que o v. acórdão padece de omissão, uma vez que “não considerou os argumentos apresentados pela Agravante, inclusive posicionamento, no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, diverso do utilizado no julgamento do Agravo de Instrumento, o que indica clara mudança de posicionamento em relação ao exarado no Acórdão embargado”.

Requer o acolhimento dos embargos de declaração para que sejam sanados os vícios apontados e para que lhes sejam atribuídos efeitos infringentes.

Sem manifestação da parte agravada.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 


AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5011394-30.2019.4.03.0000

RELATOR: Gab. 01 - DES. FED. VALDECI DOS SANTOS

AGRAVANTE: LUSITANO INDUSTRIA E COMERCIO DE EMBALAGENS PLASTICAS EIRELI, ANSELMO ASSAD ALCICI FILHO, JULIANA ALCICI, SUELI APARECIDA PEREIRA DE MORAES

Advogado do(a) AGRAVANTE: CARLOS ROBERTO DENESZCZUK ANTONIO - SP146360-A
Advogado do(a) AGRAVANTE: CARLOS ROBERTO DENESZCZUK ANTONIO - SP146360-A
Advogado do(a) AGRAVANTE: CARLOS ROBERTO DENESZCZUK ANTONIO - SP146360-A
Advogado do(a) AGRAVANTE: CARLOS ROBERTO DENESZCZUK ANTONIO - SP146360-A

AGRAVADO: CAIXA ECONOMICA FEDERAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

Os embargos de declaração são cabíveis para corrigir eventual contradição, obscuridade ou omissão do acórdão (artigo 1022 do Código de Processo Civil).

Com efeito, não houve qualquer vício sanável na via dos embargos declaratórios.

Depreende-se do recurso de agravo interposto (ID 59133188) que a causa de pedir encontra-se assim delimitada, in verbis:

 

[...] a demanda executiva ser imediatamente suspensa, por força da r. decisão que concomitantemente deferiu o processamento da recuperação judicial da Lusitano e determinou a suspensão de todas as ações e execuções em trâmite em face tanto da devedora principal como dos credores particulares dos sócios solidários, nos termos do art. 6º, caput, da Lei 11.101/05 (“LFRE”) [...].

Todavia, em que pese o comando judicial juntado na peça tenha como fundamento para suspensão o art. 6º da Lei 11.101/05, o v. acórdão embargado foi expresso, no sentido de que o C. STJ, em sede de recurso repetitivo, decidiu acerca da interpretação da referida norma federal, in verbis:

 

[...].

O C. STJ já decidiu, sob a sistemática dos recursos repetitivos que “não há falar em suspensão da execução direcionada a codevedores ou devedores solidários pelo só fato de o devedor principal ser sociedade cuja recuperação foi deferida, pouco importando se o executado é também sócio da recuperanda ou não, uma vez não se tratar de sócio solidário”.

Segue a ementa:

RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ N. 8/2008. DIREITO EMPRESARIAL E CIVIL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. PROCESSAMENTO E CONCESSÃO. GARANTIAS PRESTADAS POR TERCEIROS. MANUTENÇÃO. SUSPENSÃO OU EXTINÇÃO DE AÇÕES AJUIZADAS CONTRA DEVEDORES SOLIDÁRIOS E COOBRIGADOS EM GERAL. IMPOSSIBILIDADE. INTERPRETAÇÃO DOS ARTS. 6º, CAPUT, 49, § 1º, 52, INCISO III, E 59, CAPUT, DA LEI N. 11.101/2005.

1. Para efeitos do art. 543-C do CPC: "A recuperação judicial do devedor principal não impede o prosseguimento das execuções nem induz suspensão ou extinção de ações ajuizadas contra terceiros devedores solidários ou coobrigados em geral, por garantia cambial, real ou fidejussória, pois não se lhes aplicam a suspensão prevista nos arts. 6º, caput, e 52, inciso III, ou a novação a que se refere o art. 59, caput, por força do que dispõe o art. 49, § 1º, todos da Lei n. 11.101/2005".

2. Recurso especial não provido.

(REsp 1333349/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 26/11/2014, DJe 02/02/2015)

[...].

Referido entendimento, ademais, encontra-se sumulado pela Corte Superior, in verbis:

 

A recuperação judicial do devedor principal não impede o prosseguimento das ações e execuções ajuizadas contra terceiros devedores solidários ou coobrigados em geral, por garantia cambial, real ou fidejussória.

(Súmula 581, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 14/09/2016, DJe 19/09/2016)

 

Assim, a parte agravante não logrou êxito em distinguir o caso dos autos em relação ao precedente, haja vista que a jurisprudência colacionada versa sobre plano de recuperação aprovado pela assembleia geral de credores e homologado judicialmente.

Todavia, depreende-se que a questão relativa à aprovação do plano de recuperação e homologação ocorreu posteriormente à r. decisão agravada (02/10/2019 e 19/11/2019), bem como foi noticiada apenas em sede de embargos de declaração, opostos em 18/02/2020 (ID 124739103), afastando a similitude da lide em relação ao julgados proferidos no âmbito do C. STJ.

Ademais, ainda que se vislumbre a possibilidade de análise do tema sob a consideração de fato superveniente (aprovação do plano pela assembleia de credores e homologação judicial), os julgados proferidos, por maioria, no âmbito da C. Terceira Turma do E. STJ, não refletem precedentes de observância obrigatória, nem mesmo entendimento pacificado, conforme se depreende das seguintes decisões, in verbis:

 

RECURSO ESPECIAL Nº 1899725 - PR (2020/0263298-8)

DECISÃO

Cuida-se de recurso especial interposto por CUIABA AGRO AVÍCOLA LTDA, FRIGORÍFICO SULBRASIL LTDA, GLOBOAVES BIOTECNOLOGIA AVÍCOLA S/A, GLOBOAVES SÃO PAULO AGROAVÍCOLA LTDA EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL, GLOBOSUÍNOS AGROPECUÁRIA S/A, INTERAVES AGROPECUÁRIA LTDA, KAEFER ADMINISTRAÇÃO E PARTICIPAÇÕES S/A, KAEFER AGRO INDUSTRIAL LTDA, KAEFER INDUSTRIAL DE ALIMENTOS LTDA e VEROK - AGRICULTURA E PECUÁRIA LTDA EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL, fundamentado nas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional.

Recurso especial interposto em: 13/06/2019.

Concluso ao gabinete em: 07/01/2021.

Ação: recuperação judicial.

Decisão interlocutória: homologou o plano de recuperação judicial das agravantes e deferiu a recuperação judicial.

Acórdão: deu parcial provimento ao agravo de instrumento interposto pela recorrida para reconhecer a ilegalidade das cláusulas que preveem a suspensão das ações e execuções propostas em face dos coobrigados e garantidores e a possibilidade de compensação de créditos, nestes termos:

AGRAVO DE INSTRUMENTO – DECISÃO QUE HOMOLOGOU O PLANO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL APROVADO EM ASSEMBLEIA GERAL DE CREDORES – RECURSO DE CREDORES. CONTROLE DE LEGALIDADE DO PLANO – POSSIBILIDADE – PEDIDO DE EXCLUSÃO DA CLÁUSULA QUE PREVÊ A SUSPENSÃO DAS AÇÕES E EXECUÇÕES CONTRA OS COOBRIGADOS E GARANTIDORES (AVALISTAS E FIADORES) – PROCEDÊNCIA – VEDAÇÃO EXPRESSA NO ARTIGO 59 DA LEI Nº 11.101/05 –SÚMULA Nº 581 DO E. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA – RECURSO PROVIDO.

(e-STJ, fls. 814/815) Embargos de Declaração: opostos pelas partes foram rejeitados.

Recurso especial: alegam violação dos arts. 49, §§ 1° e 2°, 59 e 126, da Lei 11.101/2005, bem como dissídio jurisprudencial.

Sustentam, em síntese, a validade da cláusula do plano que prevê a possibilidade de suspensão das ações ajuizadas contra a empresa e seus garantidores, na hipótese de ser aprovada pelo quórum mínimo exigido no ato da assembleia geral de credores ou pela ausência de objeções pelos credores.

RELATADO O PROCESSO, DECIDE-SE.

Julgamento: aplicação do CPC/2015.

- Da jurisprudência consolidada do STJ - Súmula 568/STJ A Segunda Seção do STJ já firmou jurisprudência em precedente repetitivo no sentido de que "A recuperação judicial do devedor principal não impede o prosseguimento das execuções nem induz suspensão ou extinção de ações ajuizadas contra terceiros devedores solidários ou coobrigados em geral, por garantia cambial, real ou fidejussória, pois não se lhes aplicam a suspensão prevista nos arts. 6º, caput, e 52, inciso III, ou a novação a que se refere o art. 59, caput, por força do que dispõe o art. 49, § 1º, todos da Lei n. 11.101/2005." (REsp 1.333.349/SP, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 26/11/2014, DJe 02/02/2015).

Esse também é o entendimento contido na Súmula 581 do STJ: "a recuperação judicial do devedor principal não impede o prosseguimento das ações e execuções ajuizadas contra terceiros devedores solidários ou coobrigados em geral, por garantia cambial, real ou fidejussória".

Na hipótese, o TJ/PR, em consonância com a referida orientação, reconheceu a ilegalidade da cláusula que prevê a suspensão das ações e execuções propostas em face dos coobrigados e garantidores, sob os seguintes fundamentos, no que interessa (e-STJ, fls. 827 e 829):

Como se vê, a suspensão da exigibilidade do crédito em face dos terceiros e garantidores (fiadores, avalistas, etc.), conforme previsto no plano de recuperação judicial das agravadas, contraria expressamente a legislação de regência.

E a novação operada pela Lei de Recuperação Judicial produz efeitos diversos daquela prevista pelo Código Civil e abrange tão somente as obrigações perante a recuperanda (daqueles créditos sujeitos a recuperação judicial).

Em outras palavras, as obrigações assumidas por terceiros e garantidores não se sujeitam à novação prevista no artigo 59 da Lei nº 11.101/05.

[...] Então, conclui-se que, ainda que o presente plano preveja a supressão das garantias (reais e fidejussórias), isso não acarretará a possibilidade de suspensão das ações e execuções propostas em face dos coobrigados e garantidores (avalistas, fiadores, etc). É que, conforme expressamente ressaltado pelo e. Ministro Marco Aurélio Bellizze, a previsão no plano de recuperação judicial de liberação das garantias reais e fidejussórias vinculará apenas as partes envolvidas –as devedoras em recuperação judicial e os credores.

Portanto, em atenção ao enunciado da Súmula nº 581 do e. Superior Tribunal de Justiça e aos precedentes daquela Corte Superior, deve ser reconhecida a ilegalidade da cláusula 24.10 na forma como formulada, uma vez que não é possível prever a suspensão das ações e execuções em face dos coobrigados e garantidores (avalistas, fiadores, etc).

Nesse sentido, não merece prosperar a irresignação dos recorrentes, incidindo, na hipótese, a Súmula 568/STJ.

Forte nessas razões, com fundamento no art. 932, IV, "a", do CPC/2015, bem como na Súmula 568/STJ, CONHEÇO do recurso especial e NEGO-LHE PROVIMENTO.

Deixo de majorar os honorários de sucumbência recursal, visto que não foram arbitrados na instância de origem.

Previno as partes que a interposição de recurso contra esta decisão, se declarado manifestamente inadmissível, protelatório ou improcedente, poderá acarretar a condenação às penalidades fixadas nos arts. 1.021, § 4º, e 1.026, § 2º, do CPC/15.

Publique-se. Intimem-se.

Brasília, 02 de fevereiro de 2021.

MINISTRA NANCY ANDRIGHI Relatora

(Ministra NANCY ANDRIGHI, 09/02/2021)

 

 

TutPrv no RECURSO ESPECIAL Nº 1820063 - RO (2019/0169031-1)

DECISÃO

1. Cuida-se de recurso especial interposto por EUZEBIO ANDRE GUARESCHI e outros contra o acórdão contra acórdão proferido pelo TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE RONDÔNIA, assim ementado:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. AFRONTA À LEGISLAÇÃO ESPECÍFICA. EXECUÇÃO CONTRA TERCEIROS GARANTIDORES. POSSIBILIDADE.

A recuperação judicial do devedor principal não impede o prosseguimento das execuções nem induz suspensão ou extinção das ações ajuizadas contra terceiros devedores solidários ou coobrigados em geral, por expressa previsão legal.

Aponta que requereram a extinção do processo em razão da aprovação do plano de recuperação judicial, que importava em baixa das garantias prestadas por fiadores e/ou avalistas, consoante previsão expressa do seu plano de recuperação judicial, o que ensejaria na EXTINÇÃO da execução, destacando que a decisão que homologou o plano transitara em julgado e que o juízo da recuperação expressamente determinou a baixa das garantias.

Afirma que "ante ao iminente risco de constrição patrimonial dos Recorrentes, com evidente possibilidade de dano irreparável (caso a execução prossiga até o leilão, venda direta ou adjudicação dos bens) bem como em razão da evidente possibilidade de provimento do Recurso Especial, os Recorrentes vem perante esta Relatoria pugnar pela atribuição de efeito suspensivo".

Aduz que "o TJRO está afastando os efeitos de decisão proferida nos autos de processo de Recuperação Judicial que está acobertada pelo manto da coisa julgada (imutável, portanto), na qual o juízo da recuperação e o próprio TJRO se manifestaram contrariamente à tese utilizada pelo Banco da Amazônia para prosseguir com os atos executórios contra avalistas e/ou fiadores".

Sustenta que em relação ao periculum in mora, o "risco de dano – este também se demonstra claro na medida em que o juízo de primeiro grau autorizou o prosseguimento do cumprimento da sentença, o que, por natureza implica na prática iminente de atos de constrição patrimonial, sendo inclusive expedidos mandados de penhora de bens".

É o relatório.

Decido.

2. Em se tratando de tutela provisória almejando a concessão de efeito suspensivo ao recurso especial, é imprescindível a demonstração do periculum in mora - que se traduz na urgência da prestação jurisdicional, no sentido de evitar que, quando do provimento final, não tenha mais eficácia o pleito deduzido em juízo -, bem como do fumus boni juris, que se reflete na viabilidade do recurso especial.

Assim, está o Relator autorizado a proceder a juízo prévio e superficial de admissibilidade recursal, de modo que, apresentando-se esse manifestamente inadmissível, improcedente ou contrário à jurisprudência de Tribunal Superior, o seu aparente insucesso prejudica a admissibilidade do pedido cautelar.

O Tribunal de origem assentou que:

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

Da análise dos autos, tenho que a decisão agravada não merece reforma, porquanto proferida de acordo com o entendimento do STJ, nos autos do REsp 1333349/SP, em decisão afeta aos recursos repetitivos, cuja ementa transcrevo a seguir:

RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543 DO CPC E RESOLUÇÃO STJ N. 8/2008. DIREITO EMPRESARIAL E CIVIL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. PROCESSAMENTO E CONCESSÃO. GARANTIAS PRESTADAS POR TERCEIROS. MANUTENÇÃO. SUSPENSÃO OU EXTINÇÃO DE AÇÕES AJUIZADAS CONTRA DEVEDORES SOLIDÁRIOS E COOBRIGADOS EM GERAL. IMPOSSIBILIDADE.

INTERPRETAÇÃO DOS ARTS. 6º. CAPUT, 49, 52, INCISO III, E 59, CAPUT, DA LEI N. 11.101/2005. 1. Para efeitos do art. 543-C do CPC: "A recuperação judicial do devedor principal não impede o prosseguimento das execuções nem induz suspensão ou extinção de ações ajuizadas contra terceiros devedores solidários ou coobrigados em geral, por garantia cambial, real ou fidejussória, pois não se lhes aplicam a suspensão prevista nos art 6º, caput, e 52, inciso III, ou a novação a que se refere o art. 59, caput, por força do que dispõe o art 49,§ 1º, todos da Lei n. 11.101/2005". 2. Recurso especial não provido. (REsp 1333349/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 26/11/2014, DJe 02/02/2015) Ficou consignado no referido julgado que "muito embora o plano de recuperação judicial opere novação das dívidas a ele submetidas, as garantias reais ou fidejussórias são preservadas, circunstância que possibilita ao credor exercer seus direitos contra terceiros garantidores e impõe a manutenção das ações e execuções aforadas em face de fiadores, avalistas ou coobrigados em geral".

Além disso, consta que o entendimento abraçado de forma unânime nas Turmas de Direito Privado vale para todas as formas de garantia prestadas por terceiros, sejam elas cambiais, reais ou fidejussórias.

Se existe qualquer cláusula prevendo em sentido contrário no Plano de Recuperação Judicial, é certo que não possui validade, porquanto embora deva ser preservada a soberania da Assembleia Geral de Credores para a aprovação do plano de recuperação judicial, essa soberania deve ser entendida com ressalvas, sendo inadmissível qualquer ofensa aos parâmetros da Lei nº 11.101/2005, que regula a recuperação judicial.

Sobre o tema, esta Câmara já se posicionou quando do julgamento do Agravo de Instrumento n. 0800261.50.2017.8.22.0000, de minha relatoria.

No caso, a pretensão dos agravantes confronta expressamente o disposto no artigo 49, §1º, da Lei 11.101/2005, in verbis :

§ 1º. "Os credores do devedor em recuperação judicial conservam seus direitos e privilégios contra os coobrigados, fiadores e obrigados de regresso."

Diante de tal contexto, é certo que a pretensão dos agravantes fere a disposição da lei específica, contrariando-a e também está em confronto com o entendimento sedimentado da Corte Superior e deste Tribunal, portanto não merece subsistir.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso e revogo o efeito suspensivo anteriormente concedido.

3. Como assinalei em voto-vista proferido no Resp 1.797.924/MT perante a Segunda Seção, com o deferimento do processamento da recuperação judicial, o magistrado, dentre outras providências, nomeia administrador judicial e determina a expedição de edital para publicação no órgão oficial, de modo a permitir a habilitação dos créditos e apresentação de objeções ao plano de recuperação judicial (art. 52, § 1º, da Lei 11.101/2005).

Segundo a jurisprudência do STJ, "no processo recuperacional, são soberanas as decisões da assembleia geral de credores sobre o conteúdo do plano de reestruturação e sobre as objeções/oposições suscitadas, cabendo ao magistrado apenas o controle de legalidade do ato jurídico, o que decorre, principalmente, do interesse público consubstanciado no princípio da preservação da empresa e consectária manutenção das fontes de produção e de trabalho" (REsp 1587559/PR, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 06/04/2017, DJe 22/05/2017).

Ademais, após intensos debates acerca da posição a ser assumida por quem, juntamente com a empresa recuperanda, figurou como coobrigado em contratos ou títulos de crédito submetidos à recuperação, o STJ, em sede de recurso repetitivo, definiu a tese de que "a recuperação judicial do devedor principal não impede o prosseguimento das execuções nem induz suspensão ou extinção de ações ajuizadas contra terceiros devedores solidários ou coobrigados em geral, por garantia cambial, real ou fidejussória, pois não se lhes aplicam a suspensão prevista nos arts. 6°, caput, e 52, inciso III, ou a novação a que se refere o art. 59, caput, por força do que dispõe o art. 49, § 1°, todos da Lei n. 11.101/2005" (REsp 1.333.349/SP, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, julgado em 26/1 1/2014, DJe 02/02/2015).

Posteriormente, tal entendimento restou sedimentado na Súm 581 do STJ: "A recuperação judicial do devedor principal não impede o prosseguimento das ações e execuções ajuizadas contra terceiros devedores solidários ou coobrigados em geral, por garantia cambial, real ou fidejussória".

Diante disso, concluiu-se que o Plano de Recuperação Judicial acaba por operar uma novação sui generis e sempre sujeita a condição resolutiva, que é o eventual descumprimento do que ficou acertado no Plano, circunstância que a diferencia, sobremaneira, daqueloutra, comum, prevista na lei civil.

Dessarte, muito embora o Plano de Recuperação Judicial opere novação das dívidas a ele submetidas, as garantias reais ou fidejussórias são preservadas, circunstância que possibilita ao credor exercer seus direitos contra terceiros garantidores e impõe a manutenção das ações e execuções aforadas em face de fiadores, avalistas ou coobrigados em geral.

Não haveria lógica no sistema se a conservação dos direitos e privilégios dos credores contra coobrigados, fiadores e obrigados de regresso (art. 49, § 1º, da Lei n. 11.101/2005) dissesse respeito apenas ao interregno temporal que medeia o deferimento da recuperação e a aprovação do Plano, cessando tais direitos após a concessão definitiva com a decisão judicial.

Portanto, mostra-se descabida a suspensão das ações, em razão do processamento da recuperação, ou a extinção, por força da alegada novação operada pelo plano, estando o credor autorizado a exercer seus direitos contra os garantidores com a mantença de ações e execuções frente a fiadores, avalistas e coobrigados em geral.

4. Já no que toca à discussão em relação à possibilidade ou não de se estabelecer, no Plano de Recuperação, cláusula de supressão das garantias reais e fidejussórias, estendendo a novação recuperatória aos coobrigados e garantidores do crédito, seja para suspensão das ações e execuções, seja para novação condicional do crédito, trata-se, essencialmente, da interpretação dos arts. 49, §§ 1° e 2°, 50, § 1° e 59 da Lei n. 11.101/2005 a ser conjugado com todo o sistema recuperacional.

Art. 49. Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos.

§ 1º Os credores do devedor em recuperação judicial conservam seus direitos e privilégios contra os coobrigados, fiadores e obrigados de regresso.

§ 2º As obrigações anteriores à recuperação judicial observarão as condições originalmente contratadas ou definidas em lei, inclusive no que diz respeito aos encargos, salvo se de modo diverso ficar estabelecido no plano de recuperação judicial.

_________________ Art. 59. O plano de recuperação judicial implica novação dos créditos anteriores ao pedido, e obriga o devedor e todos os credores a ele sujeitos, sem prejuízo das garantias, observado o disposto no § 1o do art. 50 desta Lei [Art. 50. § 1° Na alienação de bem objeto de garantia real, a supressão da garantia ou sua substituição somente serão admitidas mediante aprovação expressa do credor titular da respectiva garantia].

Dessarte, apesar da recuperação judicial do garantido (avalizado ou afiançado) não importar em nenhuma consequencia em relação aos direitos do credor contra o garante (avalista ou fiador), é possível, em razão da soberania da Assembleia de Credores sobre o conteúdo do Plano de Reestruturação, inclusive em relação às objeções/oposições suscitadas, que se estabeleça cláusula supressória das garantias, em verdadeira novação recuperacional ex lege, ainda que a proposta que ora se apresenta seja um tanto mitigada.

Isto porque, dentre os instrumentos previstos no art. 50 da LRE para a confecção do Plano de Recuperação, cujo rol é exemplificativo, pode ser incluída a tal disposição especial, em que os envolvidos (credores e devedor), diante da autonomia da vontade, venham a não mais exigir, de forma imediata, a dívida em relação aos seus garantidores e coobrigados.

Não se pode olvidar que o processo de negociação entre devedor e credores na recuperação judicial é muito diverso de uma mera negociação de direito privado, sendo fortemente regulado pela norma.

Prova disso é que "o plano aprovado pela maioria vincula a minoria de credores, numa solução incompatível com o regime de uma negociação de direito privado. Além disso, a negociação entre devedor e credores no processo de recuperação é conduzida e presidida pela autoridade judicial, que pode interferir no seu desenvolvimento, inclusive para superar o veto imposto por determinada classe de credores à aprovação do plano (art. 58, § 1.

°)" (MUNHOZ, Eduardo Secchi. Comentários à Lei de recuperação de empresas e falência. Coord. Francisco Satiro de Souza. São Paulo:

RT, 2007, p. 295).

No entanto, deve-se assinalar que eventual convolação da recuperação judicial em falência acarretará a desconstituição da novação recuperacional, com a repristinação da situação anterior, em que "os credores terão reconstituídos seus direitos e garantias nas condições originalmente contratadas, deduzidos os valores eventualmente pagos e ressalvados os atos validamente praticados no âmbito da recuperação judicial" (art. 61, § 2º, da Lei n. 11.101/2005).

Em verdade, penso que se deve adotar o meio termo entre àquelas soluções propugnadas pela Terceira Turma do STJ: a depender do tipo de garantia do crédito, poderá ser exigido ou não a concordância do credor titular, ainda que a cláusula de supressão tenha sido aprovada pelo Plano de Recuperação Judicial.

De fato, com relação à fiança, ao aval e ao direito de regresso, garantias fidejussórias (de direito pessoal), por haver expressa disposição legal e se tratar de exceção ao princípio majoritário na aprovação do Plano, elas não podem ser afastadas automaticamente.

Como sabido, em busca de maior segurança ao adimplemento do débito, os credores têm exigido do devedor certas garantias, que inclusive refletem no custo de concessão do crédito. A garantia pessoal é aquela em que terceiros se responsabilizam, acrescendo seu patrimônio, pelo pagamento da dívida.

Em relação a este tipo de garantia, por haver expressa disposição de lei – "os credores do devedor em recuperação judicial conservam seus direitos e privilégios contra os coobrigados, fiadores e obrigados de regresso (art. 49, § 1°, LREF)" –, segundo penso tornou inalcançável a modificação da garantia pela simples aprovação do Plano de Recuperação.

Deveras, a novação "não opera qualquer mudança nos direitos dos credores em relação às obrigações cambiárias (avais e endossos) de coobrigados e obrigados de regresso porque autônomas em relação à principal. Esta conclusão está em sintonia com o disposto no art. 365 do Código Civil" (NEGRÃO, Ricardo. Manual de direito comercial e de empresa. vol. 3. São Paulo, Saraiva, 2015, p. 225).

Aliás, tal dispositivo, apesar de inserido numa nova ordem recuperacional e falimentar, traz a exegese histórica da antiga concordata, segundo a qual "a concordata não produz novação, não desonera os coobrigados com o devedor, nem os fiadores deste e os responsáveis por via de regresso" (art. 148 do Decreto-Lei n° 7.661/1945).

Como pondera o escólio dos clássicos, os garantes fidejussórios continuavam a responder regressivamente, nos termos originalmente contratados e de forma integral:

TRAJANO MIRANDA VALVERDE:

A concordata não nova a obrigação, vale dizer, o credor não adquire com a concordata um novo direito. Se a concordata é rescindida, e, em conseqüência, aberta, ou reaberta a falência, o seu crédito não está sujeito a novo processo de verificação.

Continuará a figurar no passivo pelo mesmo montante, se nenhum pagamento parcial foi efetuado pelo concordatário. Terceiros interessados na concordata são, de modo geral, todos aqueles que respondem com o concordatário pelo pagamento de obrigações reguladas na concordata. Entram nesta classe não só o fiador da concordata, cuja responsabilidade é limitada às condições que formam o conteúdo da concordata, como também os coobrigados com o concordatário, seus fiadores e os obrigados por ação regressiva, cuja responsabilidade é integral, se o título ou a lei não dispõe o contrário. O artigo, a exemplo de outras legislações, declara que a concordata não desonera os coobrigados com o devedor, nem os fiadores deste e os responsáveis pela via de regresso. É a solidariedade passiva, contratual ou legal, simultânea ou sucessiva, em obrigações sujeitas aos efeitos da concordata. O decreto revogado concedia a esses co-devedores o direito de discutir a proposta da concordata, cujos efeitos repercutem, sem dúvida, no seu patrimônio. Quanto mais alta for a percentagem oferecida pelo devedor principal, o concordatário, menor será o prejuízo deles.

(Comentários à Lei de Falências, v. 2, Rio de Janeiro: Forense, 1999, pp. 262-264) _________________ PONTES DE MIRANDA:

A concordata não tem eficácia novativa, nem libera os coobrigados do devedor, nem os fiadores dos coobrigados, nem os que respondem regressivamente (1961, p. 108, § 3.470).

[...] Os coobrigados com o concordatário ficam incólumes; os credores podem ir contra eles como se nada houvesse ocorrido. Obrigados solidários, fiadores, donos de bens dados em garantia, obrigados de regresso, coobrigados cambiários e cambiariformes, todos continuam obrigados como estavam antes da concordata. Os que pagam as dívidas e se sub-rogam pessoalmente aos credores satisfeitos podem habilitar-se à percentagem concordatícia. Com a sentença que julga cumprida a concordata (sentença de cumprimento da concordata), nenhum credor, que recebeu percentagem, tem ação para haver a diferença entre o recebido e o que lhe era devido, nem subsiste crédito sem pretensão, nem obrigação natural. Se há responsabilidade de outrem, muda de figura.

O credor do concordatário e de coobrigado tem ação para desse receber todo o crédito, ou para receber o restante, se teve a percentagem concordatícia. Se o coobrigado também pediu e obteve concordata, ou se lhe foi decretada a falência , tem o credor, que recebeu a percentagem falencial, ou a percentagem que lhe coube na concordata do coobrigado, a ação para receber o restante na concordata do devedor.

O art. 27 e seus § § 1° e 2° são invocáveis, por se tratar de regras jurídicas que apenas exprimem princípios.

(Tratado de direito privado. v. 30. Rio de Janeiro: Borsoi, 1961, pp. 108-109).

No direito estrangeiro, aliás, a solução que vem sendo adotada segue essa linha de raciocínio, conforme aponta Manoel de Queiroz Pereira Calças :

Na Argentina, a Lei n° 24.522, que regulamenta os concursos e quebras, estabelece no art. 55: "Novación. En todos los casos, el acuerdo homologado importa la novación de todas las obligaciones con origen o causa anterior aI concurso. Esta novación no causa la extinción de las obligaciones deI fiador ni de los codeudores solidarios" ("Novação.

Em todos os casos, o acordo homologado importa a novação de todas as obrigações com origem ou causa anterior ao concurso. Esta novação não causa a extinção das obrigações do fiador nem dos codevedores solidários", tradução livre do autor).

[...] Em Portugal, o Código de Insolvência e da Recuperação de Empresas (Decreto-Lei n° 200/2004, de 18 de agosto), no 21T artigo, n° 4, preconiza: "As providências previstas no plano de insolvência com incidência no passivo do devedor não afectam a existência nem o montante dos direitos dos credores da insolvência contra os condevedores ou terceiros garantes da obrigação, mas estes sujeitos apenas poderão agir contra o devedor em via de regresso nos termos em que o credor da insolvência pudesse exercer contra ele os seus direitos."

[...] Na Itália, foi aprovado, em 16 de janeiro de 2006, "Il Nuovo Códice deI Fallimento e delle Altre Procedure Concorsuali" (Novo Código de Falência e de Outros Procedimentos Concursais) pelo Decreto-Lei n° 5, de 2006, que em seu art. 135 preconiza:

"(Effetti del concordato). Il concordata omologato e obbligatorio per tutti i creditori anteriori all'apertura del fallimento, compresi quelli che non hanno presentato dom anda di ammissione Ai passivo. A questi perà non si estendono le garanzie date nel concordata da terzi. I creditori conservano la loro azione per l' intero credito contro i coobbligati, i fideiussori del fallito e gli obbligati in via di regresso" ("Efeito da concordata. A concordata homologada é obrigatória para todos os credores anteriores à abertura da falência, compreendendo aqueles que não tenham apresentado pedido de admissão ao passivo. A estes, porém, não se estendem as garantias dadas na concordata por terceiro. Os credores conservam suas ações por inteiro crédito contra os coobrigados, os fiadores do falido e os obrigados pela via de regresso", tradução livre do autor).

(Revista do Advogado n° 105, de setembro de 2009, Ano XXIX, editado pela ASSP - Associação dos Advogados de São Paulo, pp. 124-125) Dessarte, na perspectiva da atual legislação e tendo em conta a exegese histórica da norma, penso que, diante da previsão normativa específica do art. 49, § 1°, devem ser mantidos os direitos, privilégios e garantias titulados pelos credores que não anuírem com a supressão de suas garantias, mercê da deliberação assemblear em sentido diverso, sendo possível, no entanto, a derrogação convencional de tal prerrogativa por se estar diante de direito disponível, tratando-se de interesse eminentemente privado.

Portanto, só há falar em eficácia da cláusula extensiva da novação aos coobrigados ("cláusula supressória") se houver manifestação do credor titular da garantia fidejussória nesse sentido, ou, ainda, que futuramente venha a existir previsão legal específica conferindo tal autorização.

No que toca à fiança, importante destacar que, apesar de se tratar de obrigação acessória que deveria seguir a sorte da principal, por opção legislativa, o fiador continuará respondendo pela dívida se o devedor estiver em recuperação judicial. A ratio, ao que parece, é porque, nos termos da norma, em aberto o concurso de credores, o benefício de ordem deverá ser afastado, por se tratar de devedor "insolvente [concordatário ou recuperando] ou falido" (CC, art. 828, III).

No ponto, com maior razão em relação ao avalista, haja vista a força dos predicados do título crédito, notadamente a sua autonomia em relação à obrigação principal, nos termos do art 32 da LUG e 899 do Código Civil.

A Segunda Seção do STJ, inclusive, firmou posicionamento de que "o aval é ato dotado de autonomia substancial em que se garante o pagamento do título de crédito em favor do devedor principal ou de um co-obrigado, isto é, é uma garantia autônoma e solidária. Assim, não sendo possível o credor exercer seu direito contra o avalizado, no caso a empresa em recuperação judicial, tal fato não compromete a obrigação do avalista, que subsiste integralmente" (EAg 1179654/SP, Rel. Ministro Sidnei Beneti, Segunda Seção, julgado em 28/03/2012, DJe 13/04/2012).

5. No entanto, em relação aos direitos reais de garantia, a conclusão é diversa.

É que, nestes casos, "os créditos hipotecários, pignoratícios e anticréticos (objetos de direito real de garantia) sujeitam-se aos efeitos da recuperação judicial, isto significa que todos os elementos da obrigação podem ser alterados. Não somente o seu valor pode ser reduzido ou o seu vencimento dilatado, mas também a garantia pode ser reduzida, substituída ou mesmo suprimida. Nada há, na lei, que importe tornar a garantia (quando sujeito o crédito aos efeitos da recuperação judicial) um dos elementos da obrigação que estaria por assim dizer imune à novação recuperacional" (COELHO, Fábio Ulhoa. Comentários à Lei de Falências e de Recuperação de Empresas, 13. ed., São Paulo:Thomson Reuters Brasil, 2018, item 123-A, p. 195).

Com efeito, não havendo nenhum dispositivo da legislação de regência que obste a novação de direitos reais de garantia, mostra-se plenamente possível, a meu juízo, que o Plano de Recuperação, por aprovação pela Assembleia, tenha o poder de novar o crédito principal e as correspondentes garantias de direito real, inclusive suprimindo-as, reduzindo-as ou substituindo-as, sob pena de equipará-los aos créditos não sujeitos aos efeitos da recuperação judicial, sem que haja normativo legal para tanto.

Assim, ainda que o credor venha a se opor ou votar pela rejeição da supressão de suas garantias reais, deverá se submeter à decisão soberana do órgão máximo representativo dos credores, nos termos do quórum dos arts. 37 e 45 da lei de regência.

É que a supressão de garantia de direito real, tal como previsto no plano de recuperação judicial aprovado pela Assembleia Geral, como parte integrante das tratativas negociais, vincula todos os credores titulares de tais garantias.

Importante destacar que a dicção do art. 50, §1° da LREF – "na alienação de bem objeto de garantia real, a supressão da garantia ou sua substituição somente serão admitidas mediante aprovação expressa do credor titular da respectiva garantia" –, por si não é apta a afastar esse entendimento.

Isto porque, conforme bem pontua a doutrina de Fábio Ulhoa Coelho, tal normativo é voltado "a assegurar que o credor hipotecário, pignoratício ou anticrético possa exercer sua preferência na liquidação falimentar", pois "a finalidade deste direito resume-se a tornar efetiva a preferência na hipótese de convolação em falência e não importa em limitar a sua sujeição aos efeitos da recuperação judicial" (ob. cit., p. 196).

Além do mais, a exegese do § 2º do art. 49 da LREF acaba por autorizar que à deliberação assemblear disponha no Plano de Recuperação em relação à supressão do direito de garantia real, já que a restrição interpretativa do dispositivo, segundo as regras de hermenêutica, volta-se apenas em relação ao § 1° (garantias fidejussórias).

De fato, os §§ 1° e 2° excepcionam a regra geral disposta no caput de que todos os créditos existentes na data do pedido estão sujeitos à recuperação judicial. O § 1° excepciona as garantias fidejussórias, determinando que estas não podem ser atingidas pela recuperação judicial. O § 2º traz outra exceção (que não pode colidir, por óbvio, com a primeira), segundo a qual, as condições originalmente previstas (valores, prazos, encargos) para cumprimento das obrigações anteriores ao pedido – ressalvadas as garantias fidejussórias, pois já excluídas da recuperação pelo §1° –, poderão ser modificadas pelo plano de soerguimento.

É nesse sentido a precisa conclusão de Fabio Ulhoa Coelho:

Em suma, o plano de recuperação aprovado pela assembleia de credores pode novar o crédito suportado em direito real de garantia, inclusive suprimindo, reduzindo ou substituindo a garantia real.

Caso ela não pudesse ser alcançada pela novação, o estatuto jurídico do crédito seria outro, isto é, em vez de sujeito, estaria numa situação assemelhada aos não sujeitos aos efeitos da recuperação judicial.

Ressalte-se, contudo, que eventual convolação da recuperação judicial em falência acarretará a desconstituição da novação recuperacional. Neste caso, para assegurar que o credor hipotecário, pignoratício ou anticrético possa exercer sua preferência na liquidação falimentar, a LF estabelece que o bem onerado não pode ser alienado sem a concordância daquele (art. 50, § 1º). A finalidade deste direito resume-se a tornar efetiva a preferência na hipótese de convolação em falência e não importa em limitar a sua sujeição aos efeitos da recuperação judicial.

No julgamento do Recurso Especial 1.523.943-MT, o STJ adotou, por maioria, este entendimento relativamente às garantias reais.

De acordo com o relator, Min. Marco Aurélio Bellizze, "ainda que determinado credor tenha optado por não comparecer à deliberação assemblear; ou, presente, se absteve de votar ou se posicionado em contrariedade, total ou parcialmente, à aprovação do plano, seus termos o subordinam, necessariamente. Compreensão diversa, por óbvio, teria o condão de inviabilizar a consecução do plano, o que refoge dos propósitos do instituto da recuperação judicial. De se reconhecer, portanto, que a supressão das garantias reais (...), tal como previsto no plano de recuperação judicial aprovado pela assembleia geral, como parte integrante das tratativas negociais, vincula todos os credores titulares de tais garantias. Naturalmente, caso não se implemente o plano de recuperação judicial, tal como aprovado, ‘os credores terão reconstituídos seus direitos e garantias nas condições originariamente contratadas’ (art. 61, § 2º, da Lei n. 11.101/2005). (...) Assinala-se, ainda que a necessidade de que os credores com garantia real consintam, por ocasião da alienação do bem dado em garantia, com a substituição ou supressão da garantia, contemplada no art. 50, § 1º, da Lei n. 11.101/2005, na hipótese dos autos, afigura-se absolutamente preservada, pois, como visto, todos os credores, representados pelas respectivas classes, ao aprovarem o plano de recuperação judicial que dispõe sobre tal matéria (supressão das garantias reais (...)), com ela anuíram, inegavelmente".

A este entendimento, opôs-se o Min. João Otávio de Noronha, vencido:

"o § 1º do art. 50 da Lei n. 11.101/2005 faz referência à necessidade de anuência expressa do credor para a supressão ou substituição de garantia real no caso de alienação do bem com ela gravado, porquanto o legislador previu como um dos meios eficazes para a recuperação da empresa a venda de bens. Contudo, é evidente que a única interpretação que se lhe pode atribuir é que essa exigência se aplica a todos os casos em que haja a liberação total ou parcial ou a substituição da garantia real. Admitir forma diversa ensejaria um desequilíbrio entre as normas que regem a matéria, o que, no Direito, não se justifica sob nenhum enfoque".

Há, contudo, que se ressaltar, data venia, o acerto do voto vencido acerca das garantias fidejussórias. A maioria tratou igualmente os dois gêneros de garantias (reais e fidejussórias), mas a lei as distingue. Com ênfase, enquanto não se encontra nenhuma norma legal obstando a novação de direitos reais de garantia, em relação às garantias fidejussórias (aval ou fiança prestados naturalmente por terceiros), há disposição expressa tornando-as inalcançáveis pela recuperação judicial do garantido: art. 49, § 1º.

(Op.cit, pp. 196-197) 6. Na hipótese, houve oposição do credor com relação à supressão das garantias.

Assim, ele deverá se submeter à decisão soberana do órgão máximo representativo dos credores em relação à supressão das garantias reais, mantendo, no entanto, o seu direito de prosseguir na execução no que toca às garantias pessoais, já que em relação a esta, a eficácia da cláusula extensiva da novação aos coobrigados ("cláusula supressória") só ocorreria se houvesse a manifestação favorável do credor titular da garantia fidejussória, o que não ocorreu.

7. Ante do exposto, defiro parcialmente a tutela pleiteada, para determinar a suspensão da execução do credor em relação ao requerentes - Processo n. 022353-57.2014.8.22.00 - tão-somente em relação ao valores atinentes às garantias reais que tenham sido suprimidas pelo plano de recuperação judicial, podendo o feito executivo, no entanto, prosseguir com relação às garantias pessoais.

Oficie-se ao ilustre Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, bem como ao Juízo de 1ª instância (10ª Vara Cível da Comarca de Porto Velho), para ciência desta decisão.

Publique-se. Intimações necessárias.

Brasília, 21 de dezembro de 2020.

MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO Relator

 

(Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, 02/02/2021)

 

 

Dessa feita, considerando que os embargos de declaração são espécie de recurso de fundamentação vinculada, não se vislumbra a existência de vício sanável nesta via.

Por certo tem a parte o direito de ter seus pontos de argumentação apreciados pelo julgador. Não tem o direito, entretanto, de ter este rebate feito como requerido. Falta razão ao se pretender que se aprecie questão que já se mostra de pronto afastada com a adoção de posicionamento que se antagoniza logicamente com aquele deduzido em recurso.

A exigência do art. 93, IX, da CF, não impõe que o julgador manifeste-se, explicitamente, acerca de todos os argumentos e artigos, constitucionais e infraconstitucionais, arguidos pela parte. Tendo o julgado decidido, de forma fundamentada, a controvérsia posta nos autos, não há como tachá-lo de omisso ou contraditório ou obscuro.

Aliás, está pacificado o entendimento de que o julgador, tendo encontrado motivação suficiente para decidir desta ou daquela maneira, não está obrigado a rebater, um a um, todos os argumentos apresentados pela parte para decidir a demanda.

Nesse sentido, a jurisprudência: "PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA. CRUZADOS NOVOS. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS. OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. PREQUESTIONAMENTO. REJEIÇÃO. 1. Os embargos de declaração são cabíveis, tão-somente, em face de obscuridade, contradição e omissão. 2. O princípio da exigibilidade da fundamentação das decisões não impõe que o julgador se manifeste sobre todas as razões apresentadas pelas partes, se apenas uma delas for suficiente ao deslinde da controvérsia. 3. O prequestionamento prescinde de referência expressa no acórdão guerreado ao número e à letra de norma legal (Precedentes do Pleno do STF e da Corte Especial do STJ)." (TRF - 3ª Região, 3ª Turma, EDAMS 125637/SP, Rel. Juiz Baptista Pereira, j. 24/04/2002, rejeitados os embargos ,v.u., DJU 26/06/2002, p. 446); "EMBARGOS DE DECLARAÇÃO - VÍCIOS - AUSENTES - PREQUESTIONAMENTO. 1. Ausentes os vícios do art. 535 do CPC, não merecem ser conhecidos os embargos de declaração. 2. Inadmissível a modificação do julgado por meio de embargos de declaração, atribuindo-se-lhes indevidamente, efeitos infringentes. 3. Não é obrigatório o pronunciamento do magistrado sobre todos os tópicos alegados, mas sim que a decisão esteja devida e suficientemente fundamentada, como no caso. 4. Embargos de declaração não conhecidos." (TRF - 3ª Região, 6ª Turma, EDAMS 91422/SP, Rel. Juiz Mairan Maia, j. 05/12/2001, não conhecidos os embargos, v.u., DJU 15/01/2002, p. 842); "EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PROCESSUAL CIVIL. MATÉRIA PURAMENTE DE DIREITO. INTERPRETAÇÃO DO ARTIGO 34 DO CTN. INAPLICABILIDADE DAS SÚMULAS 07 E 05 DO STJ. DESNECESSIDADE DE MANIFESTAÇÃO ACERCA DE TODOS OS ARGUMENTOS LEVANTADOS EM CONTRARRAZÕES DO RECURSO ESPECIAL. PRETENSÃO. REJULGAMENTO DA CAUSA. INVIÁVEL ATRAVÉS DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. NULIDADE DO JULGAMENTO. ADIAMENTO. NOVA INCLUSÃO EM PAUTA. DESNECESSIDADE. RECURSO JULGADO NAS SESSÕES SUBSEQUENTES. 1. A matéria constante dos autos é puramente de direito, restrita à interpretação do artigo 34 do CTN, pelo que não há falar em aplicação das Súmulas 07 e 05 do STJ. 2. O magistrado não está obrigado a se manifestar acerca de todos os argumentos esposados nas contrarrazões do recurso especial, quando já encontrou fundamento suficiente para resolver a controvérsia. 3. Ausência de omissão no julgado embargado. Na verdade, a pretensão dos aclaratórios é o rejulgamento do feito, contudo inviável diante da via eleita. 4. Não é nulo o julgamento que, tendo sido incluído em pauta, foi apreciado na segunda sessão subseqüente, mormente quando o pedido de adiamento foi feito pela parte que ora embarga. Despicienda nova inclusão em pauta já que o processo não foi dela retirado. Precedentes: (EDcl na Rcl 1785 DF, Ministro Teori Albino Zavascki, PRIMEIRA SEÇÃO, DJ 28/11/2005; Resp. 996.117/DF, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, DJ 01/06/2009 EDcl no REsp 774161/SC; Ministro Castro Meira, DJ 28.4.2006; EDcl no REsp 324.361/BA, Rel. Ministro Francisco Falcão, DJ 6.3.2006; EDcl no REsp 331.503/SP, Rel. Min. Fernando Gonçalves, DJ de 1/9/03; REsp 703429/MS, Ministro Nilson Naves, DJ 25/06/2007; EDcl no REsp 618169/SC, Ministra Laurita Vaz, DJ 14/08/2006). 5. Embargos rejeitados." (STJ, 1ª Seção, EDcl no REsp 1111202/SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe 21/08/09).

Ademais, não cabe acolher os embargos de declaração, quando nítido, como no caso vertente, que foram opostos com caráter infringente, objetivando o reexame da causa, com invasão e supressão da competência que, para tal efeito, foi reservada às instâncias superiores, pela via recursal própria e específica, nos termos da pacífica jurisprudência da Suprema Corte, do Superior Tribunal de Justiça, deste Tribunal Federal e desta Turma (v.g. - EDRE nº 255.121, Rel. Min. MOREIRA ALVES, DJU de 28.03.03, p. 75; EDRE nº 267.817, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA, DJU de 25.04.03, p. 64; EDACC nº 35.006, Rel. Min. NANCY ANDRIGHI, DJU de 06.10.02, p. 200; RESP nº 474.204, Rel. Min. SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, DJU de 04.08.03, p. 316; EDAMS nº 92.03.066937-0, Rel. Des. Fed. MAIRAN MAIA, DJU de 15.01.02, p. 842; e EDAC nº 1999.03.99069900-0, Rel. Des. Fed. CARLOS MUTA, DJU de 10.10.01, p. 674).

Ante o exposto, REJEITO os embargos de declaração.

 

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AUSENTES AS HIPÓTESES DE CABIMENTO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO REJEITADOS.

I - Não houve qualquer vício sanável na via dos embargos declaratórios.

II - A matéria objeto dos presentes embargos de declaração traz questão que foi apreciada de forma clara com o mérito da causa, não apresentando o acórdão embargado, obscuridade, contradição ou omissão.

III - Hipótese em que os embargos declaratórios são opostos com nítido caráter infringente.

IV - Embargos de declaração rejeitados.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Primeira Turma, por unanimidade, rejeitou os embargos de declaração, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.