Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0005093-45.2006.4.03.6100

RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE

APELANTE: SIEMENS LTDA, GRID SOLUTIONS TRANSMISSAO DE ENERGIA LTDA

Advogados do(a) APELANTE: ISABELLA BITTENCOURT TANNUS - DF65661, LIVIA CALDAS BRITO - DF35308, VICENTE COELHO ARAUJO - DF13134, JOSE ALEXANDRE BUAIZ NETO - DF14346
Advogado do(a) APELANTE: MATEUS AIMORE CARRETEIRO - SP256748-A

APELADO: UNIÃO FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

ASSISTENTE: CONSELHO ADMINISTRATIVO DE DEFESA ECONÔMICA - CADE
 

ADVOGADO do(a) ASSISTENTE: MARCELO CAVALETTI DE SOUZA CRUZ - SP138973

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0005093-45.2006.4.03.6100

RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE

APELANTE: SIEMENS LTDA, GRID SOLUTIONS TRANSMISSAO DE ENERGIA LTDA

Advogados do(a) APELANTE: MARCO AURELIO MARTINS BARBOSA - DF29783, VICENTE COELHO ARAUJO - DF13134, JOSE ALEXANDRE BUAIZ NETO - DF14346
Advogado do(a) APELANTE: MATEUS AIMORE CARRETEIRO - SP256748-A

APELADO: UNIÃO FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

ASSISTENTE: CONSELHO ADMINISTRATIVO DE DEFESA ECONÔMICA - CADE
 ADVOGADO do(a) ASSISTENTE: MARCELO CAVALETTI DE SOUZA CRUZ - SP138973

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

 

Trata-se de apelações interpostas por SIEMENS LTDA. e por GRID SOLUTIONS TRANSMISSAO DE ENERGIA LTDA., visando a reforma da r. sentença (volume 03 – documento 107022997) que, em ação cautelar, julgou procedente o pedido e, em consequência, deferiu a busca e apreensão dos elementos descritos na inicial, a fim de instruir o procedimento administrativo a ser instaurado para averiguação dos fatos descritos.

Em seu recurso, a SIEMENS LTDA. suscita, preliminarmente, que o pedido da SDE, de periciar o material apreendido, seria juridicamente impossível, já que as normas de regência (arts. 14, XII, e 35-A, ambos, da Lei n° 8.884/94) não lhe dão tal atribuição, bem como o art. 18, II, da Lei n° 9.784/99, impede a autoridade que atua em processo administrativo de realizar perícia no mesmo. No mérito, alega a inexistência do fumus boni iuris na demanda, pois não haveria elementos indiciários que apontassem o seu envolvimento em cartel. Afirma que a busca e apreensão seria agressiva à propriedade privada e à intimidade. Aduz, também, que não haveria periculum in mora, tendo em vista a inexistência de perigo de destruição de provas. Ademais, a abertura de processo administrativo, pela SDE, antes do deslacre do material apreendido, evidenciando ser a busca desnecessária à investigação.

GRID SOLUTIONS TRANSMISSAO DE ENERGIA LTDA , por sua vez, alega que a busca e apreensão seria ilegal por não ter objeto determinado, violando as regras do Código de Processo Civil a esse respeito, que se aplicam subsidiariamente às da Lei Antitruste. Afirma, também, que o pedido é típico de ação ordinária, e não de cautelar, já que teria cunho satisfativo, dando acesso à SDE aos materiais pretendidos. Sendo assim, a mera existência de indícios, consistentes na celebração de acordo de leniência com outras empresas, não bastaria para legitimar o deferimento da busca e apreensão. Por fim, reafirma a inexistência do fumus e periculum.

Com contrarrazões, subiram os autos a este Egrégio Tribunal Regional Federal.

Com vista à Procuradoria Regional da República da 3ª Região, foi ofertado o parecer, com manifestação pelo não provimento aos apelos.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0005093-45.2006.4.03.6100

RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE

APELANTE: SIEMENS LTDA, GRID SOLUTIONS TRANSMISSAO DE ENERGIA LTDA

Advogados do(a) APELANTE: MARCO AURELIO MARTINS BARBOSA - DF29783, VICENTE COELHO ARAUJO - DF13134, JOSE ALEXANDRE BUAIZ NETO - DF14346
Advogado do(a) APELANTE: MATEUS AIMORE CARRETEIRO - SP256748-A

APELADO: UNIÃO FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

ASSISTENTE: CONSELHO ADMINISTRATIVO DE DEFESA ECONÔMICA - CADE
 ADVOGADO do(a) ASSISTENTE: MARCELO CAVALETTI DE SOUZA CRUZ - SP138973

 

 

 

V O T O

 

A UNIÃO ajuizou a presente medida cautelar de busca e apreensão dos elementos descritos na inicial (objetos, papéis de qualquer natureza, livros, fitas, computadores e arquivos magnéticos descriminados) em poder das empresas SIEMENS LTDA. e AREVA TRANSMISSÃO E DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA LTDA., com a finalidade de possibilitar a instrução e investigação para a apuração da existência de cartel formado com a finalidade de dominação do mercado de equipamentos de distribuição de energia elétrica.

Posto isto, e a fim de facilitar a compreensão do presente caso, anoto que a análise das alegações invocadas nos apelos não se aterá à ordem em que foram colocadas.

Pois bem.

Afasto, de imediato, a alegação de impossibilidade jurídica do pedido, eis que a referida apreensão foi efetuada com base na Lei nº 8.884/94, vigente à época, e teve por finalidade instruir procedimento administrativo. Ademais, o procedimento revestiu-se de legalidade, uma vez que foi realizado por oficiais de justiça, com autorização judicial, sendo somente assistida e orientada pelos técnicos da SECRETARIA DE DIREITOS ECONÔMICOS - SDE.

Da mesma forma, não há que se falar que o pedido é típico de ação ordinária, e não de cautelar. A busca e apreensão aqui discutida tem caráter instrumental, na medida em que visa fornecer subsídios à investigação de cartel por parte da SDE, para o julgamento do CADE e tendo feição tipicamente preparatória porquanto prepara a investigação da SDE e o julgamento do CADE.

Quanto ao mérito, como bem consignado na r. sentença, o procedimento foi deferido com base na Lei nº 8.884/94, que tinha por objeto a prevenção e a repressão às infrações contra a ordem econômica, dando poderes ao CADE e a SDE para efetuar a prevenção e a repressão às infrações contra a ordem econômica, orientada pelos ditames constitucionais de liberdade de iniciativa, livre concorrência, função social da propriedade, defesa dos consumidores e repressão ao abuso do poder econômico.

Nesse sentido, previa a Lei nº 8.884/94:

“Art. 14. Compete à SDE:

(...)

XII - receber e instruir os processos a serem julgados pelo CADE, inclusive consultas, e fiscalizar o cumprimento das decisões do CADE;

(...)

Art. 35-A. A Advocacia-Geral da União, por solicitação da SDE, poderá requerer ao Poder Judiciário mandado de busca e apreensão de objetos, papéis de qualquer natureza, assim como de livros comerciais, computadores e arquivos magnéticos de empresa ou pessoa física, no interesse da instrução do procedimento, das averiguações preliminares ou do processo administrativo, aplicando-se, no que couber, o disposto no art. 839 e seguintes do Código de Processo Civil, sendo inexigível a propositura de ação principal.

§ 1o No curso de procedimento administrativo destinado a instruir representação a ser encaminhada à SDE, poderá a SEAE exercer, no que couber, as competências previstas no caput deste artigo e no art. 35 desta Lei.”

Como se vê, resta claro o poder instrutório da SDE, quanto aos processos a serem julgados pelo CADE.

Como órgão eminentemente de instrução, é natural que faça perícias no material, não se lhe aplicando o art. 18, II, da Lei n° 9.784/99, pois este dispositivo refere-se à autoridade que decide o processo, o que não é o caso da SDE.

Destaco, também, que a justificativa para a busca e apreensão encontra-se documentada nos autos.

Além disso, tendo em vista o acordo de leniência, através do qual tomou-se ciência de grave denúncia de formação de cartel, a SDE tinha obrigação legal de instaurar procedimento investigativo.

Saliento, por oportuno, que a questão aqui debatida foi decidida pelo Superior Tribunal de Justiça, haja vista que a UNIÃO interpôs medida cautelar objetivando a concessão de medida liminar inaudita altera pars para conceder efeito suspensivo ao acórdão proferido por esta 4ª Turma no julgamento do agravo de instrumento nº 2006.03.00.017554-7, que tinha reformado a liminar, consubstanciada na determinação de busca e apreensão de documentos e equipamentos nas dependências das apelantes.

Assim decidiu o STJ:

“PROCESSO CIVIL E ADMINISTRATIVO. MEDIDA CAUTELAR. EFEITO SUSPENSIVO À DECISÃO DO TRF DA 3ª REGIÃO. DANO IRREPARÁVEL. MANUTENÇÃO DO STATUS QUO.

1. Excepcionalidade da situação pela inexistência de recurso especial pendente.

2. Providências procedimentais não solucionadas na instância a quo.

3. Urgência por dano irreparável que enseja a concessão excepcional da cautelar, para manutenção do status quo.

4. Busca e apreensão de documentos para instruir processo administrativo do CADE, em combate a cartel, com disciplina específica (Lei 8.884/94).

5. Ilegalidade quanto à decisão que, desprezando a lei específica, firma-se em regra do CPC.

6. Medida liminar concedida.

(STJ, MC nº 12.748/SP, Rel. Ministra Eliana Calmon, 2ª Turma, DJ de 17/05/2007)”

 

Como observado pelo Ministério Público Federal: “Fumus boni iuris. O primeiro requisito para deferimento da busca e apreensão visada encontra-se presente no caso. O acordo de leniência assinado por outras empresas do setor fez chegar à mãos da União dados concretos sobre o suposto envolvimento das ora apelantes em cartel. As beneficiárias do acordo delataram à autoridade, inclusive, as supostas cotas das apelantes em cada mercado (fls. 153 e 161) e as compras afetadas pelo acordo no Brasil (fis. 144/147 e 164/165). Periculum in mora. O simples indício da existência de cartel, que é atividade lesiva à concorrência e aos consumidores, já satisfaz o requisito do "periculum". Com efeito, o cartel subtrai possibilidades vitais à comunidade, concentrando renda e mercado nas mãos de poucos, que, após certo tempo, conseguem eliminar os concorrentes não cartelizados e podem abusar de seu poder econômico, obtendo lucros desmesurados e elevando os preços ao consumidor”.

Assim, a r. sentença deve ser mantida.

Por fim, cumpre anotar que a determinação de sigilo compatível com o feito é a de SIGILO DE DOCUMENTOS. Quanto à fase processual e os demais atos, impera o princípio da publicidade. Portanto, mantenho o sigilo no feito, mas na espécie SIGILO DE DOCUMENTOS.

Diante do exposto, nego provimento às apelações interpostas pela SIEMENS LTDA. e por GRID SOLUTIONS TRANSMISSAO DE ENERGIA LTDA.

Sigilo no feito mantido somente na espécie sigilo de documentos.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

PROCESSUAL CIVIL. MEDIDA CAUTELAR. BUSCA E APREENSÃO DE DOCUMENTOS PARA INSTRUIR PROCESSO ADMINISTRATIVO DO CADE, EM COMBATE A CARTEL, COM DISCIPLINA ESPECÍFICA (LEI Nº 8.884/94). MEDIDA DEFERIDA. APELAÇÕES NÃO PROVIDAS.

- A Advocacia Geral da União ajuizou a presente medida cautelar de busca e apreensão dos elementos descritos na inicial (objetos, papéis de qualquer natureza, livros, fitas, computadores e arquivos magnéticos descriminados) em poder das empresas SIEMENS LTDA. e GRID SOLUTIONS TRANSMISSAO DE ENERGIA LTDA., com a finalidade de possibilitar a instrução e investigação para a apuração da existência de cartel formado com a finalidade de dominação do mercado de equipamentos de distribuição de energia elétrica.

- Não há que se falar em impossibilidade jurídica do pedido, haja vista que a referida apreensão foi efetuada com base na Lei nº 8.884/94, vigente à época, e teve por finalidade instruir procedimento administrativo. Ademais, o procedimento revestiu-se de legalidade, uma vez que foi realizado por oficiais de justiça, com autorização judicial, sendo somente assistida e orientada pelos técnicos da SDE.

- Da mesma forma, não prospera a alegação de que o pedido é típico de ação ordinária, e não de cautelar. A busca e apreensão aqui discutida tem caráter instrumental: visa fornecer subsídios à investigação de cartel por parte da SDE, para o julgamento do CADE, tendo feição tipicamente preparatória: prepara a investigação da SDE e o julgamento do CADE.

- Quanto ao mérito, como bem consignado na r. sentença, o procedimento foi deferido com base na Lei nº 8.884/94, que tinha por objeto a prevenção e a repressão às infrações contra a ordem econômica, dando poderes ao CADE e a SDE para efetuar a prevenção e a repressão às infrações contra a ordem econômica, orientada pelos ditames constitucionais de liberdade de iniciativa, livre concorrência, função social da propriedade, defesa dos consumidores e repressão ao abuso do poder econômico.

- Nos termos do art. 14, e art. 35-A, § 1º, resta claro o poder instrutório da SDE, quanto aos processos a serem julgados pelo CADE. Como órgão eminentemente de instrução, é natural que faça perícias no material, não se lhe aplicando o art. 18, II, da Lei n° 9.784/99, pois este dispositivo refere-se à autoridade que decide o processo, o que não é o caso da SDE.

- A justificativa para a busca e apreensão encontra-se documentada nos autos. Além disso, tendo em vista o acordo de leniência, através do qual tomou-se ciência de grave denúncia de formação de cartel, a SDE tinha obrigação legal de instaurar procedimento investigativo.

- Como observado pelo Ministério Público Federal: “Fumus boni iuris. O primeiro requisito para deferimento da busca e apreensão visada encontra-se presente no caso. O acordo de leniência assinado por outras empresas do setor fez chegar à mãos da União dados concretos sobre o suposto envolvimento das ora apelantes em cartel. As beneficiárias do acordo delataram à autoridade, inclusive, as supostas cotas das apelantes em cada mercado (fls. 153 e 161) e as compras afetadas pelo acordo no Brasil (fis. 144/147 e 164/165). Periculum in mora. O simples indício da existência de cartel, que é atividade lesiva à concorrência e aos consumidores, já satisfaz o requisito do "periculum". Com efeito, o cartel subtrai possibilidades vitais à comunidade, concentrando renda e mercado nas mãos de poucos, que, após certo tempo, conseguem eliminar os concorrentes não cartelizados e podem abusar de seu poder econômico, obtendo lucros desmesurados e elevando os preços ao consumidor”.

-  Sigilo no feito mantido somente na espécie sigilo de documentos.

- Apelações interpostas pela SIEMENS LTDA. e por GRID SOLUTIONS TRANSMISSAO DE ENERGIA LTDA não providas.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quarta Turma, à unanimidade, decidiu negar provimento às apelações, nos termos do voto da Des. Fed. MÔNICA NOBRE (Relatora), com quem votaram o Des. Fed. MARCELO SARAIVA e o Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE., nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.