Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0005728-22.2008.4.03.6111

RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE

APELANTE: CARINO INGREDIENTES LTDA

Advogado do(a) APELANTE: MARCOS VINICIUS GONCALVES FLORIANO - SP210507-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0005728-22.2008.4.03.6111

RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE

APELANTE: CARINO INGREDIENTES LTDA

Advogado do(a) APELANTE: MARCOS VINICIUS GONCALVES FLORIANO - SP210507-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

Cuida-se de apelação interposta por CARINO INGREDIENTES LTDA visando a reforma da r. sentença, que denegou a segurança no presente mandamus, em razão da decadência.

Em suas razões, preliminarmente, sustenta a inocorrência da decadência. Depois, aduz, a procedência do pedido.

Com contrarrazões.

O representante do Ministério Público Federal manifestou-se pela reforma da sentença para fins de afastar a decadência, com a denegação da segurança.

É o Relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0005728-22.2008.4.03.6111

RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE

APELANTE: CARINO INGREDIENTES LTDA

Advogado do(a) APELANTE: MARCOS VINICIUS GONCALVES FLORIANO - SP210507-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

Pretende a impetrante, ora apelante, ter reconhecido o direito à compensação dos valores recolhidos a título de PIS e COFINS, nos meses de novembro de 2003 a dezembro de 2007, em razão da inconstitucionalidade do artigo 3°, parágrafo l, da Lei n.° 9.718/98, que ampliou o conceito de faturamento.
 

Acolho a preliminar arguida, eis que o mandado de segurança revela-se preventivo, porquanto o pedido versa afastar a possível e então futura negativa da autoridade coatora ao direito de compensar o tributo que alegadamente pagou a maior, de modo que deve ser afastada a decadência, não se aplicando o prazo decadencial de 120 dias previsto no artigo 18 da Lei nº 1.533/51, vigente à época (REsp 1216972/AM, Segunda Turma, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, DJe 14/02/2011).

Assim, em razão do disposto no § 3º do art. 1.013 do CPC de 2015, encontrando-se os autos em termos, deixo de determinar a remessa dos autos à Vara de origem e passo à apreciação do mérito.

Pois bem.

A Lei 9.718, de 27 de novembro de 1998, dispôs em seu art. 2º que as contribuições para o PIS/PASEP e a COFINS serão calculadas com base no faturamento. Posteriormente, em seu art. 3º, estatuiu que faturamento corresponde à receita bruta da pessoa jurídica, assim entendida a totalidade das receitas auferidas pela pessoa jurídica, sendo irrelevantes o tipo de atividade por ela exercida e a classificação contábil adotada para as receitas.

Todavia, até então, o artigo 195 da Constituição Federal previa a contribuição para a seguridade social incidente apenas sobre o faturamento. Cumpre ressaltar que o STF já havia se pronunciado sobre o conceito de faturamento previsto na LC 70/91, no julgamento da ADC nº 1, entendendo que este, para efeitos fiscais, compreendia apenas a receita bruta das vendas de mercadorias e serviços.

Assim, o legislador infraconstitucional, ao prever a incidência das citadas contribuições sobre a totalidade das receitas auferidas pela pessoa jurídica instituiu, por meio de lei ordinária, novo tributo, sem respaldo constitucional, violando, ainda, o disposto no art. 110 do CTN, porquanto alterou a noção jurídica de faturamento.

Posteriormente, a Emenda Constitucional nº 20, de 15/12/1998 modificou a redação do aludido inciso I do artigo 195 da Constituição da República, que passou a dispor que a contribuição social do empregador poderia ter como base de cálculo a receita ou o faturamento.

Tal alteração já demonstra a diferença dos conceitos "receita" e "faturamento".

No entanto, sendo posterior à edição da Lei 9.718/98, a EC 20/98 não tem o condão de ratificar seus termos e convalidar o vício de origem.

Segundo o art. 17 da Lei 9.718/98, esta lei entraria em vigor na data de sua publicação e produziria efeitos em relação às contribuições em comento a partir de 1º de fevereiro de 1999.

Assim, mesmo que os efeitos somente fossem produzidos posteriormente à alteração constitucional, em observância do princípio da anterioridade nonagesimal, a data do início de sua vigência foi a data da sua publicação, em 27/11/1998, quando ainda estava em vigor o art. 195, I em sua redação original.

Portanto, quando da sua edição e vigência, a Lei nº 9.718/1998 não tinha amparo constitucional para instituir nova contribuição social sobre a receita bruta auferida pela pessoa jurídica e não se pode considerar que a posterior alteração constitucional, pela EC nº 20/1998, antes do término do prazo para produção dos seus efeitos, teria conferido constitucionalidade superveniente à norma, pois a compatibilidade da lei com a Constituição Federal deve ser verificada ao tempo do início de sua vigência e não ao tempo em que ela começa a surtir efeitos concretos.

A questão foi levada ao Supremo Tribunal Federal que, no julgamento dos Recursos Extraordinários 357950, 390840, 358273 e 346084, decidiu pela inconstitucionalidade da ampliação da base de cálculo das contribuições destinadas ao PIS e à COFINS prevista no parágrafo 1º do artigo 3º da Lei 9.718, por extrapolar o conceito de faturamento ao incluir a totalidade de receitas auferidas pela pessoa jurídica.

Restou, também, reiterado o entendimento de que não haveria necessidade de a regulamentação dar-se por meio de lei complementar, pois a Constituição não exigiu tal espécie de ato normativo para a disciplina das contribuições para Seguridade Social previstas nos incisos I, II, e III do artigo 195 a edição de lei complementar, de sorte que apenas para novas contribuições com fundamento na competência residual, faz-se necessária a edição de lei complementar nos termos do artigo 195, § 4º, da CF.

Por tal motivo, o STF afastou a inconstitucionalidade da Lei 9.715/98, bem como o artigo 8º da Lei 9.718/98, que majorou a alíquota da COFINS de 2% para 3%.

Realmente, a partir da vigência da Emenda Constitucional n.º 20/98, passou a ter fundamento constitucional a ampliação da base de cálculo da COFINS para alcançar também receitas estranhas ao conceito de faturamento.

Com a nova redação dada ao dispositivo constitucional (art. 195, I), o legislador encontrou respaldo para a edição das Leis nº 10.637/2002 e 10.833/2003, prevendo que a base de cálculo compreende a receita bruta da venda de bens e serviços e as demais receitas auferidas pela pessoa jurídica.

Referidas leis passaram a produzir efeitos a partir de 01/12/2002 e 01/02/2004, respectivamente.

Do anteriormente exposto, depreende-se que subsiste a exigibilidade da COFINS, nos termos da Lei Complementar 70/91, e a partir de 1º/2/2004 de acordo com a Medida Provisória nº. 135/2003, convertida na Lei nº. 10.833, de 29/12/200. Também é exigível o PIS nos termos da Lei Complementar nº. 7/70, observando-se as alterações promovidas pela Medida Provisória nº. 1.212/95 (a partir de março de 1996) e reedições, convertida na Lei nº. 9.715/98, e a partir de 1º/12/2002 consoante a Medida Provisória nº. 66/02, convertida na Lei nº. 10.637/02.

In casu, ocorre, no entanto, configurada a incidência do disposto no artigo 8º da Lei nº 10.637/02 e 10 da Lei 10.833/03:

 

Lei 10.637/02

Art. 8o Permanecem sujeitas às normas da legislação da contribuição para o PIS/Pasep, vigentes anteriormente a esta Lei, não se lhes aplicando as disposições dos arts. 1o a 6o: Produção de efeito

I – as pessoas jurídicas referidas nos §§ 6o, 8o e 9o do art. 3o da Lei no 9.718, de 27 de novembro de 1998 (parágrafos introduzidos pela Medida Provisória no 2.158-35, de 24 de agosto de 2001), e Lei no 7.102, de 20 de junho de 1983;

II – as pessoas jurídicas tributadas pelo imposto de renda com base no lucro presumido ou arbitrado; (Vide Medida Provisória nº 497, de 2010)

III – as pessoas jurídicas optantes pelo Simples;

IV – as pessoas jurídicas imunes a impostos;

V – os órgãos públicos, as autarquias e fundações públicas federais, estaduais e municipais, e as fundações cuja criação tenha sido autorizada por lei, referidas no art. 61 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição de 1988;

 

Lei 10.833/03

Art. 10. Permanecem sujeitas às normas da legislação da COFINS, vigentes anteriormente a esta Lei, não se lhes aplicando as disposições dos arts. 1º a 8º (Produção de efeito)

I - as pessoas jurídicas referidas nos §§ 6º, 8º e 9º do art. 3º da Lei no 9.718 , de 1998, e na Lei no 7.102, de 20 de junho de 1983;

II - as pessoas jurídicas tributadas pelo imposto de renda com base no lucro presumido ou arbitrado; (Vide Medida Provisória nº 497, de 2010)

 

Assim, a nova sistemática de cálculo não se aplica às pessoas jurídicas e grandezas econômicas mencionadas no art. 8º da Lei nº. 10.637/2002 e no art. 10 da Lei nº. 10.833/2003, as quais devem permanecer sujeitas às normas da legislação vigente anteriormente a estas leis, ou seja, à Lei nº. 9.718 /98 (sistema da cumulatividade/ faturamento ).

Anoto, ainda, que o inc. XII do art. 79 da Lei nº. 11.941/09, de 27/5/09 (DOU 28/5/09), revogou expressamente o § 1º do art. 3º da Lei nº. 9.718/98. Restituíveis, pois, os pagamentos efetuados na forma deste dispositivo.

Dessa forma, verifica-se indevidos os recolhimentos efetuados a título da PIS/COFINS a partir de fevereiro de 1999 (data em que passou a produzir efeitos a Lei 9.718/98) sobre as receitas que não as exclusivamente decorrentes do faturamento, fazendo jus a apelante à sua compensação.

Assim, tem direito o impetrante à compensação dos valores indevidamente recolhidos a título de PIS/COFINS, no período de novembro/2003 a Dezembro/2007, visto que consoante documentação constante nos autos, à época optante do Lucro Presumido (fl. 41/395).

A compensação observará o disposto na Lei 10.637/02, que passou a admitir a compensação entre quaisquer tributos e contribuições administrados pela Secretaria da Receita Federal.

Os valores corrigidos pela SELIC, observando-se ainda o disposto no art. 170-A do CTN, consoante REsp nº 1.167.039, sujeito ao regime do art. 543-C do CPC.

Na hipótese, há de ser reformada a r. sentença, com a procedência do pedido, e reconhecido o direito da impetrante à compensação dos valores recolhidos a título de  PIS/ COFINS, no período de novembro/2003 a Dezembro/2007.

 

Ante o exposto, dou provimento à apelação, para anular a sentença e, nos termos do art. 1.013, § 3º, I do NCPC, julgo procedente o pedido, consoante fundamentação.
 

É o meu voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. PIS E COFINS. LEI 9.718/98. 10.637/02 E 10.833/03.CONCEITO FATURAMENTO. OPTANTE LUCRO PRESUMIDO. APELAÇÃO PROVIDA.



-Acolhida a preliminar arguida, eis que o mandado de segurança revela-se preventivo.



-Em razão do disposto no § 3º do art. 1.013 do CPC de 2015, encontrando-se os autos em termos, deixo de determinar a remessa dos autos à Vara de origem e passo à apreciação do mérito.



-O Supremo Tribunal Federal, no julgamento dos Recursos Extraordinários 357950, 390840, 358273 e 346084, decidiu pela inconstitucionalidade da ampliação da base de cálculo das contribuições destinadas ao PIS e à COFINS prevista no parágrafo 1º do artigo 3º da Lei 9.718, por extrapolar o conceito de faturamento ao incluir a totalidade de receitas auferidas pela pessoa jurídica.



-Restou também reiterado o entendimento de que não haveria necessidade de a regulamentação dar-se por meio de lei complementar, pois a Constituição não exigiu tal espécie de ato normativo para a disciplina das contribuições para Seguridade Social previstas nos incisos I, II, e III do artigo 195 a edição de lei complementar, de sorte que apenas para novas contribuições com fundamento na competência residual, faz-se necessária a edição de lei complementar nos termos do artigo 195, § 4º, da CF.

 

-A nova sistemática de cálculo não se aplica às pessoas jurídicas e grandezas econômicas mencionadas no art. 8º da Lei nº. 10.637/2002 e no art. 10 da Lei nº. 10.833/2003, as quais devem permanecer sujeitas às normas da legislação vigente anteriormente a estas leis, ou seja, à Lei nº. 9.718 /98 (sistema da cumulatividade/ faturamento ).





-Com a nova redação dada ao dispositivo constitucional (art. 195, I), o legislador encontrou respaldo para a edição das Leis nº 10.637/2002 e 10.833/2003, prevendo que a base de cálculo compreende a receita bruta da venda de bens e serviços e as demais receitas auferidas pela pessoa jurídica.

 

-Tem direito o impetrante à compensação dos valores indevidamente recolhidos a título de PIS/COFINS, no período de novembro/2003 a Dezembro/2007, observando o disposto na Lei 10.637/02 e o disposto no art. 170-A do CTN. Correção Taxa Selic.



- Anulada sentença.





-Nos termos do art. 1.013, § 3º, I do NCPC, procedente o pedido.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quarta Turma, à unanimidade, decidiu dar provimento à apelação, nos termos do voto da Des. Fed. MÔNICA NOBRE (Relatora), com quem votaram o Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE e a Des. Fed. MARLI FERREIRA. Ausente, justificadamente, o Des. Fed. MARCELO SARAIVA, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.