APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006341-38.2018.4.03.6100
RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA
APELANTE: PREMA TECNOLOGIA E COMERCIO LTDA., INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS
Advogados do(a) APELANTE: ANTONIO CANDIDO DE AZEVEDO SODRE FILHO - SP15467, MICHEL ALVES PINTO NOGUEIRA MELGUINHA - SP311140-A
APELADO: INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS, PREMA TECNOLOGIA E COMERCIO LTDA.
Advogados do(a) APELADO: MICHEL ALVES PINTO NOGUEIRA MELGUINHA - SP311140-A, ANTONIO CANDIDO DE AZEVEDO SODRE FILHO - SP15467
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006341-38.2018.4.03.6100 RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA APELANTE: PREMA TECNOLOGIA E COMERCIO LTDA., INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS Advogados do(a) APELANTE: ANTONIO CANDIDO DE AZEVEDO SODRE FILHO - SP15467, MICHEL ALVES PINTO NOGUEIRA MELGUINHA - SP311140-A Advogados do(a) APELADO: MICHEL ALVES PINTO NOGUEIRA MELGUINHA - SP311140-A, ANTONIO CANDIDO DE AZEVEDO SODRE FILHO - SP15467 R E L A T Ó R I O Trata-se de embargos de declaração contra acórdão assim ementado: "DIREITO PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AMBIENTAL. APELAÇÃO. RAZÕES DIALÉTICAS. AUTO DE INFRAÇÃO. AQUISIÇÃO DE MADEIRA. DOCUMENTAÇÃO IDEOLOGICAMENTE FALSA. ORIGEM ILÍCITA. POSTERIOR INVALIDAÇÃO PELA FISCALIZAÇÃO. INFRAÇÃO DA ADQUIRENTE NÃO CARACTERIZADA. CULPA INCOMPROVADA. ATOS DE APREENSÃO MANTIDOS. ORIGEM ILÍCITA DA MADEIRA. PROTEÇÃO DO COMÉRCIO LEGAL. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. 1. A apelação autárquica não padece do vício formal que torne inaptas as razões deduzidas frente à fundamentação contida na sentença recorrida, cabendo no mérito apreciar se procede ou não a irresignação manifestada. 2. Não fundamentada a decisão administrativa nem o auto de infração na apuração da prática de infração ambiental, à luz do artigo 47 do Decreto 6.514/2008, insubsistente a multa, já que não basta afirmar que a falta de conhecimento da origem ilícita da madeira e da falsidade ideológica das declarações e guias ambientais gera responsabilidade da adquirente. A negligência configura modalidade de culpa, atribuindo-se responsabilidade subjetiva ao agente, por deixar de agir com o cuidado exigível e passível de observância, gerando resultado previsível, o que, na espécie, não foi objeto de imputação fática contextual, pois apenas restou afirmado que o desconhecimento da origem ilícita dos produtos gera conduta negligente. Não se provou, porém, a razão pela qual seria possível à autora ter ciência da falsidade ideológica das guias e documentos florestais e, assim mesmo, ter agido de forma a praticar a infração ambiental. Ao menos indícios de que agiu a autuada com culpa deveriam ter sido destacados na decisão administrativa, pois não se presume responsabilidade infracional nem esta pode derivar de mera abstração fático-jurídica. De acordo com orientação adotada pela própria ré no âmbito administrativo, “nos casos em que o recebedor não tenha ciência da irregularidade do DOF e não tenha sido identificado nenhum indício de participação nas fraudes que viabilizaram a emissão do DOF inválido, recomenda-se que esse não seja autuado”. 3. Não restou caracterizado descumprimento, à luz da prova dos autos, de supostos deveres de averiguação da origem dos materiais. É insuficiente menção isolada ao fato de que "a madeira possui um elevado valor principalmente ambiental e que há no país uma grande rede fraudulenta de exploração e comercialização do produto” e fraudes ocorrem comumente no setor madeireiro.Se admitida a suficiência de tais alegações, seria adotada presunção de ilicitude da origem de todo produto ambiental, porém a legislação não exige do adquirente que atue em função investigativa e fiscalizatória, encargos legais afetos ao próprio IBAMA, mas apenas que exija do vendedor a exibição de licença válida, outorgada pela autoridade própria e competente. Ademais, a verificação in loco da veracidade das informações prestadas é medida que se impõe à autoridade competente em ação fiscalizatória, não se podendo transferir tal responsabilidade a adquirentes sem expressa previsão legal. 4. Contudo, uma vez que não há controvérsia quanto à origem ilegal da madeira, deve prevalecer a respectiva apreensão, enquanto produto de infração ambiental, nos termos dos artigos 25 e 72, IV, da Lei 9.605/1998. No caso específico da indústria madeireira, a interrupção do fornecimento de madeira extraída ilegalmente é medida necessária para que não se promova uso comercial de produção de origem ilícita, assim evitando o fomento à exploração de recursos naturais de maneira predatória e sem o devido controle ambiental. Embora a autora tenha adquirido os bens de boa-fé, não se podendo admitir que praticou infração ambiental sujeita à multa pela aquisição de material de origem ilícita, como exposto acima, não se pode permitir a efetiva utilização de madeira ilegal apenas para evitar prejuízo econômico para quem a adquiriu, dado que tal solução importaria em lesar a tutela da proteção ambiental e estimular a cadeia produtiva ilegal. 5. Configurada a sucumbência recíproca, as partes devem ser condenadas em verba honorária em proporção ao decaimento respectivo, assim considerando o grau de zelo do profissional, lugar da prestação do serviço, natureza e importância da causa e tempo exigido de atuação, nos termos do § 2º do artigo 85, CPC. 6. Preliminar de contrarrazões rejeitada, apelação da ré provida e apelação da autora prejudicada." Alegou o IBAMA omissão e contradição, inclusive em prequestionamento, pois: (1) foram regulares a autuação da autora e a apreensão das madeiras, cuja origem não foi comprovada; (2) diante do grande volume de madeira e de seu elevado valor e, face à existência de rede fraudulenta que atua no setor madeireiro, a compradora deveria ter conferido a existência da vendedora; (3) a empresa Casagrande Madeiras EIRELI – EPP iniciou atividades no SISFLORA, à Rua Dois, 340 – SINOP, CEP 78559649, local em que se observa, por meio do “Google Maps”, apenas “pequenas casas simples e muitos terrenos baldios”; (4) durante a fiscalização, apurou-se que a transação comercial não ocorreu exatamente da maneira como mencionada na inicial e, ademais, em que pese possuir o telefone de contato do responsável pela empresa Casagrande Madeiras, a aquisição foi feita por intermediação de terceiro de nome Marcos Artur Souto Rocha; (5) a responsabilidade administrativa por degradação ao meio ambiente, cujo caráter é objetivo, independe de comprovação de dolo ou culpa do infrator, sendo suficientes a materialidade e a autoria; e (5) há necessidade de menção expressa aos artigos 70 da Lei 9.605/1998; e 47 do Decreto 6.514/2008. Alegou a empresa autuada, por sua vez, omissão, inclusive em prequestionamento, pois: (1) a manutenção dos efeitos do termo de apreensão constitui penalidade indireta, embora não tenha cometido infração, como reconhecido no acórdão; e (2) em atenção à teoria do fato consumado, cabe reconhecer que houve a efetiva solidificação da situação fática pelo decurso de tempo, e que reverter tal quadro implicaria em danos desnecessários e irreparáveis à embargante e à sociedade, em ofensa aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade. Apresento o feito em mesa para julgamento (artigo 1.024, § 1º, CPC). É o relatório.
APELADO: INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS, PREMA TECNOLOGIA E COMERCIO LTDA.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006341-38.2018.4.03.6100 RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA APELANTE: PREMA TECNOLOGIA E COMERCIO LTDA., INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS Advogados do(a) APELANTE: ANTONIO CANDIDO DE AZEVEDO SODRE FILHO - SP15467, MICHEL ALVES PINTO NOGUEIRA MELGUINHA - SP311140-A Advogados do(a) APELADO: MICHEL ALVES PINTO NOGUEIRA MELGUINHA - SP311140-A, ANTONIO CANDIDO DE AZEVEDO SODRE FILHO - SP15467 V O T O Senhores Desembargadores, são manifestamente improcedentes ambos os embargos de declaração, inexistindo quaisquer dos vícios apontados, restando nítido que os recursos foram interpostos com o objetivo de rediscutir a causa e manifestar inconformismo diante do acórdão embargado. Neste sentido, cabe pontuar que as alegações não envolvem omissão, contradição ou obscuridade sanáveis em embargos de declaração, mas efetiva impugnação ao acórdão embargado, que teria incorrido em error in judicando, desvirtuando, pois, a própria natureza do recurso, que não é a de reapreciar a causa como pretendido. Com efeito, examinando primeiramente o recurso do IBAMA, o acórdão embargado registrou o seguinte, em demonstração à inexistência do vício apontado: "No mérito, a autora alegou ter sido autuada por infração ao artigo 47 do Decreto 6.514/2008: “Receber ou adquirir, para fins comerciais ou industriais, madeira serrada ou em tora, lenha, carvão ou outros produtos de origem vegetal, sem exigir a exibição de licença do vendedor, outorgada pela autoridade competente, e sem munir-se da via que deverá acompanhar o produto até final beneficiamento”. Ressaltou, contudo, que, no momento da aquisição das madeiras, em novembro de 2017, o vendedor encontrava-se devidamente registrado no Cadastro Técnico Federal (CTF) do IBAMA, o que viabilizou que emitisse regularmente as notas fiscais e respectivos documentos florestais (DOFs/GFs). Somente após entrega dos materiais, o IBAMA, em ação de fiscalização, considerou o vendedor como empresa fictícia, efetuando bloqueio cadastral em 16/01/2018. Em 28/02/2018 a autora foi autuada (AI 9215909) porque, embora verdadeiras materialmente, as licenças emitidas pela vendedora seriam ideologicamente falsas no momento da autuação." Asseverou o aresto, ademais, que: "A respeito da responsabilização do adquirente de madeira fornecida por vendedor com licença ideologicamente falsa, a ré apontou na apelação (grifos nossos): “A responsabilização dos receptadores aos ilícitos envolvendo utilização de DOFs/GFs/GCAs ideologicamente falsos é a que se mostra com maior potencial de dissuasão para interrupção destes esquemas fraudulentos, por atacar incisivamente a parte financiadora do esquema fraudulento e o elo final da cadeia econômica, no qual o produto florestal possui maior valor agregado. A boa-fé dos entes envolvidos em uma transação comercial fraudulenta deve ser apurada no caso concreto, a fim de que a empresa receptadora seja responsabilizada por infração ambiental pelo recebimento de uma carga de produto florestal acompanhada de um documento ideologicamente falso originário de uma pessoa jurídica que o emitiu com a utilização de crédito indevido, devendo ser colhidos outros elementos que demonstrem o dolo ou culpa da empresa destinatária. Ou seja, para que uma empresa seja autuada por receber madeira nativa com licença de transporte inválida (DOF/GF/GCA ideologicamente falso), devem estar presentes no caso concreto elementos suficientes para que se caracterize essa conduta infracional, por ação ou omissão. Nos casos em que o recebedor não tenha ciência da irregularidade do DOF e não tenha sido identificado nenhum indício de participação nas fraudes que viabilizaram a emissão do DOF inválido, recomenda-se que esse não seja autuado. Porém, observa-se que essa circunstância não poderá ser fator impeditivo para a apreensão do produto florestal ilegal oriundo do esquema fraudulento, conforme explicitado anteriormente. Salienta-se que nos casos em que os DOFs/GFs/GCAs forem provenientes de origens “fantasmas” ou com descrição de rota impossível estará configurada a conduta infracional do recebedor do documento inválido, devendo esse ser autuado. A inexistência do empreendimento de origem (“fantasma”) evidencia a ciência ou negligência do recebedor do DOF/GF/GCA ideologicamente falso, que não adotou nenhuma providência de verificação da situação de legalidade do fornecedor ou transportador – necessariamente envolvido na infração, caracterizando a infração por receber madeira com documento inválido. A descrição de rota impossível ou economicamente inviável também caracteriza a ciência, pelo recebedor, da invalidade do DOF/GF/GCA e, consequentemente, da origem ilegal do produto florestal, tendo em vista a impossibilidade de execução do transporte conforme descrito no documento. Nesses dois últimos casos, entende-se que as empresas recebedoras incorreram em infração administrativa tipificada no Artigo 47 do Decreto Federal 6.514/2008 ao receberem para fins comerciais ou industriais produtos florestais sem munir-se de licença válida para transporte.” Assim, a decisão administrativa fundamentou a negligência da autora nos seguintes termos (ID 126748296): “No mérito entendo que não cabe razão a recorrente, conforme salienta a NOTA TÉCNICA Nº 12/2018/COINF/CGFIS/DIPRO no seu item 9.7. “A inexistência do empreendimento de origem (fantasma) evidencia a ciência ou negligência do recebedor do DOF/GF/GCA ideologicamente falso, que não adotou nenhuma providência de verificação da situação de legalidade do fornecedor ou transportador – necessariamente envolvido na infração, caracterizando a infração por receber madeira com documento inválido.” Considerando que a recorrente não tivesse conhecimento da origem dos produtos adquiridos (madeira serrada), esta pode ser responsabilizada por negligência. Uma vez identificado, por argumentação técnica comprobatória, que determinado DOF/GF/GCA é ideologicamente falso, para efeitos de fiscalização entende-se por sua total invalidade. Apesar de ter sido um documento legalmente emitido em sistema oficial de controle, o mesmo não é idôneo.” A análise conjunta dos excertos revela que, no caso específico, não foi fundamentada a responsabilidade atribuída por infração ambiental, pois não se apontou que a autuada tivesse conhecimento ou indicativos para supor que fosse falsa ideologicamente a documentação de origem dos produtos, e que a vendedora fosse "empresa fantasma", tanto que se aduziu que 'se a recorrente não tivesse conhecimento da origem dos produtos adquiridos (madeira serrada), esta pode ser responsabilizada por negligência'." Consignou o julgado, ainda, que: "Não fundamentada a decisão administrativa nem o auto de infração na apuração da prática de infração ambiental, à luz do artigo 47 do Decreto 6.514/2008, insubsistente a multa, já que não basta afirmar que a falta de conhecimento da origem ilícita da madeira e da falsidade ideológica das declarações e guias ambientais gera responsabilidade da adquirente. A negligência configura modalidade de culpa, atribuindo-se responsabilidade subjetiva ao agente, por deixar de agir com o cuidado exigível e passível de observância, gerando resultado previsível, o que, na espécie, não foi objeto de imputação fática contextual, pois apenas restou afirmado que o desconhecimento da origem ilícita dos produtos gera conduta negligente. Não se provou, porém, a razão pela qual seria possível à autora ter ciência da falsidade ideológica das guias e documentos florestais e, assim mesmo, ter agido de forma a praticar a infração ambiental. Ao menos indícios de que agiu a autuada com culpa deveriam ter sido destacados na decisão administrativa, pois não se presume responsabilidade infracional nem esta pode derivar de mera abstração fático-jurídica. Ressalte-se que, de acordo com orientação adotada pela própria ré no âmbito administrativo, 'nos casos em que o recebedor não tenha ciência da irregularidade do DOF e não tenha sido identificado nenhum indício de participação nas fraudes que viabilizaram a emissão do DOF inválido, recomenda-se que esse não seja autuado'." Assim, restou devidamente assentado no acórdão que: "Não restou caracterizado descumprimento, à luz da prova dos autos, de supostos deveres de averiguação da origem dos materiais. É insuficiente menção isolada ao fato de que "a madeira possui um elevado valor principalmente ambiental e que há no país uma grande rede fraudulenta de exploração e comercialização do produto” e fraudes ocorrem comumente no setor madeireiro. Se admitida a suficiência de tais alegações, seria adotada a presunção de ilicitude da origem de todo produto ambiental, porém a legislação não exige do adquirente que atue em função investigativa e fiscalizatória, encargos legais afetos ao próprio IBAMA, mas apenas que exija do vendedor a exibição de licença válida, outorgada pela autoridade própria e competente. Ademais, a verificação in loco da veracidade das informações prestadas é medida que se impõe à autoridade competente em ação fiscalizatória, não se podendo transferir tal responsabilidade a adquirentes sem expressa previsão legal. Conforme já decidido no Agravo de Instrumento 5008990-40.2018.4.03.0000, a respeito da concessão da tutela antecipada: 'Ora, a agravante demonstrou que cumpriu os procedimentos previstos pela legislação ambiental quando da aquisição das madeiras, ao exigir a licença ambiental da empresa fornecedora do produto florestal. Ao receber o produto, acompanhado da respectiva licença, possuía uma legítima expectativa quanto à higidez do ato administrativo (DOF) emitido por meio do sítio eletrônico do IBAMA, o qual, frise-se, mantinha, à época, a empresa fornecedora do produto florestal como ativa em seus sistemas de controle. Aliás, sobreleva destacar que a legislação não impõe à adquirente do produto florestal qualquer obrigação de investigar se os dados apostos no DOF são ideologicamente falsos, não havendo qualquer dever de verificar in loco se a empresa efetivamente existia ou se no pátio de origem havia o estoque de árvores informado na licença. Impor ao adquirente qualquer obrigação nesse sentido, à míngua de lei, é manifestamente irrazoável, o que tenderia a inviabilizar as próprias transações comerciais. De outro modo, a legislação cria um sistema informatizado de controle florestal, no qual são inseridas informações que passam a ser revestidas da presunção de veracidade e legitimidade, pois integram o banco de dados da própria Administração Pública e permite a emissão eletrônica de atos administrativos com a natureza de licença ambiental. Portanto, se a empresa consta como ativa e regular nos sistemas de controle florestal do IBAMA, e emite as licenças ambientais, não há que se exigir do adquirente dos produtos que efetue diligências fiscalizatórias in loco, a cada transação, para verificar a veracidade de cada dado. O que a legislação exige é que o adquirente não dispense a apresentação das competentes licenças ambientais, bem como que realize a conferência das informações quando do recebimento da carga em seu estabelecimento. Confere-se assim, segurança às transações que envolvam produtos florestais nativos, sem prejuízo, contudo, do exercício do poder de polícia por parte do IBAMA. A este sim cabe a realização de outras diligências fiscalizatórias que entenda mais efetiva para a proteção do meio ambiente. Para tanto, inclusive, se prevê recursos específicos advindos do recolhimento da Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental – TCFA, paga por todos aqueles que exerçam atividades potencialmente poluidoras e utilizados de recursos ambientais. Não há, portanto, qualquer justificativa para que o IBAMA transfira ao particular o exercício do poder de polícia ambiental. Portanto, não merece acolhida a tese do IBAMA no sentido de que “A empresa compradora deveria ter-se respaldado e conferido, seja em loco ou através de um representante, se a empresa vendedora realmente existia, considerando que se trata de sua principal matéria-prima, que seu consumo é grande, que a madeira possui um elevado valor principalmente ambiental e que há no país uma grande rede fraudulenta de exploração e comercialização do produto. A presente empresa, que está no ramo desde 1936, deve saber da importância e das fraudes que ocorrem no setor madeireiro”, argumento acatado pelo Juízo a quo como fundamento para negar a tutela de urgência (ID 5497205 dos autos de origem). Em suma, constato que a adquirente exigiu a licença ambiental da empresa fornecedora dos produtos florestais, a qual foi regularmente expedida por meio dos sistemas do IBAMA à época da aquisição das madeiras. O fato de referidas licenças terem sido posteriormente invalidadas por fatos alheios a qualquer conduta ilícita que seja imputável à adquirente não pode gerar sua responsabilização pela infração ambiental tipificada no art. art. 47 do Decreto 6.514/08. Consoante bem apontou o agravante em suas razões recursais, se algum equívoco ocorreu, este deve ser imputado ao próprio IBAMA, tendo em vista que manteve a empresa fictícia como ativa em seus sistemas, permitindo que ela emitisse as indigitadas licenças. Portanto, o responsável da falha é o ente público que deveria investigar a autoria do agente responsável pela falha e sua responsabilidade dela decorrente.'" Evidenciado, pois, que não houve omissão nem contradição no julgamento, mas apenas divergência quanto à interpretação dos fatos e aplicação do direito, dado que insiste o IBAMA em apontar que foi regular a autuação, por indícios indicados e por responsabilidade objetiva face à tal espécie de infração, ao passo que o acórdão embargado, diante da prova dos autos, concluiu que não era possível imputar nem exigir da autuada ciência da falsidade ideológica de guias e documentos florestais, em descumprimento a deveres de averiguação da origem dos materiais, sendo insuficiente a ilação da autarquia baseada no elevado valor da madeira, cabendo ao órgão estatal a fiscalização do setor e não à autuada, a quem basta exigir da empresa vendedora a exibição da licença válida, não podendo responder a compradora por falsidade atribuída à vendedora sem participação ou conhecimento da adquirente. Quanto ao recurso da autuada, não se cogita de omissão no julgado, vício que nem de longe se evidencia na espécie, dado que registrou o acórdão, expressamente que: "[...] uma vez que não há controvérsia quanto à origem ilegal da madeira, deve prevalecer a respectiva apreensão, enquanto produto de infração ambiental, nos termos dos artigos 25 e 72, IV, da Lei 9.605/1998. No caso específico da indústria madeireira, a interrupção do fornecimento de madeira extraída ilegalmente é medida necessária para que não se promova uso comercial de produção de origem ilícita, assim evitando o fomento à exploração de recursos naturais de maneira predatória e sem o devido controle ambiental. Embora a autora tenha adquirido os bens de boa-fé, não se podendo admitir que praticou infração ambiental sujeita à multa pela aquisição de material de origem ilícita, como exposto acima, não se pode permitir a efetiva utilização de madeira ilegal apenas para evitar prejuízo econômico para quem a adquiriu, dado que tal solução importaria em lesar a tutela da proteção ambiental e estimular a cadeia produtiva ilegal. Neste sentido: AC 1001117-87.2018.4.01.3500, Des. Fed. JIRAIR ARAM MEGUERIAN, TRF1 - SEXTA TURMA, PJe 02/12/2019: “PJe - ADMINISTRATIVO. AMBIENTAL. TERMO DE APREENSÃO. MADEIRA. COMERCIALIZAÇÃO. OBSERVÂNCIA DOS TRÂMITES LEGAIS. IRREGULARIDADE NA ORIGEM DO PRODUTO FLORESTAL. TERCEIRO. PERDIMENTO. I Em debate pleito de anulação de Processo Administrativo e de demais atos a ele relacionados, como o Termo de Apreensão e de Depósito, além de decisão de perdimento de madeira apreendida, em decorrência de vistoria realizada na sede da empresa apelante, com o fim de verificar se havia em depósito as madeiras referentes ao DOF 15829348, recebido da empresa M S F GATO ME, empresa esta alvo de investigação por irregularidades junto ao sistema DOF. II Ainda que não seja a empresa recorrente, MADEIREIRA GOIÁS LTDA ME, alvo de autuação por infração ambiental, porquanto não comprovada má-fé ou sua concorrência para as irregularidades apontadas pelo IBAMA na origem da mercadoria comercializada com terceiro, a pena de perdimento de bens é medida que se alberga na legislação de regência, sob risco de se fomentar ilícitos ambientais, como o comércio de produto florestal de origem ilegal, a teor do quanto dispõe o art. 102 da lei n. 9.605/1998, e o art. 72 do Decreto n. 6.514/2008. III Dado o contexto dos autos, em que a parte autora não foi alvo de autuação pelo IBAMA, nem está sob suspeita de concurso na infração administrativa noticiada, relativamente a terceiro, de quem adquiriu a madeira, este envolvido em irregularidades que macularam a origem do produto florestal, não subsiste anteparo legal para o pleito de suspensão do procedimento administrativo 02010.000122/2017-69 ou de declaração de nulidade do referido processo, bem como dos demais atos a ele correlatos, Termo de Apreensão n. 9667/E e Termo de Depósito, n. 9668/E, porquanto a madeira apreendida foi alcançada pelos efeitos da persecução investigativa no âmbito administrativo. IV O entendimento relativo à não imposição, à autora/apelante, das consequências decorrentes do equívoco do IBAMA apenas se justifica em relação aos autos de infração lavrados e às respectivas multas aplicadas. Caso houvesse notícia de apreensão do produto florestal - o que não é o caso, já que não há termo de apreensão lavrado em desfavor da autora/apelante, bem como porque o pedido final refere-se à nulidade apenas dos autos de infração -, o ato administrativo, neste particular, deveria prevalecer, a fim de impedir a comercialização de madeira retirada de área não contemplada por autorização para exploração. Os prejuízos suportados pelo particular, nessa hipótese, deveriam ser objeto de discussão no âmbito da responsabilidade civil. (AC 0004576-28.2006.4.01.3600, JUIZ FEDERAL ROBERTO CARLOS DE OLIVEIRA (CONV.), TRF1 - SEXTA TURMA, e-DJF1 26/02/2019 PAG.) V Os prejuízos sofridos pela parte autora/apelante, inclusive relativos aos danos morais pleiteados da empresa fornecedora, podem ser demandados em esfera processual própria, como bem lembrou a r. sentença, que julgou improcedente o pedido proposto em face do IBAMA, e não conheceu da pretensão de reparação por danos morais, relativamente à empresa M.S.F.GATO ME, ressalvando a possibilidade desse pleito em desfavor da referida empresa, na Justiça Estadual. VI Apelação da parte autora a que se nega provimento.” Portanto, embora não se possa validar o auto de infração no sentido da aplicação de penalidade infracional à autora, devem ser mantida a apreensão da madeira de origem ilícita para a devida destinação legal." Como se observa, não se trata de omissão nem de qualquer outro vício sanável na via eleita, pois o que se pretende é rediscutir a matéria decidida, alegando que houve error in judicando, o que não se presta à discussão em embargos de declaração. De fato, restou devidamente fundamentado que a madeira adquirida pela autuada tem origem ilícita e, assim, não poderia ser liberada da apreensão, ainda que a aquisição tenha ocorrido de boa-fé sem imputação de prática de infração à própria adquirente, por falta de conhecimento da ilicitude do produto ambiental. Conforme esclarecido nos autos, embora a multa não tenha sido aplicada por falta de demonstração da responsabilidade pessoal da adquirente, disto não decorre, tal qual enunciado e ao contrário do pretendido, direito da autora de desconstituir a apreensão e permitir-lhe comercialização da madeira de origem ilícita adquirida, não se tratando, como alegado, de sanção indireta, mas de efeito legalmente derivado da origem ilícita do produto apreendido. A alegação de que foi a madeira comercializada com base em liminar concedida não exime a autuada, diante do julgamento do mérito nos termos assinalados, da responsabilidade processual respectiva, já que a decisão provisória e precária não gera direito adquirido nem convola a ilegalidade em legalidade por decurso do tempo. A pretensão da autuada de ver-se eximida de qualquer obrigação ou responsabilidade em razão de atos praticados com base em decisão liminar, cassada no exame do mérito, não configura omissão do acórdão embargado, pois este delimitou claramente os limites do direito reconhecido, dele excluindo a devolução da madeira apreendida e, assim, portanto, o direito à respectiva comercialização, dado que de origem ilícita. Se tal motivação é equivocada ou insuficiente, fere as normas apontadas (artigos 70 da Lei 9.605/1998; e 47 do Decreto 6.514/2008), ou contraria julgados ou jurisprudência, deve a embargante veicular recurso próprio para a impugnação do acórdão e não rediscutir a matéria em embargos de declaração. Por fim, embora tratados todos os pontos invocados nos embargos declaratórios, de relevância e pertinência à demonstração de que não houve qualquer vício no julgamento, é expresso o artigo 1.025 do Código de Processo Civil em enfatizar que se consideram incluídos no acórdão os elementos suscitados pelas embargantes, ainda que inadmitidos ou rejeitados os recursos, para efeito de prequestionamento, pelo que aperfeiçoado, com os apontados destacados, o julgamento cabível no âmbito da Turma. Ante o exposto, rejeito os embargos de declaração de ambas as partes. É como voto.
APELADO: INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS, PREMA TECNOLOGIA E COMERCIO LTDA.
E M E N T A
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AMBIENTAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AUTO DE INFRAÇÃO. AQUISIÇÃO DE MADEIRA. DOCUMENTAÇÃO IDEOLOGICAMENTE FALSA. ORIGEM ILÍCITA. POSTERIOR INVALIDAÇÃO PELA FISCALIZAÇÃO. INFRAÇÃO DA ADQUIRENTE NÃO CARACTERIZADA. CULPA INCOMPROVADA. ATOS DE APREENSÃO MANTIDOS. ORIGEM ILÍCITA DA MADEIRA. PROTEÇÃO DO COMÉRCIO LEGAL. VÍCIOS INEXISTENTES. REJEIÇÃO.
1. São manifestamente improcedentes ambos os embargos de declaração, inexistindo quaisquer dos vícios apontados, restando nítido que os recursos foram interpostos com o objetivo de rediscutir a causa e manifestar inconformismo diante do acórdão embargado. Neste sentido, cabe pontuar que as alegações não envolvem omissão, contradição ou obscuridade sanáveis em embargos de declaração, mas efetiva impugnação ao acórdão embargado, que teria incorrido em error in judicando, desvirtuando, pois, a própria natureza do recurso, que não é a de reapreciar a causa como pretendido.
2. Com efeito, examinando os embargos de declaração da AGU, demonstrando inexistência de qualquer vício, registrou o acórdão que: "No mérito, a autora alegou ter sido autuada por infração ao artigo 47 do Decreto 6.514/2008: “Receber ou adquirir, para fins comerciais ou industriais, madeira serrada ou em tora, lenha, carvão ou outros produtos de origem vegetal, sem exigir a exibição de licença do vendedor, outorgada pela autoridade competente, e sem munir-se da via que deverá acompanhar o produto até final beneficiamento”. Ressaltou, contudo, que, no momento da aquisição das madeiras, em novembro de 2017, o vendedor encontrava-se devidamente registrado no Cadastro Técnico Federal (CTF) do IBAMA, o que viabilizou que emitisse regularmente as notas fiscais e respectivos documentos florestais (DOFs/GFs). Somente após entrega dos materiais, o IBAMA, em ação de fiscalização, considerou o vendedor como empresa fictícia, efetuando bloqueio cadastral em 16/01/2018. Em 28/02/2018 a autora foi autuada (AI 9215909) porque, embora verdadeiras materialmente, as licenças emitidas pela vendedora seriam ideologicamente falsas no momento da autuação".
3. Asseverou o aresto, ademais, que: "A respeito da responsabilização do adquirente de madeira fornecida por vendedor com licença ideologicamente falsa, a ré apontou na apelação (grifos nossos): “A responsabilização dos receptadores aos ilícitos envolvendo utilização de DOFs/GFs/GCAs ideologicamente falsos é a que se mostra com maior potencial de dissuasão para interrupção destes esquemas fraudulentos, por atacar incisivamente a parte financiadora do esquema fraudulento e o elo final da cadeia econômica, no qual o produto florestal possui maior valor agregado. A boa-fé dos entes envolvidos em uma transação comercial fraudulenta deve ser apurada no caso concreto, a fim de que a empresa receptadora seja responsabilizada por infração ambiental pelo recebimento de uma carga de produto florestal acompanhada de um documento ideologicamente falso originário de uma pessoa jurídica que o emitiu com a utilização de crédito indevido, devendo ser colhidos outros elementos que demonstrem o dolo ou culpa da empresa destinatária. Ou seja, para que uma empresa seja autuada por receber madeira nativa com licença de transporte inválida (DOF/GF/GCA ideologicamente falso), devem estar presentes no caso concreto elementos suficientes para que se caracterize essa conduta infracional, por ação ou omissão. Nos casos em que o recebedor não tenha ciência da irregularidade do DOF e não tenha sido identificado nenhum indício de participação nas fraudes que viabilizaram a emissão do DOF inválido, recomenda-se que esse não seja autuado. Porém, observa-se que essa circunstância não poderá ser fator impeditivo para a apreensão do produto florestal ilegal oriundo do esquema fraudulento, conforme explicitado anteriormente. Salienta-se que nos casos em que os DOFs/GFs/GCAs forem provenientes de origens “fantasmas” ou com descrição de rota impossível estará configurada a conduta infracional do recebedor do documento inválido, devendo esse ser autuado. A inexistência do empreendimento de origem (“fantasma”) evidencia a ciência ou negligência do recebedor do DOF/GF/GCA ideologicamente falso, que não adotou nenhuma providência de verificação da situação de legalidade do fornecedor ou transportador – necessariamente envolvido na infração, caracterizando a infração por receber madeira com documento inválido. A descrição de rota impossível ou economicamente inviável também caracteriza a ciência, pelo recebedor, da invalidade do DOF/GF/GCA e, consequentemente, da origem ilegal do produto florestal, tendo em vista a impossibilidade de execução do transporte conforme descrito no documento. Nesses dois últimos casos, entende-se que as empresas recebedoras incorreram em infração administrativa tipificada no Artigo 47 do Decreto Federal 6.514/2008 ao receberem para fins comerciais ou industriais produtos florestais sem munir-se de licença válida para transporte”. Assim, a decisão administrativa fundamentou a negligência da autora nos seguintes termos (ID 126748296): “No mérito entendo que não cabe razão a recorrente, conforme salienta a NOTA TÉCNICA Nº 12/2018/COINF/CGFIS/DIPRO no seu item 9.7. “A inexistência do empreendimento de origem (fantasma) evidencia a ciência ou negligência do recebedor do DOF/GF/GCA ideologicamente falso, que não adotou nenhuma providência de verificação da situação de legalidade do fornecedor ou transportador – necessariamente envolvido na infração, caracterizando a infração por receber madeira com documento inválido.” Considerando que a recorrente não tivesse conhecimento da origem dos produtos adquiridos (madeira serrada), esta pode ser responsabilizada por negligência. Uma vez identificado, por argumentação técnica comprobatória, que determinado DOF/GF/GCA é ideologicamente falso, para efeitos de fiscalização entende-se por sua total invalidade. Apesar de ter sido um documento legalmente emitido em sistema oficial de controle, o mesmo não é idôneo.” A análise conjunta dos excertos revela que, no caso específico, não foi fundamentada a responsabilidade atribuída por infração ambiental, pois não se apontou que a autuada tivesse conhecimento ou indicativos para supor que fosse falsa ideologicamente a documentação de origem dos produtos, e que a vendedora fosse "empresa fantasma", tanto que se aduziu que 'se a recorrente não tivesse conhecimento da origem dos produtos adquiridos (madeira serrada), esta pode ser responsabilizada por negligência'".
4. Consignou o julgado, ainda, que: "Não fundamentada a decisão administrativa nem o auto de infração na apuração da prática de infração ambiental, à luz do artigo 47 do Decreto 6.514/2008, insubsistente a multa, já que não basta afirmar que a falta de conhecimento da origem ilícita da madeira e da falsidade ideológica das declarações e guias ambientais gera responsabilidade da adquirente. A negligência configura modalidade de culpa, atribuindo-se responsabilidade subjetiva ao agente, por deixar de agir com o cuidado exigível e passível de observância, gerando resultado previsível, o que, na espécie, não foi objeto de imputação fática contextual, pois apenas restou afirmado que o desconhecimento da origem ilícita dos produtos gera conduta negligente. Não se provou, porém, a razão pela qual seria possível à autora ter ciência da falsidade ideológica das guias e documentos florestais e, assim mesmo, ter agido de forma a praticar a infração ambiental. Ao menos indícios de que agiu a autuada com culpa deveriam ter sido destacados na decisão administrativa, pois não se presume responsabilidade infracional nem esta pode derivar de mera abstração fático-jurídica. Ressalte-se que, de acordo com orientação adotada pela própria ré no âmbito administrativo, 'nos casos em que o recebedor não tenha ciência da irregularidade do DOF e não tenha sido identificado nenhum indício de participação nas fraudes que viabilizaram a emissão do DOF inválido, recomenda-se que esse não seja autuado'".
5. Assim, restou devidamente assentado no acórdão que: "Não restou caracterizado descumprimento, à luz da prova dos autos, de supostos deveres de averiguação da origem dos materiais. É insuficiente menção isolada ao fato de que "a madeira possui um elevado valor principalmente ambiental e que há no país uma grande rede fraudulenta de exploração e comercialização do produto” e fraudes ocorrem comumente no setor madeireiro. Se admitida a suficiência de tais alegações, seria adotada a presunção de ilicitude da origem de todo produto ambiental, porém a legislação não exige do adquirente que atue em função investigativa e fiscalizatória, encargos legais afetos ao próprio IBAMA, mas apenas que exija do vendedor a exibição de licença válida, outorgada pela autoridade própria e competente. Ademais, a verificação in loco da veracidade das informações prestadas é medida que se impõe à autoridade competente em ação fiscalizatória, não se podendo transferir tal responsabilidade a adquirentes sem expressa previsão legal. Conforme já decidido no Agravo de Instrumento 5008990-40.2018.4.03.0000, a respeito da concessão da tutela antecipada: 'Ora, a agravante demonstrou que cumpriu os procedimentos previstos pela legislação ambiental quando da aquisição das madeiras, ao exigir a licença ambiental da empresa fornecedora do produto florestal. Ao receber o produto, acompanhado da respectiva licença, possuía uma legítima expectativa quanto à higidez do ato administrativo (DOF) emitido por meio do sítio eletrônico do IBAMA, o qual, frise-se, mantinha, à época, a empresa fornecedora do produto florestal como ativa em seus sistemas de controle. Aliás, sobreleva destacar que a legislação não impõe à adquirente do produto florestal qualquer obrigação de investigar se os dados apostos no DOF são ideologicamente falsos, não havendo qualquer dever de verificar in loco se a empresa efetivamente existia ou se no pátio de origem havia o estoque de árvores informado na licença. Impor ao adquirente qualquer obrigação nesse sentido, à míngua de lei, é manifestamente irrazoável, o que tenderia a inviabilizar as próprias transações comerciais. De outro modo, a legislação cria um sistema informatizado de controle florestal, no qual são inseridas informações que passam a ser revestidas da presunção de veracidade e legitimidade, pois integram o banco de dados da própria Administração Pública e permite a emissão eletrônica de atos administrativos com a natureza de licença ambiental. Portanto, se a empresa consta como ativa e regular nos sistemas de controle florestal do IBAMA, e emite as licenças ambientais, não há que se exigir do adquirente dos produtos que efetue diligências fiscalizatórias in loco, a cada transação, para verificar a veracidade de cada dado. O que a legislação exige é que o adquirente não dispense a apresentação das competentes licenças ambientais, bem como que realize a conferência das informações quando do recebimento da carga em seu estabelecimento. Confere-se assim, segurança às transações que envolvam produtos florestais nativos, sem prejuízo, contudo, do exercício do poder de polícia por parte do IBAMA. A este sim cabe a realização de outras diligências fiscalizatórias que entenda mais efetiva para a proteção do meio ambiente. Para tanto, inclusive, se prevê recursos específicos advindos do recolhimento da Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental – TCFA, paga por todos aqueles que exerçam atividades potencialmente poluidoras e utilizados de recursos ambientais. Não há, portanto, qualquer justificativa para que o IBAMA transfira ao particular o exercício do poder de polícia ambiental. Portanto, não merece acolhida a tese do IBAMA no sentido de que “A empresa compradora deveria ter-se respaldado e conferido, seja em loco ou através de um representante, se a empresa vendedora realmente existia, considerando que se trata de sua principal matéria-prima, que seu consumo é grande, que a madeira possui um elevado valor principalmente ambiental e que há no país uma grande rede fraudulenta de exploração e comercialização do produto. A presente empresa, que está no ramo desde 1936, deve saber da importância e das fraudes que ocorrem no setor madeireiro”, argumento acatado pelo Juízo a quo como fundamento para negar a tutela de urgência (ID 5497205 dos autos de origem). Em suma, constato que a adquirente exigiu a licença ambiental da empresa fornecedora dos produtos florestais, a qual foi regularmente expedida por meio dos sistemas do IBAMA à época da aquisição das madeiras. O fato de referidas licenças terem sido posteriormente invalidadas por fatos alheios a qualquer conduta ilícita que seja imputável à adquirente não pode gerar sua responsabilização pela infração ambiental tipificada no art. art. 47 do Decreto 6.514/08. Consoante bem apontou o agravante em suas razões recursais, se algum equívoco ocorreu, este deve ser imputado ao próprio IBAMA, tendo em vista que manteve a empresa fictícia como ativa em seus sistemas, permitindo que ela emitisse as indigitadas licenças. Portanto, o responsável da falha é o ente público que deveria investigar a autoria do agente responsável pela falha e sua responsabilidade dela decorrente'".
6. Evidenciado, pois, que não houve omissão nem contradição no julgamento, mas apenas divergência quanto à interpretação dos fatos e aplicação do direito, dado que insiste o IBAMA em apontar que foi regular a autuação, por indícios indicados e por responsabilidade objetiva face à tal espécie de infração, ao passo que o acórdão embargado, diante da prova dos autos, concluiu que não era possível imputar nem exigir da autuada ciência da falsidade ideológica de guias e documentos florestais, em descumprimento a deveres de averiguação da origem dos materiais, sendo insuficiente a ilação da autarquia baseada no elevado valor da madeira, cabendo ao órgão estatal a fiscalização do setor e não à autuada, a quem basta exigir da empresa vendedora a exibição da licença válida, não podendo responder a compradora por falsidade atribuída à vendedora sem participação ou conhecimento da adquirente.
7. Quanto ao recurso da autora, não se cogita de omissão no julgado, vício que nem de longe se evidencia na espécie, dado que registrou o acórdão, expressamente que: "[...] uma vez que não há controvérsia quanto à origem ilegal da madeira, deve prevalecer a respectiva apreensão, enquanto produto de infração ambiental, nos termos dos artigos 25 e 72, IV, da Lei 9.605/1998. No caso específico da indústria madeireira, a interrupção do fornecimento de madeira extraída ilegalmente é medida necessária para que não se promova uso comercial de produção de origem ilícita, assim evitando o fomento à exploração de recursos naturais de maneira predatória e sem o devido controle ambiental. Embora a autora tenha adquirido os bens de boa-fé, não se podendo admitir que praticou infração ambiental sujeita à multa pela aquisição de material de origem ilícita, como exposto acima, não se pode permitir a efetiva utilização de madeira ilegal apenas para evitar prejuízo econômico para quem a adquiriu, dado que tal solução importaria em lesar a tutela da proteção ambiental e estimular a cadeia produtiva ilegal (...). Portanto, embora não se possa validar o auto de infração no sentido da aplicação de penalidade infracional à autora, devem ser mantida a apreensão da madeira de origem ilícita para a devida destinação legal".
8. Como se observa, não se trata de omissão nem de qualquer outro vício sanável na via eleita, pois o que se pretende é rediscutir a matéria decidida, alegando que houve error in judicando, o que não se presta à discussão em embargos de declaração. De fato, restou devidamente fundamentado que a madeira adquirida pela autuada tem origem ilícita e, assim, não poderia ser liberada da apreensão, ainda que a aquisição tenha ocorrido de boa-fé sem imputação de prática de infração à própria adquirente, por falta de conhecimento da ilicitude do produto ambiental. Conforme esclarecido nos autos, embora a multa não tenha sido aplicada por falta de demonstração da responsabilidade pessoal da adquirente, disto não decorre, tal qual enunciado e ao contrário do pretendido, direito da autora de desconstituir a apreensão e permitir-lhe comercialização da madeira de origem ilícita adquirida, não se tratando, como alegado, de sanção indireta, mas de efeito legalmente derivado da origem ilícita do produto apreendido. A alegação de que foi a madeira comercializada com base em liminar concedida não exime a autuada, diante do julgamento do mérito nos termos assinalados, da responsabilidade processual respectiva, já que a decisão provisória e precária não gera direito adquirido nem convola a ilegalidade em legalidade por decurso do tempo. A pretensão da autuada de ver-se eximida de qualquer obrigação ou responsabilidade em razão de atos praticados com base em decisão liminar, cassada no exame do mérito, não configura omissão do acórdão embargado, pois este delimitou claramente os limites do direito reconhecido, dele excluindo a devolução da madeira apreendida e, assim, portanto, o direito à respectiva comercialização, dado que de origem ilícita.
9. Se tal motivação é equivocada ou insuficiente, fere normas apontadas (artigos 70 da Lei 9.605/1998; e 47 do Decreto 6.514/2008), ou contraria julgados ou jurisprudência, deve a embargante veicular recurso próprio para a impugnação do acórdão e não rediscutir a matéria em embargos de declaração.
10. Por fim, embora tratados todos os pontos invocados nos embargos declaratórios, de relevância e pertinência à demonstração de que não houve qualquer vício no julgamento, é expresso o artigo 1.025 do Código de Processo Civil em enfatizar que se consideram incluídos no acórdão os elementos suscitados pelas embargantes, ainda que inadmitidos ou rejeitados os recursos, para efeito de prequestionamento, pelo que aperfeiçoado, com os apontados destacados, o julgamento cabível no âmbito da Turma.
11. Embargos de declaração de ambas as partes rejeitados.