APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000895-89.2021.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: VERA LUCIA SILVA DOS SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: THAYSON MORAES NASCIMENTO - MS17829-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000895-89.2021.4.03.9999 RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN APELANTE: VERA LUCIA SILVA DOS SANTOS Advogado do(a) APELANTE: THAYSON MORAES NASCIMENTO - MS17829-A APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de apelação interposta em ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez ou de auxílio doença. A r. sentença, proferida em 18.08.2020, julgou improcedente o pedido e condenou a parte autora ao pagamento das custas processuais, e da verba honorária, fixada em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, suspendendo a exigibilidade do pagamento, conforme determina o art. 98, §3º, do CPC/2015. (ID 155032375 – págs. 14-20) Em suas razões recursais, a parte autora pugna pela decretação de procedência do pedido, ao argumento de que preenche os requisitos legais para a concessão da aposentadoria por invalidez ou de auxílio doença, sustentando que o laudo pericial é contrário aos documentos médicos apresentados. Pleiteia a fixação da DIB na data do requerimento administrativo em 03.08.2016, e a inversão do ônus da sucumbência. (ID 155032375 – págs. 26-42 e ID 155032376 – págs. 01-09). Sem contrarrazões, subiram os autos a este Eg. Tribunal. É o relatório. dcm
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000895-89.2021.4.03.9999 RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN APELANTE: VERA LUCIA SILVA DOS SANTOS Advogado do(a) APELANTE: THAYSON MORAES NASCIMENTO - MS17829-A APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passo ao exame da matéria objeto de devolução. DA APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E AUXÍLIO - DOENÇA A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da Seguridade Social, no art. 201, I, da Constituição Federal. A Lei nº 8.213/91 preconiza, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário da aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que tiver cumprido o período de carência exigido de 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência e a condição de segurado. Independe, porém, de carência a concessão do benefício nos casos de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social, for acometido das doenças relacionadas no art. 151 da Lei de Benefícios. Cumpre salientar que a doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social não impede a concessão do benefício na hipótese em que a incapacidade tenha decorrido de progressão ou agravamento da moléstia. Acerca da matéria, há de se observar o disposto na seguinte ementa: "PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ . CARÊNCIA E QUALIDADE DE SEGURADO NÃO COMPROVAÇÃO. INCAPACIDADE PREEXISTENTE. REFILIAÇÃO. 1- Não é devida a aposentadoria por invalidez à parte Autora que não cumpriu a carência , bem como não demonstrou a manutenção da qualidade de segurado no momento em sobreveio a incapacidade para o trabalho. 2- Incapacidade constatada em perícia médica realizada pelo INSS no procedimento administrativo originado do requerimento de auxílio - doença . 3- Ainda que se considerasse a refiliação da Autora à Previdência pelo período necessário de 1/3 do número de contribuições exigidas para o cumprimento da carência definida para o benefício a ser requerido, esta se deu posteriormente à sua incapacidade. 4- A doença preexistente não legitima o deferimento de aposentadoria por invalidez ou auxílio - doença , à exceção de quando a incapacidade laborativa resulte progressão ou agravamento do mal incapacitante. 5- A Autora quando reingressou no sistema previdenciário, logrando cumprir a carência exigida e recuperando sua qualidade de segurada, já era portadora da doença e da incapacidade, o que impede a concessão do benefício pretendido, segundo vedação expressa do art. 42, § 2º, da Lei nº 8.213/91. 6- Apelação da parte Autora improvida. Sentença mantida." (TRF3, 9ª Turma, AC nº 2005.03.99.032325-7, Des. Fed. Rel. Santos Neves, DJU de 13/12/2007, p. 614). É certo que o art. 43, §1º, da Lei de Benefícios disciplina que a concessão da aposentadoria depende da comprovação da incapacidade total e definitiva mediante exame médico-pericial a cargo da Previdência Social. O entendimento jurisprudencial, no entanto, firmou-se no sentido de que também gera direito ao benefício a incapacidade parcial e definitiva para o trabalho, atestada por perícia médica, a qual inabilite o segurado de exercer sua ocupação habitual, tornando inviável a sua readaptação. Tal entendimento traduz, da melhor forma, o princípio da universalidade da cobertura e do atendimento da Seguridade Social. É que, para efeitos previdenciários, basta a incapacidade permanente que impeça o exercício da atividade laborativa nos moldes ditados pelo mercado de trabalho, evidenciando, dessa forma, padecer o periciando de incapacidade total. Nesse sentido, destaco acórdão desta Turma: "PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. REQUISITOS: PREENCHIMENTO. NÃO VINCULAÇÃO DO JUIZ AO LAUDO PERICIAL. INVIABILIDADE DE EXERCÍCIO DAS ATIVIDADES HABITUAIS E DE READAPTAÇÃO A OUTRAS. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. (...) II - O laudo pericial concluiu pela incapacidade parcial da autora. Porém, o Juiz não está adstrito unicamente às suas conclusões, devendo valer-se de outros elementos para a formação de sua convicção. No caso, corretamente considerada a falta de condições da autora para exercer suas funções habituais de cozinheira, em razão de tenossinovite no punho e problemas de coluna, que levaram-na a perder as forças das mãos, bem como sua idade avançada e as dificuldades financeiras e físicas para exercer outra profissão ou aprender novo ofício. Mantida a sentença que deferiu o benefício da aposentadoria por invalidez à autora. (...) IV - Apelações improvidas." (9ª Turma, AC nº 1997.03.007667-0, Des. Fed. Rel. Marisa Santos, v.u., DJU de 04.09.2003, p. 327). É necessário, também, para a concessão da aposentadoria por invalidez o preenchimento do requisito da qualidade de segurado. Mantém essa qualidade aquele que, mesmo sem recolher as contribuições, conserve todos os direitos perante a Previdência Social, durante um período variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de segurado e a sua situação, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios, a saber: "Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições: I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício; II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração; III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória; IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso; V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar; VI - até (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo." É de se observar, ainda, que o §1º do supracitado artigo prorroga por 24 meses tal período de graça aos que contribuíram por mais de 120 meses. Em ambas as situações, restando comprovado o desemprego do segurado perante o órgão do Ministério de Trabalho ou da Previdência Social, os períodos serão acrescidos de mais 12 meses. Convém esclarecer que, conforme disposição inserta no §4º do art. 15 da Lei nº 8.213/91, c.c. o art. 14 do Decreto Regulamentar nº 3.048/99, com a nova redação dada pelo Decreto nº 4.032/01, a perda da qualidade de segurado ocorrerá no 16º dia do segundo mês seguinte ao término do prazo fixado no art. 30, II, da Lei nº 8.212/91 para recolhimento da contribuição, acarretando, consequentemente, a caducidade do direito pretendido. O benefício de auxílio doença, por sua vez, é devido ao segurado que tiver cumprido o período de carência exigido de 12 contribuições mensais e for considerado temporariamente incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual, por mais de 15 dias consecutivos e possuir a condição de segurado (arts. 59 a 63 da Lei de Benefícios). Cumpre salientar, ainda, que o benefício acima referido é um "minus" em relação à aposentadoria por invalidez, a qual sendo concedida não gera cumulação, mas sim cessação daquele. DO CASO DOS AUTOS No tocante à incapacidade laborativa, o laudo pericial, elaborado em 25.08.2018 (ID 155032372 – págs. 15-23), concluiu pela ausência de incapacidade laborativa da autora, empregada doméstica, com 58 anos, ensino fundamental incompleto, conforme segue: “(...) V) EXAME CLÍNICO E CONSIDERAÇÕES MÉDICO-PERICIAIS SOBRE A PATOLOGIA a) Queixa que o (a) periciado (a) apresenta no ato da perícia? R: A periciada refere que começou sentir dores em seus pés em meados de 2016, procurou atendimento médico, tendo diagnostico de fascite plantar em pé direito e esquerdo. Desde então vem realizando tratamento ortopédico (medicamentoso) sem melhora (sic). Não apresenta indicação cirúrgica, não realizou fisioterapia conforme indicado e apresenta receita original de 09/08/2018. Queixa-se de dor nos pés e dificuldade para andar (sic). b) Doença, lesão ou deficiência diagnosticada por ocasião da perícia (com CID)? R: A periciada é portadora de Fascite Plantar Bilateral. CID M72.2. (...) f) Doença/moléstia ou lesão torna o (a) periciado (a) incapacitado (a) para o exercício do último trabalho ou atividade habitual? Justifique a resposta, descrevendo os elementos nos quais se baseou a conclusão? R: No momento não apresenta incapacidade laboral, conforme anamnese, exame físico e análise de documentos. (...) n) Qual ou quais são os exames clínicos, laudos ou elementos considerados para o presente ato médico pericial? R: Apresenta marcha normal, consciente, eupneica, acianótica, bom estado geral, membros inferiores simétricos, força e sensibilidade preservados. Movimentos dos pés preservados, sem sinais de edema ou inflamatórios. 1) Ultrassonografia de Pé Esquerdo e Direito de 20/04/2016 (anexo aos autos, fls. 13-14). 2) RX de Pé Direito e Esquerdo de 04/08/2016 (anexo aos autos, fls. 24-26). 3) Atestado Médico de 16/03/2017 (anexo aos autos, fls. 12). 4) Ultrassonografia de Tornozelo Direito de 27/07/2017 (anexo aos autos, fls. 105). 5) Atestado Médico de 27/07/2017 (anexo aos autos, fls. 103). 6) Atestado Médico de 13/11/2017 (anexo aos autos, fls. 107). 7) Atestado Médico de 15/02/2018 (anexo aos autos, fls. 109). 8) Atestado Médico de 08/05/2018 (anexo aos autos, fls. 119). 9) Ultrassonografia de Pé Direito e Esquerdo de 09/08/2018 (anexo à perícia). 10) Atestado Médico de 09/08/2018 (anexo à perícia). (...) Discussão: Fibromatose da fáscia plantar ou fascite plantar é um distúrbio que pode provocar dor, comum que afeta o calcanhar e a planta do pé. Por uma desordem no local de inserção dos ligamentos no osso e se caracteriza por inflamação. Aproximadamente 10% das pessoas desenvolvem fascite plantar em algum momento da vida. Tratamento a maior parte dos casos de fascite plantar melhora em um período de 6 meses com tratamento conservador (medicamentos, fisioterapia e exercícios físicos para fortalecer a panturrilha, tendão de Aquiles e fáscia plantar) ou em ano independente de qualquer tratamento. A cirurgia é considerada como último recurso, raramente. Conclusão: Para confecção do presente trabalho pericial foi realizada a anamnese, exame físico, análise dos documentos médicos legais de interesse ao caso e revisão da literatura médica. A periciada é portadora de Fascite Plantar do Pé Direito e Esquerdo (doença crônica e inflamatória). No momento não apresenta incapacidade ou redução na capacidade laboral. (...)” (ID 155032372 - págs. 18-21). Anoto que a documentação colacionada pela parte autora (ID 155032369 – págs. 12-18 e 24-26, ID 155032371 – págs. 29-31, 33 e 35, ID 155032372 – pág. 10 e ID 155032374 – págs. 01-06) não tem o condão de afastar a conclusão da perícia. Nesse sentido, destaco que os relatórios médicos juntados aos autos (ID 155032369 – pág. 12, ID 155032371 – págs. 29, 33 e 35 e ID 155032372 – pág. 10) informam a impossibilidade do exercício do trabalho apenas pelos diagnósticos/CID’s das doenças, sem qualquer indicação quanto aos eventuais sintomas incapacitantes que demonstrem a necessidade do afastamento do trabalho, não descaracterizando a conclusão pericial. Apesar do juiz não estar adstrito às conclusões ou informações de tais documentos, não há como aplicar o preceito contido no art. 479 do Código de Processo Civil/2015, à míngua de informações que conduzam à convicção da incapacidade laboral da postulante. No que concerne especificamente ao laudo pericial, transcrevo, por oportuno, lição de De Plácido e Silva: "Embora peça de relevância no processo judicial, não está o juiz adstrito às conclusões ou informações do laudo, desde que tenha suas razões para o julgar longe da verdade ou incongruente em face de outras provas. Mas, quando se trate de questões técnicas, e não possua o julgador outros elementos probatórios do fato ou dos fatos constantes do laudo e nele evidenciados, não deve o juiz desprezá-lo ou se afastar de suas conclusões. Somente motivos fortes e ponderáveis, em tal caso, poderiam anular uma prova parcial de tal natureza." (Vocabulário Jurídico. 22ª ed. revista e atualizada, Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 819). Para exaurimento da matéria trago a colação o seguinte julgado: "PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO-DOENÇA. AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE LABORATIVA. (...) 3 - A prova pericial acostada aos autos revela que as doenças diagnosticadas não causam na apelante qualquer incapacidade para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência. 4 - Não preenchidos os requisitos legais para obtenção dos benefícios de aposentadoria por invalidez nem de auxílio-doença, correta a sentença que os indeferiu. 5 - Agravos retidos não conhecidos e recurso improvido." (TRF 3ª Região, 2ª Turma, AC n.º 2002.03.99.026865-8, Des. Fed. Rel. Marisa Santos, v.u., DJU de 04.02.2003, p. 486). Desta feita, para obter auxílio-doença/aposentadoria por invalidez, é requisito indispensável a incapacidade laborativa da parte autora, a qual não restou comprovada nos autos, não fazendo jus ao benefício postulado. Assim, correta a sentença que julgou improcedente o pedido da parte autora. CONSECTÁRIOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS Em razão da sucumbência recursal majoro em 100 % os honorários fixados em sentença, observando-se o limite máximo de 20% sobre o valor da causa, a teor dos §§ 2º e 11 do art. 85 do CPC/2015, suspensa sua exigibilidade, por ser a parte autora beneficiária da assistência judiciária gratuita, nos termos dos §§2º e 3º do art. 98 do CPC. DISPOSITIVO Ante o exposto, nego provimento à apelação da parte autora, observado o exposto acerca dos honorários advocatícios, nos termos da fundamentação. É o voto.
E M E N T A
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE AUXÍLIO - DOENÇA /APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. REQUISITOS LEGAIS NÃO PREENCHIDOS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.
- A Lei nº 8.213/91 preconiza, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário da aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que tiver cumprido o período de carência exigido de 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência e a condição de segurado.
- O benefício de auxílio-doença, por sua vez, é devido ao segurado que tiver cumprido o período de carência exigido de 12 contribuições mensais e for considerado temporariamente incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual, por mais de 15 dias consecutivos e possuir a condição de segurado (arts. 59 a 63 da Lei de Benefícios).
- Não restou suficientemente comprovado o preenchimento dos requisitos legais (incapacidade laborativa), não fazendo jus a parte autora à concessão do benefício.
- Honorários advocatícios majorados ante a sucumbência recursal, observando-se o limite legal, nos termos do §§ 2º e 11 do art. 85 do CPC/2015, observada a gratuidade da justiça.
- Apelação da parte autora não provida.