AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 5020192-48.2017.4.03.0000
RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. ANTONIO CEDENHO
AUTOR: AES TIETE ENERGIA S.A.
Advogados do(a) AUTOR: WERNER GRAU NETO - SP120564, MATEUS DA COSTA MARQUES - SP373989
REU: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL
OUTROS PARTICIPANTES:
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 5020192-48.2017.4.03.0000 RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. ANTONIO CEDENHO AUTOR: AES TIETE ENERGIA S.A. Advogados do(a) AUTOR: WERNER GRAU NETO - SP120564, MATEUS DA COSTA MARQUES - SP373989 REU: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de ação rescisória, com pedido de antecipação de tutela, ajuizada pela AES TIETÊ ENERGIA S.A., com fundamento no artigo 966, inciso V, do Código de Processo Civil, em face do Ministério Público Federal com o objetivo de rescindir o acórdão proferido pela C. Terceira Turma deste E. Tribunal, autos da Ação Civil Pública n° 0008824-94.2007.4.03.6106. Alega, em síntese, que o acórdão rescindendo violou manifestamente norma jurídica uma vez que deixou de aplicar o artigo 62 da Lei nº 12.651/2012 (Novo Código Florestal) ao caso concreto, negando-lhe vigência, bem como ignorou o §1°, do artigo 3°, da Resolução CONAMA n° 302/2002, os quais delimitariam a área de preservação permanente no entorno da UHE Água Vermelha. Pugnou, em caráter de antecipação de tutela, pela suspensão imediata dos efeitos do acórdão rescindendo, impedindo seu cumprimento. Ao final, requer a rescisão do mencionado acórdão e a designação de novo julgamento a fim de que seja aplicado imediatamente o Novo Código Florestal, com a improcedência total dos pedidos iniciais formulados na ação civil pública ambiental. A antecipação de tutela requerida foi indeferida. O Ministério Público Federal apresentou contestação. Alega, preliminarmente, a decadência para propositura da ação. Ressalta, nesse tocante, que o acórdão rescindendo não unânime foi proferido na vigência do Código de Processo Civil de 1973, configurando erro grosseiro a interposição de Recurso Especial sem o anterior manejo de embargos infringentes. No mérito, traz que o acórdão rescindendo não violou a literalidade do artigo 62 da Lei n. 12.651/2012 no caso concreto, apenas decidindo o conflito de leis no tempo haja vista o reconhecimento da incidência do princípio tempus regit actum. Quanto à aplicação da Resolução CONAMA nº 302/2002, artigo 3º, § 1º, observa a necessidade de critérios e estudos prévios para eventual redução da área de preservação, o que não ocorreu no caso concreto. Protesta pelo não conhecimento da ação ou, no mérito, pela sua improcedência. Contra a decisão que negou a antecipação de tutela, a autora interpôs agravo interno. O MPF ofertou contraminuta. Foi apresentada réplica. O Ministério Público, em parecer, opina pelo desprovimento da ação. O feito foi levado a julgamento em 05.05.2020, com pedido de vista antecipada da Desembargadora Federal Marli Ferreira. Levado o feito a julgamento pela Desembargadora Federal, na sessão de 07.07.2020 este Relator vista dos autos para melhor perscrutar a matéria. É o relato do essencial. Cumpre decidir.
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 5020192-48.2017.4.03.0000 RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. ANTONIO CEDENHO AUTOR: AES TIETE ENERGIA S.A. Advogados do(a) AUTOR: WERNER GRAU NETO - SP120564, MATEUS DA COSTA MARQUES - SP373989 REU: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O De saída, registro que não se aplica a suspensão da tramitação do presente feito, decorrente da determinação do Superior Tribunal de Justiça no tocante ao tema 1.062 acerca da "Possibilidade de se reconhecer a retroatividade de normas não expressamente retroativas da Lei 12.651/2012 (novo Código Florestal) para alcançar situações consolidadas sob a égide da legislação anterior", eis que o tema ora em debate nestes autos diz respeito à aplicabilidade do artigo 62 do Novo Código Florestal cujo conteúdo da norma é, diversamente do tema sobrestado, expressamente retroativo. E prossigo. Tendo em vista a apreciação definitiva, nesta oportunidade, do mérito da questão posta a julgamento, julgo prejudicado o agravo interno interposto. Quanto à alegada decadência, observo, de saída, que os embargos infringentes previstos no Código de Processo Civil de 1973 tinham cabimento em caso de acórdão não unânime que, em grau de apelação, reformasse sentença de mérito. Art. 530. Cabem embargos infringentes quando o acórdão não unânime houver reformado, em grau de apelação, a sentença de mérito, ou houver julgado procedente ação rescisória. Se o desacordo for parcial, os embargos serão restritos à matéria objeto da divergência. No caso, a sentença de mérito julgou a demanda parcialmente procedente contra os interesses da autora, tendo considerado como Área de Preservação Permanente aquela de 30 metros da cota máxima de operação da UHE Água Vermelha. Abaixo, excertos da sentença proferida: Trata-se de ação civil pública proposta pelo Ministério Público Federal contra Vanderlei Segatt, Município de Cardoso, AES Tietê S/A e Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA, pretendendo a condenação dos primeiros réus a repararem o dano ambiental causado em área de preservação permanente e ao Ibama em fiscalizar e acompanhar a recuperação da área de preservação permanente. (...) FUNDAMENTAÇÃO Busca o Ministério Público Federal com a presente ação civil, a demolição e remoção de entulhos das construções feitas de forma ilegal em área de preservação permanente, situada às margens do reservatório da represa de Água Vermelha. Pretende a completa recuperação da área de preservação permanente bem como impedir a prática de toda e qualquer atividade que possa causar lesão à área. Busca também a condenação dos co-réus Município de Cardoso e AES Tietê S/A, solidariamente a promoverem a recuperação da área de preservação permanente mediante o auxílio na remoção das edificações existentes no local e da adoção de práticas de adequação ambiental. (...) Não tenho dúvida em afirmar que, por se tratar de intervenção sobre o domínio privado combinada com proteção ao meio ambiente, a escolha deveria recair na menor metragem contemplada no próprio Código Florestal. No caso, aplicando-se o valor de 30 metros. (...) Desse modo, há constatação de que a área até os 30 metros sofre intensa intervenção antrópica o que impede o aparecimento de mata ciliar. Constatada a lesão ao meio ambiente e estabelecido o nexo de causalidade entre a ação do réu e a lesão, nasce o dever de reparação e este encontra respaldo no artigo 14, 1º, da Lei 6938/81: (...) DISPOSITIVO Destarte, como consectário da fundamentação, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido e confirmando a liminar deferida, determino ao réu Vanderlei Segatt bem como à Ré AES Tietê S/A - SOLIDARIAMENTE - que procedam à demolição integral das edificações que se encontrem dentro da faixa de proteção ambiental de 30 metros, bem como removam os entulhos dali decorrentes no prazo de noventa dias, sendo que o não cumprimento integral desta determinação acarretará multa no valor de R$ 500,00 por dia até o limite de 1000 dias. O valor da multa diária e dos dias em que incidirão levam em conta a dimensão da reparação a ser realizada, visando fixar a pena pelo descumprimento dentro do vetor da proporcionalidade. IMPROCEDE O PEDIDO em relação ao Município de Cardoso. Deverão ainda promover a reparação do dano ambiental mediante a implantação de projeto de recomposição da vegetação aprovado pelo IBAMA, no mesmo prazo nonagesimal. Mantenho a antecipação da tutela e fixo também para ambos a determinação de impedimento de acesso e atividade antrópica na referida faixa, mediante colocação cerca ou alambrado, cuja construção deverá ser feita em até 180 dias após o transito em julgado da presente decisão, sendo que o não cumprimento integral desta determinação acarretará multa no valor de R$ 500,00 por dia até o limite de 250 dias. Igualmente, o valor da multa diária e dos dias em que incidirão levam em conta a dimensão da obra a ser realizada, visando fixar a pena pelo descumprimento dentro do vetor da proporcionalidade. Excetuo da proibição acima fixada a reserva de faixa de acesso a água, rampa de lançamento de barcos (ambas, com no máximo 4 metros), ancoradouro ou pequenas estruturas de apoio às embarcações, além do acesso de pessoas e animais desde que não ocorra a supressão e não comprometa a regeneração e a manutenção a longo prazo da vegetação nativa, nos termos do artigo 3º do Decreto Estadual 49.566/2005 e do disposto no 7º do artigo 4º do Código Florestal. Considerando a possibilidade de reconstituição da área afetada, deixo de fixar indenização por danos irrecuperáveis. Tratando-se de ação civil pública, incabível a condenação em custas e honorários advocatícios (art. 18 da Lei 7.347/1985). Publique-se, Registre-se e Intime-se. Contra a sentença, a autora interpôs recurso de apelação, o qual restou desprovido e, mantida a condenação, houve, em razão da remessa oficial, modificação da sentença, por acórdão não unânime, tão somente para considerar como área de preservação permanente o limite de 100 e não de 30 metros. Abaixo, ementa do acórdão rescindendo: PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL. ENTORNO DE RESERVATÓRIO ARTIFICIAL. UHE ÁGUA VERMELHA. ZONA RURAL. CÓDIGO FLORESTAL VIGENTE À ÉPOCA DA DEGRADAÇÃO. LEI Nº 4.771/65. RESOLUÇÃO CONAMA Nº 302/05. LEGALIDADE. INAPLICABILIDADE DA LEI Nº 12.651/02. (...) 13. Neste passo, tem-se que, no entorno do reservatório da UHE Água Vermelha, situando-se na zona rural, a área a ser considerada de preservação permanente é de 100m. 14. No caso concreto, a área ocupada por VANDERLEI SEGATT está situada às margens do Reservatório da Usina Hidrelétrica de Água Vermelha, em área rural, no município de Cardoso/SP, não restando dúvidas de que o rancho foi implantado em área de preservação permanente e, portanto, imperiosa a reparação dos danos causados ao meio ambiente no local, mediante a desocupação do imóvel, demolição da área construída e elaboração de plano de regeneração e recuperação da área degradada. 15. Não é demasia ressaltar que esta E. Corte tem admitido a demolição destes ranchos, pois não é possível restabelecer a vegetação local sem a adoção da providencia. 16. Nego provimento à apelação do AES TIETE S/A e dou parcial provimento à remessa oficial para reformar a r. sentença no sentido de considerar como área de preservação permanente aquela até 100 metros da cota máxima de operação da UHE Água Vermelha, mantendo a condenação da AES TIETE S/A e VANDERLEI SEGATT em proceder, a demolição integral das edificações, bem como a remoção dos entulhos decorrentes na faixa de proteção ambiental, reparando o dano ambiental verificado na APP mencionada, bem como efetuarem a colocação de cerca ou alambrado para o impedimento de acesso e de atividade antrópica, nos termos e prazos contidos na r sentença. Pois bem. O recurso de apelação interposto pela ora autora visava afastar a condenação imposta pela sentença. Ocorre que o recurso foi desprovido, não acarretando, portanto, reforma de decisão recorrida. A modificação da decisão recorrida se deu em razão da remessa oficial e somente em sua extensão eis que, na oportunidade, foi mantida a condenação (não houve reforma propriamente dita), tendo os Julgadores, em sua maioria, considerado que a área de preservação aplicável ao caso seria de 100 e não de 30 metros. Vale ressaltar que mesmo que a remessa oficial houvesse de fato reformado a sentença, os embargos infringentes não seriam cabíveis em razão da literalidade do artigo 530 do CPC/73 e também da Súmula 390 do STJ, a saber: Nas decisões por maioria, em reexame necessário, não se admitem embargos infringentes. Ademais, sequer foi aventado, no curso dos autos originários, o cabimento dos infringentes. Não caracterizado o erro grosseiro, deve ser considerado o prazo de 02 (dois) anos para propositura da ação rescisória contado a partir do trânsito em julgado da última decisão nos autos, o que ocorreu em 02.06.2017. Proposta a ação em novembro/2017, não decorreu o prazo decadencial. Afastada, portanto, a preliminar arguida. No mérito, nos termos do artigo 355, I, do Código de Processo Civil, julgo antecipadamente a lide haja vista tratar-se de matéria unicamente de direito, não havendo necessidade de produção de provas. Trago que o acórdão rescindendo, integrado pelo que rejeitou os embargos de declaração, restou assim ementado: “PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL. ENTORNO DE RESERVATÓRIO ARTIFICIAL. UHE ÁGUA VERMELHA. ZONA RURAL. CÓDIGO FLORESTAL VIGENTE À ÉPOCA DA DEGRADAÇÃO. LEI Nº 4.771/65. RESOLUÇÃO CONAMA Nº 302/05. LEGALIDADE. INAPLICABILIDADE DA LEI Nº 12.651/02. 1. Trata-se de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal para efeito de indenizar "in natura" dano ao meio ambiente, em loteamento situado no Município de Cardoso-SP, em razão da utilização, conservação e manutenção de rancho a menos de 100 metros de distância do reservatório de acumulação de água para geração de energia elétrica da Usina Hidrelétrica de Água Vermelha (AES Tietê S/A), causando dano direto à área de preservação permanente, sem que se possa restaurar a vegetação que existia no local, em flagrante afronta ao meio ambiente, ao patrimônio público e à legislação específica. 2. Foi reconhecida a omissão da r. sentença apontada pelo Ministério Público Federal quanto ao cabimento da remessa oficial diante da improcedência de parte do pedido inicial. 3. Não conhecido o agravo de instrumento convertido em retido de VANDERLEI SEGATT, por não haver reiteração em razões de apelação, nos termos do art 523, § 1º, do Código de Processo Civil. 4. Não merece guarida a alegação de inexistência de dano ambiental contida na apelação da ré AES TIETE S/A, embasando-se no art. 61-A do novo Código Florestal. Tem-se do auto de infração ambiental que existe intervenção não autorizada em área de proteção permanente no reservatório e que a intensa intervenção antrópica impede o aparecimento de mata ciliar. 5. Também não é o caso de aplicabilidade das normas do novo Código Florestal. O C. STJ já firmou entendimento, no sentido de que o novo regramento material tem eficácia ex nunc e não alcança fatos pretéritos, quando implicar em redução do patamar de proteção do meio ambiente sem a necessária compensação. No mesmo sentido já decidiu aquela Corte Superior e esta E. Terceira Turma. De qualquer sorte, tratando-se de rancho em área rural, cujo uso é meramente o lazer particular do proprietário, onde não há atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo e de turismo rural, não se lhe aproveitariam as disposições transitórias de que trata a Lei nº 12.651/02, nos art's. 61 em diante. 6. Aplica-se a regra geral, portanto, vigente à época do ajuizamento da ação, posto que então apontada a degradação ambiental que ensejou a providencia, no caso, o artigo 2º, da Lei 4.771/65 (Código Florestal). 7. Quanto à responsabilidade da AES Tietê S/A, a documentação carreada é suficiente para comprová-la. A própria empresa ressalta que é de sua titularidade apenas uma faixa de segurança no entorno do reservatório, de aproximadamente 20 m de largura, a qual é objeto de contratos de concessão de uso, com respaldo na legislação setorial aplicável, Portaria nº 170, de 14/02/1987, editada pelo Ministério das Minas e Energia. 8. Foi celebrado um contrato da espécie com VANDERLEI SEGATT. Embora suas cláusulas pretendam eximir a AES Tietê de quaisquer responsabilidades pelo mau uso da área concedida, há previsão expressa acerca de seu poder de fiscalização da utilização racional da mesma, em cumprimento às competências legais e regulamentares independentemente de aviso prévio por escrito (cláusula 4ª, I, "j"), bem como a obrigatoriedade do usuário obedecer as restrições impostas pela Resolução CONAMA nº 302, de 20/03/2002, no que tange a edificações de qualquer natureza, instalações sanitárias, como também, utilizar-se do solo de modo a causar ou a contribuir para o assoreamento do reservatório (cláusula 4ª, I, "l"). 9. É ela quem detém a concessão do serviço público de geração de energia elétrica e opera a UHE Água Vermelha, sendo a maior interessada na preservação em causa, em ordem a manter indene o móvel de sua exploração econômica, razão mais que suficiente, num regime de livre iniciativa, para demonstrar a legitimação passiva para figurar na presente ação. 10. De reverso, não ressai dos autos responsabilidade do Município de Cardoso/SP. Embora a municipalidade tenha o poder dever de fiscalizar a ocupação ordenada do solo urbano, no caso concreto, a área em questão é objeto de posse de uma pequena parcela de propriedade rural particular, localizada às margens do reservatório da UHE Água Vermelha. 11. Assim, não se patenteia qualquer interferência direta da municipalidade na ocupação irregular do local, que pudesse ter concorrido para o dano perpetrado, como seria o caso de emissão de licença ambiental indevida. Nem mesmo a alegada omissão pode ser invocada, pois, em sendo propriedade rural privada, a fiscalização caberia aos órgãos estaduais e federais. 12. Quanto à delimitação da faixa a ser considerada como área de preservação permanente, a r sentença merece reforma. Com o advento da Lei nº 6.938/81, que instituiu o Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA), a propósito da implementação da Política Nacional do Meio Ambiente, foi editada a Resolução 302, de 20/03/2002, do Conselho Nacional do Meio Ambiente - CONAMA. Sem razão o juízo monocrático ao afastar sua aplicabilidade, visto não padecer a Resolução nº 302/02 da aludida ilegalidade, consoante já pacificado pelo C. STJ, ao afirmar a higidez das normas editadas pelo CONAMA. 13. Neste passo, tem-se que, no entorno do reservatório da UHE Água Vermelha, situando-se na zona rural, a área a ser considerada de preservação permanente é de 100m. 14. No caso concreto, a área ocupada por VANDERLEI SEGATT está situada às margens do Reservatório da Usina Hidrelétrica de Água Vermelha, em área rural, no município de Cardoso/SP, não restando dúvidas de que o rancho foi implantado em área de preservação permanente e, portanto, imperiosa a reparação dos danos causados ao meio ambiente no local, mediante a desocupação do imóvel, demolição da área construída e elaboração de plano de regeneração e recuperação da área degradada. 15. Não é demasia ressaltar que esta E. Corte tem admitido a demolição destes ranchos, pois não é possível restabelecer a vegetação local sem a adoção da providencia. 16. Nego provimento à apelação do AES TIETE S/A e dou parcial provimento à remessa oficial para reformar a r. sentença no sentido de considerar como área de preservação permanente aquela até 100 metros da cota máxima de operação da UHE Água Vermelha, mantendo a condenação da AES TIETE S/A e VANDERLEI SEGATT em proceder, a demolição integral das edificações, bem como a remoção dos entulhos decorrentes na faixa de proteção ambiental, reparando o dano ambiental verificado na APP mencionada, bem como efetuarem a colocação de cerca ou alambrado para o impedimento de acesso e de atividade antrópica, nos termos e prazos contidos na r sentença.” Do que se extrai do acórdão rescindendo, ao fixar a área de preservação permanente como “aquela até 100 metros da cota máxima de operação da UHE Água Vermelha”, a decisão consignou a inaplicabilidade do artigo 62 do Código Florestal sob o fundamento “de que o novo regramento material tem eficácia ex nunc e não alcança fatos pretéritos, quando implicar em redução do patamar de proteção do meio ambiente sem a necessária compensação”. Aplicou-se, pois, os princípios tempus regit actum e da vedação à regressão ou ao retrocesso ecológico, impondo-se a aplicação da Lei n° 4.771/65 (antigo Código Florestal) eis que os danos ambientais se iniciaram antes do advento do Código Florestal atualmente em vigor. Contudo, conforme bem pontuou a Desembargadora Federal Marli Ferreira em seu voto vista, na ADI 4.903/DF, assim como na ADC 42, restou consignada a constitucionalidade do artigo 62 do Novo Código Florestal, conforme abaixo reproduzo: “ (...) (h) Artigos 5º, caput e §§ 1º e 2º, e 62 (Redução da largura mínima da APP no entorno de reservatórios d’água artificiais implantados para abastecimento público e geração de energia): O estabelecimento legal de metragem máxima para áreas de proteção permanente no entorno de reservatórios d’água artificiais constitui legítima opção de política pública ante a necessidade de compatibilizar a proteção ambiental com a produtividade das propriedades contíguas, em atenção a imperativos de desenvolvimento nacional e eventualmente da própria prestação do serviço público de abastecimento ou geração de energia (art. 175 da CF). Por sua vez, a definição de dimensões diferenciadas da APP em relação a reservatórios registrados ou contratados no período anterior à MP nº 2166-67/2001 se enquadra na liberdade do legislador para adaptar a necessidade de proteção ambiental às particularidades de cada situação, em atenção ao poder que lhe confere a Constituição para alterar ou suprimir espaços territoriais especialmente protegidos (art. 225, § 1º, III). Trata-se da fixação de uma referência cronológica básica que serve de parâmetro para estabilizar expectativas quanto ao cumprimento das obrigações ambientais exigíveis em consonância com o tempo de implantação do empreendimento; CONCLUSÃO : Declaração de constitucionalidade dos artigos 5º, caput e §§ 1º e 2º, e 62, do novo Código Florestal”; A decisão do Supremo Tribunal Federal na ADI 4.903/DF é bastante assertiva quando, objetivamente, declara a constitucionalidade do artigo 62 do Novo Código Florestal, cuja redação trago à colação: Art. 62. Para os reservatórios artificiais de água destinados a geração de energia ou abastecimento público que foram registrados ou tiveram seus contratos de concessão ou autorização assinados anteriormente à Medida Provisória nº 2.166-67, de 24 de agosto de 2001, a faixa da Área de Preservação Permanente será a distância entre o nível máximo operativo normal e a cota máxima maximorum . Não é demais ressaltar que o Ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, debruçando-se não só sobre o tema, mas especificamente sobre a UHE Água Vermelha, nos autos da Reclamação Rcl 38.764/SP distribuída à Relatoria do Min. Edson Fachin, decidiu que esta Corte Federal, nos autos da Apelação Cível nº 0002737-88.2008.4.03.6106/SP (caso análogo ao presente), cuja ementa doravante transcrevo, desrespeitou a autoridade do Supremo Tribunal Federal e a eficácia do julgado na ADI 4.903/DF e na ADC nº 42/DF. “AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL. REEXAME NECESSÁRIO. CABIMENTO. APLICAÇÃO, POR ANALOGIA, DO ART. 19 DA LEI 4.717/1965. DANO AMBIENTAL. AREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE EM RIO QUE BANHA MAIS DE UM ESTADO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. DANO AMBIENTAL. NOVO CÓDIGO FLORESTAL. RETROATIVIDADE. IMPOSSIBILIDADE. INTERVENÇÃO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE (APP) DO LAGO ARTIFICIAL DA HIDRELÉTRICA ÁGUA VERMELHA. REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA NÃO COMPROVADA. ÁREA RURAL. FIXAÇÃO DE APP DE 100 METROS. DANO AMBIENTAL RECUPERÁVEL. REMESSA OFICIAL E APELAÇÃO DO MPF PARCIALMENTE PROVIDAS. APELAÇÃO DO IBAMA PROVIDA. APELAÇÃO DE NELSON GORAYEB E DO MUNICÍPIO DE CARDOSO/SP NÃO PROVIDAS. 1. Sentença submetida à remessa oficial, consoante a jurisprudência assente do C. Superior Tribunal de Justiça e deste E. Tribunal Regional Federal, aplicando-se por analogia a Lei nº 4.717, de 1965, a qual prevê, em seu art. 19, que "a sentença que concluir pela carência ou pela improcedência da ação está sujeita ao duplo grau de jurisdição". 2. Os rios que banham mais de um Estado da federação e os seus terrenos marginais, bem como os potenciais de energia hidráulica são bens da União, de interesse dos entes federais, incisos III e VIII da Constituição Federal, o que atrai a competência da Justiça Federal para processar e julgar a presente ação, inciso I do art. 109 da Carta Magna. 3. Cinge-se a controvérsia em apurar se a área em que se encontra o imóvel em questão, localizado às margens do reservatório da usina hidrelétrica Água Vermelha, às margens do Rio Grande, no município de Cardoso/SP, deve ser considerada área rural e, portanto, com APP de 100 (cem) metros, ou se área urbana consolidada, com APP de 30 (trinta) metros, nos termos do disposto no inciso I do art. 3º da Resolução nº 302/2002 do CONAMA, ou, ainda, como loteamento irregular, em área urbana, com APP de 30 (trinta) metros, nos moldes da r. sentença. 4. O fato de existirem, no curso do processo de apuração, três leis tratando dessa matéria (4.771, de 1965 - 7.803, de 1989 e 12651, de 2012), por razões de segurança jurídica, deve-se aplicar o princípio do tempus regit actum, até porque, como já decidiu o C. STJ, o novo Código Florestal tem eficácia ex nunc e não alcança fatos pretéritos quando isso implicar a redução do patamar de proteção do meio ambiente. 5. O CONAMA tem competência legal para editar normas, estabelecer critérios e padrões relativos ao controle e à manutenção da qualidade do meio ambiente com o objetivo de garantir o uso racional, principalmente, dos recursos hídricos, conforme dispõe o inciso VII do art. 8º da Lei nº 6938, de 1981. 6. O IBAMA, além de ter autorização legal para se habilitar como litisconsorte, nos termos do §2º do art. 5º da Lei nº 7.347, de 1985, detém competência, também legal, para executar medidas de proteção e melhoria da qualidade do meio ambiente, nos moldes do que estabelece o inciso IV do art. 6º da Lei nº 6.938, de 1981. Portanto, mediante a expressa concordância do MPF e do interesse do Instituto, é perfeitamente possível sua inclusão no polo ativo da ação como litisconsorte do parquet. 7. É importante ressaltar que este E. Tribunal tem exigido a realização de prova pericial no âmbito judicial, para averiguar eventuais danos ambientais ocasionados, seus elementos e alcance. 8. A prova pericial no âmbito judicial, neste caso específico e excepcionalmente, mostra-se prescindível, haja vista o que consta do Laudo de Exame Para Constatação de Dano Ambiental, documento expedido por órgão público com competência para dizer sobre questões ambientais e que instruiu a presente ação civil pública. 9. A Lei nº 8.171, de 1991, o Contrato de Concessão nº 92/99 (852/870) e a Licença de Operação nº 345/2003 (fls. 279/281) são claros ao afirmar a responsabilidade da AES em recuperar e fiscalizar a utilização da APP no entorno do lago artificial da hidrelétrica Água Vermelha, que na hipótese é de 100 (cem) metros. 10. Considerando que o imóvel está localizado em área rural e que o dever de fiscalização dos municípios restringe-se, no que se refere à ocupação ordenada do solo, à área urbana, não há que se falar em responsabilidade solidária do município de Cardoso/SP. 11. Resta comprovado que o dano ambiental ocorreu em área de APP fixada em 100 (cem) metros e, portanto, a reparação da área danificada é determinação constitucional nos termos do § 3º do art. 225 da Constituição da República e deve ser promovida pelo seu causador. 12. A área é plenamente recuperável, desde que se promova a demolição e a remoção das edificações e a elaboração de um Plano de Recuperação de Área Degradada (PRAD) que deve ser apresentado à autoridade ambiental competente para aprovação e fiscalização de sua execução. 13. Dá-se parcial provimento ao reexame necessário e à apelação do MPF, dá-se provimento ao recurso da União (IBAMA) e nega-se provimento às apelações de Nelson Gorayeb e do município de Cardoso/SP”. A decisão monocrática mencionada, proferida na Rcl 38.764/SP, oportunamente confirmada, com trânsito em julgado certificado, asseverou: “(...) Em juízo de estrita delibação, entendo que a autoridade reclamada, ao recusar aplicação ao art. 62 da Lei nº 12.651/2012 no caso concreto com fundamento no ‘princípio do tempus regit actum’ e do postulado da vedação do retrocesso em matéria ambiental, em 26/7/2018, esvaziou a eficácia normativa do referido dispositivo legal cuja validade constitucional fora afirmada pelo STF na ADI 4.903/DF e na ADC nº 42/DF (sessão de julgamento de 28/2/2018, ata de julgamento publicada no DJe de 2/3/2018). (...).” Assim, resta indene de dúvida que o artigo 62 do Novo Código Florestal tem aplicação pretérita já que o dispositivo, cuja constitucionalidade foi declarada, em sua literalidade, define novos parâmetros às áreas de preservação permanente “Para os reservatórios artificiais de água destinados a geração de energia ou abastecimento público que foram registrados ou tiveram seus contratos de concessão ou autorização assinados anteriormente à MP nº 2.166-67 de 2001”, o que e o caso da UHE Água Vermelha. Realizado este apanhado, há de ser reconhecida a violação à norma jurídica, especificamente o artigo 62 do Novo Código Florestal, pelo acórdão rescindendo, de modo que a decisão combatida comporta rescisão. Com efeito, embora o acórdão rescindendo tenha fixado como área de preservação permanente a extensão de 100 metros no entorno da UHE Água Vermelha, aplicado o artigo 62 do Novo Código Florestal ao contrato de concessão em espécie, firmado em 1999, a distância entre o nível máximo operativo normal e a cota máxima maximorum da UHE de Água Vermelha coincide no valor de 383,3 m, o que culmina em uma área de preservação permanente nula ou igual a zero. Em decorrência, havendo norma legal declarada constitucional e aplicável ao caso vertente, afasta-se a pretensa aplicação, pela defesa, da Resolução CONAMA 302/2004, inexistindo, via de consequência, dano ambiental a ser reconhecido. Em juízo rescisório, portanto, o apelo da AES Tietê deve ser provido de modo a afastar a obrigação de "demolição integral das edificações, bem como a remoção dos entulhos decorrentes na faixa de proteção ambiental, reparando o dano ambiental verificado na APP mencionada, bem como efetuarem a colocação de cerca ou alambrado para o impedimento de acesso e de atividade antrópica". Sem condenação em honorários advocatícios ante a natureza da ação originária. Ante o exposto, julgo prejudicado o agravo interno, afasto a preliminar arguida e, no mérito, após a apresentação de voto vista pela Desembargadora Federal Marli Ferreira, julgo procedente a ação rescisória para desconstituir o acórdão rescindendo, proferido nos autos da Ação Civil Pública nº 0008824-94.2007.4.03.6106 e, em juízo rescisório, dou provimento à apelação da AES TIETÊ S/A e nego provimento à remessa oficial. É o voto. (d)
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 5020192-48.2017.4.03.0000
RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. ANTONIO CEDENHO
AUTOR: AES TIETE ENERGIA S.A.
Advogados do(a) AUTOR: WERNER GRAU NETO - SP120564, MATEUS DA COSTA MARQUES - SP373989
REU: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O V I S T A
A Excelentíssima Senhora Desembargadora Federal MARLI FERREIRA:
Pedi vista dos autos para melhor exame da matéria, sobretudo no que tange à aplicação retroativa do Novo Código Florestal, Lei nº 12.651/2012.
Acompanho o e. Relator quanto ao afastamento da preliminar arguida, no mérito, no entanto, ouso divergir de S. Excelência.
Tal como ocorre em matéria penal e administrativa, a lei benéfica deve necessariamente retroagir para beneficiar os que são por ela alcançados, pena de se perpetrar odiosa injustiça.
No âmbito da 4ª Turma tenho entendido que, a partir do julgamento pelo C. Supremo Tribunal Federal da constitucionalidade do Novo Código Florestal, é de ser imediatamente observado o quanto preceitua o art. 62 desse diploma legal, que vem assim expresso:
“Art. 62 – Para os reservatórios artificiais de água destinados à geração de energia ou abastecimento público que foram registrados ou tiveram seus contratos de concessão ou autorização assinados anteriormente à Medida Provisória nº 2.166-67, de 24 de agosto de 2001, a faixa de Área de Preservação Permanente será a distância entre o nível máximo operativo e a cota máxima maximorum.”
Destaco que o contrato de concessão n. 92/1999, juntado à inicial, estabelece o prazo de 30 (trinta) anos, a partir da data de sua assinatura.
Portanto, totalmente aplicável o dispositivo legal na hipótese dos autos.
De se indagar, o que se entende por nível máximo operativo normal e cota máxima maximorum?
O nível máximo operativo normal é a cota máxima em que o reservatório pode operar normalmente e a maximorum é aquela observada na excepcionalidade de um reservatório cheio.
Portanto, a conta é matemática. Subtrai-se o valor do nível normal de operação daquele da máxima maximorum para se aferir a extensão a ser observada da APP na área. Significa afirmar que, doravante, sequer a Resolução CONAMA 302/2004 pode ser exigida; isto porque os direitos fundamentais somente podem ser enfrentados por lei e não por Resolução, e ainda porque há lei específica sobre a questão aqui debatida, já enfrentada pelo STF.
A cota máxima normal de operação e a cota máxima maximorum da UHE de Água Vermelha coincidem no valor de 383,3 m. Em decorrência, a faixa de APP nesse reservatório é ZERO, ex vi do artigo 62 do novo Código Florestal.
Aliás, julgar de forma diversa seria declarar obliquamente a inconstitucionalidade do Novo Código Florestal, decisão que abriria ensejos, perante o STF de Reclamação para restabelecimento da autoridade da matéria decidida na ADI.
Com efeito, em 10/01/2020, na Reclamação nº 38.764/SP, distribuída ao e. Ministro Edson Fachin cujo ato reclamado é o acórdão proferido nos autos da AC nº 0002737-88.2008.4.03.6106/SP deste Regional, sob a alegação de que teria desrespeitado a autoridade do Supremo Tribunal Federal e a eficácia do julgado na ADI 4.903/DF e na ADC nº 42/DF, o e. Presidente, Ministro Dias Toffoli deferiu a tutela de urgência para suspender a eficácia daquela decisão com base nos mesmos fundamentos ora explanados, cujo excerto transcrevo:
“(...)
Em juízo de estrita delibação, entendo que a autoridade reclamada, ao recusar aplicação ao art. 62 da Lei nº 12.651/2012 no caso concreto com fundamento no ‘princípio do tempus regit actum’ e do postulado da vedação do retrocesso em matéria ambiental, em 26/7/2018, esvaziou a eficácia normativa do referido dispositivo legal cuja validade constitucional fora afirmada pelo STF na ADI 4.903/DF e na ADC nº 42/DF (sessão de julgamento de 28/2/2018, ata de julgamento publicada no DJe de 2/3/2018).
Destaco que a constitucionalidade do art. 62 da Lei nº 12.651/2012 foi questionada em sede de controle abstrato perante o STF pela Procuradoria-Geral da República (ADI nº 4.903/DF) com os seguintes argumentos:
‘103. Não bastassem as alterações acima descritas, a Lei 12.651/12 criou uma disciplina legal específica - e ainda mais prejudicial - para os reservatórios artificiais de água destinados a geração de energia ou abastecimento público que foram registrados ou tiveram seus contratos de concessão ou autorização assinados anteriormente à Medida Provisória nº 2.166-67, de 24 de agosto de 2001. Dispõe o art. 62 da lei impugnada:
Art. 62 - Para os reservatórios artificiais de água destinados a geração de energia ou abastecimento público que foram registrados ou tiveram seus contratos de concessão ou autorização assinados anteriormente à Medida Provisória n° 2.166-67, de 24 de agosto de 2001, a faixa da Área de Preservação Permanente será a distância entre o nível máximo operativo normal e a cota máxima maximorum.
104. Há, uma vez mais, evidente retrocesso em matéria ambiental pois reduz-se, sensivelmente, a proteção das áreas de preservação permanente de reservatórios, que era traçada a contar da cota máxima de inundação do reservatório artificial.
[…]
106. Na disciplina anterior, como mencionado, iniciava-se a configuração da APP a partir da cota máxima de inundação e estendia-se por metragem mínima pré estabelecida. Havia, na prática, uma faixa de transição entre o reservatório e a APP, que era composta pela distância entre a cota máxima e maximorum.
107. A nova definição reduz sensivelmente o grau de proteção no entorno dos reservatórios artificiais. Isso porque as cotas (máxima e maximorum, por exemplo) estão voltadas a medir e garantir a vazante do reservatório em seus níveis operacionais, enquanto a área de preservação permanente visa proteger a vegetação do entorno do reservatório.
108. Como consequência, na prática, serão removidas áreas de preservação permanente dos reservatórios formados antes da entrada em vigor da Medida Provisória nº 2.166-67, de 24 de agosto de 2001, marco temporal que, ademais, não possui qualquer razoabilidade, pois a obrigatoriedade de preservação das áreas no entorno dos reservatórios é anterior à mencionadaMedida Provisória.
[…]
110. Assim sendo, deve ser declarado inconstitucional o ar!. 62 da Lei 12.651/12, por configurar evidente retrocesso ambiental, além de permitir a descaracterização das áreas de preservação permanente do entorno de reservatórios artificiais.’
No ponto, as razões da Procuradoria-Geral da República não foram acolhidas pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal que, ‘por unanimidade, julgou constitucional o art. 62 do Código Florestal’ (ata de julgamento publicada no DJe de 2/3/2018). Disciplina o art. 493 do CPC:
‘Art. 493. Se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no julgamento do mérito, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a decisão.
Parágrafo único. Se constatar de ofício o fato novo, o juiz ouvirá as partes sobre ele antes de decidir.’
Por essas razões, entendo que há plausibilidade na tese de que o TRF 3, ao recusar a aplicação do art. 62 do Código Florestal na solução do caso concreto, esvaziou a força normativa do dispositivo legal, recusando eficácia vinculante ao julgado pelo STF na ADI 4.903/DF e na ADC nº 42/DF. Ademais, por haver, na decisão reclamada, determinação para ‘demolição e a remoção das edificações’ localizadas em área eventualmente alcançada pela força normativa do art. 62 do Código Florestal, entendo presente o requisito do periculum in mora, justificando minha atuação com fundamento no art. 13, VIII, do RISTF.
Ante o exposto, e sem prejuízo de nova análise da questão pelo eminente Relator, defiro a tutela de urgência para suspender a eficácia de decisão do TRF 3 na ACP nº 0002737-88.2008.4.03.6106/SP, bem comopara obstar a prática de eventuais atos ou procedimentos executivos dela decorrentes.
Cite-se a parte beneficiária da decisão reclamada. Solicitem-se informações. Após, encaminhem-se os autos ao gabinete do eminente Relator.
Publique-se.
Brasília, 10 de janeiro de 2020.”
Assim considerando, acompanho o e. Relator para julgar prejudicado o agravo interno e afastar a preliminar arguida, contudo, no mérito, vênia devida, julgo procedente a ação rescisória para desconstituir o acórdão prolatado na ACP nº 0008824-94.2007.4.03.6106 e, em juízo rescisório dar provimento à apelação da AES TIETÊ S/A e negar provimento à remessa oficial.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. PRELIMINAR DE DECADÊNCIA AFASTADA. MÉRITO. JULGAMENTO ANTECIPADO. DANO AMBIENTAL. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. UHE ÁGUA VERMELHA. APLICAÇÃO DO CÓDIGO NOVO CÓDIGO FLORESTAL. ARTIGO 62. CONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA PELO STF. ADI 4.903 E ADC 42. AGRAVO INTERNO PREJUDICADO. RESCISÓRIA PROCEDENTE.
1. Tendo em vista a apreciação definitiva, nesta oportunidade, do mérito da questão posta a julgamento, julgo prejudicado o agravo interno interposto.
2. Os embargos infringentes previstos no Código de Processo Civil de 1973 tinham cabimento em caso de acórdão não unânime que, em grau de apelação, reformasse sentença de mérito. O recurso de apelação interposto pela ora autora visava afastar a condenação imposta pela sentença. Ocorre que o recurso foi desprovido, não acarretando, portanto, reforma de decisão recorrida. A modificação da decisão recorrida se deu em razão da remessa oficial e somente em sua extensão eis que, na oportunidade, foi mantida a condenação (não houve reforma propriamente dita), tendo os Julgadores, em sua maioria, considerado que a área de preservação aplicável ao caso seria de 100 e não de 30 metros.
3. Vale ressaltar que mesmo que a remessa oficial houvesse de fato reformado a sentença, os embargos infringentes não seriam cabíveis em razão da literalidade do artigo 530 do CPC/73 e também da Súmula 390 do STJ. Ademais, sequer foi aventado, no curso dos autos originários, o cabimento dos infringentes.
4. Não caracterizado o erro grosseiro, deve ser considerado o prazo de 02 (dois) anos para propositura da ação rescisória contado a partir do trânsito em julgado da última decisão nos autos, o que ocorreu em 02.06.2017. Proposta a ação em novembro/2017, não decorreu o prazo decadencial.
5. Quanto ao mérito, na ADI 4.903/DF, assim como na ADC 42, restou consignada a constitucionalidade do artigo 62 do Novo Código Florestal. Não é demais ressaltar que o Ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, debruçando-se não só sobre o tema, mas especificamente sobre a UHE Água Vermelha, nos autos da Reclamação Rcl 38.764/SP distribuída à Relatoria do Min. Edson Fachin, decidiu que esta Corte Federal, nos autos da Apelação Cível nº 0002737-88.2008.4.03.6106/SP (caso análogo ao presente), desrespeitou a autoridade do Supremo Tribunal Federal e a eficácia do julgado na ADI 4.903/DF e na ADC nº 42/DF.
6. Assim, resta indene de dúvida que o artigo 62 do Novo Código Florestal tem aplicação pretérita já que o dispositivo, cuja constitucionalidade foi declarada, em sua literalidade, define novos parâmetros às áreas de preservação permanente “Para os reservatórios artificiais de água destinados a geração de energia ou abastecimento público que foram registrados ou tiveram seus contratos de concessão ou autorização assinados anteriormente à MP nº 2.166-67 de 2001”, o que e o caso da UHE Água Vermelha.
7. Realizado este apanhado, há de ser reconhecida a violação à norma jurídica, especificamente o artigo 62 do Novo Código Florestal, pelo acórdão rescindendo, de modo que a decisão combatida comporta rescisão.
8. Com efeito, embora o acórdão rescindendo tenha fixado como área de preservação permanente a extensão de 100 metros no entorno da UHE Água Vermelha, aplicado o artigo 62 do Novo Código Florestal ao contrato de concessão em espécie, firmado em 1999, a distância entre o nível máximo operativo normal e a cota máxima maximorum da UHE de Água Vermelha coincide no valor de 383,3 m, o que culmina em uma área de preservação permanente nula ou igual a zero.
9. Em decorrência, havendo norma legal declarada constitucional e aplicável ao caso vertente, afasta-se a pretensa aplicação, pela defesa, da Resolução CONAMA 302/2004, inexistindo, via de consequência, dano ambiental a ser reconhecido.
10. Agravo interno prejudicado, preliminar arguida afastada. No mérito, julgada procedente a ação rescisória.