APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5022742-50.2021.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: ZELIA APARECIDA FERREIRA
Advogados do(a) APELANTE: FERNANDA DE OLIVEIRA VIEIRA - SP423041-A, JULIA MILENE RODRIGUES - SP265858-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5022742-50.2021.4.03.9999 RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA APELANTE: ZELIA APARECIDA FERREIRA Advogados do(a) APELANTE: FERNANDA DE OLIVEIRA VIEIRA - SP423041-A, JULIA MILENE RODRIGUES - SP265858-N APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de apelação interposta pela parte autora em face de sentença que julgou extinto o feito, sem resolução do mérito, nos termos do artigo 485, IV, do Código de Processo Civil, por inadequação da via eleita. Em síntese, busca a reforma da sentença recorrida, para que seja dado imediato cumprimento ao alvará judicial, alegando que o procedimento de jurisdição voluntária pode se tornar contencioso no momento em que há oposição ao pretendido pela requerente, como ocorreu no caso, sendo descabido o ingresso de nova ação de jurisdição contenciosa para haver o que lhe é devido, em respeito aos princípios da instrumentalidade e economia processual. Sem contrarrazões, os autos subiram a esta Corte. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5022742-50.2021.4.03.9999 RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA APELANTE: ZELIA APARECIDA FERREIRA Advogados do(a) APELANTE: FERNANDA DE OLIVEIRA VIEIRA - SP423041-A, JULIA MILENE RODRIGUES - SP265858-N APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Conheço do recurso, em razão da satisfação de seus requisitos. Discute-se a extinção do feito, sem resolução do mérito, nos termos do artigo 485, IV, do Código de Processo Civil, por inadequação da via eleita. Segundo se infere dos autos, a parte autora valeu-se de um procedimento de jurisdição voluntária (artigo 1.105 do CPC/1973) a fim de que fosse expedido alvará judicial para levantamento de valores relativos ao período de 1º/12/2009 a 30/11/2014 do seu benefício de pensão por morte, que constavam bloqueados nos sistemas da autarquia. A "jurisdição voluntária" distingue-se da contenciosa por algumas características, a saber: na voluntária não há ação, mas pedido; não há processo, mas apenas procedimento; não há partes, mas interessados; não produz coisa julgada, nem há lide (Resp 238.573). A “jurisdição contenciosa”, como a própria denominação já indica, pressupõe a existência de controvérsia, a resistência de uma parte à pretensão da outra. Nessa esteira, por se tratar de procedimento de jurisdição voluntária, o alvará judicial constitui-se mera autorização para a prática de um ato (cujo objeto sobre o qual recai é incontroverso), não pode substituir o contencioso, nem comporta formação de lide, motivo pelo qual não cabe cogitar em dilação probatória. Na hipótese, a agência do INSS responsável pelo benefício da parte autora foi oficiada para indicar os valores devidos e, desde o primeiro momento, opôs-se ao levantamento pretendido, esclarecendo ao juízo, de forma pormenorizada, que se tratava de uma informação equivocada lançada no sistema. Nítida, portanto, é a resistência da autarquia previdenciária, assumindo o feito feições de caráter litigioso, o que demonstra ser inadequada a utilização do procedimento de jurisdição voluntária. De fato, houve absoluto desvirtuamento do procedimento de jurisdição voluntária, o qual culminou por imputar ao INSS um pagamento que entende não ser devido, sem que fossem observadas as garantias do contraditório e da ampla defesa. Nem mesmo de defesa técnica jurídica pode se valer o INSS, porquanto não foi determinada a citação, nem mesmo aquela prevista no artigo 1.105 do CPC/1973 (vigente à época), e a procuradoria federal - órgão de representação judicial da autarquia -, não participou do procedimento. A propósito, dispunha o artigo 1.105 do CPC/1973: “Serão citados, sob pena de nulidade, todos os interessados, bem como o Ministério Público.” Vale dizer: ainda que houvesse alguma remota hipótese de se vislumbrar como adequada a utilização do procedimento de jurisdição voluntária, este seria nulo por ausência de citação do INSS na qualidade de interessado, por seu representante legal, nos termos do artigo 1.105 do CPC/1973. Confira-se a respeito (g.n.): ”PROCESSUAL CIVIL. PEDIDO DE ALVARÁ JUDICIAL. JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA. INADEQUAÇÃO ENTRE A VIA ELEITA E O PROVIMENTO JURISDICIONAL PRETENDIDO. DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO. SÚMULA 284 DO STF. 1. Hipótese em que a agravante deseja levantar valores em conta-corrente de militar falecido, sob a alegação de que foram erroneamente depositados a título de remuneração após a morte do servidor. 2. Ocorre que a via eleita não comporta a pretensão da União - uma vez que o pedido de Alvará Judicial não se presta ao levantamento de valores sobre os quais possam residir controvérsia e interesse de terceiros não citados (a exemplo de eventuais herdeiros) -, tampouco o recebimento dos valores corrigidos e o pagamento de honorários. 3. A deficiência na fundamentação de Recurso Especial que impeça a exata compreensão da controvérsia atrai, por analogia, a incidência da Súmula 284/STF. 4. Agravo Regimental não provido.” (STJ, AGRESP 1203009 , proc. n. 20100136361-5, 2ª Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, DJ 4/11/2010, DJE 1/2/2011) Enfim, o fato é que, por ter decorrido de um inadequado e nulo procedimento de jurisdição voluntária, que de toda forma não faz coisa julgada material, não há qualquer título ou medida judicial válida a respaldar o prosseguimento da presente ação de descumprimento judicial. Diante do exposto, nego provimento a apelação. É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. ALVARÁ JUDICIAL. PROCEDIMENTO DE JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA. INADEQUADO. CARÁTER LITIGIOSO.
- A parte autora valeu-se de um procedimento de jurisdição voluntária (artigo 1.105 do CPC/1973) a fim de que fosse expedido alvará judicial para levantamento de valores do seu benefício de pensão por morte que constavam bloqueados nos sistemas da autarquia.
- Como procedimento de jurisdição voluntária, o alvará judicial constitui-se mera autorização para a prática de um ato (cujo objeto sobre o qual recai é incontroverso), não pode substituir o contencioso, nem comporta formação de lide, motivo pelo qual não cabe cogitar dilação probatória.
- Na hipótese, a agência do INSS, responsável pelo benefício da parte aurora foi oficiada para indicar os valores devidos e, desde o primeiro momento, opôs-se ao levantamento pretendido.
- Nítida, portanto, é a resistência da autarquia previdenciária, assumindo o feito feições de caráter litigioso, o que demonstra ser inadequada a utilização do procedimento de jurisdição voluntária.
- Houve absoluto desvirtuamento do procedimento de jurisdição voluntária, o qual culminou por imputar ao INSS um pagamento que entende não ser devido, sem que fossem observadas as garantias do contraditório e da ampla defesa.
- Nem mesmo de defesa técnica jurídica pode se valer o INSS, porquanto não foi determinada a citação e a procuradoria federal, não participou do procedimento.
- Enfim, por ter decorrido de um inadequado e nulo procedimento de jurisdição voluntária, que de toda forma não faz coisa julgada material, não há qualquer título ou medida judicial válida a respaldar o prosseguimento da presente ação de descumprimento judicial.
- Apelação desprovida.