APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0004906-15.2017.4.03.6112
RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO
APELANTE: DAIANA LAVAGNOLLI MOLINA DOS SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: EDSON APARECIDO CARVALHO - SP350725-A
APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A.
Advogado do(a) APELADO: HENRIQUE JOSE PARADA SIMAO - SP221386-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0004906-15.2017.4.03.6112 RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO APELANTE: DAIANA LAVAGNOLLI MOLINA DOS SANTOS Advogado do(a) APELANTE: EDSON APARECIDO CARVALHO - SP350725-A APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A. Advogado do(a) APELADO: HENRIQUE JOSE PARADA SIMAO - SP221386-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O EXMO SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO (Relator): Trata-se de apelação interposta DAIANA LAVAGNOLLI MOLINA DOS SANTOS em face de sentença que julgou improcedente o pedido de limitação dos descontos realizados para pagamento de empréstimos consignados a 30% do valor de sua remuneração. Foi a autora condenada em honorários advocatícios fixados em 10% do valor da causa, observada a justiça gratuita. As razões da apelação são: o princípio da autonomia da vontade e do pacta sunt servanda devem ser relativizados diante da determinação legal de limitação dos 30% da remuneração prevista em lei. Com contrarrazões, vieram os autos a esta E. Corte. É o breve relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0004906-15.2017.4.03.6112 RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO APELANTE: DAIANA LAVAGNOLLI MOLINA DOS SANTOS Advogado do(a) APELANTE: EDSON APARECIDO CARVALHO - SP350725-A APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A. Advogado do(a) APELADO: HENRIQUE JOSE PARADA SIMAO - SP221386-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO (Relator): Versa o caso dos autos sobre os limites a serem respeitados pelas instituições financeiras nos descontos realizados para pagamento de empréstimos, consignados em folha de pagamento de servidores públicos. A consignação em folha de pagamento do servidor público referente a empréstimo contraído junto a instituições financeiras é disciplinada pelas Leis nº 1.046/1950 e Lei nº 8.112/1990 que, a respeito dos limites consignáveis, dispõem: Leis nº 1.046/50: Art. 21. A soma das consignações não excederá de 30% (trinta por cento) do vencimento, remuneração, salário, provento, subsídio, pensão, montepio, meio-sôldo, e gratificação adicional por tempo de serviço. (Redação dada pela Lei nº 2.853, de 1956) Parágrafo único. Êsse limite será elevado até 70% (setenta por cento) para prestação alimentícia, educação, aluguel de casa ou aquisição de imóvel destinados a moradia própria. (Redação dada pela Lei nº 2.853, de 1956) Lei nº 8.112/90: Art. 45. Salvo por imposição legal, ou mandado judicial, nenhum desconto incidirá sobre a remuneração ou provento. § 1º Mediante autorização do servidor, poderá haver consignação em folha de pagamento em favor de terceiros, a critério da administração e com reposição de custos, na forma definida em regulamento. (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015) § 2º O total de consignações facultativas de que trata o § 1o não excederá a 35% (trinta e cinco por cento) da remuneração mensal, sendo 5% (cinco por cento) reservados exclusivamente para: (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015) I - a amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito; ou (Incluído pela Lei nº 13.172, de 2015) II - a utilização com a finalidade de saque por meio do cartão de crédito. (Incluído pela Lei nº 13.172, de 2015) Frise-se que as leis dispõem sobre a modalidade de empréstimo em que a parcela referente ao seu adimplemento sequer chega a ser depositada na conta do mutuário. É dizer, o desconto é realizado pela Administração e passado diretamente à instituição financeira mutuante. Difere-se, portanto, de outras modalidades de contrato em que o mutuante autoriza o débito direto em sua conta. Isto é, autoriza a instituição mutuante a retirar a parcela devida mês a mês dos valores já depositados em sua conta corrente, seja a título de verbas salariais ou a qualquer outro. Porque decorre diretamente da lei, a legitimidade da limitação indicada é absolutamente pacífica na jurisprudência do E. STJ: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO. DESCONTOS EM FOLHA DE PAGAMENTO. LIMITE DE 30% DOS VENCIMENTOS. MATÉRIA PACIFICADA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS EM DESFAVOR DE BENEFICIÁRIO DE ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. EXIGIBILIDADE SUSPENSA. AGRAVO REGIMENTAL DO BANCO CRUZEIRO DO SUL S.A. A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Esta Corte consolidou a orientação afirmando que os empréstimos consignados na folha de pagamento do Servidor público estão limitados a 30% do valor de sua remuneração líquida, ante a natureza alimentar da verba e em atenção ao princípio da razoabilidade. 2. O beneficiário da Justiça Gratuita, embora não faça jus à isenção do pagamento dos ônus sucumbenciais, faz jus ao reconhecimento da suspensão da exigibilidade do débito, pelo período de 5 anos, a contar da condenação final, quando então, não havendo condições financeiras de o recorrente quitar o débito, restará prescrita a obrigação. 3. Agravo Regimental do Banco a que se nega provimento. (AgRg no AREsp 45.082/AP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 28/05/2019, DJe 03/06/2019) AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. DESCONTO LIMITADO A 30% DA REMUNERAÇÃO. PRECEDENTES 1. O Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de que os empréstimos consignados na folha de pagamento do servidor público estão limitados a 30% do valor de sua remuneração, ante a natureza alimentar da verba. 2. Agravo regimental improvido. (AgRg no RMS 30.070/RS, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 17/09/2015, DJe 08/10/2015) Por outro lado, cumpre ressaltar que o limite de 30% (podendo chegar a 35% nas condições do art. 45, §2º da Lei nº 8.112/1990, e art. 6º, §5º, da Lei nº 10.820/2003) deve ser calculado sobre o rendimento disponível do contratante, é dizer, excluídos apenas os descontos compulsórios, excluídos os descontos voluntários, conforme se confere da Lei nº 10.820/2003: Art. 2º Para os fins desta Lei, considera-se: (...) VII - desconto, ato de descontar na folha de pagamento ou em momento anterior ao do crédito devido pelo empregador ao empregado como remuneração disponível ou verba rescisória o valor das prestações assumidas em operação de empréstimo, financiamento, cartão de crédito ou arrendamento mercantil; e (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015) VIII - remuneração disponível, os vencimentos, subsídios, soldos, salários ou remunerações, descontadas as consignações compulsórias. (Incluído pela Lei nº 13.097, de 2015) § 1o Para os fins desta Lei, são consideradas consignações voluntárias as autorizadas pelo empregado. § 2o No momento da contratação da operação, a autorização para a efetivação dos descontos permitidos nesta Lei observará, para cada mutuário, os seguintes limites: I - a soma dos descontos referidos no art. 1o não poderá exceder a 35% (trinta e cinco por cento) da remuneração disponível, conforme definido em regulamento, sendo 5% (cinco por cento) destinados exclusivamente para: (Redação dada pela Lei nº 13.172, de 2015) a) a amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito; ou (Incluída pela Lei nº 13.172, de 2015) b) a utilização com a finalidade de saque por meio do cartão de crédito; e (Incluída pela Lei nº 13.172, de 2015) II - o total das consignações voluntárias, incluindo as referidas no art. 1o, não poderá exceder a quarenta por cento da remuneração disponível, conforme definida em regulamento. Tenha-se em mente também que o Decreto nº 8.690/2016 dispõe em seu art. 6º sobre as verbas que não compõem a remuneração, apesar de pagas com habitualidade: Art. 6º Para os efeitos do disposto neste Decreto, considera-se remuneração a soma dos vencimentos com os adicionais de caráter individual e demais vantagens, nestas compreendidas as relativas à natureza ou ao local de trabalho, aquela prevista no art. 62-A da Lei nº 8.112, de 1990 , ou outra paga sob o mesmo fundamento, excluídos: (Vigência) I - diárias; II - ajuda de custo; III - indenização de transporte a servidor que realizar despesas com a utilização de meio próprio de locomoção para execução de serviços externos, por força de atribuições próprias do cargo; IV - salário-família; V - gratificação natalina; VI - auxílio-natalidade; VII - auxílio-funeral; VIII - adicional de férias; IX - adicional pela prestação de serviço extraordinário; X - adicional noturno; XI - adicional de insalubridade, de periculosidade ou de atividades penosas; e XII - outro auxílio ou adicional de caráter indenizatório. Quanto à aplicação desse mesmo limite para outros tipos de contratos, havia entendimento no E.STJ que o mesmo limite de 30% dos empréstimos consignados em folha de pagamento deveria ser aplicado a empréstimos que previssem débito em conta corrente (conforme E.STJ, AgRg no REsp 1535736/DF 2015/0125654-9, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, Segunda Turma, j. em 13/10/2015, DJe 18/11/2015). Entretanto, que tal entendimento foi substancialmente alterado pela Corte Superior, cuja jurisprudência mais recente é no sentido de que o limite de 30% somente é aplicável aos contratos de empréstimo consignado, e não a outros tipos de empréstimo, ainda que sejam saldados por meio de débito em conta corrente. Confiram-se, nesse sentido, trechos do voto proferido no AgInt no RECURSO ESPECIAL Nº 1836620 – DF, em que o Ministro Relator Luis Felipe Salomão esclarece a questão: “Acerca desse tema, o entendimento do STJ inicialmente foi no sentido de que o débito em conta deveria limitar-se a 30% dos rendimentos do devedor, em analogia ao mesmo limite do "empréstimo consignado". (...) 4. Sem prejuízo desse entendimento, após minucioso debate, esta Corte Superior, em aresto sob a relatoria deste signatário, conferiu nova percepção acerca do tema, no sentido de que a limitação de 30% para fins do "empréstimo consignado" não se aplica ao mútuo bancário na modalidade ‘débito em conta-corrente’. (...) Conforme se vê, o entendimento que foi vencedor na instância de origem estava em confronto com o firmado nesta Corte, no sentido de que a limitação a 30% dos rendimentos da parte recorrente aplica-se somente aos empréstimos consignados. Sendo assim, foi correta a decisão ora agravada ao ter restabelecido a sentença, que julgou improcedentes os pedidos iniciais da parte recorrente. 6. Ante o exposto, nego provimento ao agravo interno.” Nessa esteira, confiram-se as seguintes ementas do E. STJ (grifei): RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÕES DE MÚTUO FIRMADO COM INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. DESCONTO EM CONTA-CORRENTE E DESCONTO EM FOLHA. HIPÓTESES DISTINTAS. APLICAÇÃO, POR ANALOGIA, DA LIMITAÇÃO LEGAL AO EMPRÉSTIMO CONSIGNADO AO MERO DESCONTO EM CONTA-CORRENTE, SUPERVENIENTE AO RECEBIMENTO DA REMUNERAÇÃO. INVIABILIDADE. DIRIGISMO CONTRATUAL, SEM SUPEDÂNEO LEGAL. IMPOSSIBILIDADE. 1. A regra legal que fixa a limitação do desconto em folha é salutar, possibilitando ao consumidor que tome empréstimos, obtendo condições e prazos mais vantajosos, em decorrência da maior segurança propiciada ao financiador. O legislador ordinário concretiza, na relação privada, o respeito à dignidade humana, pois, com razoabilidade, limitam-se os descontos compulsórios que incidirão sobre verba alimentar, sem menosprezar a autonomia privada. 2. O contrato de conta-corrente é modalidade absorvida pela prática bancária, que traz praticidade e simplificação contábil, da qual dependem várias outras prestações do banco e mesmo o cumprimento de pagamento de obrigações contratuais diversas para com terceiros, que têm, nessa relação contratual, o meio de sua viabilização. A instituição financeira assume o papel de administradora dos recursos do cliente, registrando lançamentos de créditos e débitos conforme os recursos depositados, sacados ou transferidos de outra conta, pelo próprio correntista ou por terceiros. 3. Como característica do contrato, por questão de praticidade, segurança e pelo desuso, a cada dia mais acentuado, do pagamento de despesas em dinheiro, costumeiramente o consumidor centraliza, na conta-corrente, suas despesas pessoais, como, v.g., luz, água, telefone, tv a cabo, cartão de crédito, cheques, boletos variados e demais despesas com débito automático em conta. 4. Consta, na própria petição inicial, que a adesão ao contrato de conta-corrente, em que o autor percebe sua remuneração, foi espontânea, e que os descontos das parcelas da prestação - conjuntamente com prestações de outras obrigações firmadas com terceiros - têm expressa previsão contratual e ocorrem posteriormente ao recebimento de seus proventos, não caracterizando consignação em folha de pagamento. 5. Não há supedâneo legal e razoabilidade na adoção da mesma limitação, referente a empréstimo para desconto em folha, para a prestação do mútuo firmado com a instituição financeira administradora da conta-corrente. Com efeito, no âmbito do direito comparado, não se extrai nenhuma experiência similar - os exemplos das legislações estrangeiras, costumeiramente invocados, buscam, por vezes, com medidas extrajudiciais, solução para o superendividamento ou sobreendividamento que, isonomicamente, envolvem todos os credores, propiciando, a médio ou longo prazo, a quitação do débito. 6. À míngua de novas disposições legais específicas, há procedimento, já previsto no ordenamento jurídico, para casos de superendividamento ou sobreendividamento - do qual podem lançar mão os próprios devedores -, que é o da insolvência civil. 7. A solução concebida pelas instâncias ordinárias, em vez de solucionar o superendividamento, opera no sentido oposto, tendo o condão de eternizar a obrigação, visto que leva à amortização negativa do débito, resultando em aumento mês a mês do saldo devedor. Ademais, uma vinculação perene do devedor à obrigação, como a que conduz as decisões das instâncias ordinárias, não se compadece com o sistema do direito obrigacional, que tende a ter termo. 8. O art. 6º, parágrafo 1º, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro confere proteção ao ato jurídico perfeito, e, consoante os arts. 313 e 314 do CC, o credor não pode ser obrigado a receber prestação diversa da que lhe é devida, ainda que mais valiosa. 9. A limitação imposta pela decisão recorrida é de difícil operacionalização, e resultaria, no comércio bancário e nas vendas a prazo, em encarecimento ou até mesmo restrição do crédito, sobretudo para aqueles que não conseguem comprovar a renda. 10. Recurso especial do réu provido, julgado prejudicado o do autor. (REsp 1586910/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 29/08/2017, DJe 03/10/2017) AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. CONTRATOS BANCÁRIOS. MÚTUO BANCÁRIO. DÉBITO EM CONTA-CORRENTE. LIVRE PACTUAÇÃO. POSSIBILIDADE. PREVISÃO CONTRATUAL. LIMITE DE 30% SOBRE OS VENCIMENTOS. POSSIBILIDADE. 1. Nos contratos de mútuo bancário, é legal e possível o desconto, pela instituição financeira, de valores depositados na conta bancária do mutuário/correntista, desde que expressamente previsto em contrato, não se lhe aplicando o limite de 30% dos vencimentos referente à modalidade "empréstimo consignado" - REsp 1586910/SP, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, 4ª Turma, julgado em 29/08/2017, DJe 03/10/2017. 2. Agravo interno não provido. (AgInt no REsp 1836620/DF, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 19/10/2020, DJe 26/10/2020) AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. EMPRÉSTIMO BANCÁRIO. DESCONTO EM CONTA CORRENTE ONDE É DEPOSITADO SALÁRIO. LIMITAÇÃO EM 30% DOS VENCIMENTOS.AUSÊNCIA DE ATO ILÍCITO. REEXAME DE PROVAS. SÚMULA 7/STJ. 1. A jurisprudência desta Corte orienta que são lícitos os descontos em conta corrente autorizados para pagamento de prestações contratadas com a instituição financeira, sendo indevida a aplicação analógica do limite legal aos descontos relativos a empréstimo consignado e que, em princípio, não há dano moral ou repetição de indébito caso as instâncias ordinária tenham limitado os descontos. 2. Caso em que o Tribunal de origem entendeu não configurado ato ilícito passível de reparação. A reforma do acórdão recorrido, no ponto, requer incursão nos elementos fático-probatórios do processo, o que é inviável em recurso especial (Súmula 7 do Superior Tribunal de Justiça - STJ). 3. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt no AREsp 1662754/DF, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 28/09/2020, DJe 01/10/2020) Neste E. TRF da 3ª Região, a jurisprudência vai na mesma esteira (grifei): CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATOS BANCÁRIOS. APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. NÃO CABIMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE LIMITAÇÃO DAS PRESTAÇÕES A 30% DOS RENDIMENTOS DO MUTUÁRIO. MULTIPLICIDADE DE CONTRATOS DE EMPRÉSTIMOS CELEBRADOS QUE NÃO SE SUBMETEM AO REGRAMENTO DA LEI 1.046/1950. COBRANÇA DE JUROS REMUNERATÓRIOS EM VALORES ABUSIVOS. NÃO OCORRÊNCIA. CONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 5º. DA MP 2.170-36/01. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. ÔNUS DA AUTORA. IMPOSSIBILIDADE DE EXCLUSÃO DA COBRANÇA DOS PRÊMIOS DE SEGURO. 1. A aplicação da Lei nº 8.078/1990 (Código de Defesa do Consumidor) aos contratos bancários é questão superada no âmbito dos Tribunais Superiores. O Superior Tribunal de Justiça já firmou entendimento no sentido de que as instituições financeiras, como prestadoras de serviços especialmente contemplados no artigo 3º, §2º, estão submetidas às disposições da lei consumerista, editando a Súmula n° 297: "o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras". 2. Inobstante a previsão do art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor, considerando tratar-se de questão eminentemente de direito, cuja solução prescinde da produção de prova, e estando presentes elementos suficientes para o deslinde da causa, não há de se falar em inversão do ônus da prova. 3. Conforme dicção do art. 21 da Lei nº 1.046/1950, a soma das consignações para pagamento de empréstimos não pode exceder 30% da remuneração do devedor. 4. Caso dos autos em que foram celebrados diversos tipos de contratos de mútuo, que não são de desconto em folha, mas crédito direto ao consumidor e empréstimo pessoal com cláusula de alienação fiduciária, sendo realizado os descontos diretamente na conta corrente do mutuário, e por essa razão não encontram limitação a 30% de seus rendimentos. 5. Os descontos feitos em folha de pagamento que efetivamente se referem a empréstimos consignados não atingem o limite de 30% do total da remuneração bruta do mutuário, ou mesmo do benefício previdenciário recebido por ele através do INSS. 6. O extrato bancário acostado aos autos demonstra que existem vários descontos relativos a outras despesas que não decorrem de empréstimos consignados em folha de pagamento, não podendo ser computados na aferição da limitação percentual porque tratam de outro tipo de transação. 7. A parte autora se enquadra no superendividamento ativo consciente, não demonstrando situação de insolvência imposta por condições alheias à sua vontade, tampouco existindo indícios de imprudência na contratação dos inúmeros empréstimos, cabendo anotar que o mutuário teve condições de avaliar o impacto financeiro dos descontos em sua renda mensal e celebrou os contratos por sua livre e espontânea vontade. 8. Conforme assinalado pelo Supremo Tribunal Federal na ADIn 2.591-DF (DJ 29/09/2006, p. 31), as instituições financeiras submetem-se à disciplina do Código de Defesa do Consumidor, exceto quanto à "definição do custo das operações ativas e a remuneração das operações passivas praticadas na exploração da intermediação de dinheiro na economia". Em outras palavras, a definição da taxa de juros praticada pelas instituições financeiras não pode ser considerada abusiva com apoio no CDC. E as instituições financeiras não estão sujeitas à limitação da taxa de juros, conforme entendimento de há muito firmado pelo Supremo Tribunal Federal na Súmula 596. 9. No caso dos autos, não se verifica qualquer excesso ou abusividade nas cláusulas contratuais que fixam inicialmente os juros remuneratórios. Não há nos autos nada que indique que se trata de taxa que destoa das efetivamente praticadas no Sistema Financeiro Nacional. 10. No sentido de que a mera estipulação de juros contratuais acima de 12% (doze por cento) não configura abusividade, que somente pode ser admitida em situações excepcionais, firmou-se a orientação do Superior Tribunal de Justiça. 11. Vale destacar que considerando que ADI 2.316 do STF está ainda em trâmite, impõe-se reconhecer a presunção de constitucionalidade do artigo 5o. da MP 2.170-36/01. 12. Tratando-se de contrato bancário firmado posteriormente à vigência da Medida Provisória nº 1.963-17, de 30/03/2000 (em vigor a partir da publicação no DOU de 31/03/2000), por diversas vezes reeditada, a última sob nº 2.170-36, de 23/08/2001, ainda em vigor por força do artigo 2º da Emenda Constitucional nº 32, de 11/09/2001, é lícita da capitalização dos juros, nos termos do artigo 5º. Precedentes. 13. Ademais, verifica-se que não há como dar guarida a pretensão da apelante de cobrança de juros capitalizados em período inferior a um ano, visto que caberia à parte que faz a alegação demonstrar eventual cobrança, ônus do qual não se desincumbiu. 14. A contratação dos seguros é medida prudente a ser tomada nos contratos de empréstimo, a fim de serem resguardados os interesses de ambas as partes contratante, uma vez que haverá pagamento de indenização caso ocorra sinistro previsto em suas cláusulas contratuais. 15. Não houve por parte da apelante demonstração da existência de abuso na cobrança do prêmio do seguro, ou que tenha havido qualquer discrepância em relação aos valores normalmente praticados no mercado, não merecendo reforma a sentença. 16. Recurso desprovido. (TRF 3ª Região, 1ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL, 5004332-95.2017.4.03.6114, Rel. Desembargador Federal HELIO EGYDIO DE MATOS NOGUEIRA, julgado em 06/11/2019, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 11/11/2019) PROCESSO CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONTRATOS BANCÁRIOS. SUPERENDIVIDAMENTO. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO ANALÓGICA EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS. SÚMULA 603 DO STJ CANCELADA. AGRAVO IMPROVIDO. I - O CDC se aplica às instituições financeiras (Súmula 297 do STJ), mas as cláusulas dos contratos do SFH observam legislação cogente imperando o princípio pacta sunt servanda. A teoria da imprevisão e o princípio rebus sic standibus requerem a demonstração de que não subsistem as circunstâncias fáticas que sustentavam o contrato, justificando o pedido de revisão contratual. Mesmo nos casos em que se verifica o prejuízo financeiro, a nulidade pressupõe a incidência dos termos do artigo 6º, V, artigo 51, IV e § 1º do CDC, sendo o contrato de adesão espécie de contrato reconhecida como regular pelo próprio CDC em seu artigo 54. II - A agravante formula sua pretensão no teor da Súmula 603 do STJ. Ocorre, porém, que a Segunda Seção do STJ, na sessão de 22 de agosto de 2018, ao julgar o REsp 1.555.722-SP, determinou o seu cancelamento. Com efeito, a inadimplência do mutuário acompanhada da contratação de operações em cascata não tem o condão de configurar abuso de poder econômico das instituições financeiras a justificar o impedimento da inclusão do nome do devedor em cadastros de proteção ao crédito ou o prosseguimento da execução das garantias ofertadas aos contratos, por representar exercício regular de direito. III - O consumidor que concentra diversas obrigações, tais como, no caso, financiamento imobiliário, seguro, cheque especial, empréstimo pessoal, na mesma conta em que recebe seu salário, deve zelar para seus vencimentos sejam suficientes para arcar com as obrigações que representam contrapartida a valores a ele disponibilizados. A legislação aplicável aos empréstimos consignados justifica-se tão somente pelo fato de que os descontos são realizados em folha de pagamento. Por essa razão, não se cogita a aplicação analógica para todas as espécies de mútuo ou obrigações assumidas ou impostas ao consumidor o que, no limite, poderia abranger quaisquer operações em que são autorizados débitos automáticos. IV - Ocorre que a retenção de valores pela instituição financeira decorre não apenas de cláusula contratual, mas também da opção do consumidor em manter sua conta corrente ou conta salário a ela vinculada por livre estipulação contratual, quando, ademais, há tempos já se encontra regulada no país a possibilidade de se requerer portabilidade de conta salário. V - Nestas condições, além do instituto da insolvência civil mencionada nos julgados do STJ, o autor tem instrumentos processuais para requerer prestação de contas dos contratos individualizados, ou consignar os valores do contrato que pretende regularizar, o que não se vislumbra no caso em tela. VI - Agravo de instrumento improvido. (TRF 3ª Região, 1ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO, 5014810-40.2018.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal VALDECI DOS SANTOS, julgado em 23/10/2019, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 28/10/2019) APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATOS. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. DESCONTOS REALIZADOS DIRETAMENTE DA CONTA CORRENTE. INAPLICÁVEL O LIMITE MÁXIMO DE 30% DA REMUNERAÇÃO DO SERVIDOR PÚBLICO. PEDIDO IMPROCEDENTE. SENTENÇA MANTIDA. APELAÇÃO DESPROVIDA. 1. O percentual máximo de desconto que pode ser autorizado na remuneração do servidor público civil é de 30% dos vencimentos, admitindo-se mais 5% para despesas relativas a cartão de crédito. 2. Não obstante, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça entende que o limite máximo da remuneração para desconto de parcelas de empréstimos consignados não se aplica aos contratos de mútuo bancário em que o cliente autoriza o débito das prestações em conta corrente. 3. Ademais, o apelante estava consciente de que os novos empréstimos contraídos estavam fora da margem consignável, não lhe sendo lícito pleitear a redução dos descontos em sua remuneração com base justamente na alegação de que ultrapassam o limite de descontos. 4. Admitir o contrário atentaria contra o princípio da boa-fé objetiva, que deve ser observada pelos contratantes na conclusão e na execução dos contratos, nos termos do artigo 422 do Código Civil. 5. Evidenciada sua correção, a sentença deve ser integralmente mantida. 6. Recurso de apelação desprovido. (TRF 3ª Região, PRIMEIRA TURMA, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 2146868, 0055012-35.2013.4.03.6301, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ZAUHY, julgado em 15/10/2019, e-DJF3 Judicial 1 DATA:23/10/2019) Desses arestos depreende-se que a lei zela pela proteção do patrimônio do servidor público nos casos em que cabe à Administração realizar descontos diretamente de suas verbas alimentares, situações em que busca seja preservado ao menos montante que, presume-se, será destinado às suas necessidades básicas. Para além disso, não pode ser conferida proteção extra, sob pena de indevida ingerência na liberdade de contratar de partes maiores e capazes que, por motivos diversos, buscam recursos financeiros além do limite consignável em sua remuneração. Nesse mesmo sentido, impor alterações posteriores invocando-se atenção a limites financeiros não observados pelo próprio servidor no momento de celebrar o contrato de mútuo seria atentar contra a boa-fé objetiva, que deve ser observada pelos contratantes na conclusão e na execução dos contratos, nos termos do artigo 422 do Código Civil. Portanto, na análise de alegada violação aos limites permitidos de descontos decorrentes de parcelas referente a pagamento de mútuo financeiro, há que ser considerada a natureza do contrato e o montante da remuneração disponível do servidor. No caso dos autos, verifica-se dos contracheques da autora que apenas o empréstimo contraído junto à CEF foi feito na modalidade consignado em folha de pagamento. Não há descontos diretamente de sua remuneração para pagamento das parcelas a serem adimplidas junto ao Banco Santander, daí porque se depreende que, com esta instituição financeira, não deve incidir a limitação legal de 30% da remuneração bruta do servidor. A remuneração disponível da autora, entendida como o montante do qual já foram retirados os descontos compulsórios (no presente caso, contribuição previdenciária e imposto de renda) e não considerando as verbas do art. 6º do Decreto nº 8.690/2016 (no presente caso, adicional de insalubridade e plantões), é de R$ 3.239,21. A parcela devida mensalmente à CEF é do valor de R$ 676,34, não atingindo 30% da remuneração da autora; portanto, não há qualquer readequação a ser feita quanto aos valores que devem ser pagos segundo esse contrato. Por fim, anoto que eventuais outros argumentos trazidos nos autos ficam superados e não são suficientes para modificar a conclusão baseada nos fundamentos ora expostos. Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação. Com fundamento no art. 85, §11, do CPC, majoro em 20% o percentual da verba honorária fixada em primeiro grau de jurisdição, respeitados os limites máximos previstos nesse mesmo preceito legal, e observada a publicação da decisão recorrida a partir de 18/03/2016, inclusive (E.STJ, Agravo Interno nos Embargos de Divergência 1.539.725/DF, Rel. Min. Antônio Carlos Ferreira, 2ª seção, DJe de 19/10/2017). Observe-se o art. 98, § 3º, do CPC, em vista de a parte ser beneficiária de gratuidade. É como voto.
E M E N T A
APELAÇÃO. SERVIDOR PÚBLICO. CONTRATOS BANCÁRIOS. EMPRÉSTIMO COM DESCONTO EM CONTA CORRENTE. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. LIMITAÇÃO 30% OU 35% DA REMUNERAÇÃO. LEI 1046/1950. LEI 8112/90.
- Diferenciam-se as modalidades de empréstimo consignado em folha de pagamento e empréstimo com desconto autorizado em conta corrente, na medida em que no primeiro a parcela referente ao seu adimplemento sequer chega a ser depositada na conta do mutuário, ou seja, o desconto é realizado pela Administração e passado diretamente à instituição financeira mutuante; e no segundo, o mutuante autoriza o débito direto em sua conta da parcela devida mês a mês.
- Os limites consignáveis a que se referem as leis nº 1.046/1950 e 8.112/1990 referem-se apenas à primeira modalidade referida. Esses limites são calculados sobre os rendimentos disponíveis do servidor, nos termos da Lei nº 10.820/2003 e Decreto 8.690/2016.
- A lei zela pela proteção do patrimônio do servidor público nos casos em que cabe à Administração realizar descontos diretamente de suas verbas alimentares. Para além disso, não pode ser conferida proteção extra, sob pena de indevida ingerência na liberdade de contratar de partes maiores e capazes que, por motivos diversos, buscam recursos financeiros além do limite consignável em sua remuneração.
- No caso dos autos, apenas o contrato mantido com a CEF enquadra-se na modalidade consignação em folha de pagamento, incidindo somente sobre ele a limitação legal. Analisando os documentos, entretanto, não se verifica que a parcela contratada sobeje 30% da remuneração da autora
- Apelação desprovida.