Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005322-66.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA

APELANTE: TEREZINHA ALEXANDRINO FAVARO

Advogados do(a) APELANTE: RAFAEL COLDIBELLI FRANCISCO FILHO - MS15878-A, ARTHUR ANDRADE FRANCISCO - MS16303-A, THAYLA JAMILLE PAES VILA - MS16317-A

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005322-66.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA

APELANTE: TEREZINHA ALEXANDRINO FAVARO

Advogados do(a) APELANTE: RAFAEL COLDIBELLI FRANCISCO FILHO - MS15878-A, ARTHUR ANDRADE FRANCISCO - MS16303-A, THAYLA JAMILLE PAES VILA - MS16317-A

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

 

A Excelentíssima Senhora Juíza Federal convocada Leila Paiva (Relatora): 

Cuida-se de recurso de apelação interposto por Terezinha Alexandrino Favaro contra sentença proferida em demanda previdenciária, que julgou improcedente o pedido de aposentadoria por idade rural pleiteado perante o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS.

A parte autora sustenta, em síntese: a) há indícios de prova material aliados à prova testemunhal; b) ressalta que os vínculos urbanos dos filhos da autora são de curta duração; c) o tamanho do imóvel da autora não afasta por si só a qualificação de segurada especial, sendo que a autora produz e cria gado em área de apenas 160ha; d) requer a condenação do INSS para implantar o benefício de aposentadoria por idade rural desde a DER, inclusive os atrasados aplicando-se os índices de correção monetária e juros previstos no RE 870947; e) requer condenação do INSS ao pagamento de honorários advocatícios; f) subsidiariamente, requer o reconhecimento, ainda que parcial, de labor rural para averbação perante a autarquia previdenciária; g) não acolhendo nenhum dos requerimentos supracitados, que o processo seja extinto sem resolução de mérito, ao revés de julgado improcedente os pedidos; h) prequestiona a matéria para fins recursais.

Sem contrarrazões, os autos subiram a esta E. Corte Regional.

É o relatório.

 

 

 

 

rig

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005322-66.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA

APELANTE: TEREZINHA ALEXANDRINO FAVARO

Advogados do(a) APELANTE: RAFAEL COLDIBELLI FRANCISCO FILHO - MS15878-A, ARTHUR ANDRADE FRANCISCO - MS16303-A, THAYLA JAMILLE PAES VILA - MS16317-A

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

 

 

A Excelentíssima Senhora Juíza Federal convocada Leila Paiva (Relatora):

Da aposentadoria por idade rural

O direito à aposentadoria por idade rural foi estabelecido no artigo 201, § 7º, inciso II, da Constituição da República, in verbis:

“Art. 201 (...)

§ 7 É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, obedecidas as seguintes condições: (...)

II - 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, para os trabalhadores rurais e para os que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, nestes incluídos o produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019)”.

A disciplina legal para exercício do direito pelos trabalhadores rurais consta dos artigos 48 e 143 da Lei nº 8.213, de 24/07/1991, o Plano de Benefícios da Previdência Social (PBPS), valendo transcrever o teor do artigo 48, in verbis:

“Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher.                 (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)

§ 1o Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11.                (Redação Dada pela Lei nº 9.876, de 26.11.99)

§ 2o  Para os efeitos do disposto no § 1o deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período  a que se referem os incisos III a VIII do § 9o do art. 11 desta Lei.                   (Redação dada pela Lei nº 11,718, de 2008)

§ 3o  Os trabalhadores rurais de que trata o § 1o deste artigo que não atendam ao disposto no § 2o deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher.               (Incluído pela Lei nº 11,718, de 2008)

§ 4o  Para efeito do § 3o deste artigo, o cálculo da renda mensal do benefício será apurado de acordo com o disposto  no inciso II do caput do art. 29 desta Lei, considerando-se como salário-de-contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo de salário-de-contribuição da Previdência Social.                 (Incluído pela Lei nº 11,718, de 2008)”.

Quanto aos segurados especiais em regime de economia familiar, a previsão está no artigo 39, inciso I, da Lei nº 8.213, de 24/07/1991, in verbis:

“Art. 39.  Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do caput do art. 11 desta Lei, fica garantida a concessão: (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)

I - de aposentadoria por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de pensão, no valor de 1 (um) salário mínimo, e de auxílio-acidente, conforme disposto no art. 86 desta Lei, desde que comprovem o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício requerido, observado o disposto nos arts. 38-A e 38-B desta Lei; ou             (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)”

Anote-se que, embora o artigo 143 da Lei nº 8.213, de 24/07/1991, refira limitação temporal ao requerimento do benefício, a concessão da aposentadoria por idade rural contém a sua base legal na norma do artigo 48 da mesma lei, razão por que não há que se cogitar de tal limite. (Precedente: TRF 3ª Região, 9ª Turma, Apelação Cível 5000087-29.2018.4.03.6139, Rel. Desembargadora Federal MARISA FERREIRA DOS SANTOS, j. 07/02/2020)

Enfatize-se, ainda, que o direito à percepção do benefício é regulado pela lei vigente no tempo em que preenchidos os requisitos, porquanto a interpretação da sucessão de leis no tempo submete-se à observância do valor da segurança jurídica e, consequentemente, ao direito adquirido (artigo 5º, XXXVI da CR), em observância ao princípio tempus regit actum, bem assim pelo pacificado pelo Colendo Supremo Tribunal Federal no RE 597.389/SP, sob o regime da repercussão geral (Questão de Ordem, Relator Ministro Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, j. 22/04/2009). (Precedentes: REsp 1.900.559/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, j. 24/11/2020; AgInt no REsp 1.871.619/SP, Rel. Ministro Og Fernandes, j. 16/11/2020).

Assim, a obtenção da aposentadoria por idade rural depende do preenchimento de dois requisitos: a idade e a prova da atividade rural.

1. A idade mínima de 60 (sessenta) anos, se homem, e 55 (cinquenta e cinco) anos, se mulher, foi fixada pelo texto constitucional, e também no artigo 11, incisos I, letra “a”; V, letra “g”; VI e VIII, c/c o artigo 48, §1º, todos da Lei nº 8.213, de 24/07/1991.

2. O exercício de atividade rural, ainda que descontínuo, deve ser demonstrado no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício (artigo 143 da Lei nº 8.213, de 21/07/1991), pelo tempo correspondente ao da carência do benefício pretendido, atualmente 180 (cento e oitenta) meses, observados os artigos 142 e 143 da Lei nº 8.213, de 24/07/1991.

2.1. Inicialmente, anote-se a necessidade de perfazimento simultâneo dos requisitos, embora essa regra não se aplique à aposentadoria por idade urbana.

Assim, é imprescindível a comprovação da labuta no campo no período imediatamente anterior ao implemento da idade, conforme entendimento assentado pelo Colendo Superior Tribunal da Justiça no Tema 642/STJ: “O segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade”, extraído do julgamento do RESP Repetitivo n°1.354.908/SP, com a seguinte ementa, in verbis:

PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO. REGRA DE TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS QUE DEVEM SER PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.

1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo 48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito. Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício.

2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência. Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil.

(REsp 1354908/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/09/2015, DJe 10/02/2016)

Evidentemente, uma vez comprovados os requisitos de idade de do tempo de labor campesino equivalente à carência, não há que se falar em perda da qualidade de segurado, na medida em que o direito à aposentação é incorporado ao patrimônio jurídico do trabalhador.

2.2. A comprovação da atividade rural pode ser realizada mediante início de prova material corroborada por prova testemunhal, conforme o § 3º do artigo 55 da Lei nº 8.213, de 24/07/1991, in verbis:

Art. 55. (...)

§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os fins desta Lei, inclusive mediante justificativa administrativa ou judicial, observado o disposto no art. 108 desta Lei, só produzirá efeito quando for baseada em início de prova material contemporânea dos fatos, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, na forma prevista no regulamento.  (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)

Nesse sentido, estabelece o verbete da Súmula 149 do C. STJ: “A prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário”. (STJ, Terceira Seção, j. 07/12/1995, DJ 18/12/1995).

O precedente aplica-se também aos trabalhadores rurais denominados “boias-frias”, conforme assentado no Tema 554/STJ: “Aplica-se a Súmula 149/STJ (...) aos trabalhadores rurais denominados 'boias-frias', sendo imprescindível a apresentação de início de prova material. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal”. (REsp Repetitivo nº 1.321.493, Relator Ministro Herman Benjamin, j. 10/10/2012, DJe 19/12/2012).

2.3. Ademais, com fulcro na possibilidade de eficácia prospectiva e retrospectiva dos documentos, o reconhecimento de tempo de serviço rural vai além do período relativo ao início de prova material, quando for corroborado por prova testemunhal. Esse entendimento foi consolidado pelo C. STJ no Tema 638/STJ: “Mostra-se possível o reconhecimento de tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo, desde que amparado por convincente prova testemunhal, colhida sob contraditório" (RESP nº 1.348.633/SP, Relator Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 28/08/2013, DJE 05/12/2014).

Nessa senda, confirmando que não prescinde que o início de prova material diga respeito a todo o período de carência, contanto que seja corroborado pela prova testemunhal, o C. STJ editou a Súmula 577/STJ: “É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório” (Primeira Seção, j. 22/06/2016, DJe 27/06/2016).

2.4. As provas materiais aptas à demonstração do trabalho rural foram elencadas no rol meramente exemplificativo do artigo 106 da Lei nº 8.213, de 24/07/1991, conforme jurisprudência pacificada (Precedentes: AgInt no AREsp 1372590/SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, j. 21/03/2019;  DJe 28/03/2019; RESP nº 1.081.919/PB, Relator Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe 03/08/2009; TRF3, Nona Turma, Apelação/Remessa Necessária 6080974-09.2019.4.03.9999, Relator Desembargador Federal Gilberto Jordan, publ. 25/11/2020)

A comprovação da atividade rural será realizada, ainda, mediante verificação dos registros de segurados especiais no Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS), na forma dos artigos 38-A e 38-B da Lei nº 8.213, de 24/07/1991.

Quanto à declaração de sindicato de trabalhadores rurais, o documento foi submetido a três disciplinas distintas. Inicialmente, por força do disposto pelo artigo 106 do PBPS, exigia-se a homologação do Ministério Público. A partir da edição da Lei nº 9.063, em 14/06/1995, passou a ser necessária a homologação do INSS. E desde 18/01/2019, com a edição da Medida Provisória nº 871/2019, convertida na Lei nº 13.846, de 2019, não pode ser aceita a referida declaração para fins de comprovação da atividade rural.

2.5. De outra parte, a ausência de início de prova material constitui óbice ao julgamento do mérito da lide, resultando, necessariamente, em extinção sem julgamento de mérito, a teor do previsto no artigo 55, § 3°, da Lei nº 8.213, de 24/07/1991, caracterizando-se a ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo, na forma do artigo 485, IV, do CPC.

Foi submetida questão à Corte Especial do C. STJ no sentido de pacificar a solução dos casos nos quais “a parte autora deixou de instruir seu pedido inicial com documentos que comprovassem o exercício de atividade rural em momento imediatamente anterior ao ajuizamento da ação, consoante exigência legal prevista no art. 143 da Lei 8.213/91”.

Aquela C. Corte Superior cristalizou o assunto no Tema 629/STJ: “A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa”. (RESP Repetitivo nº 1.352.721/SP, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Corte Especial, j. 16/12/2015, DJe 28/04/2016).

Nesse sentido, o precedente deste E. Tribunal Regional Federal 3ª Região: Terceira Seção, AR - AÇÃO RESCISÓRIA - 10396 - 0008699-33.2015.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal SERGIO NASCIMENTO, j.09/06/2016, e-DJF3 Judicial 1 17/06/2016.

Postas essas balizas, passemos, pois, ao exame do caso dos autos.

DO CASO CONCRETO

A parte autora nascida em 18/06/1961, cumpriu o requisito etário em 18/06/2016, quando completou 55 (cinquenta e cinco) anos de idade.

Sustenta a autora que sempre trabalhou no campo como trabalhadora rural em regime de economia familiar na Fazenda Nova Itália em Tapira/PR. Em 1980 casou-se com José Carlos Favaro, o qual também era trabalhador rural até o seu falecimento. A autora afirma que se mudou de Tapira/PR para Caracol/MS onde adquiriu a Fazenda Primavera, onde permaneceu até 2010 e a vendeu. Em seguida, adquiriu a Fazenda de Deus, em Rio Verde do Mato Grosso/MS onde permanece residindo e trabalhando na lide rural desde então.

Alega ter preenchido os requisitos mínimos exigidos em lei para a concessão do benefício ora pleiteado.

A autora juntou aos autos os seguintes documentos:

- certidão de casamento, contraído em 02/02/1980, entre a autora e José Carlos Favaro. Consta a profissão do contraente como comerciante. A autora, como “do lar”;

- declaração de exercício de atividade rural nº 014/2016, no qual a autora alega ter trabalhado na lida rural entre 02/01/1995 a 14/11/2005;

- Matrícula nº 9.107 do Cartório de Registro de Imóveis de Cidade Gaúcha/PR, de imóvel com 4,84 hectares, em formal de partilha tendo herdeira a autora;

- notas fiscais em nome de José Carlos Favaro de 1995 e 1996;

- notas fiscais em nome da autora de venda de produtos e aquisição de insumos, de 1999 a 2004 e de 2012 a 2016;

- comprovantes de Imposto sobre Propriedade Territorial Rural - ITR, com área de 73,4ha de 1998 e 2005 da Fazenda Nova Itália com endereço de cadastro: Av. Porto Alegre, 996, Centro, Tapira/PR (zona urbana);

- ITR de 2013 a 2015 da Fazenda de Deus, com endereço na Rua Norberto Ribeiro de Souza, 50, Campo Grande/MS (zona urbana);

- Certificado de Cadastro de Imóvel Rural - CCIR dos anos de 2006 a 2014 da Fazenda de Deus, com 428,0174 hectares;

- Matrícula 14.793 da Fazenda de Deus, com 428,0174 hectares de área;

- entrevista rural na agência do INSS, em 01/11/2016.

Em que pese a documentação apresentada, verifica-se que não foi anexado aos autos nenhum documento em nome da parte autora capaz de comprovar o seu efetivo labor campesino por todo período de carência necessário à concessão do benefício pleiteado, nos termos preconizados pela legislação previdenciária.

A certidão de casamento apresenta a ocupação profissional da autora como “do lar” e a do marido como “comerciante” (ID 136123426 – Pág. 18). Em audiência, a própria autora alegou que “o seu esposo era de comércio cerealista, de arroz e que recebe pensão por morte previdenciária em razão do falecimento do cônjuge.” (ID 136123431).

Não obstante, nas declarações sobre Imposto sobre Propriedade Territorial Rural – ITR da Fazenda de Deus e da Fazenda Nova Itália, constam, respectivamente, endereços em zona urbana de cada município (ID 136123426 – Pág. 29, 38, 39, 55 e 61).

O Certificado de Cadastro de Imóvel Rural – CCIR referente aos anos de 2006 a 2014 apresentam imóvel rural com 428,0174 hectares de área, equivalentes a 7,1336 módulos fiscais, excedendo o limite permitido de 04 módulos fiscais na legislação previdenciária vigente, para se enquadrar na qualidade de segurado especial que labora na terra como trabalhador rural.

Some-se a isso o fato de que nos extratos CNIS dos filhos da autora constam registros empregatícios de natureza majoritariamente urbana. Além de o fato de a autora ter aberto empresa que produz e comercializa carvão vegetal em florestas nativas / plantadas, conforme comprovante de inscrição no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica, desde 2004, permanecendo ativa até o momento (ID 136123426 – Pág. 102).

Ademais, tanto a propriedade denominada Fazenda Nova Itália, com mais de 202 hectares de área, quanto a Fazenda de Deus, com cerca de 428 hectares de área, excedem o limite estabelecido em lei, para figurar como segurado especial, que é de até 04 (quatro) módulos fiscais (ID 136123426 – Págs. 103-115).

Apesar da alegação da autora em audiência (ID 136123431), não há nos autos prova fidedigna ou sequer indícios demonstrando que o genro da autora seja responsável pela criação de mais da metade das cabeças de gado, bem como pelo labor na terra em nome dos filhos, que comprovem tal alegação.

Outrossim, ainda que a parte autora tenha se dedicado à atividade rural, não a exercia em regime de economia familiar, precária ou rudimentar, com a finalidade de subsistência. Trata-se, portanto, de produtor rural em larga escala, que explora a terra visando ao lucro.

Não quer dizer que o segurado especial esteja impedido de vender o excedente produzido por meio da atividade rural. Mas diferencia-se da figura de segurado especial aquele produtor rural, cuja produção, seja ela proveniente da agricultura, pecuária ou extração, possua como objetivo principal a obtenção de lucro a partir da venda do que foi produzido para o comércio e/ou indústria, o que reforça a descaracterização de segurado especial da parte autora.

Observe-se que há notas fiscais que demonstram vultosa produção agropecuária, conforme exemplos a seguir, todos do ID 136123426:

- em 15/11/2014 - de 200 cabeças de gado (fêmea) por R$218.400,00

- em 16/07/2015 - (aquisição) de 37 cabeças de gado bovino por R$44.400,00;

- em 21/12/2012, 800kg de sementes.

Não é crível que a parte requerente exerça, somente com o mero auxílio do filho, todas as atividades rurais no imóvel informado (e.g. produção e venda de carvão, produção de leite e criação de gado de corte com cerca de 250 reses bovinas), em uma propriedade tão extensa sem a ajuda de empregados.

Considerando-se o contexto fático, com base nas provas apresentadas, conclui-se tratar de família de produtor rural, como se depreende das notas fiscais com vultosas quantias cultivadas ao longo dos anos, e não a de segurado especial, que labora em regime de economia familiar, cuja produção tem finalidade de subsistência, com eventual comercialização do excedente produzido, conforme se verifica nos julgados a seguir:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. PROPRIEDADE RURAL DE GRANDE PRODUÇÃO. LATIFÚNDIO. DESCARACTERIZAÇÃO DO REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. IMPROCEDÊNCIA.

I. É considerada atividade rural em regime de economia familiar aquela em que o trabalho dos membros da família é indispensável à sua própria subsistência e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados.

II. Verificando-se que a produção do módulo rural excede em demasia o indispensável ao seu sustento e ao de sua família, torna-se inviável enquadrar a parte autora como segurada especial, entendida como o pequeno produtor rural que vive sob o regime de economia familiar. (grifei)

III. Apelação improvida.

(7ª Turma, AC nº 98.03.101265-7, Rel. Des. Fed. Walter do Amaral, j. 30.08.2004, DJ 21.10.2004, p. 220)

 

PROCESSO CIVIL. AGRAVO LEGAL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. ATIVIDADE RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR DESCARACTERIZADO. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.

- A prova testemunhal deve vir acompanhada de início de prova documental, para fins de comprovar o efetivo labor no campo (Súmula 149 de STJ).

- Os documentos acostados aos autos, indicando a produção em larga escala, não permitem que o marido seja enquadrado como segurado especial, nos termos da legislação vigente. (grifei)

- Aplicável a autorização legal de julgamento monocrático, prevista no artigo 557, § 1º-A, do Código de Processo Civil, diante de jurisprudência dominante do STJ.

- Agravo legal a que se nega provimento.

(8ª Turma, AC nº 98.03.101265-7, Rel. Des. Fed. Therezinha Cazerta, j. 29.04.2013, e-DJF3 de 14.05.2013, Judicial 1)

Assim, fica afastado o labor rural de pequeno produtor em regime de economia familiar, nos termos do art. 11, VII, §1º, da Lei nº 8.213/91.

O conjunto probatório não tem o condão de demonstrar a atividade rural pela autora em regime de economia familiar, assim entendido como atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes.

Desta forma, ainda que tenha adimplido o requisito etário, a parte recorrente não se desincumbiu do ônus probatório que lhe competia, qual seja, o de provar a carência, na qualidade de segurado especial, pelo período necessário à concessão do benefício em questão, pois requer que a pessoa interessada esteja em labor rural em regime de economia familiar, em período imediatamente anterior ao requerimento administrativo em número de meses iguais e necessários à concessão da aposentadoria por idade rural, o que não foi comprovado.

Na espécie, não há provas materiais a serem corroboradas pelo depoimento das testemunhas, o que desautoriza a concessão da modalidade de aposentadoria pretendida (Súmula 149 do STJ).

Quanto ao prequestionamento suscitado, assinalo não haver qualquer infringência à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.

Assim, concluo pelo não preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício. 

Ante o exposto, nego provimento à apelação, nos termos da fundamentação.

É o voto.

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR AFASTADO. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. INEXISTÊNCIA. NOTAS FISCAIS DE PRODUÇÃO. PRODUÇÃO EM LARGA ESCALA. COMERCIALIZAÇÃO DA PRODUÇÃO. NÃO COMPROVAÇÃO DE TRABALHO RURAL PELO PERÍODO DE CARÊNCIA EXIGIDO EM LEI. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS.

 - Comprovação da idade mínima e o desenvolvimento de atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento (REsp Repetitivo nº 1.354.908) como requisitos para concessão ao benefício previdenciário.

- A atividade rural deverá ser comprovada por meio de início de prova material podendo ser corroborado por prova testemunhal (Súmula nº 149 do STJ e Recursos Repetitivos nºs 1.348.633 e 1.321.493).

- Entendimento uniforme de que as contribuições previdenciárias são desnecessárias, contanto que se comprove o efetivo exercício de labor rural. Precedentes do STJ.

- Produção em larga escala e comercialização em quantidade incompatível com labor campesino nos moldes de regime de economia familiar de subsistência.

- Requisitos para concessão ao benefício pleiteado não foram preenchidos.

- Apelação não provida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.