APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0026493-72.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: DALVA APARECIDA BERTOLINO NUNES DA CONCEICAO
Advogado do(a) APELADO: SABRINA RODRIGUES DO NASCIMENTO - SP363824-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0026493-72.2017.4.03.9999 RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: DALVA APARECIDA BERTOLINO NUNES DA CONCEICAO Advogado do(a) APELADO: SABRINA RODRIGUES DO NASCIMENTO - SP363824-N OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O A Excelentíssima Senhora Juíza Federal convocada Leila Paiva (Relatora): Cuidam-se de recursos de apelação apresentado pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS – e adesivo interposto por Dalva Aparecida Bertolino Nunes da Conceição em face de sentença proferida em demanda previdenciária, que julgou parcialmente procedente a demanda, condenando o INSS ao pagamento da quantia descontada da pensão por morte concedida a ela, da forma simples, já que a hipótese não se trata de relação de consumo, corrigido monetariamente pelo IPCA-E e com a incidência de juros de mora de 1% ao mês sobre os honorários advocatícios, a contar do trânsito em julgado. Concedida tutela antecipatória para fins de interromper os descontos efetuados pelo INSS. Em síntese, sustenta a autarquia federal que: a) o recebimento pela autora foi de má-fé, o que viabiliza o desconto efetuado no benefício recebido por ela; b) a r. sentença incorreu em erro quanto à condenação dos juros de mora, correção monetária e honorários advocatícios, que deverá ser da seguinte forma: quanto aos honorários advocatícios, de 0,5% até a vigência do atual Código Civil; juros de 1% após a entrada em vigor desse diploma e até a edição da Lei 11.960/2009; correção monetária e juros de poupança, a partir da vigência da Lei 11.960/2009 e nos termos dessa, até 25/03/2015, quando o INPC passa a compor o deflator de atualização monetária.; e d) seja reconhecida a remessa necessária, por se tratar de sentença ilíquida. Adesivamente, a autora sustenta que a devolução da quantia deve ser em dobro, nos termos do artigo 42 do CDC, bem como a condenação da autarquia federal em danos morais. Com contrarrazões da autora, vieram os autos a esta E. Corte Regional. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0026493-72.2017.4.03.9999 RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: DALVA APARECIDA BERTOLINO NUNES DA CONCEICAO Advogado do(a) APELADO: SABRINA RODRIGUES DO NASCIMENTO - SP363824-N OUTROS PARTICIPANTES: V O T O A Excelentíssima Senhora Juíza Federal convocada Leila Paiva (Relatora): Da remessa oficial A r. sentença foi publicada vigência do CPC de 2015 (após 18/03/2016), razão pela qual aplica-se o Enunciado Administrativo nº 3, do Colendo Superior Tribunal de Justiça, que dispõe: " Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC". Depreende-se do artigo 496, inciso I, § 3º, inciso I, que apenas as causas cuja condenação alcançar 1.000 (mil) salários mínimos devem ser submetidas à remessa necessária. Não se desconhece que, sob a égide do CPC de 1973, o C. STJ cristalizou o entendimento no sentido de que era obrigatória a remessa necessária na hipótese de sentença ilíquida contra a União e suas autarquias, inclusive o INSS, conforme o precedente emanado do julgamento do Recurso Especial nº 1.101.727/PR, sob a técnica dos repetitivos (Rel. Min. Hamilton Carvalhido, Corte Especial, j. 04/11/2009). Tendo, inclusive, editado a Súmula 490 que estabelece que: "A dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas" (STJ, Corte Especial, j. 28/06/2012). Verifica-se, entretanto, que o C. STJ, aplicando a técnica do overrinding, em homenagem à redação do artigo 496, inciso I, § 3º, inciso I, do CPC de 2015, revisitou o tema anteriormente professado no Recurso Especial nº 1.101.727/PR, quanto às demandas previdenciárias, considerando que as condenações nesses casos, ainda que ilíquidas, regra geral não superam o valor de 1.000 (mil) salários mínimos, concluindo, assim, pela dispensa da remessa necessária. Precedentes: STJ, REsp 1844937/PR, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 12/11/2019, DJe 22/11/2019; TRF 3ª Região, 9ª Turma, Remessa Necessária Cível - 6078868-74.2019.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal GILBERTO RODRIGUES JORDAN, j. 02/04/2020. Nesse diapasão, ainda que aparentemente ilíquida a sentença, resta evidente que a condenação ou o proveito econômico pretendido pela parte autora não excede o novo valor de alçada do CPC de 2015, consistente em mil salários mínimos. Assim sendo, não conheço da remessa oficial. Da devolução da quantia A autora é beneficiária da pensão por morte (NB 1640887099) concedida em razão do falecimento de seu cônjuge, Sr. Rodrigo Nunes da Conceição, em 30/11/2013 (ID 90256993 – p. 18). Referida pensão foi requerida em 03/12/2013 e deferida em 19/01/2014 (ID 90256993 – p. 31), sendo que a partir de março/2015 a autora passou a sofrer descontos em seu benefício, decorrente do recebimento da aposentadoria por tempo de serviço pertencente ao falecido, no valor R$ 1.807,51, pago por equívoco pela autarquia federal em 07/01/2014, pertinente a período posterior ao óbito, notadamente de 01/12/2013 a 31/12/2013. Desse modo, a celeuma é oriunda dos descontos efetuados pelo INSS diretamente da pensão por morte paga à autora, por ter recebido benefício previdenciário pertencente ao falecido, após o passamento dele. Independentemente de a autora ter ou não recebido a quantia de boa-fé, é fato que a autarquia federal não podia ter efetuado os descontos sem conceder a ela o direito de apresentar defesa na esfera administrativa (artigo 5º, LIV e LV, da CF). Não se nega que o ente autárquico tem o poder-dever de revisar seus próprios atos, mormente quando entende que está eivado de erro. No entanto, devem ser observados os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, em atenção ao respeito do devido processo legal, sob pena de nulidade. Desse modo, diante da violação aos preceitos constitucionais fundamentais apontados, encontra-se escorreita a r. sentença guerreada ao determinar a devolução das quantias descontadas. E ao contrário de defendido pela autora, a devolução deve proceder da forma simples, já que inexiste relação de consumo entre o ente autárquico e o segurado. Confira-se: AGRAVO REGIMENTAL. PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DIREITOS INDIVIDUAIS DISPONÍVEIS. AUSÊNCIA DE RELAÇÃO DE CONSUMO ENTRE O INSS E O SEGURADO. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. ILEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM. A quaestio objeto da ação civil pública diz respeito a direito que, conquanto pleiteado por um grupo de pessoas, não atinge a coletividade como um todo, não obstante apresentar aspecto de interesse social. Sendo assim, por se tratar de direito individual disponível, evidencia-se a inexeqüibilidade da defesa de tais direitos por intermédio da ação civil pública. Destarte, as relações jurídicas existentes entre a autarquia previdenciária e os segurados do regime de Previdência Social não caracterizam relações de consumo, sendo inaplicável, in casu, o disposto no art. 81, III, do Código de Proteção e Defesa do Consumidor. Precedentes. (g. m.) Agravo regimental desprovido. (AgRg no REsp 703.351/PR, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 27/09/2005, DJ 14/11/2005, p. 393) Do dano moral A indenização por danos morais tem previsão constitucional (art. 5º, incisos V e X) e corresponde à violação ou a ofensa de bens de ordem moral, intelectual ou psíquico de uma pessoa, sendo necessária a existência de uma consequência fática capaz de acarretar dor e sofrimento indenizável por sua gravidade. Entretanto, consoante ensina Sílvio de Salvo Venosa, “Não é também qualquer dissabor comezinho da vida que pode acarretar a indenização. Aqui, também é importante o critério objetivo do homem médio, o bônus pater famílias: não se levará em conta o psiquismo do homem excessivamente sensível, que se aborrece com fatos diuturnos da vida, nem o homem de pouca ou nenhuma sensibilidade, capaz de resistir sempre as rudezas do destino”. (Direito Civil. Obrigações e Responsabilidade Civil. 17ª. Edição). Quanto à responsabilidade civil indenizatória, a legislação civil prescreve o seguinte: Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. E o artigo 37, § 6º, da Carta Magna afirma que a responsabilidade do Estado é objetiva pelos danos causados por seus agentes a terceiros: § 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa. No caso vertente, embora essa E. 9ª. Turma tenha considerado indevidas as deduções efetuadas no benefício da autora, entendimento do qual também compartilho, não vislumbro, no caso vertente, a ocorrência de dano moral apto a ensejar a condenação pretendida. Conquanto não seja agradável sofrer descontos inesperados, a autora não demonstrou a ocorrência efetiva do dano, razão pela qual a experiência por ela sofrida configurou em mero aborrecimento. Da correção monetária Há incidência de correção monetária na forma da Lei n. 6.899, de 08/04/1981 e da legislação superveniente, conforme preconizado pelo Manual de Cálculos da Justiça Federal, consoante os precedentes do C. STF no julgamento do RE n. 870.947 (Tema 810), bem como do C. STJ no julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905). Dos juros de mora A incidência de juros de mora deve observar a norma do artigo 240 do CPC de 2015, correspondente ao artigo 219 do CPC de 1973, de modo que são devidos a partir da citação, à ordem de 6% (seis por cento) ao ano, até a entrada em vigor da Lei nº 10.406/02; após, à razão de 1% ao mês, por força do art. 406 do Código Civil e, a partir da vigência da Lei nº 11.960/2009 (art. 1º-F da Lei 9.494/1997), de acordo com a remuneração das cadernetas de poupança, conforme determinado na Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947 (Tema 810) e no Recurso Especial Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905). Dos honorários advocatícios Em razão da sucumbência considerável do pedido, condeno a autora no pagamento de honorários advocatícios arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor dado à causa, observadas as normas do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, do CPC/2015, suspensa sua exigibilidade, tendo em vista o benefício da assistência judiciária gratuita. Dispositivo Ante o exposto, dou provimento parcial ao recurso de apelação da autarquia federal e nego provimento ao recurso adesivo da autora. É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. DESCONTOS INDEVIDOS. AUSÊNCIA DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. DEVOLUÇÃO DA FORMA SIMPLES. INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO DE CONSUMO. DANO MORAL NÃO COMPROVADO.
1. A celeuma é oriunda dos descontos efetuados pelo INSS diretamente da pensão por morte paga à autora, por ter recebido benefício previdenciário pertencente ao falecido, após ao passamento dele.
2. Independentemente de a autora ter ou não recebido a quantia de boa-fé, é fato que a autarquia federal não podia ter efetuado os descontos sem conceder a ela o direito de apresentar defesa na esfera administrativa (artigo 5º, LIV e LV, da CF). Não se nega que o ente autárquico tem o poder-dever de revisar seus próprios atos, mormente quando entende que está eivado de erro. No entanto, devem ser observados os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, em atenção ao respeito do devido processo legal, sob pena de nulidade.
3. Ao contrário de defendido pela autora, a devolução deve proceder da forma simples, diante da inexistência de relação de consumo entre o ente autárquico e o segurado. Precedente.
4. A indenização por danos morais tem previsão constitucional (art. 5º, incisos V e X) e corresponde à violação ou a ofensa de bens de ordem moral, intelectual ou psíquico de uma pessoa, sendo necessária a existência de uma consequência fática capaz de acarretar em dor e sofrimento indenizável por sua gravidade.
5. Conquanto não seja agradável sofrer descontos inesperados, a autora não demonstrou a ocorrência efetiva do dano, razão pela qual a experiência por ela sofrida configurou em mero aborrecimento.
6. Recurso do INSS parcialmente provido e recurso adesivo da autora não provido.