APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004947-05.2018.4.03.6000
RELATOR: Gab. 21 - DES. FED. JOHONSOM DI SALVO
APELANTE: UNIÃO FEDERAL
APELADO: VERTICE COMERCIO DE ROUPAS E ACESSORIOS LTDA - EPP
Advogados do(a) APELADO: DANIELA SOARES MARASCA - RS80510-A, RAQUEL SEVERO - RS108533-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004947-05.2018.4.03.6000 RELATOR: Gab. 21 - DES. FED. JOHONSOM DI SALVO APELANTE: UNIÃO FEDERAL APELADO: VERTICE COMERCIO DE ROUPAS E ACESSORIOS LTDA - EPP Advogados do(a) APELADO: DANIELA SOARES MARASCA - RS80510-A, RAQUEL SEVERO - RS108533-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O Excelentíssimo Senhor Desembargador Federal Johonsom di Salvo, Relator: Trata-se de ação ordinária ajuizada em 10/07/2018 por VÉRTICE COMÉRCIO DE ROUPAS E ACESSÓRIOS LTDA – EPP em face da UNIÃO objetivando a condenação da ré a revisar os preços previstos no Pregão Eletrônico nº 07/2015, de 15/12/2015, promovido pela 3ª Superintendência da polícia Federal/MS, no percentual de 10% sobre o valor total, com efeitos retroativos à data da emissão dos primeiros empenhos, ou seja, 29/12/2015, até a data em que foi emitido parecer favorável – Termo Aditivo nº 1/2016, de 09/05/2016. A autora conta que se sagrou vencedora do Pregão Eletrônico nº 07/2015, modalidade menor preço, promovido pela 3ª Superintendência da Polícia Federal/MS para aquisição de capa de chuva modelo PRF. Diz que apresentou a proposta no dia 26/11/2015, com previsão de vigência até 14/12/2016, e que a ata de Registro de Preço foi assinada no dia 15/12/2015. No entanto, “fazendo a contabilidade da empresa, verificou-se um alto prejuízo resultante de queda brusca e repentina do dólar, além de aumento de custos de frete, reajuste nos impostos sobre matéria-prima, etc”. Sendo assim, viu-se obrigada a pleitear a revisão dos preços incialmente pactuados e tal requerimento obteve resposta positiva pela AGU, Parecer nº 161/2016/CJUMS/CGU/AGU, desde que constatada a presença dos requisitos legais, destacando que a revisão deveria ser válida apenas para os empenhos ainda não recebidos. Conta que o Parecer nº 651/2016/CJU-MS/CGU/AGU negou a retroatividade do reajuste de preços até a data do Registro de Preços. A autora sustenta que faz jus à revisão retroativa dos preços, pois seu produto é composto de 90% de matéria-prima importada e houve aumento da cotação do dólar, impactando fortemente sua produção. Além disso, houve aumento da alíquota do ICMS “no máximo três dias após os pedidos de fornecimento (Notas de Empenho) serem emitidos”, por força da entrada em vigor da Lei nº 14.743/2015, em vigor no dia 1º/01/2016, c/c o Decreto nº 52.841/2015, refletindo um aumento direto na média de 10% sobre os valores. Ampara o seu pedido nos arts. 58, § 2º, 65, II, “d” e § 5º, da Lei nº 8.666/93 e no art. 17 do Decreto nº 7.892/2013. Insiste que houve a quebra da equação econômico-financeira inicialmente contratada pelo surgimento de fatos imprevisíveis e incalculáveis, o que impõe que o percentual de 10% de reajuste – já concedido no Processo SEI nº 08669.003428/2016-8 em relação aos novos empenhos – seja aplicado retroativamente. Atribuiu à causa o valor de R$ 187.264,00. O pedido de Justiça Gratuita foi indeferido e a autora interpôs agravo de instrumento, ao qual neguei provimento. Houve recolhimento de custas iniciais. Citada, a ré apresentou contestação (ID nº 154757575). A autora foi intimada a apresentar réplica e especificar provas e limitou-se a apresentar réplica (ID nº 154757578). Intimada a especificar provas, a UNIÃO manifestou-se pela suficiência das provas já existentes nos autos (ID nº 15475782). Em 08/01/2021 o Juiz a quo proferiu sentença julgando procedente o pedido “para condenar a parte ré a aplicar, de forma retroativa, o efeito do reequilíbrio econômico concedido à empresa autora, relativamente às notas de empenho relacionadas no documento ID 9283083, todas emitidas no final de 2015, fixando desde já o valor da condenação em R$ 187.264,00 (cento e oitenta e sete mil, duzentos e sessenta e quatro reais)”, com correção monetária desde a data do efetivo pagamento das notas fiscais emitidas, nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal. Honorários advocatícios de 10% do valor da condenação. Sentença não submetida ao reexame necessário. Irresignada, a UNIÃO interpôs apelação sustentando, em síntese, que dentro do prazo de validade da ata, há vinculação do licitante às quantidades e aos preços registrados, sendo descabida a revisão no caso, pois se o autor pretende obter reajuste de 10% dos preços desde a assinatura da Ata de Registro de Preços, o aumento foi anterior à expedição das notas de empenho, o que impunha que fizesse o pedido de revisão antes do recebimento delas ou que tomasse as providências para se liberar do compromisso, encontrando o seu pedido empeço no art. 19, II, do Decreto nº 7.892/2013. Defende que quando houve o aceite da proposta já se podia há muito falar em crise econômica no país, com aumento da inflação e do dólar, e que a autora não comprovou que a majoração dos custos foi decorrente das causas que enumerou, bem como que não estão previstos os requisitos da causalidade e da imprevisibilidade (ID nº 154757589). Houve contrarrazões, com preliminar de violação ao princípio da dialeticidade (ID nº 154757593). É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004947-05.2018.4.03.6000 RELATOR: Gab. 21 - DES. FED. JOHONSOM DI SALVO APELANTE: UNIÃO FEDERAL APELADO: VERTICE COMERCIO DE ROUPAS E ACESSORIOS LTDA - EPP Advogados do(a) APELADO: DANIELA SOARES MARASCA - RS80510-A, RAQUEL SEVERO - RS108533-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O Excelentíssimo Senhor Desembargador Federal Johonsom di Salvo, Relator: Primeiramente, em atenção à preliminar aventada em contrarrazões, registro que embora a apelação contemple os mesmos argumentos da contestação, eles são aptos, em tese, a impugnar todos os fundamentos da sentença, não havendo violação ao princípio da dialeticidade. Sendo assim, conheço do recurso e passo ao julgamento. A recomposição do equilíbrio econômico-financeiro do contrato pressupõe a existência de alteração nas condições contratuais pactuadas pelas partes ocasionada por fatos imprevisíveis, ou previsíveis de consequências incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado (art. 65, II, d, Lei nº 8.66/93). A intervenção do Poder Judiciário, à luz da teoria da imprevisão, exige a demonstração de mudanças supervenientes das circunstâncias vigentes ao tempo da contratação, oriundas de evento imprevisível que comprometa o valor da prestação. Nesse sentido: REsp 1321614/SP, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Rel. p/ Acórdão Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 16/12/2014, DJe 03/03/2015. No caso, a autora/apelada sagrou-se vencedora da licitação para Registro de Preços, Modalidade Pregão Eletrônico nº 07/2015, tipo menor preço, promovido pela 3ª Superintendência da Polícia Federal/MS para aquisição de capa de chuva modelo PRF. A proposta foi oferecida no dia 26/10/2015, no valor unitário de R$ 190,00, e resultou na Ata de Registro de Preços assinada em 15/12/2015, com vigência até 14/12/2016. Alegando aumento de impostos e de insumos, a empresa autora solicitou o reequilíbrio econômico-financeiro do contrato. A Advocacia-Geral da União proferiu o Parecer nº 161/2016/CJU-MS/CGU/AGU, datado de 12/04/2016. Nele há referência expressa à excepcionalidade da medida e determinação para que o órgão consulente verifique se todos os requisitos estão presentes, “analisando se a documentação apresentada pela empresa fornecedora serve como prova inequívoca e robusta dos fundamentos alegados, especialmente no que toca à imprevisibilidade do evento ou de suas conseqüências, configurando álea econômica extraordinária, que extrapola os limites dos riscos normais da atividade comercial”. Consignou-se, ainda, que “com relação aos pedidos de fornecimento já existentes, não cabe a revisão de preços visto que cabia ao fornecedor as providências para se liberar do compromisso (art. 19, I, do Decreto nº 7.982/13)” e que “a revisão, se cabível, refletirá nos próximos pedidos de fornecimento”. No dia 09/05/2016 foi celebrado o Termo Aditivo nº 001/2016, alterando o valor do preço registrado para o valor unitário de R$ 209,00, considerando o Parecer nº 161/2016/CJU-MS/CGU/AGU. A empresa autora pediu a reconsideração do Parecer nº 161/2016/CJU-MS/CGU/AGU para que a revisão tivesse efeito retroativo. A Nota nº 00027/2016/CJU-MS/CGU/AGU deixa clara a falta de comprovação dos requisitos legais para a revisão do contrato com amparo na teoria da imprevisão. Vejamos (ID nº 154757248): “..... 7. Nessa oportunidade, a empresa alega a ocorrência de fato do príncipe. Sabe-se, porém, que a alteração tributária não acarreta automaticamente a agravação da situação do particular. Isso deve ser demonstrado como salienta o § 5º do art. 65 da Lei n. 8.666, de 1993, assim redigido (ID nº 154757248): ..... 8. A nosso ver, tal agravamento não ocorreu. É que a alteração tributária apontada decorreu de Emenda Constitucional que instituiu a partilha do tributo. Anteriormente à EC nº 87/15, nas vendas realizadas para outros estados, caso o consumidor final não fosse contribuinte do ICMS (como é o presente caso), o ICMS era devido apenas ao estado de origem, utilizando-se a alíquota interna desse estado. No caso, então, o requerente deveria recolher 17% (percentual da alíquota interna do RS antes da alteração pela Lei) ao RS. Com a nova sistemática trazida pela EC nº 87/15, nas operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final, contribuinte ou não do imposto, localizado em outro Estado, adotar-se-á a alíquota interestadual e caberá ao Estado de localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna do Estado destinatário e a alíquota interestadual. 9. Disso decorre que, a partir de 2016, o requerente deveria utilizar a alíquota interestadual (de 7% ou 12% Resolução do Senado Federal nº 22, de 1989) prevista para a operação, para o cálculo do imposto devido à unidade federada de origem. No caso, a alíquota interestadual aplicável ao presente fornecimento seria de 7% (art. 1º, caput, da citada Resolução). Assim, o requerente deveria recolher 7% de ICMS para o RS. Além disso, o requerente deve recolher, ainda, para o MS, o montante de ICMS resultante da aplicação da diferença entre as alíquotas interna de MS (17%) e interestadual. No caso, essa diferença será de 10% (17% da alíquota interna de MS – 7% da alíquota interestadual). 10. Diante do que acima se detalhou, percebe-se que o valor total devido a título de ICMS manteve-se inalterado (antes era 17% apenas para o RS, agora é 17% sendo 7% para o RS e 10% para o MS). Assim, s.m.j, tais fatos não repercutiram sobre o custo do produto e aos aumentos de 5% e 10% decorrentes da Lei nº 14.743/2015 e do Decreto nº 52.841/2015 (na verdade, não é esse o decreto do Difal!) não restaram comprovados. 11. Cumpre ainda dizer que, no que se refere ao aumento da alíquota do ICMS promovida pela Lei nº 14.743/2015, em nosso entendimento, também não autorizaria a revisão de preços, visto que se trata de modificação de alíquota interna do RS, o que, como já explicamos acima, não tem qualquer aplicabilidade ao presente fornecimento. 12. No entanto, quanto ao argumento da requerente acerca dos "aumentos, acima do esperado, nos preços de todos os insumos que compõem o produto", resultante da crise econômica atual, da ordem de 10%, deve ficar comprovado que essa situação se deu efetivamente após as solicitações de fornecimento e que apesar de previsível as consequências eram incalculáveis. 13. Como não consta dos autos a análise técnica da Administração, acreditamos que, ao conceder a revisão ora vigente, o órgão assessorado identificou o ocorrido tomando por base apenas a época do pedido (29.2.2016) e a situação do mercado atual. No entanto, se em tal análise tiverem sido reconhecidos os pressupostos do reequilíbrio tal como apontado pelo fornecedor, à época das solicitações, daí estará justificado o deferimento do requerimento visto que o desequilíbrio terá sido evidenciado, devendo a situação se recomposta desde sua ocorrência. Era o que tínhamos a esclarecer. Ao órgão assessorado, para avaliação técnica conforme as diretrizes acima lançadas.”. Por fim, o foi proferido o Parecer nº 651/2016/CJU-MS/CGU/AGU, contrário ao propugnado efeito retroativo da revisão às notas de empenho emitidas entre os dias 29 a 31/12/2015. O parecer está fundamentado no art. 19 do Decreto nº 7.829/2013 e também na existência de erro no dimensionamento da proposta. Vejamos (ID nº 154757248): “..... 7. O órgão assessorado analisou o pleito e documentos apresentados pela empresa, e emitiu o Memorando nº 162/2016/LICITAÇÃO-MS/SAF-MS/SRPRF-MS, de 17 de outubro de 2016 (f. 95-96), com as constatações que seguem: o aceite individual da proposta do fornecedor VÉRTICE COMERCIO DE ROUPAS E ACESSÓRIOS LTDA - ME, CNPJ/CPF: 08.763.888/0001-26, pelo melhor lance de R$ 190,0000 foi realizado em 27/10/2015; após a análise de planilha, o órgão informa que foi verificado que os 12 insumos informados, sofreram um acréscimo médio proporcional de 11,12%; considerando que os demais componentes do preço final são percentuais ligados diretamente a esta base de cálculos, atendendo as condições estabelecidas na alínea “d” do inc. II do art.65 da LLCA, os custos dos insumos apresentados não estão majorados por impostos, visto que são valores obtidos na entrega da matéria prima dos fornecedores ao fabricante. Diz ainda o memorando em questão que, considerando que a documentação acostada apresenta a elevação dos encargos da Empresa, a ocorrência das elevações de custos ocorreram entre o registro do preço por meio do PE e a emissão dos empenhos, sendo que a elevação dos custos dos insumos não estão sob controle do licitante, desta forma caracterizando a não previsibilidade das majorações. 8. Pode-se constatar que o órgão, tendo analisado os documentos apresentados pela empresa, não declarou que a majoração dos preços pelos fornecedores ocorreu após o pedido de fornecimento. 9. De outro norte, há que se considerar que, se o pedido da empesa consiste no reajuste em 10% dos preços desde a assinatura da Ata de Registro de Preços, isso significa que o aumento de preços foi anterior à expedição das notas de empenho, cumprindo-lhe, assim, ter feito o pedido de revisão antes do recebimento das notas de empenho. Assim, se formulou o pedido somente após o recebimento das notas de empenho, o reajuste de preços não poderá retroagir, haja vista que, do contrário, restará frontalmente violado o art. 19, II, do Decreto n. 7892/2013, que prescreve que, quando o preço de mercado tornar-se superior aos preços registrados e o fornecedor não puder cumprir o compromisso, o órgão gerenciador poderá: I - liberar o fornecedor do compromisso assumido, caso a comunicação ocorra antes do pedido de fornecimento, e sem aplicação da penalidade se confirmada a veracidade dos motivos e comprovantes apresentados; II - convocar os demais fornecedores para assegurar igual oportunidade de negociação. Logo, se o pedido de revisão não for apresentado antes do pedido, o fornecedor estará obrigado a cumprir o contrato, sob pena de ser penalizado. ..... 13. No caso submetido à apreciação é importante registrar que, quando ocorreu o aceite da proposta, ou seja, em 27.10.2015, já estava deflagrada a crise econômica no Brasil, com aumento da inflação, e o valor da moeda americana - dólar já havia aumentado de forma considerável. E foi nessa conjuntura econômica que a empresa formulou sua proposta de preço e venceu a licitação, mediante oferecimento de preço mais vantajoso em relação aos seus concorrentes, devendo, por isso, arcar com eventuais erros no dimensionamento da proposta, considerando que, os preços registrados, em regra, vigoram por doze meses. A Ata de Registro de Preços foi assinada dias antes da emissão das notas de empenho. Soma-se a isso, o fato de que a própria empresa pede que os preços majorados desde a assinatura da ata de registro de preços, demonstrando assim que o fato que ocorreu anteriormente ao pedido de fornecimento. 14. Releva ressaltar que, ao nosso ver, a concessão de reajuste retroativo à data da assinatura da ARP pode configurar burla à licitação na hipótese de ser permitido a um fornecedor oferecer proposta de preço mais vantajoso que a de outros licitantes, para, depois de sair vencedora, vir a pleitear o reajuste dos preços, com base no argumento de aumento de preços pelos fornecedores. Para tanto, entendemos que os requisitos ressaltados na NOTA n. 00027/2016/CJUMS/CGU/AGU (f. 69-71) devem restar comprovados de forma inequívoca. Chama atenção para o fato de que a ARP foi assinada em 15.12.2015, e as notas de empenho foram emitidas apenas cerca de 14 dias após, lapso de tempo muito curto. Adiciona-se que na oportunidade da assinatura da ARP a empresa nada alegou, e que, na análise da documentação, representada pelo Memorando nº 162/2016/LICITAÇÃO-MS/SAFMS/SRPRF-MS, de 17 de outubro de 2016 (f. 95-96), o órgão assessorado nada manifestou em relação à eventual existência de prova de ocorrência do aumento de preços após o recebimento das notas de empenho. Entendemos, assim, que o pleito da empresa de reajuste de 10% desde a assinatura da ARP não pode ser atendido. .....” O que se dessume da prova dos autos é que a empresa não faz jus ao efeito retroativo pretendido. Primeiramente, a pretensão encontra empeço no art. 19 do Decreto nº 7.892/2013, que regulamenta o Sistema de Registro de Preços previsto no art. 15 da Lei nº 8.666/93, estabelecendo o procedimento a ser adotado no caso de o preço de mercado tornar-se superior aos preços registrados, impossibilitando o cumprimento do compromisso pelo fornecedor. A regra é expressa no sentido de que a comunicação deve ocorrer antes do pedido de fornecimento, o que inocorreu in casu. Não bastasse, a Ata de Registro de Preços foi assinada em 15/12/2015 e as notas de empenho foram emitidas entre 29 e 31/12/2015, inexistindo nos autos efetiva comprovação da superveniência de fatos imprevisíveis, ou previsíveis de consequências incalculáveis que teriam tornado o fornecimento oneroso. A Nota nº 00027/2016/CJU-MS/CGU/AGU deixa claro que a Lei Estadual nº 14.743/2015 não implicou em aumento da carga tributária, mas sim em partilha do tributo. Nada obstante, deve-se ainda atentar para o fato de que ela foi publicada no DOE nº 184, de 25/09/2015, ou seja, mesmo que tivesse havido aumento da carga tributária, não se poderia alegar imprevisibilidade para justificar a revisão de preços, pois a publicação é bastante anterior à data da apresentação da proposta (26/10/2015) e da assinatura da Ata de Registro de Preços (15/12/2015). No que tange ao Decreto Estadual nº 52.841/2015, que a empresa alega que teria criado nova tributação, ele não foi sequer juntado aos autos, colhendo-se da Nota nº 00027/2016/CJU-MS/CGU/AGU que os “aumentos de 5% e 10%decorrentes da Lei nº 14.743/2015 e do Decreto nº 52.841/2015 (na verdade, não é esse o decreto do Difal!) não restaram comprovados” (ID nº 154757248). Quanto ao aumento dos preços dos insumos, supostamente decorrente da alta do dólar, a empresa não logrou demonstrar que se tratava de fato imprevisível ou previsível de consequências incalculáveis. Aliás, o Parecer nº 651/2016/CJU-MS/CGU/AGU deixa claro que o que houve foi o erro no dimensionamento da proposta, pois quando de seu aceite, em 27/10/2015, a crise econômica no país já estava deflagrada, com o aumento considerável do valor da moeda americana e da inflação. Vale registrar, no ponto, que a variação cambial está compreendida na álea empresarial. Sendo assim, apenas a comprovação de variação extraordinária seria capaz de ensejar a revisão dos preços com base na Teoria da Imprevisão. Nesse contexto, a aplicação retroativa da revisão de preços deferida pelo Termo Aditivo nº 001/2016 implicaria em burla à licitação, pois a empresa ofereceu proposta de preço mais vantajoso que os demais licitantes e sagrou-se vencedora, não se podendo admitir que, em exíguo tempo após a assinatura da Ata de Registro de Preços, obtenha a revisão dos preços após a emissão das notas de empenho e sem eu haja comprovação efetiva de fato superveniente e imprevisível ou de fato previsível de consequências incalculáveis que alterem o equilíbrio econômico-financeiro da proposta. A regra do art. 65, II, “d”, da Lei nº 8.666/96 tem por objetivo restabelecer a relação que as partes pactuaram inicialmente, objetivando a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato abalado por evento imprevisível posterior à formulação da proposta. Não se presta, pois, à correção de erro no dimensionamento da proposta. Nesse sentido, mutatis mutandis: PROCESSO CIVIL E ADMINISTRATIVO. CONTRATO ADMINISTRATIVO. ALTERAÇÃO CONTRATUAL. ART. 65, II, DA LEI 8.666/93. DESEQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO. INOCORRÊNCIA. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. NÃO CONFIGURADA. PAGAMENTO DAS PARCELAS ATRASADAS. INCIDÊNCIA DOS CONSECTÁRIOS LEGAIS. APELAÇÃO DA UNIÃO E REMESSA NECESSÁRIA DESPROVIDAS. APELAÇÃO DAS AUTORAS PARCIALMENTE PROVIDA. 1. Narra a exordial que, após o início das obras de duplicação e restauração da Rodovia Federal BR 116/SP, houve um reajuste de 19,6% sobre os preços do betume comercializado em 01.12.1998, o que resultou na majoração dos custos do principal insumo utilizado na execução contratual, razão pela qual pleiteiam a recomposição do equilíbrio econômico-financeiro do contrato. 2. O artigo 65, II, da Lei nº 8.666/1993 permite a alteração contratual com intuito de restabelecer a relação que as partes pactuaram inicialmente entre os encargos do contratado e a justa remuneração pela execução dos serviços, em observância à manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato. 3. Vê-se, todavia, que a análise para demonstração de desequilíbrio econômico-financeiro em contrato administrativo não requer que se considerem, como procedimento geral, todas as variações ordinárias nos preços dos insumos contratados - cobertos naturalmente pelos índices de reajustamento da avença -, mas apenas alterações de preços significativas e imprevisíveis (ou previsíveis, porém de consequências incalculáveis), capazes de justificar a aplicação da teoria da imprevisão. 4. O aumento do preço do petróleo não se enquadra em nenhuma das hipóteses legais que autorizam o reequilíbrio contratual, pois é cediço que o dólar americano serve como parâmetro para a fixação dos preços de materiais asfálticos e, consequentemente, há variação significativa do preço do insumo em determinados períodos. 5. Não se verifica, portanto, qualquer desequilíbrio econômico no contrato a ensejar a recomposição dos valores pretendida na inicial. 6. O juiz não está adstrito à prova pericial produzida nos autos, podendo, inclusive, decidir de forma contrária, com fundamento no livre convencimento motivado. Precedentes do STJ. 7. O simples fato de a parte autora nada ter mencionado acerca dos termos aditivos realizados no contrato não significa que tenha alterado a verdade dos fatos, até mesmo porque trouxe com a documentação apresentada na inicial as publicações no Diário Oficial, à época, dos aludidos aditivos contratuais. Assim, não se verifica no caso em comento a ocorrência de litigância de má-fé. 8. No que tange, por sua vez, à aplicação de juros e correção monetária às parcelas pagas em atraso, por se tratar de obrigação positiva e líquida, com vencimento certo, os juros de mora e a correção monetária devem incidir após 30 (trinta) dias contados da data final do período de adimplemento de cada parcela, conforme previsão contratual, de acordo com os índices do Manual de Cálculos da Justiça Federal. 9. Apelação da União e remessa necessária desprovidas. 10. Apelação da autora parcialmente provida. (TRF 3ª Região, TERCEIRA TURMA, ApelRemNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1780356 - 0008576-59.2001.4.03.6100, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL NELTON DOS SANTOS, julgado em 19/06/2019, e-DJF3 Judicial 1 DATA:28/06/2019) Ante o exposto, dou provimento à apelação, condenado a autora ao pagamento de honorários advocatícios fixados nos percentuais mínimos do § 3º do art. 85 do CPC, a incidir sobre o valor da causa, observada a regra do § 5º do referido dispositivo. É como voto.
E M E N T A
DIREITO PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. REGISTRO DE PREÇOS. PRETENSÃO DE EMPRESTAR EFEITOS RETROATIVOS AO TERMO ADITIVO QUE DEFERIU REAJUSTE DE PREÇOS: IMPOSSIBILIDADE. COMUNICAÇÃO REALIZADA APÓS OS PEDIDOS DE FORNECIMENTO (ART. 19 DO DECRETO Nº 7.892/2013). FALTA DE COMPROVAÇÃO DE FATO SUPERVENIENTE IMPREVISÍVEL OU PREVISÍVEL DE CONSEQUÊNCIAS INCALCULÁVEIS. APELAÇÃO PROVIDA. CONDENAÇÃO DA AUTORA AO PAGAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
1. Embora a apelação contemple os mesmos argumentos da contestação, eles são aptos, em tese, a impugnar todos os fundamentos da sentença, não havendo violação ao princípio da dialeticidade. Recurso conhecido.
2. A recomposição do equilíbrio econômico-financeiro do contrato pressupõe a existência de alteração nas condições contratuais pactuadas pelas partes ocasionada por fatos imprevisíveis, ou previsíveis de consequências incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado (art. 65, II, d, Lei nº 8.66/93).
3. A intervenção do Poder Judiciário, à luz da teoria da imprevisão, exige a demonstração de mudanças supervenientes das circunstâncias vigentes ao tempo da contratação, oriundas de evento imprevisível que comprometa o valor da prestação. Nesse sentido: REsp 1321614/SP, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Rel. p/ Acórdão Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 16/12/2014, DJe 03/03/2015.
4. A pretensão encontra empeço no art. 19 do Decreto nº 7.892/2013, que regulamenta o Sistema de Registro de Preços previsto no art. 15 da Lei nº 8.666/93, estabelecendo o procedimento a ser adotado no caso de o preço de mercado tornar-se superior aos preços registrados, impossibilitando o cumprimento do compromisso pelo fornecedor. A regra é expressa no sentido de que a comunicação deve ocorrer antes do pedido de fornecimento, o que inocorreu in casu.
5. Não bastasse, a Ata de Registro de Preços foi assinada em 15/12/2015 e as notas de empenho foram emitidas entre 29 e 31/12/2015, inexistindo nos autos efetiva comprovação da superveniência de fatos imprevisíveis, ou previsíveis de consequências incalculáveis que teriam tornado o fornecimento oneroso.
6. A Nota nº 00027/2016/CJU-MS/CGU/AGU deixa claro que a Lei Estadual nº 14.743/2015 não implicou em aumento da carga tributária, mas sim em partilha do tributo. Nada obstante, deve-se ainda atentar para o fato de que ela foi publicada no DOE nº 184, de 25/09/2015, ou seja, mesmo que tivesse havido aumento da carga tributária, não se poderia alegar imprevisibilidade para justificar a revisão de preços, pois a publicação é bastante anterior à data da apresentação da proposta (26/10/2015) e da assinatura da Ata de Registro de Preços (15/12/2015).
7. No que tange ao Decreto Estadual nº 52.841/2015, que a empresa alega que teria criado nova tributação, ele não foi sequer juntado aos autos, colhendo-se da Nota nº 00027/2016/CJU-MS/CGU/AGU que os “aumentos de 5% e 10%decorrentes da Lei nº 14.743/2015 e do Decreto nº 52.841/2015 (na verdade, não é esse o decreto do Difal!) não restaram comprovados”.
8. Quanto ao aumento dos preços dos insumos, supostamente decorrente da alta do dólar, a empresa não logrou demonstrar que se tratava de fato imprevisível ou previsível de consequências incalculáveis. Aliás, o Parecer nº 651/2016/CJU-MS/CGU/AGU deixa claro que o que houve foi o erro no dimensionamento da proposta, pois quando de seu aceite, em 27/10/2015, a crise econômica no país já estava deflagrada, com o aumento considerável do valor da moeda americana e da inflação.
9. Vale registrar, no ponto, que a variação cambial está compreendida na álea empresarial. Sendo assim, apenas a comprovação de variação extraordinária seria capaz de ensejar a revisão dos preços com base na Teoria da Imprevisão.
10. Nesse contexto, a aplicação retroativa da revisão de preços deferida pelo Termo Aditivo nº 001/2016 implicaria em burla à licitação, pois a empresa ofereceu proposta de preço mais vantajoso que os demais licitantes e sagrou-se vencedora, não se podendo admitir que, em exíguo tempo após a assinatura da Ata de Registro de Preços, obtenha a revisão dos preços após a emissão das notas de empenho e sem eu haja comprovação efetiva de fato superveniente e imprevisível ou de fato previsível de consequências incalculáveis que alterem o equilíbrio econômico-financeiro da proposta.
11. A regra do art. 65, II, “d”, da Lei nº 8.666/96 tem por objetivo restabelecer a relação que as partes pactuaram inicialmente, objetivando a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato abalado por evento imprevisível posterior à formulação da proposta. Não se presta, pois, à correção de erro no dimensionamento da proposta.
12. Apelação provida. Condenação da autora ao pagamento de honorários advocatícios fixados nos percentuais mínimos do § 3º do art. 85 do CPC, a incidir sobre o valor da causa, observada a regra do § 5º do referido dispositivo.