Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002060-24.2018.4.03.6105

RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR

APELANTE: RING PRODUCOES CULTURAIS LTDA - ME

Advogados do(a) APELANTE: CARLOS EDUARDO PEREIRA BARRETTO FILHO - SP194526-A, PAULO HUMBERTO CARBONE - SP174126-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002060-24.2018.4.03.6105

RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR

APELANTE: RING PRODUCOES CULTURAIS LTDA - ME

Advogados do(a) APELANTE: CARLOS EDUARDO PEREIRA BARRETTO FILHO - SP194526-A, PAULO HUMBERTO CARBONE - SP174126-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 Trata-se de recurso de apelação interposto por RING PRODUCOES CULTURAIS LTDA contra sentença que julgou improcedente o pedido e denegou a segurança, nos termos do art. 487, I, do CPC.

O presente mandamus foi impetrado pela ora recorrente contra ato INSPETOR CHEFE DA ALFÂNDEGA AEROPORTO INTERNAC VIRACOPOS CAMPINAS-SP, objetivando, ao final, a liberação para reexportação as mercadorias constantes na DSI nº 16/000183-3, que guarneciam a exposição “The Art of the Brick”.

O pedido de liminar foi indeferido (ID 4326684).

Informações prestadas pela autoridade impetrada (ID 4326693).

Pela sentença (ID 4326703), o Juiz a quo entendeu que: “a Instrução Normativa da Receita Federal do Brasil nº 1.600/2015, ao dispor sobre a aplicação dos regimes aduaneiros especiais de admissão temporária, expressamente impõe ao interessado a multa por descumprimento do regime e estabelece que a reexportação somente poderá ser efetuada depois do pagamento da multa, conforme artigo 51, parágrafos 2º e 3º do referido ato normativo. Nesse contexto, não verifico a ilegalidade da exigência, porque a impetrante é responsável pela multa decorrente da reexportação fora do prazo legal, não se aplicando à hipótese dos autos a Súmula nº 323 do E. STF”.

Consignou, ainda, que “há risco de irreversibilidade da medida, se autorizada a reexportação e, caso mantida a multa, a impetrante não possua patrimônio para solvê-la, tendo em vista que consta em seu estatuto capital social de R$ 1.000,00 (um mil reais). Nada impede, porém, que de modo a resguardar os seus interesses, seja prestada garantia idônea, como condição à imediata reexportação”.

Embargos de declaração rejeitados, consoante sentença ID 4326709.

Em suas razões de recorrer (ID 4326715), alega, em síntese: a) “a Apelante apresentou um pedido de prorrogação do prazo de admissão temporária. Em que pese a intempestividade do pedido, a Apelante demonstrou às autoridades aduaneiras que essa intempestividade decorreu de um caso fortuito, ou seja, um fato alheio a sua vontade, o que foi comprovadamente demonstrado no processo administrativo e colacionado também na presente ação”; b) “não há que se falar em irreversibilidade, pois eventual multa, ainda que se pudesse considerar como devida, é de responsabilidade da Apelante e não da proprietária das obras de arte, Terminal 2, B.V.”; c) “reexportação não pode ficar condicionada ao recolhimento de uma multa que sequer é de responsabilidade da proprietária dos bens, configurando verdadeiro confisco de patrimônio, sem sequer ter sido dada oportunidade de defesa ao dono das obras”; d) a retenção da mercadoria afronta a Súmula n. 323 do STF; d)

Contrarrazões da União (ID 4326724), pugnando pelo desprovimento do apelo.

Parecer do Ministério Público Federal (ID 6814422) opinando pelo parcial provimento do recurso, “reformando-se a r. sentença de forma a coibir a Apelada de condicionar a liberação das mercadorias ao pagamento da multa”.

Foi proferido despacho (ID 89928187) determinando aos impetrados que informassem se as obras de arte em questão encontravam-se em seu poder e desde que data, do qual não houve resposta.

A impetrante, conforme ID 93313743, juntou aos autos extrato emitido pela concessionária de Viracopos que afirma que a carga continuava, até aquela data (27/06/2019) no aeroporto sob guarda da Alfândega.

É o relato do necessário.

 

 

 

 

 

 

 


DECLARAÇÃO DE VOTO

 

 

Senhores Desembargadores, divirjo do relator, por entender que, verificada irregularidade no procedimento de reexportação, o despacho aduaneiro deve ser interrompido para devida regularização.

Não se trata, em tais casos, de apreensão de bens como forma coercitiva de pagamento de tributos, como vedado pela Súmula 323/STF, pois o enunciado cuida das hipóteses em que a autoridade age sem previsão legal, adotando solução que repute, arbitrariamente, devida, substituindo o processo regular de cobrança pela apreensão de mercadorias. 

Se, contudo, a verificação da regularidade fiscal da operação, que abrange apuração e recolhimento de tributos e outros encargos aduaneiros, integra o próprio processo legal de exportação e desembaraço de bens, como assente, não cabe cogitar de restrição ilícita, mas de etapa legal prevista para a conclusão do despacho aduaneiro.

Neste sentido a jurisprudência, em casos análogos:

 

RESP 1.728.921, Rel. Min. REGINA COSTA, DJE 24/10/2018"PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE. TRIBUTÁRIO. DESPACHO ADUANEIRO. DIREITO ANTIDUMPING. SÚMULA 323/STF. NÃO INCIDÊNCIA. HONORÁRIOS. NÃO CABIMENTO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. I - Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado. In casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 2015. II - Não se pode conhecer a apontada violação ao art. 1.022, do Código de Processo Civil, porquanto o recurso cinge-se a alegações genéricas e, por isso, não demonstra, com transparência e precisão, qual seria o ponto omisso, contraditório ou obscuro do acórdão recorrido, bem como a sua importância para o deslinde da controvérsia, o que atrai o óbice da Súmula 284 do Supremo Tribunal Federal, aplicável, por analogia, no âmbito desta Corte. III - A quitação dos direitos antidumping é requisito para perfectibilização do processo de importação. A retenção de mercadorias e a exigência do recolhimento de tributos e multa ou prestação de garantia integram a operação aduaneira. Inaplicabilidade da Súmula 323 do Supremo Tribunal Federal. IV - Honorários. Não cabimento. V - Recurso Especial provido." 

 


ApCiv 5002051-96.2017.4.03.6105, Rel. Des. Fed. NELTON DOS SANTOS, publicação 08/02/2020: "TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONTROLE ADUANEIRO. SÚMULA 323 STF. INAPLICAÇÃO. PARALISAÇÃO DE DESPACHO ADUANEIRO. ATO ADMINISTRATIVO. PRESUNÇÃO DE LEGALIDADE E VERACIDADE. APELAÇÃO NÃO PROVIDA. 1. A interrupção do despacho aduaneiro está expressamente respaldada no mencionado art. 571, § 1º, I, do Decreto 6.759/2009, uma vez que a impetrante descumpriu a exigência de apresentação de documentos no curso da conferência aduaneira.2. Impertinente, pois, a invocação da Súmula nº 323 do Supremo Tribunal Federal, uma vez que não se trata de "apreensão" de mercadoria, e sim de paralisação de despacho aduaneiro. Precedentes do STJ. 3. Tampouco merece prosperar o pedido subsidiário formulado, porquanto a liberação da mercadoria somente poderia ser realizada mediante a prestação de garantia se tivesse sido instaurado procedimento especial de controle aduaneiro em razão das irregularidades constantes dos incisos IV e V do art. 2º da IN RFB 1.169/2011, inaplicáveis ao caso. Precedentes desta Turma. 4. Em relação à própria autuação, não se vislumbram, por ora, elementos suficientes a afastar a presunção de veracidade e legitimidade do ato administrativo. Precedentes.5. Apelação não provida."

 

O caso cuida de despacho de reexportação, em que consta da legislação, expressamente, nos termos do artigo 71, § 6º, do Decreto-lei 37/1966, que "Não será desembaraçada para reexportação a mercadoria sujeita à multa, enquanto não for efetuado o pagamento desta.".

Trata-se de norma vigente, cuja eficácia não pode ser afastada, mesmo em sede judicial, sem a declaração de sua inconstitucionalidade, com observância do rito próprio, inclusive a cláusula de reserva de plenário, nos termos da Súmula Vinculante 10 da Suprema Corte. 

Para cabalmente afastar a inconstitucionalidade de que se cogita, cabe registrar o paradigma da Suprema Corte no RE 1.091.591, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, referente ao Tema 1.042, conforme acórdão assim ementado: 

 

"IMPORTAÇÃO – TRIBUTO E MULTA – MERCADORIA – DESPACHO ADUANEIRO – ARBITRAMENTO – DIFERENÇA – CONSTITUCIONALIDADE. Surge compatível com a Constituição Federal o condicionamento, do desembaraço aduaneiro de bem importado, ao pagamento de diferença tributária apurada por arbitramento da autoridade fiscal."

 

Existe, portanto, previsão legal de cumprimento de requisito para a reexportação, que não sendo observada autoriza a interrupção do despacho aduaneiro, sem que caiba cogitar, portanto, de violação a direito líquido e certo. 

Ante o exposto, nego provimento à apelação. 

É como voto. 


O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO:

 

Narra a apelante que tendo como objeto social produções culturais, artísticas e cinematográficas, dentre outras atividades, firmou contrato com a empresa Terminal 2 para produzir o evento no Brasil denominado “The Art Of The Brick”, sendo os respectivos bens importados sob o regime aduaneiro especial de admissão temporária. Informa que tal regime venceu em 03/02/2017, sendo prorrogado por mais seis meses, até 03/08/2017.

Relata que diante do sucesso da exposição, solicitou, em 25/08/2017, a prorrogação do prazo de vigência por mais 6 (seis) meses para que continuasse a exposição no país e assim fosse montada na cidade de Campinas.

O despacho de reexportação dos bens foi interrompido pela aduana brasileira em razão da imposição de multa pelo descumprimento do prazo do regime.

Em suma, a retenção dos bens se deu pela inobservância de prazo para prorrogação do regime de admissão temporária.

Examinando os autos, tenho que a apelante não buscou burlar a legislação de regência ou as regras aduaneiras correlatas. 

A retenção das obras, cuja liberação depende tão somente do pagamento de multa de mais de 10 milhões, viola o direito constitucional que proíbe a retenção de bens de terceiros sem o devido processo legal (artigo 5º, inciso LIV) e Súmula 323 do C. Supremo Tribunal Federal, verbis:

 

Súmula 323: É inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos. 

 

Ademais, como bem ressaltou a apelante, a retenção das obras de arte implicará em descumprimento de seu roteiro pelo mundo, como, por exemplo, a exposição que era prevista para o período de 22/03/2018 a 24/06/2018, na Itália.

Entendo que foge da razoabilidade impedir a exposição de obras pelo mundo por ato da administração pública interna.

Sobre o tema, seguem precedentes desta E. Corte:

 

AÇÃO ORDINÁRIA - DIREITO TRIBUTÁRIO E ADUANEIRO - INFORMAÇÃO INEXATA EM DECLARAÇÃO DE IMPORTAÇÃO - MULTA PREVISTA NO ARTIGO 711, INCISO III, DO DECRETO N.º 6.759/2009 - RETENÇÃO DA MERCADORIA: IMPOSSIBILIDADE - SÚMULA 323, DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. 1. O pedido é de anulação da multa prevista no artigo 711, inciso III, do Decreto n.º 6.759/2009 (Regulamento Aduaneiro): "Art. 711. Aplica-se a multa de um por cento sobre o valor aduaneiro da mercadoria (Medida Provisória nº 2.158-35, de 2001, art. 84, caput; e Lei nº 10.833, de 2003, art. 69, § 1º): (...)III - quando o importador ou beneficiário de regime aduaneiro omitir ou prestar de forma inexata ou incompleta informação de natureza administrativo-tributária, cambial ou comercial necessária à determinação do procedimento de controle aduaneiro apropriado." 2. No caso, o preenchimento inexato da declaração de importação - fato incontroverso - configura o pressuposto fático de incidência da sanção pecuniária. 3. A existência, ou não, de prejuízo financeiro do Fisco e a intenção do infrator são fatores irrelevantes à tipificação da conduta (artigo 136, do Código Tributário Nacional). Precedente do Superior Tribunal de Justiça. 4. A Súmula n.º 323, do Supremo Tribunal Federal: "É inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos." 5. A retenção de mercadorias não é medida adequada para coagir o importador ao pagamento de tributos ou multas, mas, sim, providência acautelatória, destinada a garantir efetividade à atividade fiscalizatória. 6. Se ausentes outros impedimentos à liberação da mercadoria, o ato de retenção não se sustenta. 7. Apelação e remessa necessária parcialmente providas.

(ApReeNec 00119891920114036104, JUIZ CONVOCADO LEONEL FERREIRA, TRF3 - SEXTA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:18/07/2018 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)

 

AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. DESEMBARAÇO ADUANEIRO. RECLASSIFICAÇÃO TARIFÁRIA. INEXISTÊNCIA DE LAVRATURA DE AUTO DE INFRAÇÃO. LIBERAÇÃO DAS MERCADORIAS (DI Nº 16/0769425-7). DESNECESSIDADE DE PRESTAÇÃO DE GARANTIA. A FAZENDA PÚBLICA DISPÕE DE MEIOS PRÓPRIOS PARA COBRANÇA. 1. No caso vertente, a impetrante importou mercadoria selecionada pela Fiscalização da Receita Federal do Brasil para conferência aduaneira. A controvérsia cinge-se à possibilidade de liberação de mercadorias objeto do DI nº 16/0769425-7 que se encontram em processo de importação sem a prestação de garantia. 2. A Fazenda Pública tem os meios próprios e eficazes para a cobrança de tributos e das demais despesas acessórias, mostrando-se desarrazoada a medida adotada de retenção da mercadoria enquanto se aguarda a prestação de garantia, sendo possível, no presente caso, a aplicação analógica da Súmula n.º 323 do Supremo Tribunal Federal. 3. Inexistindo fraude no procedimento de importação e não sendo a mercadoria em questão de importação proibida, mostra-se correta a liberação dos bens importados sem a necessidade de prestação de garantia ou imediato recolhimento dos tributos e das multas devidas, que devem ser apurados durante o procedimento administrativo fiscal. 4. Agravo de instrumento provido e agravo interno prejudicado.

(AI 00156215620164030000, DESEMBARGADORA FEDERAL CONSUELO YOSHIDA, TRF3 - SEXTA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:20/04/2017 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)

 

ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. DIVERGÊNCIA QUANTO À CLASSIFICAÇÃO FISCAL DE MERCADORIAS. RETENÇÃO INDEVIDA. EXIGÊNCIA DE TRIBUTOS. PARALISAÇÃO DO DESPACHO ADUANEIRO. ILEGALIDADE. 1. Não se conhece do agravo de instrumento convertido em retido, cuja reiteração exigida pelo art. 523, §1º, do Código de Processo Civil de 1973 não ocorreu. 2. Afastada a alegação de descabimento da via eleita porquanto, a par da divergência acerca da correta classificação da mercadoria importada, a ser discutida em via própria, a impetrante comprovou a violação de seu direito líquido e certo, qual seja, a retenção da mercadoria como meio para cobrança de tributos. 3. A retenção das mercadorias importadas se deu em razão de divergência entre a classificação fiscal adotada pelo importador e a considerada correta pela Receita Federal, uma vez que discordam a respeito da inclusão ou não dos livros com brinquedos no conceito de quebra-cabeças. 4. A revisão e conferência da documentação e dos bens importados encontra previsão legal, sendo, ainda, a apreensão de bens pela autoridade alfandegária, justificável em determinadas situações e por prazo determinado, decorrência de seu poder de polícia e atividade de agente de fiscalização tributária. 5. Encontrando-se a mercadoria suficientemente descrita e com todos os elementos necessários à sua identificação e ao enquadramento tarifário existente, há a possibilidade de sua alteração pelo Fisco, independentemente da atuação da contribuinte, lavrando-se o respectivo auto para a exigência dos tributos eventualmente devidos, o que pode ocorrer sem a necessidade de retenção das mercadorias. 6. A retenção da mercadoria como meio para a exigência dos impostos e multas correspondentes é vedada nos termos da Súmula nº 323 do Supremo Tribunal Federal. 7. A dúvida acerca da correta classificação não poderá obstar a liberação do bem, podendo o Fisco exigir, se for o caso, para a entrega da mercadoria, a correspondente caução. 8. A interrupção do despacho aduaneiro, equivale ao ato administrativo de apreensão de bens, porquanto não importa o nome que se dê para a hipótese, a consequência, para ambos os casos, é a privação indevida, ao proprietário, dos bens que lhe pertencem, o que é ilegal. 9. Agravo não conhecido. Apelação desprovida.

(Ap 00250376220084036100, DESEMBARGADOR FEDERAL NELTON DOS SANTOS, TRF3 - TERCEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:30/09/2016 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)

 

Não vislumbro, portanto, motivo plausível para a não liberação dos bens, cabendo ao Fisco lançar mão dos meios ordinários de cobrança para obtenção do pretenso crédito. 

Ante o exposto, acompanho o e. Relator para dar provimento à apelação. 

É o voto. 

 

DECLARAÇÃO DE VOTO

 

Apelação interposta por Ring Produções Culturais Ltda – ME contra sentença que, em sede de mandado de segurança, denegou a ordem e julgou improcedente o pedido de liberação e continuidade do procedimento de reexportação do bem objeto da Declaração Simplificada de Exportação – DSE n.º 0817700-010 (Id 4326703).

O relator deu provimento ao recurso para conceder a segurança e determinar o prosseguimento do despacho de reexportação sem a exigência da multa prevista no artigo 72, inciso I, da Lei n.º 10.833/03. Divirjo, todavia.

Sobre o regime aduaneiro especial da admissão temporária, dispõem os artigos 353, 361, §1º, 367, inciso I e §10º, e 709, do Decreto n.º 6.759/09, bem como o artigo 71, §6º, do Decreto-Lei n.º 37/66 verbis:

 

Decreto n.º 6.759/09

Art. 353.  O regime aduaneiro especial de admissão temporária é o que permite a importação de bens que devam permanecer no País durante prazo fixado, com suspensão total do pagamento de tributos, ou com suspensão parcial, no caso de utilização econômica, na forma e nas condições deste Capítulo

 

Art. 361.  O prazo de vigência do regime será fixado observando-se o disposto no art. 307 e no § 1o do art. 355. 

§ 1º Não será conhecido pedido de prorrogação apresentado após o termo final do prazo fixado para permanência dos bens no País, hipótese em que será aplicada a multa referida no art. 709. 

 

Art. 709.  Aplica-se a multa de dez por cento sobre o valor aduaneiro, no caso de descumprimento de condições, requisitos ou prazos estabelecidos para aplicação do regime aduaneiro especial de admissão temporária ou de admissão temporária para aperfeiçoamento ativo (Lei nº 10.833, de 2003, art. 72, inciso I)

 

Art. 367.  Na vigência do regime, deverá ser adotada, com relação aos bens, uma das seguintes providências, para liberação da garantia e baixa do termo de responsabilidade:

I - reexportação;

(...)

§ 10.  Quando exigível multa, o despacho de reexportação deverá ser interrompido, formalizando-se a correspondente exigência (Decreto-Lei nº 37, de 1966, art. 71, § 6º, com a redação dada pelo Decreto-Lei nº 2.472, de 1988, art. 1º). 

 

Decreto-Lei n.º 37/66

Art.71 - Poderá ser concedida suspensão do imposto incidente na importação de mercadoria despachada sob regime aduaneiro especial, na forma e nas condições previstas em regulamento, por prazo não superior a 1 (um) ano, ressalvado o disposto no § 3º, deste artigo.    

(...)

§ 6º - Não será desembaraçada para reexportação a mercadoria sujeita à multa, enquanto não for efetuado o pagamento desta. (Incluído pelo Decreto-Lei nº 2.472, de 01.09.1988)

[destaquei]

 

Afirma o apelante que o condicionamento de liberação das mercadorias ao recolhimento da multa contraria o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal na Súmula n.º 323: é inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos. Contudo, entendo que o recolhimento da multa não configura meio coercitivo, mas o cumprimento dos requisitos legais necessários para o aperfeiçoamento da operação de reexportação e, por consequência, da extinção do regime de admissão temporária.  Nesse sentido, inclusive, é o entendimento recentemente adotado por aquela Corte, no julgamento do Tema 1.042 (Recurso Extraordinário n.º 1.090.591), representativo da controvérsia, em relação ao condicionamento do desembaraço aduaneiro ao recolhimento de exigências fiscais apuradas pela autoridade aduaneira, verbis:

 

IMPORTAÇÃO. TRIBUTO E MULTA. MERCADORIA. DESPACHO ADUANEIRO. ARBITRAMENTO. DIFERENÇA. CONSTITUCIONALIDADE.

Surge compatível com a Constituição Federal o condicionamento, do desembaraço aduaneiro de bem importado, ao pagamento de diferença tributária apurada por arbitramento da autoridade fiscal.

(RE 1090591, Rel. Marco Aurélio, Tribunal Pleno, j. em 16.09.2020).

 

Desse modo, à vista da compatibilidade entre as normas que regulam a questão e a Carta Magna, é de rigor a manutenção da sentença.

Ante o exposto, acompanho a divergência apresentada pelo Desembargador Federal Carlos Muta para negar provimento à apelação.

É como voto.

ANDRÉ NABARRETE - DESEMBARGADOR FEDERAL

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002060-24.2018.4.03.6105

RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR

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APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.

 

  1. BREVE CONTEXTUALIZAÇÃO

 

Depreende-se dos autos que a empresa TERMINAL 2 B.V., detentora do direito de representação e exibição das obras elaboradas por Nathan Saway, contratou a impetrante (Ring Produções Culturais Ltda) para promover no país a exposição “The Art of the Brick”, figurando esta como importadora dos bens que integram a exposição e beneficiária do regime de admissão temporária.

O processo de desembaraço dos bens referentes às DSI nº 16/000183-3 e DSE nº 0817700-010, para a reexportação, foi interrompido, em virtude da existência de multa não paga, correspondente a 10% do valor da mercadoria, fundada no art. 72, I, da Lei n. 10.833/2003, decorrente da não observância, pela impetrante, do prazo para solicitação de prorrogação do regime de admissão temporária.

 

 

2 – DO MÉRITO

 

De início, necessário destacar que não se discute nestes autos a legalidade da multa imposta, como bem destacado pelo Magistrado sentenciante, “a questão posta na presente lide cinge-se à liberação dos bens para que a impetrante promova a sua reexportação parcial e envio a Turin/Itália, próximo cidade a receber tal exposição cultural”.

A apelante, por sua vez, afirma categoricamente, em seu apelo, que “Não se pretende, aqui, obviamente, discutir o mérito da multa”.

Sendo assim, deixo de analisar, por impertinentes, as alegações da apelante relacionadas ao suposto ataque cibernético que teria levado a apelante a não observar os prazos da legislação aduaneira, incorrendo, por consequência, na multa do art. 72, I, da Lei n. 10.833/2003.

Portanto, a controvérsia se restringe em saber se legítima a interrupção do despacho aduaneiro, no procedimento de reexportação de obras de arte, na hipótese de não pagamento da multa do art. 72, da Lei 10.833/2003.

Com efeito, dispõe o art. 592 do Decreto nº 6.759/2009 que:

 

“Art. 592.  A mercadoria a ser reexportada somente será desembaraçada após o pagamento das multas a que estiver sujeita (Decreto-Lei nº 37, de 1966, art. 71, § 6º, com a redação dada pelo Decreto-Lei no 2.472, de 1988, art. 1o). “

 

Preceitua o art. 51, §§ 2º e 3º, da Instrução Normativa RFB nº 1600/2015, por sua vez, que:

 

Art. 51. O beneficiário será intimado a manifestar-se, no prazo de 10 (dez) dias, sobre o descumprimento total ou parcial do regime nas seguintes hipóteses:

(...)

§ 2º Em qualquer caso, comprovado o descumprimento do regime, é exigível o recolhimento da multa de 10% (dez por cento) do valor aduaneiro da mercadoria, prevista no inciso I do caput do art. 72 da Lei nº 10.833, de 29 de dezembro de 2003.

§ 3º A reexportação só poderá ser efetuada depois do pagamento da multa referida no § 2º.”

 

No caso dos autos, verifica-se que, de fato, não resta demonstrada o pagamento da multa aplicada com base no art. 72, I, da Lei n. 10.833/2003.

Todavia, não se revela razoável condicionar a reexportação dos bens em questão ao pagamento da aludida multa, sobretudo se considerada a natureza daqueles (obras de arte), vez que a autoridade aduaneira pode se valer de outros meios para a persecução de seu crédito.

Tal situação, a propósito, se assemelha a retenção de mercadoria como meio coercitivo de pagamento de crédito fazendário, o que não se admite, a teor dos Enunciados de Súmulas nºs. 323 e 547, do Supremo Tribunal Federal, que ora transcrevo:

 

Súmula 323: “É inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos”

 

Súmula 547: “Não é lícito à autoridade proibir que o contribuinte em débito adquira estampilhas, despache mercadorias nas alfândegas e exerça suas atividades profissionais”.

 

Transcreve-se, por pertinente, relevantes excertos do parecer ministerial:

 

“(...) Todavia, no que concerne ao condicionamento de pagamento de multa para a liberação das mercadorias, merece razão à apelante. Isto porque, o Supremo Tribunal Federal já se manifestou sobre o tema e sumulou o entendimento de que é inadmissível a apreensão de mercadorias como meio de coerção para pagamento de tributos, in verbis:

(...)

Tal entendimento deve ser estendido também à obrigação de pagamento de multa em favor da Receita Federal, conforme tem sido entendido pela jurisprudência, inclusive desta E. Corte, vejamos:

(...)

Em suma, conclui-se, conforme bem explanado nos julgados acima, que não se pode condicionar a liberação da mercadoria ao pagamento da multa, devendo esta ser discutida pela via administrativa ou judicial e seu pagamento deverá recair sobre o patrimônio da Apelante.”

 

Nessa mesma linha, válido colacionar os seguintes precedentes jurisprudenciais desta Corte:

 

MANDADO DE SEGURANÇA – INTERRUPÇÃO DE DESEMBARAÇO ADUANEIRO – EXIGÊNCIA DE MULTA - SÚMULA 323 DO STF.

1. A Súmula n.º 323, do Supremo Tribunal Federal: "É inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos."

2. No caso concreto, ocorreu a interrupção do desembaraço aduaneiro, mediante o lançamento de exigências que incluíam providências de caráter não pecuniário e complementação de tributos, além do pagamento de multas. Cumpridas as primeiras providências, foi feito o lançamento de nova exigência no Siscomex, atinente ao recolhimento da multa prevista no artigo 706, inciso I, alínea “a”, do Decreto n.º 6.759/2009, em face da emissão de licença de importação após o registro da declaração de importação. Assim, a exigência remanescente limita-se ao recolhimento de multa.

3. A retenção de mercadorias não é medida adequada para coagir o importador ao pagamento de tributos ou multas, mas, sim, providência acautelatória, destinada a garantir efetividade à atividade fiscalizatória.

4. Remessa necessária desprovida.

(TRF 3ª Região, 6ª Turma,  ReeNec - REEXAME NECESSÁRIO - 5001554-82.2017.4.03.6105, Rel. Desembargador Federal FABIO PRIETO DE SOUZA, julgado em 01/03/2019, Intimação via sistema DATA: 11/03/2019)

 

TRIBUTÁRIO. DESEMBARAÇO ADUANEIRO. REGIME ESPECIAL DE ADMISSÃO TEMPORÁRIA. RETENÇÃO DE MERCADORIA VINCULADA AO PAGAMENTO DE MULTA. OFENSA AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE.

1. O cerne da questão em análise cinge-se à controvérsia sobre o regular prosseguimento do desembaraço aduaneiro de mercadorias importadas sob o regime de admissão temporária, independentemente do recolhimento da multa aplicada pela autoridade fiscal.

2. Verifica-se que a apelada importou motores para aeronaves, retidos por ocasião do desembaraço aduaneiro, sob o fundamento de divergência no número de série de um deles e pela falta de informação sobre a capacidade dos motores, determinando-se a regularização e aplicando-se a multa prevista no artigo 711 do Decreto 6759/2009, pelo descumprimento dos incisos III e §1º, III do artigo 711 do Decreto 6759/2009.

3. Não se trata da dispensa da necessidade do cumprimento das formalidades regulamentares e da aplicação da sanção cabível, não se questionando neste feito, a exigibilidade ou adequação da multa aplicada, mas o descabimento da retenção das mercadorias, apenas sob o fundamento do seu não recolhimento, sendo correta a determinação de prosseguimento do despacho aduaneiro, desde que as exigências legais, requeridas pela autoridade alfandegária sejam cumpridas pela apelada-impetrante.

4. As hipóteses de interrupção do despacho aduaneiro, previstas no art. 570 do Regulamento Aduaneiro, restringem-se de forma exclusiva às exigências documentais e pecuniárias referentes ao ato de importação, inexistindo qualquer previsão legal da interrupção somente pelo descumprimento da obrigação acessória de recolhimento de multa, daí decorrendo a ilegalidade de tal condicionamento.

5. Apelação e remessa necessária improvidas.

(TRF 3ª Região, SEXTA TURMA,  ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 369812 - 0006943-55.2016.4.03.6110, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL CONSUELO YOSHIDA, julgado em 21/06/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:29/06/2018 )

 

AÇÃO DE MANDADO DE SEGURANÇA - INTERRUPÇÃO DO DESPACHO ADUANEIRO - RECLASSIFICAÇÃO DA MERCADORIA COM A EXIGÊNCIA DE PAGAMENTO DE MULTA E DE IMPOSTO - DESCABIMENTO - SÚMULA 323, STF - PARCIAL PROCEDÊNCIA AO PEDIDO - IMPROIVMENTO À APELAÇÃO E À REMESSA OFICIAL, TIDA POR INTERPOSTA

Dispõe a Súmula 323, STF, ser "inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos".

Conforme a motivação da Receita Federal, o despacho aduaneiro foi interrompido em razão da necessidade de reclassificar a mercadoria, de recolher multa prevista no art. 711, I, Regulamento Aduaneiro e de recolher a diferença de tributo, referente à adição, acrescida de multa do art. 725, I, do Regulamento aduaneiro, fls. 337.

Não se discute o dever do Auditor da Receita Federal inspecionar a mercadoria importada, errando a União o foco do litígio, pois a interrupção do despacho aduaneiro, explicitamente, está vinculada não somente à reclassificação da mercadoria, mas a condicionamento, pela Autoridade Fiscal, do prévio pagamento de tributo.

Inoponível a suscitação de esgotamento das vias administrativas para a solução da controvérsia, pois, de pronto, fls. 337, exigiu a autoridade aduaneira o pagamento de tributo, para que a mercadoria internada pudesse seguir o seu trâmite aduaneiro, violando, cabalmente, aquela disposição sumular.

Para deixar claro à União, a conferência e a interrupção do despacho aduaneiro pode ser lícita, competindo ao contribuinte realizar as retificações apontadas; por outro lado, apurando o Fisco imposto/multa a pagar, deve lavrar o competente Auto de Infração, não, obstar o prosseguimento do despacho aduaneiro, como visto. Precedentes.

Improvimento à apelação e à remessa oficial, tida por interposta, na forma aqui estatuída.

(TRF 3ª Região, TERCEIRA TURMA,  Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 359767 - 0009420-37.2014.4.03.6105, Rel. JUIZ CONVOCADO SILVA NETO, julgado em 18/10/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:27/10/2017)

 

No mesmo sentido, são os seguintes arestos dos Tribunais Regionais Federais da 2ª e da 4ª Região:

 

TRIBUTÁRIO. DESEMBARAÇO ADUANEIRO. AERONAVE. REGIME DE ADMISSÃO TEMPORÁRIA. REEXPORTAÇÃO. MULTA. PAGAMENTO. LIBERAÇÃO DE MERCADORIAS. CONDIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE.

1. A impetrante alega que, por não conseguir apresentar tempestivamente o pedido de prorrogação do regime de admissão temporária, foi intimada a iniciar os procedimentos de reexportação da aeronave Boeing modelo B767-316 F, após o pagamento de multa correspondente a 10% do valor da mercadoria, tendo sido acolhido seu pedido pelo Juízo a quo , que determinou a reexportação da aeronave, independentemente do pagamento de tais valores. 2. Há que se manter a sentença recorrida, eis que a retenção de mercadorias como meio coercitivo para o pagamento de multas configura medida ilegal, nos termos da Súmula nº 323 do STF, visto que não há óbice à atuação da administração tributária em futuro procedimento fiscal, uma vez que possui meios próprios para satisfação do crédito. 3. Deve ser afastada a imposição de pagamento de pagamento de tributos e multas como condição para a liberação das mercadorias, ressalvando-se a cobrança dos valores devidos pelos meios legais.

4. Apelação e remessa necessária conhecidas e desprovidas.

(TRF2, APELREEX 0166995-38.2017.4.02.5101, 3ª Turma Especializada, Rel. Des. Fed. CLAUDIA NEIVA, data da disponibilização 23/06/2020)

 

REGIME DE ADMISSÃO TEMPORÁRIA. REEXPORTAÇÃO EXIGÊNCIA DE PAGAMENTO PRÉVIO DE MULTA. DESCABIMENTO.

Tratando-se de bem cujo prazo de permanência em território nacional sob o regime de admissão temporária se esgotou, mostra-se abusivo condicionar a sua reexportação ao pagamento de multa aplicada com base do art. 709 do Decreto 6.759, de 2009, devendo a autoridade aduaneira efetuar a lavratura de auto de infração para exigência dos respectivos valores.

(TRF4, AC 5002582-79.2019.4.04.7110, SEGUNDA TURMA, Relator RÔMULO PIZZOLATTI, juntado aos autos em 11/12/2019)

 

TRIBUTÁRIO E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. APELAÇÃO REMESSA NECESSÁRIA. PEDIDO DE REEXPORTAÇÃO DE AERONAVE. LIBERAÇÃO CONDICIONADA AO PAGAMENTO DE MULTA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 323 DOSTF. DECADÊNCIA INEXISTÊNCIA.

1. Sentença que julgou procedente o pedido e concedeu a segurança, para determinar que a autoridade impetrada autorizasse a reexportação da aeronave modelo Cessna 560, sema imposição, como condição de reexportação, do prévio pagamento de tributos e/ou qualquer outra penalidade, inclusive a multa referente ao PAF 10565.000499/2007-06. 2. Discute-se, nos autos, tão-somente a impossibilidade de retenção da aeronave sob o fundamento declinado pela autoridade impetrada deque "somente pode ser autorizada a reexportação com o pagamento da multa por não reexportação noprazo estabelecido de 30 (trinta) dias do indeferimento do regime de admissão temporária, nos termos dos §§ 5º e12 do art. 15 da IN SRF nº 285/2003". 3. O Fisco não pode suspender ou interromper o procedimento de desembaraço (liberação) colocando exigência para seu prosseguimento. Se não pode apreenderas mercadorias de modo a forçar o pagamento de tributos, que se entendem devidos, menor razão há que seimpeça a reexportação do bem cobrando multas e tributos que sequer ainda foram cobrados, pois, ainda estão sendo discutidos em sede administrativa. 4 - "É inadmissível a apreensão de mercadoria como meio coercitivo  para pagamento de tributos" (Súmula nº 323 do E. STF). 5. Além de não ser lícita a retenção de bens como meio  coercitivo para o pagamento de tributos, a Administração Pública dispõe de outras maneiras de exigir a adimplemento dos tributos e multas aplicadas, podendo inclusive, estipular a obrigatoriedade de formalização de termo de responsabilidade ou de outra garantia real, de modo a se resguardar em caso de assunção de dívida fiscal. 6. A Administração dispõe de meios privilegiados para a persecução de seus créditos, não lhe servindo de justificativa para a retenção do bem a possível incidência e não recolhimento de tributos ou penalidades. Assim, à míngua da discussão sobre o recaimento ou não da exigência fiscal na espécie, verdade é que se mostra repreensível a retenção da aeronave. 7. O ato impugnado foi consistente no indeferimento administrativo data de19/04/2013, de forma que, em confronto com a data de impetração do mandado de segurança, qual seja,10/05/2013, torna-se claro que não se configurou, no caso, o instituto da decadência. 8. Precedentes: STJ: Ag1393492, Relator Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, DJ 09/10/2012; TRF2, AC nº 201251010461048/RJ, Relator Desembargador Federal LUIZ ANTONIO SOARES, Quarta Turma Especializada, DJE: 24/08/2017; AGnº 201302010091053/RJ, Relator Desembargador Federal ALUISIO GONCALVES DE CASTROMENDES, Quinta Turma especializada, DJE: 17/10/2013; AC nº 2014.51.02.143123-9, Relator Desembargador Federal JOSÉ ANTONIO NEIVA, Sétima Turma Especializada, DJE: 26/04/2016. 9. Matéria tributária. Precedente: CCnº 0010640-58.2007.4.02.5001, Órgão Especial, Relatora Desembargadora Federal NIZETE LOBATOCARMO, DJE: 19/04/2016. 10. Apelação e remessa necessária desprovidas.

(TRF2, AP/REEXM n. 0013957-45.2013.4.02.5101. Terceira Turma. Rel: Des. Fed. Marcus Abraham. Julgamento em 28/11/2018. Publicação em03/12/2018. TRF2).

 

Dessa forma, deve ser afastada a imposição de pagamento de multa como condição para a liberação das mercadorias, ressalvando-se o direito de o Fisco brasileiro prosseguir com a cobrança da multa aplicada, valendo dos meios legais para tanto.

Ante o exposto, dou provimento ao recurso de apelação para, reformando a sentença, conceder a segurança, a fim de que a autoridade aduaneira dê prosseguimento ao despacho de reexportação dos bens objeto da DSI nº 16/000183-3, sem a exigência do pagamento da multa do art. 72, I, da Lei n. 10.833/2003, nos termos da fundamentação supra.

É como voto.

Custas ex lege.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


E M E N T A

 

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. ADUANEIRO. MANDADO DE SEGURANÇA. PROCEDIMENTO DE REEXPORTAÇÃO. IRREGULARIDADE. DESPACHO ADUANEIRO. INTERRUPÇÃO. AUSÊNCIA DE DIREITO LIQUIDO E CERTO.

1. No caso, verificada irregularidade no procedimento de reexportação, o despacho aduaneiro deve ser interrompido para devida regularização. Não se trata, em tais casos, de apreensão de bens como forma coercitiva de pagamento de tributos, como vedado pela Súmula 323/STF, pois o enunciado cuida das hipóteses em que a autoridade age sem previsão legal, adotando solução que repute, arbitrariamente, devida, substituindo o processo regular de cobrança pela apreensão de mercadorias. 

2. Se, contudo, a verificação da regularidade fiscal da operação, que abrange apuração e recolhimento de tributos e outros encargos aduaneiros, integra o próprio processo legal de exportação e desembaraço de bens, como assente, não cabe cogitar de restrição ilícita, mas de etapa legal prevista para a conclusão do despacho aduaneiro.

3. O caso cuida de despacho de reexportação, em que consta da legislação, expressamente, nos termos do artigo 71, § 6º, do Decreto-lei 37/1966, que "Não será desembaraçada para reexportação a mercadoria sujeita à multa, enquanto não for efetuado o pagamento desta.". Trata-se de norma vigente, cuja eficácia não pode ser afastada, mesmo em sede judicial, sem a declaração de sua inconstitucionalidade, com observância do rito próprio, inclusive a cláusula de reserva de plenário, nos termos da Súmula Vinculante 10 da Suprema Corte.

4. Existe, portanto, previsão legal de cumprimento de requisito para a reexportação, que não sendo observada autoriza a interrupção do despacho aduaneiro, sem que caiba cogitar, portanto, de violação a direito líquido e certo.

5. Apelação desprovida.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, Prosseguindo o julgamento, a Turma, por maioria, negou provimento à apelação, nos termos do voto do Des. Fed. CARLOS MUTA, vencidos o Relator e o Des. Fed. ANTONIO CEDENHO, que lhe davam provimento. Lavrará o acórdão o Des. Fed. CARLOS MUTA, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.