APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5263194-55.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA
APELANTE: JOVECI VIEIRA DA CRUZ CARDOSO
Advogado do(a) APELANTE: OLENO FUGA JUNIOR - SP182978-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5263194-55.2020.4.03.9999 RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA APELANTE: JOVECI VIEIRA DA CRUZ CARDOSO Advogado do(a) APELANTE: OLENO FUGA JUNIOR - SP182978-N APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O A Excelentíssima Senhora Juíza Federal convocada Leila Paiva (Relatora): Cuida-se de recurso de apelação interposto por Joveci Vieira da Cruz Cardoso contra sentença proferida em demanda previdenciária, que julgou improcedente o pedido de aposentadoria por idade rural, pleiteado perante o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS. Em suas razões recursais aduz a parte autora, em síntese, que: a) possui período superior ao mínimo necessário para a concessão do benefício; b) juntou contratos rurais em CTPS entre os anos de 1981 e 1996; c) as provas orais corroboram e guardam coerência com as provas materiais; d) requer seja julgado procedente o pedido de aposentadoria por idade rural, com condenação a partir da data de citação; e) requer, ainda, honorários sucumbenciais de 15% sobre a condenação até a data do v. acórdão. Com contrarrazões, os autos subiram a esta E. Corte Regional. É o relatório. rig
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5263194-55.2020.4.03.9999 RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA APELANTE: JOVECI VIEIRA DA CRUZ CARDOSO Advogado do(a) APELANTE: OLENO FUGA JUNIOR - SP182978-N APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: V O T O A Excelentíssima Senhora Juíza Federal convocada Leila Paiva (Relatora): Da aposentadoria por idade rural O direito à aposentadoria por idade rural foi estabelecido no artigo 201, § 7º, inciso II, da Constituição da República, in verbis: “Art. 201 (...) § 7 É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, obedecidas as seguintes condições: (...) II - 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, para os trabalhadores rurais e para os que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, nestes incluídos o produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019)”. A disciplina legal para exercício do direito pelos trabalhadores rurais consta dos artigos 48 e 143 da Lei nº 8.213, de 24/07/1991, o Plano de Benefícios da Previdência Social (PBPS), valendo transcrever o teor do artigo 48, in verbis: “Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995) § 1o Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11. (Redação Dada pela Lei nº 9.876, de 26.11.99) § 2o Para os efeitos do disposto no § 1o deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os incisos III a VIII do § 9o do art. 11 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 11,718, de 2008) § 3o Os trabalhadores rurais de que trata o § 1o deste artigo que não atendam ao disposto no § 2o deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher. (Incluído pela Lei nº 11,718, de 2008) § 4o Para efeito do § 3o deste artigo, o cálculo da renda mensal do benefício será apurado de acordo com o disposto no inciso II do caput do art. 29 desta Lei, considerando-se como salário-de-contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo de salário-de-contribuição da Previdência Social. (Incluído pela Lei nº 11,718, de 2008)”. Quanto aos segurados especiais em regime de economia familiar, a previsão está no artigo 39, inciso I, da Lei nº 8.213, de 24/07/1991, in verbis: “Art. 39. Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do caput do art. 11 desta Lei, fica garantida a concessão: (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019) I - de aposentadoria por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de pensão, no valor de 1 (um) salário mínimo, e de auxílio-acidente, conforme disposto no art. 86 desta Lei, desde que comprovem o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício requerido, observado o disposto nos arts. 38-A e 38-B desta Lei; ou (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)” Anote-se que, embora o artigo 143 da Lei nº 8.213, de 24/07/1991, refira limitação temporal ao requerimento do benefício, a concessão da aposentadoria por idade rural contém a sua base legal na norma do artigo 48 da mesma lei, razão por que não há que se cogitar de tal limite. (Precedente: TRF 3ª Região, 9ª Turma, Apelação Cível 5000087-29.2018.4.03.6139, Rel. Desembargadora Federal MARISA FERREIRA DOS SANTOS, j. 07/02/2020) Enfatize-se, ainda, que o direito à percepção do benefício é regulado pela lei vigente no tempo em que preenchidos os requisitos, porquanto a interpretação da sucessão de leis no tempo submete-se à observância do valor da segurança jurídica e, consequentemente, ao direito adquirido (artigo 5º, XXXVI da CR), em observância ao princípio tempus regit actum, bem assim pelo pacificado pelo Colendo Supremo Tribunal Federal no RE 597.389/SP, sob o regime da repercussão geral (Questão de Ordem, Relator Ministro Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, j. 22/04/2009). (Precedentes: REsp 1.900.559/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, j. 24/11/2020; AgInt no REsp 1.871.619/SP, Rel. Ministro Og Fernandes, j. 16/11/2020). Assim, a obtenção da aposentadoria por idade rural depende do preenchimento de dois requisitos: a idade e a prova da atividade rural. 1. A idade mínima de 60 (sessenta) anos, se homem, e 55 (cinquenta e cinco) anos, se mulher, foi fixada pelo texto constitucional, e também no artigo 11, incisos I, letra “a”; V, letra “g”; VI e VIII, c/c o artigo 48, §1º, todos da Lei nº 8.213, de 24/07/1991. 2. O exercício de atividade rural, ainda que descontínuo, deve ser demonstrado no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício (artigo 143 da Lei nº 8.213, de 21/07/1991), pelo tempo correspondente ao da carência do benefício pretendido, atualmente 180 (cento e oitenta) meses, observados os artigos 142 e 143 da Lei nº 8.213, de 24/07/1991. 2.1. Inicialmente, anote-se a necessidade de perfazimento simultâneo dos requisitos, embora essa regra não se aplique à aposentadoria por idade urbana. Assim, é imprescindível a comprovação da labuta no campo no período imediatamente anterior ao implemento da idade, conforme entendimento assentado pelo Colendo Superior Tribunal da Justiça no Tema 642/STJ: “O segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade”, extraído do julgamento do RESP Repetitivo n°1.354.908/SP, com a seguinte ementa, in verbis: PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO. REGRA DE TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS QUE DEVEM SER PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo 48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito. Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício. 2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência. Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil. (REsp 1354908/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/09/2015, DJe 10/02/2016) Evidentemente, uma vez comprovados os requisitos de idade de do tempo de labor campesino equivalente à carência, não há que se falar em perda da qualidade de segurado, na medida em que o direito à aposentação é incorporado ao patrimônio jurídico do trabalhador. 2.2. A comprovação da atividade rural pode ser realizada mediante início de prova material corroborada por prova testemunhal, conforme o § 3º do artigo 55 da Lei nº 8.213, de 24/07/1991, in verbis: Art. 55. (...) § 3º A comprovação do tempo de serviço para os fins desta Lei, inclusive mediante justificativa administrativa ou judicial, observado o disposto no art. 108 desta Lei, só produzirá efeito quando for baseada em início de prova material contemporânea dos fatos, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, na forma prevista no regulamento. (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019) Nesse sentido, estabelece o verbete da Súmula 149 do C. STJ: “A prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário”. (STJ, Terceira Seção, j. 07/12/1995, DJ 18/12/1995). O precedente aplica-se também aos trabalhadores rurais denominados “boias-frias”, conforme assentado no Tema 554/STJ: “Aplica-se a Súmula 149/STJ (...) aos trabalhadores rurais denominados 'boias-frias', sendo imprescindível a apresentação de início de prova material. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal”. (REsp Repetitivo nº 1.321.493, Relator Ministro Herman Benjamin, j. 10/10/2012, DJe 19/12/2012). 2.3. Ademais, com fulcro na possibilidade de eficácia prospectiva e retrospectiva dos documentos, o reconhecimento de tempo de serviço rural vai além do período relativo ao início de prova material, quando for corroborado por prova testemunhal. Esse entendimento foi consolidado pelo C. STJ no Tema 638/STJ: “Mostra-se possível o reconhecimento de tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo, desde que amparado por convincente prova testemunhal, colhida sob contraditório" (RESP nº 1.348.633/SP, Relator Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 28/08/2013, DJE 05/12/2014). Nessa senda, confirmando que não prescinde que o início de prova material diga respeito a todo o período de carência, contanto que seja corroborado pela prova testemunhal, o C. STJ editou a Súmula 577/STJ: “É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório” (Primeira Seção, j. 22/06/2016, DJe 27/06/2016). 2.4. As provas materiais aptas à demonstração do trabalho rural foram elencadas no rol meramente exemplificativo do artigo 106 da Lei nº 8.213, de 24/07/1991, conforme jurisprudência pacificada (Precedentes: AgInt no AREsp 1372590/SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, j. 21/03/2019; DJe 28/03/2019; RESP nº 1.081.919/PB, Relator Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe 03/08/2009; TRF3, Nona Turma, Apelação/Remessa Necessária 6080974-09.2019.4.03.9999, Relator Desembargador Federal Gilberto Jordan, publ. 25/11/2020) A comprovação da atividade rural será realizada, ainda, mediante verificação dos registros de segurados especiais no Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS), na forma dos artigos 38-A e 38-B da Lei nº 8.213, de 24/07/1991. Quanto à declaração de sindicato de trabalhadores rurais, o documento foi submetido a três disciplinas distintas. Inicialmente, por força do disposto pelo artigo 106 do PBPS, exigia-se a homologação do Ministério Público. A partir da edição da Lei nº 9.063, em 14/06/1995, passou a ser necessária a homologação do INSS. E desde 18/01/2019, com a edição da Medida Provisória nº 871/2019, convertida na Lei nº 13.846, de 2019, não pode ser aceita a referida declaração para fins de comprovação da atividade rural. 2.5. De outra parte, a ausência de início de prova material constitui óbice ao julgamento do mérito da lide, resultando, necessariamente, em extinção sem julgamento de mérito, a teor do previsto no artigo 55, § 3°, da Lei nº 8.213, de 24/07/1991, caracterizando-se a ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo, na forma do artigo 485, IV, do CPC. Foi submetida questão à Corte Especial do C. STJ no sentido de pacificar a solução dos casos nos quais “a parte autora deixou de instruir seu pedido inicial com documentos que comprovassem o exercício de atividade rural em momento imediatamente anterior ao ajuizamento da ação, consoante exigência legal prevista no art. 143 da Lei 8.213/91”. Aquela C. Corte Superior cristalizou o assunto no Tema 629/STJ: “A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa”. (RESP Repetitivo nº 1.352.721/SP, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Corte Especial, j. 16/12/2015, DJe 28/04/2016). Nesse sentido, o precedente deste E. Tribunal Regional Federal 3ª Região: Terceira Seção, AR - AÇÃO RESCISÓRIA - 10396 - 0008699-33.2015.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal SERGIO NASCIMENTO, j.09/06/2016, e-DJF3 Judicial 1 17/06/2016. Postas essas balizas, passemos, pois, ao exame do caso dos autos. DO CASO CONCRETO De pronto, verifica-se o cumprimento pela parte autora do requisito etário em 23/01/2016, incumbindo-lhe, pois, demonstrar atividade campestre por 180 meses. Requerimento protocolado em 11/12/2018. A parte autora anexou aos autos razoável início de prova material, consubstanciado em sua Carteira de Trabalho e Previdência Social – CTPS, com os seguintes registros: - Alvorada - Empreitadas Rurais, trabalhador rural serv. gerais, de 06/05/1981 a 08/01/1982; - Empreiteira Rural União, trabalhador rural, de 21/05/1982 a 02/06/1982; - Empreiteira União, trabalhador rural, de 11/11/1982 a 11/03/1983; - ERUCITRUS - Empreitadas Rurais, trabalhador rural, de 22/07/1983 a 31/10/1983; - Cargill Citrus, trabalhador rural safrista, de 21/11/1983 a 27/12/1983; - Cia Agrícola Sertãozinho - Faz. Santa Elisa, lavradora, de 18/01/1984 a 12/01/1985; - Antônio Carlos Evangelista - Sítio Santo Antônio, diarista rural, de 01/10/1985 a 03/11/1985; - Cargill Citrus, trabalhador rural, de 04/08/1986 a 15/04/1987; de 26/05/1987 a 27/01/1988; de 08/06/1988 a 29/12/1988; de 13/02/1989 a 18/03/1989, de 21/08/1989 a 17/03/1990; de 25/06/1990 a 26/01/1991; de 08/07/1991 a 11/01/1992; de 15/06/1992 a 14/02/1993; de 14/06/1993 a 26/12/1993; de 30/05/1994 a 15/01/1995; - Usina de Açúcar e Álcool - Fazenda Mateiro, trabalhador rural, de 16/02/1991 a 21/02/1991; - Paulo Mendes de Souza - Fazenda Ipanema, trabalhador rural - colhedor, de 14/08/1995 a 22/11/1996. Há que se considerar as anotações da carteira de trabalho gozam de presunção juris tantum de veracidade, cujo ônus da prova para desconstituição cabe à parte que a alega, no caso, ao INSS que tem o dever de provar que a anotação não corresponde com a verdade. Assim tem sido o entendimento do C. STJ (AgRg no REsp nº 1.150.515/SP, Rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, j. 28/08/2012, DJe: 05/09/2012); (AREsp nº 1.269.067/SP, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, j. 19/05/2020, DJe: 21/05/2020); (REsp nº 1.836.247/SP, Rel. Ministro Sérgio Kukina, j. 09/09/2019, DJe: 12/09/2019); (AREsp nº 1.538.837/PR, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, j. 21/08/2019, DJe: 02/09/2019). Nesse mesmo sentido, a Súmula nº 75 da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais - TNU: “A Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) em relação à qual não se aponta defeito formal que lhe comprometa a fidedignidade goza de presunção relativa de veracidade, formando prova suficiente de tempo de serviço para fins previdenciários, ainda que a anotação de vínculo de emprego não conste no Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS).” Observe-se que a autora apresentou documentação que comprovou que ela sempre laborou como trabalhadora rural, em diversas propriedades rurais. Não há nos autos prova de que ela tenha saído do meio rural para exercer atividade diversa ao longo dos anos, nem mesmo nos períodos em que recebeu os benefícios previdenciários por incapacidade. Em consulta ao extrato do Cadastro Nacional de Informações Sociais – CNIS da autora (ID 133467982), verifica-se que ela gozou de auxílio-doença previdenciário entre 01/01/1996 e 30/09/1996. Também percebeu aposentadoria por invalidez previdenciária de 30/04/2007 a 23/05/2020. Houve recolhimento na qualidade de contribuinte facultativo, de 01/11 a 30/11/2018. Conforme entendimento consolidado do C. STJ, é possível considerar os períodos em que o segurado esteve em gozo de benefício por incapacidade (e.g. auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez) para cômputo como tempo de contribuição (art. 29, §5º, da Lei nº 8.213/1991), desde que intercalados com períodos de contribuição ou de trabalho efetivo, consoante disposto no art. 55, inciso II da LBPS. Nesse sentido: AREsp nº 1.606.225/RJ, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, j. 21/09/2020, DJe: 01/10/2020). Ademais, a TNU firmou entendimento, por meio da Súmula nº 73: “O tempo de gozo de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez não decorrentes de acidente de trabalho só pode ser computado como tempo de contribuição ou para fins de carência quando intercalado entre períodos nos quais houve recolhimento de contribuições para a previdência social”. Inclusive o STF tem aplicado o mesmo raciocínio no sentido de se considerar o cômputo do período de gozo de benefício por incapacidade (auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez) intercalado com períodos laborativos ou contributivos, para fins de carência: (RE nº 1.299.883/RS, Rel. Ministra Cármen Lúcia, j. 26/11/2020, DJe: 01/12/2020); (ARE nº 1.128.051/SP, Rel. Ministro Marco Aurélio, j. 16/05/2018, DJe: 21/05/2018). A Autarquia federal apresentou, em sede de contestação, extrato processual dos autos 0056372-42.2008.4.03.9999 (ID 133467982 – Pág. 27), que tramitaram perante a Sétima Turma desta E. Corte, que tratou da aposentadoria por invalidez da autora. Por meio de decisão monocrática proferida pelo Desembargador Federal Antônio Cedenho, em 30/04/2009, com publicação em 10/06/2009 no Caderno Judicial II - MONO 69, constata-se que a requerente ainda se enquadrava, à época, como trabalhadora rural, in verbis: “(...) Quanto ao cumprimento da carência e manutenção da qualidade de segurado: Existe início de prova material quanto ao exercício de atividade rurícola devidamente complementado pela prova testemunhal, demonstrando o exercício do trabalho rural como empregado ou diarista, até 2006, sendo que, conforme laudo médico pericial, apresenta os sintomas da doença incapacitante desde 2002. Não obstante o expert na data do exame não tenha concluído pela incapacidade total e permanente da parte Autora para o trabalho, é de rigor observar que ela se encontra incapacitada para o trabalho braçal em virtude da idade avançada e baixo nível intelectual, não possuindo qualificação profissional que permita outro trabalho de menor esforço físico. Logo, não há como considerá-lo apto ao exercício de sua profissão, que inegavelmente demanda esforço físico intenso.” (g.n.) Destarte, infere-se a partir do excerto que a autora ainda exercia a atividade rural como empregado ou diarista até o ano de 2006. Portanto, fica comprovado que ela permaneceu na atividade rural até o momento em que passou a receber o benefício previdenciário, com início em 30/04/2007, que perdurou até 23/05/2020. Na presente situação, não há como se exigir que ela estivesse trabalhando na lida rural em período imediatamente anterior ao requerimento administrativo ou ao implemento da idade, visto que estava em pleno gozo de benefício previdenciário que a incapacitou exatamente em decorrência do labor rural. Em 23/11/2018, a autora teve seu benefício previdenciário cessado, em razão de perícia médica realizada por profissional cadastrado pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS (ID 133467982 – Pág. 9). Considerando-se o entendimento remansoso dos Tribunais Superiores e da TNU, no caso em tela, é possível aproveitar à parte autora o período em que esteve de auxílio-doença previdenciário, bem como o período em que recebeu a aposentadoria por invalidez, visto que houve contribuição entre os períodos intercalados, conforme demonstrado nos autos. Vejamos: A parte autor apresentou, dentre outros, o período contributivo até 11/1996. Nesse ínterim, gozou de auxílio-doença entre 01/01/1996 a 30/09/1996, voltando a trabalhar na lida rural até 22/11/1996. Por meio dos autos 0056372-42.2008.4.03.9999 (ID 133467982 – Pág. 27), verificou-se que a autora permaneceu na atividade campesina até pelo menos 2006, quando passou a receber então a aposentadoria por invalidez, entre 30/04/2007 a 23/05/2020. Novamente, em período intercalado, houve recolhimento por parte da autora como contribuinte facultativo no período referente à competência de 11/2018, conforme demonstrado nos autos por meio da guia da Previdência Social - GPS (ID 133467975), bem como no extrato CNIS da autora (ID 133467982 – Pág. 7). Portanto, resta demonstrado que houve contribuição intercalada ou do efetivo exercício entre os períodos que a autora esteve em gozo de benefícios por incapacidade, devendo ser computados tais períodos para fins de cálculo do período de carência. No mais, as testemunhas ouvidas em audiência, sob o crivo do contraditório comprovaram, de forma coerente e harmônica que a parte autora laborou como rurícola, conforme extraídos da audiência de instrução e julgamento (ID 133468014): A testemunha Áurea Rosa Bolin Souza disse que “conhece a autora há uns 35 ou 40 anos. Que ela trabalhava na roça. Que a depoente já trabalhou junto com a autora, na Santa Alice, na Dona Barra, na Fazenda Prata, na Guanabara. Que nomes de empreiteiros, menciona o Seu Severino, Claudio Jacó, Eustáquio. Que na época não tinha registro. Que a autora não trabalhou de doméstica, sempre foi rural. Que a autora adoeceu e ficou sem trabalhar. Que perdeu o contato recente com ela, neste ano (da audiência). Que até ficar doente, a autora somente trabalhou na roça. Que a última vez que trabalhou junto com a autora foi em 1996, pois a depoente parou mas a autora continuou trabalhando na roça até ficar doente”. Nesse mesmo sentido, a testemunha Benedito Gonçalves da Cruz afirmou que “conhece a autora de 35 a 40 anos, quando a autora chegou na cidade com 15 anos. Que nessa época, ela já trabalhava com serviços rurais, como cortar cana, colher algodão, chacoalhar amendoim. Que o depoente trabalhou junto com ela. Que se lembra das propriedades em que trabalharam juntos, tais como Iracema, Floresta, Xambu, Fazenda São Paulo, em serviços avulsos. Que não trabalhou com ela que tenha tido registro em carteira. Que se lembra dos empreiteiros da época tal como o Severino e outros. Que a autora sempre foi trabalhadora rural, na roça. Que a autora passou a receber aposentadoria em 2006, aí perderam contato. Este ano eles se viram na cidade. Que ela está parada ainda, pois ela estava com problemas de saúde. Que a última vez que trabalharam juntos foi em 1995, depois disso cada um partiu para um lado”. Quanto à testemunha Gesuíta Silva de Jesus, esta alegou que “conhece a autora há uns 35 anos, quando ela trabalhava na lavoura. Que a depoente também já foi trabalhadora rural desde os 15 anos de idade. Que a depoente já trabalhou junto com a autora, na roça na Santa Alice, na Guanabara, na Fazenda São Paulo, de roça isso. Que de empreiteiros, tinha o Seu Onofre, Jacó, Claudio. Que ponto de ônibus de trabalho famoso era na Pracinha. Que não sabe se a autora foi lavadeira, passadeira, doméstica. Que a autora recebia benefício da previdência, mas não recebe mais, faz um ano e pouco. Que atualmente, a autora tentou voltar pra roça, mas está doente e não conseguiu. Que a autora se queixa de dor no joelho. Que a última vez que trabalharam juntas faz tempo, quando a depoente tinha 35 anos (1995) e atualmente tem 59 anos (2019). Que depois disso nunca mais trabalharam juntas na roça”. Deveras, as testemunhas ouvidas sob o crivo do contraditório foram uníssonas em afirmar que a parte autora sempre exerceu atividades rurais, pelo menos até o momento em que adoeceu e passou a receber os benefícios por incapacidade, corroborando os termos da exordial. Desta feita, levando-se em conta os períodos que constam da CTPS, bem como os períodos aproveitados em razão das contribuições intercaladas no gozo de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez, a carência foi cumprida, sendo de rigor a concessão do benefício. Preenchidos os requisitos legais, há que se conceder o benefício da aposentadoria por idade rural, desde a data do requerimento administrativo em 11/12/2018. Os valores pagos, na via administrativa ou por força de decisão judicial, a título de benefícios inacumuláveis no período, deverão ser integralmente abatidos do débito. Passo à análise dos consectários. Custas e despesas processuais O INSS, como autarquia federal, é isento do pagamento de custas na Justiça Federal, por força do artigo 4º, I, da Lei Federal nº 9.289/1996. Da mesma forma, em face do disposto no artigo 1º, § 1º, da referida lei, combinado com o estabelecido pelo artigo 6º da Lei Estadual paulista nº 11.608, de 2003, também está isento nas lides aforadas perante a Justiça Estadual de São Paulo no exercício da competência delegada. Quanto às demandas aforadas no Estado de Mato Grosso do Sul, a isenção prevista nas Leis Estaduais sul-mato-grossenses nºs 1.135/91 e 1.936/98 foi revogada pela Lei Estadual nº 3.779/09 (art. 24, §§ 1º e 2º), razão pela qual cabe ao INSS o ônus do pagamento das custas processuais naquele Estado. Caberá à parte vencida arcar com as despesas processuais e as custas somente ao final, na forma do artigo 91 do CPC. Consectários legais Aplica-se aos débitos previdenciários a súmula 148 do C.STJ: "Os débitos relativos a benefício previdenciário, vencidos e cobrados em juízo após a vigência da Lei nº 6.899/81, devem ser corrigidos monetariamente na forma prevista nesse diploma legal”. (Terceira Seção, j. 07/12/1995) Da mesma forma, incide a súmula 8 deste E. Tribunal: “Em se tratando de matéria previdenciária, incide a correção monetária a partir do vencimento de cada prestação do benefício, procedendo-se à atualização em consonância com os índices legalmente estabelecidos, tendo em vista o período compreendido entre o mês em que deveria ter sido pago, e o mês do referido pagamento". a) Juros de mora A incidência de juros de mora deve observar a norma do artigo 240 do CPC de 2015, correspondente ao artigo 219 do CPC de 1973, de modo que são devidos a partir da citação, à ordem de 6% (seis por cento) ao ano, até a entrada em vigor da Lei nº 10.406/02; após, à razão de 1% ao mês, por força do art. 406 do Código Civil e, a partir da vigência da Lei nº 11.960/2009 (art. 1º-F da Lei 9.494/1997), de acordo com a remuneração das cadernetas de poupança, conforme determinado na Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947 (Tema 810) e no Recurso Especial Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905). b) Correção monetária Há incidência de correção monetária na forma da Lei n. 6.899, de 08/04/1981 e da legislação superveniente, conforme preconizado pelo Manual de Cálculos da Justiça Federal, consoante os precedentes do C. STF no julgamento do RE n. 870.947 (Tema 810), bem como do C. STJ no julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905). c) Honorários advocatícios Em razão da sucumbência, condeno o INSS ao pagamento de honorários advocatícios fixados em patamar mínimo sobre o valor da condenação, observadas as normas do artigo 85, §§ 3º e 5º, do CPC/2015. Os honorários advocatícios, conforme a Súmula 111 do C. STJ, incidem sobre as parcelas vencidas até a sentença de procedência; porém, tendo em vista que a pretensão do requerente apenas foi deferida nesta sede recursal, a condenação da verba honorária incidirá sobre as parcelas vencidas até a data da presente decisão. Quanto ao prequestionamento suscitado, assinalo não haver qualquer infringência à legislação federal ou a dispositivos constitucionais. Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação, nos termos da fundamentação. É o voto.
DECLARAÇÃO DE VOTO
A Exma. Sra. Desembargadora Federal Daldice Santana: A Juíza Convocada Leila Paiva, em seu voto, deu provimento à apelação da parte autora, para julgar procedente pedido de aposentadoria por idade rural.
Ouso, porém, com a máxima vênia, apresentar divergência quanto ao mérito, pelas razões que passo a expor.
Discute-se o preenchimento dos requisitos para a concessão de aposentadoria por idade ao rurícola, consoante o disposto na Lei n. 8.213/1991.
A comprovação de atividade rural, para o segurado especial e para os demais trabalhadores rurais, inclusive os denominados “boias-frias”, deve ser feita por meio de início de prova material, a qual possui eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o posterior à sua data de referência, desde que corroborado por robusta prova testemunhal (Súmula n. 149 do STJ e Recursos Especiais Repetitivos n. 1.348.633 e 1.321.493).
No mais, segundo o entendimento firmado no REsp n. 1.354.908, pela sistemática de recurso representativo da controvérsia (CPC/1973, art. 543-C), faz-se necessária a comprovação do tempo de atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento ou à aquisição da idade:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO. REGRA DE TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS QUE DEVEM SER PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo 48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito. Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício. 2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência. Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil.” (RECURSO ESPECIAL Nº 1.354.908 - SP (2012/0247219-3), RELATOR: MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES, DJ 09/09/2015)
Em relação às contribuições previdenciárias, é assente o entendimento de serem elas desnecessárias, bastando a comprovação do efetivo exercício de atividade no meio rural (STJ, REsp 207.425, 5ª Turma, j. em 21/9/1999, v.u., DJ de 25/10/1999, p. 123, Rel. Ministro Jorge Scartezzini; STJ, RESP n. 502.817, 5ª Turma, j. em 14/10/2003, v.u., DJ de 17/11/2003, p. 361, Rel. Ministra Laurita Vaz).
No caso em discussão, o requisito etário restou preenchido em 23/1/2016, quando a autora completou 55 (cinquenta e cinco) anos de idade.
A parte autora alega que trabalha na lide rural desde tenra idade, tendo cumprido a carência exigida na Lei n. 8.213/1991.
Há início de prova material presente nos vínculos empregatícios de trabalho rural da autora anotados em Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) nos seguintes períodos: de 6/5/1981 a 8/1/1982; de 21/5/1982 a 2/6/1982; de 11/11/1982 a 11/3/1983; de 22/7/1983 a 31/10/1983; de 21/11/1983 a 27/12/1983; de 18/1/1984 a 12/1/1985; de 1º/10/1985 a 3/11/1985; de 4/8/1986 a 15/4/1987; de 26/5/1987 a 27/1/1988; de 8/6/1988 a 29/12/1988; de 13/2/1989 a 18/3/1989, de 21/8/1989 a 17/3/1990; de 25/6/1990 a 26/1/1991; de 8/7/1991 a 11/1/1992; de 15/6/1992 a 14/2/1993; de 14/6/1993 a 26/12/1993; de 30/5/1994 a 15/1/1995; de 16/2/1991 a 21/2/1991; e 14/8/1995 a 22/11/1996.
Não obstante, os dados do Cadastro Nacional de Informações Sociais – CNIS demonstram que a autora recebeu aposentadoria por invalidez (concedida judicialmente) no período de 30/4/2007 a 23/5/2020. Ou seja, em grande parte do período juridicamente relevante à concessão do benefício ora pretendido a parte autora esteve afastada das lides rurais.
Com efeito, está assentado na jurisprudência o entendimento de que o período intercalado de recebimento de benefício por incapacidade deve ser computado como carência para fins de concessão de aposentadoria por idade urbana.
Nessa esteira, há posicionamento de que esse entendimento deve ser aplicado na concessão de benefício direcionados aos trabalhadores rurais que, no lugar de carência, devem comprovar exercício de atividade rural, desde que, contudo, os períodos de recebimento de benefício por incapacidade estejam intercalados com períodos de labor campesino.
Nesse sentido:
“PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. CARÁTER NÃO CONTRIBUTIVO. PERÍODOS DE AUXÍLIO-DOENÇA. APROVEITAMENTO PARA CONTAGEM DE TEMPO EM APOSENTADORIA RURAL POR IDADE QUANDO INTERCALADOS POR EXERCÍCIO DE ATIVIDADE QUE QUALIFIQUE O REQUERENTE COMO SEGURADO ESPECIAL. POSSIBILIDADE. 1. Tratando-se de benefício de caráter não contributivo, como é a aposentadoria por idade do trabalhador rural, é possível que seja computado no tempo de carência os períodos de gozo de auxílio-doença, desde que intercalados com períodos de exercício de atividade que qualifique o requerente como segurado especial. 2. Incidente da parte autora conhecido e provido”. (TRF4 5004482-98.2013.404.7113, Turma Regional de Uniformização da 4ª Região, Relator p/ Acórdão Leonardo Castanho Mendes, juntado aos autos em 24/02/2016)
Entretanto, pelas provas acostadas aos autos, não se verifica o efetivo retorno às atividades rurais após a cessação do benefício de incapacidade.
De fato, não há início de prova material do labor rural depois da cessação desse benefício.
No mais, embora as testemunhas tenham informado genericamente que a autora tenha trabalhado como boia-fria, estas, desacompanhadas de início de prova material, não se prestam, por si só, à comprovação pretendida.
Com isso, lícito é inferir que a parte autora não fez prova suficiente dos fatos de seu interesse e constitutivos de seu direito, não se desincumbindo satisfatoriamente do ônus probatório que lhe competia, merecendo o decreto de improcedência.
Fica mantida a condenação da parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, já majorados em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º e 11, do CPC, suspensa, porém, a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo estatuto processual, por tratar-se de beneficiária da justiça gratuita.
Diante do exposto, nego provimento à apelação.
É o voto.
DALDICE SANTANA
Desembargadora Federal
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. CÔMPUTO DE PERÍODO EM QUE O SEGURADO ESTEVE EM GOZO DE AUXÍLIO-DOENÇA E APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. POSSIBILIDADE, DESDE QUE INTERCALADO COM PERÍODOS CONTRIBUTIVOS. REQUISITOS PREENCHIDOS.
I. Comprovação da idade mínima e o desenvolvimento de atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento (REsp Repetitivo nº 1.354.908) como requisitos para concessão ao benefício previdenciário.
II. A atividade rural deverá ser comprovada por meio de início de prova material podendo ser corroborado por prova testemunhal (Súmula nº 149 do STJ e Recursos Repetitivos nºs 1.348.633 e 1.321.493). - Entendimento uniforme de que as contribuições previdenciárias são desnecessárias, contanto que se comprove o efetivo exercício de labor rural. Precedentes do STJ.
III. Entendimento consolidados dos Tribunais Superiores no sentido de que é possível o cômputo do período em que o segurado esteve em gozo de benefícios por incapacidade, desde que intercalados com períodos contributivos, sejam de efetivo trabalho ou de contribuição. Precedentes da TNU, STJ e STF.
IV. Requisitos para concessão ao benefício pleiteado foram preenchidos.
IV. Apelação parcialmente provida.