Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004833-29.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA

APELANTE: ROSANGELA RODRIGUES

Advogado do(a) APELANTE: RENI BLASS - MS23626-A

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004833-29.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA

APELANTE: ROSANGELA RODRIGUES

Advogado do(a) APELANTE: RENI BLASS - MS23626-A

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

A Excelentíssima Senhora Juíza Federal convocada Leila Paiva (Relatora):

Trata-se de recurso de apelação pelos herdeiros da parte autora, em face de sentença proferida em demanda proposta objetivando a concessão de benefício assistencial, previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição da República.

A r. sentença  julgou extinto o processo sem julgamento do mérito, nos termos do artigo 485, inciso IX, do Código de Processo Civil e indeferiu o pedido de habilitação de herdeiros, em razão do falecimento da parte autora ter ocorrido antes da elaboração do estudo social (ID 134124623, pg. 149/151).

A ação foi ajuizada em 27/07/2018. Atribuiu-se à causa o valor de R$ 5.724,00. A sentença foi proferida em 14/01/2020.

Em suas razões recursais, a parte autora requer seja deferida a habilitação dos herdeiros da autora, uma vez que são seus sucessores.

Afirma que, em que pese o valor mensal do benefício seja intransmissível, o valor referente aos atrasados são transmitidos aos herdeiros, desde a data do requerimento administrativo até a data do falecimento do autor.

Sustenta que, no caso em epígrafe, restaram preenchidos os requisitos para a concessão do benefício assistencial ao deficiente, sendo devido o benefício ao de cujus.

Sem contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.

Manifesta-se o Ministério Público Federal pelo provimento da apelação interposta para habilitação dos herdeiros, bem como para que seja declarada a nulidade da sentença, determinando o retorno dos autos à origem para realização da perícia social indireta e intervenção do Ministério Público (ID 137479326).

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004833-29.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA

APELANTE: ROSANGELA RODRIGUES

Advogado do(a) APELANTE: RENI BLASS - MS23626-A

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

A Excelentíssima Senhora Juíza Federal convocada Leila Paiva (Relatora):

O presente recurso é tempestivo e atende aos demais requisitos de admissibilidade, razão pela qual merece ser conhecido.

Trata-se de recurso de apelação em face de sentença proferida em demanda proposta objetivando a concessão de benefício assistencial, que extinguiu o processo sem julgamento do mérito, nos termos do artigo 485, inciso IX, do Código de Processo Civil.

Na presente hipótese assiste razão aos apelantes, senão vejamos.

Em que pese o benefício assistencial ser personalíssimo e intransmissível, não obsta o direito dos sucessores em receber os valores eventualmente reconhecidos no processo até a data do óbito da parte autora, nos termo do disposto no parágrafo único do artigo 23 do Decreto n. 6.214/2007:

 "Art. 23. O Benefício de Prestação Continuada é intransferível, não gerando direito à pensão por morte aos herdeiros ou sucessores.

Parágrafo único. O valor do resíduo não recebido em vida pelo beneficiário será pago aos seus herdeiros ou sucessores, na forma da lei civil."

 

Desta forma, os sucessores têm legitimidade de receber os valores que em vida não foram entregues ao segurado falecido, sendo que estes valores decorrem do direito que já estava, na data do óbito, incorporado ao patrimônio jurídico do de cujus.

Nesse sentido é a jurisprudência desta E. Turma:

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ART. 203, V, CF/88, LEI N. 8.742/93 E 12.435/2011. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. ÓBITO DO AUTOR. BENEFÍCIO INTRANSFERÍVEL. VALORES DEVIDOS EM VIDA. PERMANECE PRETENSÃO DE SUCESSORES PARA RECEBIMENTO. CONSECTÁRIOS LEGAIS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.

- O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência ou idoso que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.

- Na hipótese dos autos, a parte autora demonstrou o preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício assistencial.

- O benefício em questão é personalíssimo, não podendo ser transferido aos herdeiros em caso de óbito e nem geram o direito à percepção do benefício de pensão por morte aos dependentes.

- No entanto, o que não pode ser transferido é o direito de continuar recebendo mensalmente o benefício, pois a morte do beneficiário pontua termo final no pagamento. Contudo, permanece a pretensão dos sucessores de receberem os valores eventualmente devidos.

- O dies a quo do benefício de prestação continuada deve corresponder à data em que a Autarquia Previdenciária tomou conhecimento do direito da parte autora e se recusou a concedê-lo, sendo, no presente caso, a data do requerimento administrativo, devendo perdurar até a data do óbito da requerente.

- Os juros de mora são devidos a partir da citação na ordem de 6% (seis por cento) ao ano, até a entrada em vigor da Lei nº 10.406/02, após, à razão de 1% ao mês, consonante com o art. 406 do Código Civil e, a partir da vigência da Lei nº 11.960/2009 (art. 1º-F da Lei 9.494/1997), calculados nos termos deste diploma legal.

- A correção monetária deve ser aplicada em conformidade com a Lei n. 6.899/81 e legislação superveniente (conforme o Manual de Cálculos da Justiça Federal), observados os termos da decisão final no julgamento do RE n. 870.947, Rel. Min. Luiz Fux.

- Os honorários advocatícios deverão ser fixados na liquidação do julgado, nos termos do inciso II, do § 4º, c.c. §11, do artigo 85, do CPC/2015.

- Apelação da Autora provida.

(TRF 3ª Região, 9ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL, 5002948-82.2017.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA, julgado em 18/12/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 22/12/2020)

 

CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ART. 203, CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, E LEI Nº 8.742/1993. PARCELAS NÃO RECEBIDAS EM VIDA PELO BENEFICIÁRIO. TRANSMISSÃO CAUSA MORTIS. POSSIBILIDADE, NA FORMA DA LEI. PERÍCIA SOCIAL INDIRETA. IMPRESCINDIBILIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA. OCORRÊNCIA. NULIDADE DA SENTENÇA.

- As parcelas eventualmente devidas a título de benefício de prestação continuada, não recebidas em vida pelo beneficiário, são passíveis de transmissão causa mortis, na forma da lei. Precedentes.

- A prova técnica é essencial nas causas que versem sobre a concessão de benefício de prestação continuada.

- Cerceamento de defesa caracterizado.

- Sentença anulada de ofício, determinando o retorno dos autos à origem para realização de perícia social indireta e posterior julgamento do feito em Primeiro Grau.

- Apelação prejudicada.

 (TRF 3ª Região, 9ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL, 0006978-90.2013.4.03.9999, Rel. Juiz Federal Convocado VANESSA VIEIRA DE MELLO, julgado em 20/03/2020, Intimação via sistema DATA: 26/03/2020)

 

De outra parte, verifico que, na presente hipótese, o falecimento da parte autora ocorreu antes da realização do estudo social.

Trata-se de prova essencial nas causas que versem sobre a concessão do benefício assistencial, ex vi dos §§ 2º e 6º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, abaixo reproduzidos:

"Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.

(...)

§ 2o  Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.    

(...)

§ 6º A concessão do benefício ficará sujeita à avaliação da deficiência e do grau de impedimento de que trata o § 2º, composta por avaliação médica e avaliação social realizadas por médicos peritos e por assistentes sociais do Instituto Nacional de Seguro Social - INSS."

 

No caso dos autos, verifico que foi realizada perícia médica, em 08/04/2019, na qual se constatou que a incapacidade da parte autora é omniprofissional (ID 134124623, pg. 86).

Desta forma, considerando que já restou devidamente comprovado o requisito da deficiência, mostra-se imprescindível a realização de estudo social indireto para constatação do requisito da miserabilidade.                                                                              

Sobre a possibilidade de realização de prova indireta, colaciono jurisprudência desta E. Turma:

CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ART. 203, CAPUT, DA CR/88, E LEI Nº 8.742/1993. PERÍCIA MÉDICA INDIRETA. IMPRESCINDIBILIDADE.

- A prova técnica é essencial nas causas que versem sobre a concessão de benefício de prestação continuada.

- Sentença anulada, determinando o retorno dos autos ao Juízo de origem, para realização de perícia médica indireta e posterior julgamento do feito em Primeiro Grau.

- Apelação provida.

(TRF 3ª Região, 9ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL, 0030445-98.2013.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal JOAO BATISTA GONCALVES, julgado em 24/07/2020, Intimação via sistema DATA: 28/07/2020)

 

CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ART. 203, CAPUT, DA CR/88, E LEI Nº 8.742/1993. PARCELAS NÃO RECEBIDAS EM VIDA PELO BENEFICIÁRIO. TRANSMISSÃO CAUSA MORTIS. POSSIBILIDADE, NA FORMA DA LEI. PERÍCIA MÉDICA INDIRETA. IMPRESCINDIBILIDADE.

- As parcelas eventualmente devidas a título de benefício de prestação continuada, não recebidas em vida pelo beneficiário, são passíveis de transmissão causa mortis, na forma da lei. Precedentes.

- A prova técnica é essencial nas causas que versem sobre a concessão de benefício de prestação continuada.

- Extinção do feito afastada, determinando o retorno dos autos ao Juízo de origem, para realização de perícia médica indireta e posterior julgamento em Primeiro Grau.

- Apelação provida.

(TRF 3ª Região, 9ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL, 5227745-70.2019.4.03.9999, Rel. Juiz Federal Convocado VANESSA VIEIRA DE MELLO, julgado em 17/10/2019, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 22/10/2019)

 

PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. ACRÉSCIMO DE 25% NA APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. ART. 45 DA LEI Nº 8.213/91. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. AUSÊNCIA DE PROVA PERICIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. NULIDADE DA SENTENÇA.

- Necessária a realização de perícia médica indireta para verificação da eventual necessidade de assistência permanente de outra pessoa ao autor falecido e da possibilidade de retroação do termo inicial da aposentadoria por invalidez.

- O julgamento antecipado da lide, quando necessária a produção de provas ao deslinde da causa, implica em cerceamento de defesa, ensejando a nulidade da sentença proferida. -Apelação Provida.

(Ap 00209119120174039999, DESEMBARGADOR FEDERAL GILBERTO JORDAN, TRF3 - NONA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:17/11/2017)

 

Posto isto, imperiosa a anulação da r. sentença, com o retorno dos autos ao juízo de origem para o regular prosseguimento do feito, com a habilitação dos herdeiros e realização do estudo social de forma indireta conforme requerido.

Ante o exposto, DOU PROVIMENTO à apelação da parte autora, nos termos da fundamentação.

É como voto.    

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

CONSTITUCIONAL. ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. LOAS. ÓBITO DA PARTE AUTORA. HABILITAÇÃO DOS SUCESSORES. POSSIBILIDADE. ANULAÇÃO DA SENTENÇA. RETORNO DOS AUTOS A ORIGEM PARA HABILITAÇÃO DOS HERDEIROS E PROSSEGUIMENTO DO FEITO. ESTUDO SOCIAL REALIZADO POR MEIO DE PERÍCIA INDIRETA. POSSIBILIDADE.

- Trata-se de recurso de apelação em face de sentença proferida em demanda proposta objetivando a concessão de benefício assistencial, que extinguiu o processo sem julgamento do mérito, nos termos do artigo 485, inciso IX, do Código de Processo Civil.

- Em que pese o benefício assistencial ser personalíssimo e intransmissível, não obsta o direito dos sucessores em receber os valores eventualmente reconhecidos no processo até a data do óbito da parte autora, nos termo do disposto no parágrafo único do artigo 23, do Decreto n. 6.214/2007.

- Os sucessores têm legitimidade de receber os valores que em vida não foram entregues ao segurado falecido, sendo que estes valores decorrem do direito que já estava, na data do óbito, incorporado ao patrimônio jurídico do de cujus. Precedentes.

- Na presente hipótese, o falecimento da parte autora ocorreu antes da realização do estudo social.

- Trata-se de prova essencial nas causas que versem sobre a concessão do benefício assistencial, ex vi dos §§ 2º e 6º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93.

- Considerando que já restou devidamente comprovado o requisito da deficiência, mostra-se imprescindível a realização de estudo social indireto para constatação do requisito da miserabilidade. Precedentes.

- Imperiosa a anulação da r. sentença, com o retorno dos autos ao juízo de origem para o regular prosseguimento do feito, com a habilitação dos herdeiros conforme requerido e realização do estudo social de forma indireta conforme requerido.

 - Apelação da parte autora provida.

 

 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por unanimidade, decidiu dar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.