AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5028223-86.2019.4.03.0000
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
AGRAVANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
AGRAVADO: CELIO PELOGIA
Advogado do(a) AGRAVADO: JULIO WERNER - SP172919-A
OUTROS PARTICIPANTES:
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5028223-86.2019.4.03.0000 RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA AGRAVANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS AGRAVADO: CELIO PELOGIA Advogado do(a) AGRAVADO: JULIO WERNER - SP172919-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de agravo de instrumento interposto pelo INSS em face de decisão que concedeu prazo para a implantação de benefício previdenciário em cumprimento à coisa julgada, sob pena de multa. O INSS impugna a fixação de multa diária em face do Poder Público; alega que não houve intimação do setor competente para o cumprimento da decisão; e afirma a inexistência de lesão ao credor, haja vista que já recebe o benefício previdenciário e que o cumprimento do acórdão só lhe trouxe direito aos atrasados e não à mudança no valor do benefício. Em contrarrazões, o agravado alega a intempestividade do recurso. É o relatório. THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5028223-86.2019.4.03.0000 RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA AGRAVANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS AGRAVADO: CELIO PELOGIA Advogado do(a) AGRAVADO: JULIO WERNER - SP172919-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Afasta-se, em primeiro lugar, a alegação de intempestividade do recurso. O prazo recursal para impugnar a decisão agravada que não reconsiderou a multa diária fixada contra o INSS iniciou em 17/9/2019, conforme certidão lançada no feito originário, tendo encerrado em 29/10/2019, dia do ajuizamento deste recurso. Passa-se a analisar o mérito recursal. A imposição da multa diária como meio coercitivo para o cumprimento de obrigação de fazer tem respaldo nos arts. 536, § 1.º, e 537 do Código de Processo Civil. Em recentes julgamentos a respeito, o Superior Tribunal de Justiça assim enfrentou o tema: “O Superior Tribunal de Justiça, como guardião da legislação federal e da segurança jurídica, deve zelar pela credibilidade do Poder Judiciário como um todo, dele devendo partir as diretrizes que dão sustento à força cogente das decisões judiciais em qualquer instância, e não servir de inspiração para o desacato premeditado das ordens que emanam desse Poder, cabendo aqui a máxima de que ‘ordem judicial não se discute, se cumpre’. Em um Estado Democrático de Direito, as ordens judiciais não são passíveis de discussão, senão pela via dos recursos cabíveis. O destinatário da ordem judicial deve ter em mente a certeza de que eventual desobediência lhe trará consequências mais gravosas que o próprio cumprimento da ordem, e não a expectativa de redução ou de limitação da multa a ele imposta, sob pena de tornar inócuo o instituto processual e de violar o direito fundamental à efetividade da tutela jurisdicional.” (STJ, REsp 1819069/SC, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, j. 26/05/2020, DJe 29/05/2020184) “A respeito do montante da multa diária, o Superior Tribunal de Justiça possui jurisprudência pacífica no sentido de que o valor das astreintes deve guardar relação de proporcionalidade com o interesse a ser protegido pela prestação da obrigação principal, evitando-se, assim, o desvirtuamento da medida coercitiva, que poderia i) ser mais atrativa ao demandado, por ser a transgressão mais lucrativa que o cumprimento da obrigação (insuficiência da penalidade), ou ii) ser mais vantajosa ao demandante, que enriqueceria abruptamente às custas do réu (penalidade excessiva). Com efeito, a multa cominatória tem por finalidade constranger o devedor a adotar um comportamento tendente à implementação da obrigação, e não servir de compensação pela deliberada inadimplência. Assim, para a apuração da razoabilidade e da proporcionalidade das astreintes, não é recomendável se utilizar apenas do critério comparativo entre o valor da obrigação principal e a soma total obtida com o descumprimento da medida coercitiva, sendo mais adequado, em regra, o cotejamento ponderado entre o valor diário da multa no momento de sua fixação e a prestação que deve ser adimplida pelo demandado recalcitrante. A esse respeito, confiram-se: REsp nº 1.475.157/SC, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, DJe 6/10/2014, e AgRg no AREsp nº 394.283/SC, Rel. Ministro Moura Ribeiro, DJe 26/2/2016. (...) No julgamento do AgInt no AgRg no AREsp nº 738.682/RJ, o Ministro Luis Felipe Salomão, ao discorrer acerca dos parâmetros normalmente admitidos pela jurisprudência desta Corte Superior para fins de fixação da multa cominatória, constatou que, por vezes, eles apresentam certa incompatibilidade: (...) Ao final de seu voto, destacou Sua Excelência que 'a vinculação das astreintes à obrigação principal ou à dimensão econômica do dever, apesar de parâmetro confiável, não é, por óbvio, critério absoluto, sendo apenas um dos elementos a ser levados em conta' (AgInt no AgRg no AREsp 738.682/RJ, Rel. p/ acórdão Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 17/11/2016, DJe 14/12/2016). Nessa mesma ocasião, foram elencados os seguintes parâmetros para a adequada fixação do valor das astreintes: i) valor da obrigação e importância do bem jurídico tutelado; ii) tempo para cumprimento (prazo razoável e periodicidade); iii) capacidade econômica e capacidade de resistência do devedor e iv) possibilidade de adoção de outros meios pelo magistrado e dever do credor de mitigar o próprio prejuízo (duty to mitigate de loss).” (STJ, REsp 1840693/SC, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, j. 26/5/2020, DJe 29/5/2020) Para tanto, imprescindível a devida intimação do representante legal da autarquia a respeito da decisão que fixou a referida multa, nos termos da Súmula 410 do E. STJ, assim ementada: "A prévia intimação pessoal do devedor constitui condição necessária para a cobrança de multa pelo descumprimento de obrigação de fazer ou não fazer." Afasta-se a alegação de que é imperiosa a intimação da Gerência Executiva do INSS para a implantação do benefício, sem a qual a multa não pode ser aplicada. Ora, o devedor é o INSS, sendo uma questão meramente administrativa a relativa ao órgão que cumprirá a decisão. Quem tem de ser intimado é o réu que figura na ação judicial, representado pelo seu procurador. A intimação é realizada nos termos dos demais atos processuais, cabendo ao INSS acionar quem deva cumprir a decisão, conforme divisão interna do Instituto. Nos termos do art. 537, § 1.º, do Código de Processo Civil, a multa pode ser excluída, ou seu valor alterado, caso se verifique insuficiente ou excessiva, bem como se o obrigado demonstre cumprimento parcial superveniente da obrigação ou justa causa para o descumprimento. A cominação de astreintes deve ser compatível com a obrigação de fazer imposta à autarquia previdenciária, já que tem como objetivo compeli-la ao efetivo cumprimento do encargo, não podendo, entretanto, servir ao enriquecimento sem causa. Em suma, o magistrado deve ajustar o valor e a periodicidade da multa consoante as circunstâncias concretas, com vista à obtenção do resultado específico da obrigação reclamada, mas sempre atento à razoabilidade, a fim de não fixar prazo exíguo para cumprimento da obrigação de fazer ou de não fazer. Quanto ao prazo fixado para a implantação do benefício, dispõe o art. 537 do Código de Processo Civil o seguinte: "A multa independe de requerimento da parte e poderá ser aplicada na fase de conhecimento, em tutela provisória ou na sentença, ou na fase de execução, desde que seja suficiente e compatível com a obrigação e que se determine prazo razoável para cumprimento do preceito." Portanto, considerando-se que são normalmente necessários diversos procedimentos administrativos para cumprimento das múltiplas determinações judiciais recebidas pela autarquia, reputa-se razoável o prazo de 30 dias para cumprimento, sendo aceitável, contudo, justificadamente, a sua excepcional prorrogação em 15 dias, totalizando 45 dias, prazo previsto pelo § 5.º, do art. 41-A, da Lei n.º 8.213/91 (TRF3, ApCiv 5238202-30.2020.4.03.9999, Rel. Des. Fed. Therezinha Cazerta, j. 25/03/2021; AI 5024330-53.2020.4.03.0000, Rel. Des. Fed. Luiz Stefanini, j. 11/03/2021; ApCiv 5824510-46.2019.4.03.9999, Rel. Des. Fed. Newton de Lucca, j. 27/11/2019; ApCiv 5196659-81.2019.4.03.9999 , Rel. Des. Fed. Baptista Pereira, j. 23/03/2021): “§ 5.º O primeiro pagamento do benefício será efetuado até quarenta e cinco dias após a data da apresentação, pelo segurado, da documentação necessária a sua concessão.” O INSS alega, neste caso, que “o autor recebe o benefício NB 180.217.973-6 desde 12/04/2017 com renda de R$ 3.080,00 reais e a implantação do benefício nos termos do acórdão retroagirá a DIB para 24.05.2016 com efeitos financeiros que serão pagos em liquidação de sentença”. No entanto, a ação proposta pelo agravado foi julgada procedente em parte e seu pedido era o de averbação de tempo de atividade considerada especial e o de reconhecimento do direito à aposentadoria desde a DER, em 2016. O dispositivo do acórdão concluiu: “Pelas razões expostas, dou parcial provimento à apelação da parte autora, para reconhecer a especialidade do interregno de 12/03/1985 a 05/03/2001, e conceder o benefício de aposentadoria por tempo de serviço integral, com RMI fixada nos termos do artigo 53, da Lei nº 8.213/91, a partir da data do requerimento administrativo (DIB em 24/05/2016).” Assim, o fato de o agravado ter recebido benefício previdenciário concedido administrativamente em 12/4/2017 não leva à imediata conclusão de que o benefício previdenciário reconhecido como devido (judicialmente) já fora implantado, como quer fazer crer o agravante. Pelo contrário, o benefício previdenciário reconhecido judicialmente e o concedido administrativo provavelmente têm rendas mensais iniciais e salários de benefício diferentes, pelo que havia a obrigação para o INSS de implantar o benefício judicial. Ante o exposto, nego provimento ao agravo de instrumento. É o voto. THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. ASTREINTES. DESCUMPRIMENTO DE DECISÃO JUDICIAL. OBRIGAÇÃO DE FAZER PELO INSS. MULTA DIÁRIA CORRESPONDENTE A 1/30 DO VALOR DO BENEFÍCIO. ATENDIMENTO AOS FINS DA IMPOSIÇÃO DA MULTA.
- A imposição da multa diária como meio coercitivo para o cumprimento de obrigação de fazer tem respaldo nos arts. 536, § 1.º, e 537 do Código de Processo Civil.
- A jurisprudência também afirmou a possibilidade de cobrança de astreintes do INSS.
- Afastada a alegação do INSS de que é necessária a prévia intimação da Gerência Executiva do INSS para a implantação do benefício, sem a qual a multa não pode ser aplicada. Quem tem de ser intimado é o réu que figura na ação judicial, representado pelo seu procurador, cabendo ao INSS acionar quem deva cumprir a decisão, conforme divisão interna do Instituto.
- A cominação de astreintes deve ser compatível com a obrigação de fazer imposta à autarquia previdenciária, já que tem como objetivo compeli-la ao efetivo cumprimento do encargo, não podendo, entretanto, servir ao enriquecimento sem causa.
- O magistrado deve ajustar o valor e a periodicidade da multa consoante as circunstâncias concretas, com vista à obtenção do resultado específico da obrigação reclamada, mas sempre atento à razoabilidade, a fim de não fixar prazo exíguo para cumprimento da obrigação de fazer ou de não fazer.