Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001659-16.2018.4.03.6108

RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR

APELANTE: COMPANHIA AGRICOLA QUATA

Advogado do(a) APELANTE: ENEIDA VASCONCELOS DE QUEIROZ MIOTTO - SP349138-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001659-16.2018.4.03.6108

RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR

APELANTE: COMPANHIA AGRICOLA QUATA

Advogado do(a) APELANTE: ENEIDA VASCONCELOS DE QUEIROZ MIOTTO - SP349138-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

Cuida-se de mandado de segurança, com pedido de liminar inaudita altera parte, impetrado por COMPANHIA AGRÍCOLA QUATÁ em face de ato do Auditor-Fiscal Chefe da Seção de Orientação e Análise Tributária – SAORT da Delegacia da Receita Federal do Brasil em Bauru-SP e outros, objetivando provimento jurisdicional para determinar à autoridade impetrada o processamento da Manifestação de Inconformidade protocolada administrativamente pela impetrante em face do Despacho Decisório SAORT nº 371/2017, com a remessa dos autos do Processo Administrativo – P.A. nº 13828.000081/98-34 à competente Delegacia da Receita Federal do Brasil de Julgamento. Atribuído à causa o valor de R$ 122.107,33 (cento e vinte e dois mil, cento e sete reais e trinta e três centavos) à data da propositura da ação. (Id 131911399).

Sustentou, em síntese, a existência de ilegalidade e inconstitucionalidade na negativa de seguimento à manifestação apresentada pela impetrante, por meio do Despacho Decisório SAORT nº 019/2018, por entender que a discussão se encontra definitivamente encerrada e não caberia se cogitar na interposição de qualquer outra manifestação na via administrativa (Doc. 04 – fls. 2661/2662 da numeração digital do processo administrativo), ao argumento de que o Parecer Normativo nº 02/2016 retirou a possibilidade de recurso nessa fase do contencioso administrativo.

Afirmou haver um evidente confronto entre os critérios de cálculo entendidos como correto pelo contribuinte e pela autoridade fiscal, o qual deve ser submetido ao contraditório e ao devido processo legal.

Alegou, o impetrante, que a RFB em Bauru/SP se opôs explícita e formalmente ao critério de cálculo do indébito adotado explicitamente pelo acórdão do CARF, transitado em julgado.

E, ainda, que a quantificação de crédito inferior ao que faz jus o contribuinte no momento da liquidação do acórdão do CARF, devido à utilização de critério diverso do determinado pela decisão definitiva, equivale ao próprio indeferimento de parte do crédito, o que, inequivocamente, autoriza o contribuinte a levar a controvérsia às instâncias administrativas superiores, de sorte a estabilizar as divergências conforme o julgado.

Apresentadas informações pela autoridade impetrada.

O MM. Juiz de primeiro grau denegou a segurança, ao entendimento de que a matéria objeto de manifestação na seara administrativa encontrava-se preclusa, considerando que o pedido de revisão de cálculos já foi efetuado na análise da manifestação apresentada na via administrativa, em 23/08/2013 (p. 2067 a 2193 do P.A.), no qual foram utilizados os mesmos argumentos expendidos na manifestação datada de 6/10/2017 (p. 2537 a 2554 do P.A.). Sem honorários. Custas na forma da lei (Id 131911430).

A impetrante interpôs apelação, requerendo o conhecimento e provimento do recurso para anular a sentença recorrida, a fim de que: i) uma nova seja prolatada, após sua intimação para manifestação sobre o fundamento adotado pelo Juízo a quo para denegar a segurança pleiteada, tendo em vista a ofensa ao princípio do contraditório e aos artigos 9º e 10, ambos do CPC/2015, demonstrada no item “02” retro. Pede apelante, ainda, que o presente recurso de apelação seja provido para anular a sentença por desbordar do pedido deduzido no presente mandamus e mostrar-se extra petita, afrontando o disposto nos artigos 2º, 141 e 492, todos do CPC/2015, conforme demonstrado no item “03” retro.

Alternativa e sucessivamente, caso esta Corte entenda pela inocorrência de violação aos referidos preceitos legais, pleiteia a apelante que o presente recurso de apelação seja provido para reformar a sentença apelada a fim de conceder a segurança pleiteada no sentido de assegurar o direito líquido e certo da apelante ao devido processo legal, à ampla defesa e ao contraditório administrativo, determinando à autoridade coatora que dê seguimento ao processamento da manifestação de inconformidade protocolada administrativamente em face do Despacho Decisório SAORT nº 371/2017, com a remessa dos autos de nº 13828.000081/98-34 à competente Delegacia da Receita Federal do Brasil de Julgamento, diante da ilegalidade e inconstitucionalidade da negativa promovida pelo Despacho Decisório SAORT nº 019/2018. Pede, ainda, na hipótese de provimento do presente Recurso de Apelação, que fique expressamente consignado no acórdão a obrigação da União Federal (Fazenda Nacional) restituir a totalidade das custas processuais antecipadas pela apelante, face a aplicação do princípio da sucumbência. (Id 131911501). Acostado documento - Id 131911502 às razões de apelação.

Com contrarrazões da União (Fazenda Nacional), subiram os autos a esta Corte (Id 131911507).

O Ministério Público Federal opinou pelo não provimento da apelação (Id 132081969).

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001659-16.2018.4.03.6108

RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR

APELANTE: COMPANHIA AGRICOLA QUATA

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V O T O

 

 

No caso em exame, a impetrante, ora recorrente, impetrou a presente ação mandamental objetivando determinação judicial para que a impetrada efetue o processamento da alegada manifestação de inconformidade apresentada na seara administrativa - Processo Administrativo nº 13828.000081/98-34 – atinente a pedido de restituição de crédito a título de PIS.

Preliminarmente, não há de se falar em nulidade da r. sentença recorrida, posto que a fundamentação constante do julgado, ainda que fundada em entendimento contrário ao da impetrante, mostrou-se suficiente, e não extra petita, viabilizando a compreensão e propiciando o exercício da ampla defesa pela recorrente, inexistindo ofensa aos artigos 2º, 9º, 10, 141, e 492 do Código de Processo Civil/2015.

Por sua vez, considerando a juntada, pela apelante, de documento novo (Id 131911502), não submetido ao contraditório e ao duplo grau de jurisdição obrigatório, determino o seu desentranhamento.

Passo à apreciação do pedido alternativo feito pela apelante.

Como é cediço, o mandado de segurança é remédio constitucional (art. 5º, LXIX, CF/88 c/c art. 1º da Lei nº 12.016/2009) destinado à proteção de direito líquido e certo contra ato ilegal ou abusivo praticado por autoridade pública.

O cerne da controvérsia, objeto de exame nesta via recursal, cinge-se, portanto, a aferir a existência ou não de ilegalidade ou abuso de poder no ato da autoridade impetrada, porquanto não cabe ao Judiciário adentrar na questão do mérito administrativo, cabendo tão somente examinar o cabimento ou não do processamento da manifestação da recorrente na via administrativa.

Conforme relatado pela impetrante, após longo processo administrativo, em que se discutiu a aplicação do “critério da semestralidade” para fins de restituição de indébito a título de PIS, seu pedido foi definitivamente deferido pelo Segundo Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda (atual Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF), em decisão administrativa transitada em julgado, nos termos do artigo 42, III, do Decreto nº 70.235/1972 (Doc. 04 – fls. 778/788, 800/807 e 851/856 da numeração digital do processo administrativo).

Demonstrou, ainda, a impetrante, que não obstante a decisão administrativa do CARF não haja definido o valor do indébito, explicitando os índices, assegurou a correção do crédito, e fixou alguns critérios de cálculo, a saber (Doc. 04 – fls. 787/788 da numeração digital do processo administrativo):

“Portanto, no caso em questão, o indébito corresponde à diferença entre os valores devidos a título de contribuição ao PIS, aplicado o critério da semestralidade, sem qualquer correção da base de cálculo, em conformidade com o art. 6° da Lei Complementar n° 7/70, e o montante 92,2% dos depósitos convertidos em renda da União nos autos do Processo nº 89.3763-3, que tramitou junto à 5° Vara Federal de Brasília/DF” (cf. fls. 279/283 do P.A.).

Ocorre que, ao prosseguir no cumprimento do acórdão do Segundo Conselho de Contribuintes (Doc. 04 – fls. 1815/1823 da numeração digital do processo administrativo), a Autoridade Coatora não aplicou o segundo critério de cálculo ali definido, qual seja: apurar o indébito com base na diferença entre(a) os valores efetivamente devidos a título de contribuição ao PIS (aplicado o critério da semestralidade) e (b) o montante 92,2% dos depósitos convertidos em renda da União.

Conforme determinou o Segundo Conselho de Contribuintes, a conta do indébito seria:

_92,2% dos depósitos convertidos em renda da União

Valor do PIS efetivamente devido

= Valor do indébito

Contudo, a autoridade coatora apurou o crédito a restituir considerando o valor total depositado pela contribuinte, descontando o valor levantado nos autos do processo judicial (R$ 525.485,49 – fl. 1813 da numeração digital do processo administrativo), para só então descontar o valor efetivamente devido1. A conta ficaria assim:

_100% dos depósitos convertidos em renda da União

_ Valor levantado pela empresa

   Valor do PIS efetivamente devido

= Valor do indébito

Outrossim, conforme alegado pela recorrente, a impetrada também deixou de corrigir plenamente o indébito assegurado à Impetrante mediante a aplicação dos índices previstos na Tabela Única da Justiça Federal, aprovada pela Resolução nº 561/2007 do Conselho da Justiça Federal (atual Resolução nº 134/2010), de observância obrigatória pela Secretaria da Receita Federal do Brasil em razão da norma contida no artigo 19 da Lei nº 10.522/2002 c/c o Ato Declaratório PGFN nº 10/2008.

Conforme se verifica dos autos, a ora apelante apresentou, em 23/08/2013, na fase administrativa de liquidação de indébito, nos autos do Processo Administrativo nº 13828.000081/98-34, pedido de revisão de cálculos, com fulcro no art. 32 do Decreto nº 70.235/72, in verbis:

Art. 32. As inexatidões materiais devidas a lapso manifesto e os erros de escrita ou de cálculos existentes na decisão poderão ser corrigidos de ofício ou a requerimento do sujeito passivo.

Por sua vez, o pedido de revisão de cálculos apresentado pela Impetrante foi deferido parcialmente por meio do Despacho Decisório SAORT nº 371/2017 (Doc. 04 – fls. 2444/2446 da numeração digital do processo administrativo), em que a autoridade coatora procedeu a alguns ajustes na apuração do indébito, que resultaram em um pequeno acréscimo do direito creditório de PIS, remanescendo, contudo, equívocos no critério de cálculos apontado, em dissonância ao decidido no acórdão do CARF transitado em julgado.

Cientificada do referido despacho decisório em 26/09/2017 (Doc. 04 – fl. 2510 da numeração digital do processo administrativo), em 06/10/2017, com fundamento no artigo 74, § 9º, da Lei nº 9.430/1996 e no artigo 120 do Decreto nº 7.574/2011, a requerente, ora apelante, apresentou Manifestação de Inconformidade (Doc. 04 – fls. 2536/2554 da numeração digital do processo administrativo)  por entender que a forma de cálculo apresentada pela autoridade coatora não está de acordo com o que restou decidido pelo Segundo Conselho de Contribuintes (atual CARF), havendo divergência de valores na forma de cálculo apresentada pela impetrada, e implica novo indeferimento, ainda que parcial, do seu pedido de restituição, pois resulta valor menor ao real valor objeto de direito creditório da impetrante, ora recorrente, nos termos do decidido pelo CARF, conforme supramencionado.

In casu, a impetrante, ora apelante, insurge-se quanto ao ato da autoridade impetrada, consubstanciado no Despacho Decisório SAORT nº 019/2018, que negou seguimento à manifestação administrativa apresentada pela ora apelante, em 06/10/2017, em face do Despacho Decisório SAORT nº 371/2017, com a remessa dos autos do Processo Administrativo nº 13828.000081/98-34 à competente Delegacia da Receita Federal do Brasil de Julgamento, sustentando a existência de ilegalidade e inconstitucionalidade na negativa de seguimento promovida pelo Despacho Decisório SAORT nº 019/2018.

Com efeito, a decisão administrativa (Despacho Decisório SAORT nº 371/2017) que deferiu parcialmente o pedido da requerente, nos autos do P.A. nº 13828.000081/98-34, que tem por objeto pedido de restituição de indébito de PIS, ainda que em sede de liquidação, é passível de manifestação de inconformidade pelo interessado, porquanto a diferença na forma de cálculo apresentada em relação ao definido no acórdão administrativo pode eventualmente implicar redução do valor a ser restituído ao interessado, conforme restou demonstrado.

Vale mencionar que, em 23/08/2013, o interessado apresentou pedido de revisão de cálculos com fulcro no art. 32 do Decreto nº 70.235/72; e não manifestação de inconformidade, tratando-se, pois, de requerimentos distintos, à disposição do contribuinte com amparo legal.

Ademais, cumpre ressaltar a garantia constitucional ao contraditório e à ampla defesa ao contribuinte, pilares do devido processo legal administrativo.

Nesse aspecto, norma infralegal não tem o condão de se sobrepor à garantia constitucional prevista no art. 5º, inc. LV, in verbis:

LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;

Outrossim, assim dispõem os artigos 2º, 56 e 57 da Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal:

Art. 2º A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.

(...)

Art. 56. Das decisões administrativas cabe recurso, em face de razões de legalidade e de mérito.

§ 1º O recurso será dirigido à autoridade que proferiu a decisão, a qual, se não a reconsiderar no prazo de cinco dias, o encaminhará à autoridade superior.

§ 2º Salvo exigência legal, a interposição de recurso administrativo independe de caução.

§ 3º Se o recorrente alegar que a decisão administrativa contraria enunciado da súmula vinculante, caberá à autoridade prolatora da decisão impugnada, se não a reconsiderar, explicitar, antes de encaminhar o recurso à autoridade superior, as razões da aplicabilidade ou inaplicabilidade da súmula, conforme o caso. (Incluído pela Lei nº 11.417, de 2006).

Art. 57. O recurso administrativo tramitará no máximo por três instâncias administrativas, salvo disposição legal diversa.

E, ainda, prevê o art. 120 do Decreto nº 7.574, de 29 de setembro de 2011:

Art. 120. É facultado ao sujeito passivo, no prazo de trinta dias, contados da data da ciência da decisão que indeferiu seu pedido de restituição, ressarcimento ou reembolso, apresentar manifestação de inconformidade, junto à Delegacia da Receita Federal do Brasil de Julgamento competente, contra o não reconhecimento do direito creditório (Lei nº 8.748, de 1993, art. 3º , inciso II ; Lei nº 9.019, de 1995, art. 7º , §§ 1º e ).

Portanto, verifica-se que assiste razão à recorrente no tocante ao alegado direito líquido ao processamento da manifestação de inconformidade apresentada em face da decisão administrativa impugnada, em observância aos princípios do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal administrativo.

Ante o exposto, dou provimento à apelação para determinar à autoridade impetrada o processamento e apreciação da manifestação de inconformidade apresentada pelo requerente na via administrativa, devendo a impetrada arcar com o ônus da sucumbência em relação ao ressarcimento das custas recolhidas antecipadamente pela impetrante, ora apelante.

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 



DIREITO TRIBUTÁRIO E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. MANIFESTAÇÃO DE INCONFORMIDADE. DIREITO AO CONTRADITÓRIO E À AMPLA DEFESA. APELAÇÃO PROVIDA.

1. No caso em exame, a impetrante, ora recorrente, impetrou a presente ação mandamental objetivando determinação judicial para que a impetrada efetue o processamento da alegada manifestação de inconformidade apresentada na seara administrativa - Processo Administrativo nº 13828.000081/98-34 – atinente a pedido de restituição de crédito a título de PIS. 

2. Preliminarmente, não há de se falar em nulidade da r. sentença recorrida, posto que a fundamentação constante do julgado, ainda que fundada em entendimento contrário ao da impetrante, mostrou-se suficiente, e não extra petita, viabilizando a compreensão e propiciando o exercício da ampla defesa pela recorrente, inexistindo ofensa aos artigos 2º, 9º, 10, 141, e 492 do Código de Processo Civil/2015.

3. Por sua vez, considerando a juntada, pela apelante, de documento novo (Id 131911502), não submetido ao contraditório e ao duplo grau de jurisdição obrigatório, determino o seu desentranhamento. 

4. Passo à apreciação do pedido alternativo feito pela apelante. 

5. Como é cediço, o mandado de segurança é remédio constitucional (art. 5º, LXIX, CF/88 c/c art. 1º da Lei nº 12.016/2009) destinado à proteção de direito líquido e certo contra ato ilegal ou abusivo praticado por autoridade pública.

6. O cerne da controvérsia, objeto de exame nesta via recursal, cinge-se, portanto, a aferir a existência ou não de ilegalidade ou abuso de poder no ato da autoridade impetrada, porquanto não cabe ao Judiciário adentrar na questão do mérito administrativo, cabendo tão somente examinar o cabimento ou não do processamento da manifestação da recorrente na via administrativa.

7. Conforme relatado pela impetrante, após longo processo administrativo, em que se discutiu a aplicação do “critério da semestralidade” para fins de restituição de indébito a título de PIS, seu pedido foi definitivamente deferido pelo Segundo Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda (atual Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF), em decisão administrativa transitada em julgado, nos termos do artigo 42, III, do Decreto nº 70.235/1972 (Doc. 04 – fls. 778/788, 800/807 e 851/856 da numeração digital do processo administrativo). Demonstrou, ainda, a impetrante, que não obstante a decisão administrativa do CARF não haja definido o valor do indébito, explicitando os índices, assegurou a correção do crédito, e fixou alguns critérios de cálculo, a saber (Doc. 04 – fls. 787/788 da numeração digital do processo administrativo).

8. Ocorre que, ao prosseguir no cumprimento do acórdão do Segundo Conselho de Contribuintes (Doc. 04 – fls. 1815/1823 da numeração digital do processo administrativo), a Autoridade Coatora não aplicou o segundo critério de cálculo ali definido, qual seja: apurar o indébito com base na diferença entre(a) os valores efetivamente devidos a título de contribuição ao PIS (aplicado o critério da semestralidade) e (b) o montante 92,2% dos depósitos convertidos em renda da União. 

9. Contudo, a autoridade coatora apurou o crédito a restituir considerando o valor total depositado pela contribuinte, descontando o valor levantado nos autos do processo judicial (R$ 525.485,49 – fl. 1813 da numeração digital do processo administrativo), para só então descontar o valor efetivamente devido. 

10. Outrossim, conforme alegado pela recorrente, a impetrada também deixou de corrigir plenamente o indébito assegurado à Impetrante mediante a aplicação dos índices previstos na Tabela Única da Justiça Federal, aprovada pela Resolução nº 561/2007 do Conselho da Justiça Federal (atual Resolução nº 134/2010), de observância obrigatória pela Secretaria da Receita Federal do Brasil em razão da norma contida no artigo 19 da Lei nº 10.522/2002 c/c o Ato Declaratório PGFN nº 10/2008.

11. Conforme se verifica dos autos, a ora apelante apresentou, em 23/08/2013, na fase administrativa de liquidação de indébito, nos autos do Processo Administrativo nº 13828.000081/98-34, pedido de revisão de cálculos, com fulcro no art. 32 do Decreto nº 70.235/72, in verbis: Art. 32. As inexatidões materiais devidas a lapso manifesto e os erros de escrita ou de cálculos existentes na decisão poderão ser corrigidos de ofício ou a requerimento do sujeito passivo.

12. Por sua vez, o pedido de revisão de cálculos apresentado pela Impetrante foi deferido parcialmente por meio do Despacho Decisório SAORT nº 371/2017 (Doc. 04 – fls. 2444/2446 da numeração digital do processo administrativo), em que a autoridade coatora procedeu a alguns ajustes na apuração do indébito, que resultaram em um pequeno acréscimo do direito creditório de PIS, remanescendo, contudo, equívocos no critério de cálculos apontado, em dissonância ao decidido no acórdão do CARF transitado em julgado.

13. Cientificada do referido despacho decisório em 26/09/2017 (Doc. 04 – fl. 2510 da numeração digital do processo administrativo), em 06/10/2017, com fundamento no artigo 74, § 9º, da Lei nº 9.430/1996 e no artigo 120 do Decreto nº 7.574/2011, a requerente, ora apelante, apresentou Manifestação de Inconformidade (Doc. 04 – fls. 2536/2554 da numeração digital do processo administrativo)  por entender que a forma de cálculo apresentada pela autoridade coatora não está de acordo com o que restou decidido pelo Segundo Conselho de Contribuintes (atual CARF), havendo divergência de valores na forma de cálculo apresentada pela impetrada, e implica novo indeferimento, ainda que parcial, do seu pedido de restituição, pois resulta valor menor ao real valor objeto de direito creditório da impetrante, ora recorrente, nos termos do decidido pelo CARF, conforme supramencionado.

14. In casu, a impetrante, ora apelante, insurge-se quanto ao ato da autoridade impetrada, consubstanciado no Despacho Decisório SAORT nº 019/2018, que negou seguimento à manifestação administrativa apresentada pela ora apelante, em 06/10/2017, em face do Despacho Decisório SAORT nº 371/2017, com a remessa dos autos do Processo Administrativo nº 13828.000081/98-34 à competente Delegacia da Receita Federal do Brasil de Julgamento, sustentando a existência de ilegalidade e inconstitucionalidade na negativa de seguimento promovida pelo Despacho Decisório SAORT nº 019/2018.

15. Com efeito, a decisão administrativa (Despacho Decisório SAORT nº 371/2017) que deferiu parcialmente o pedido da requerente, nos autos do P.A. nº 13828.000081/98-34, que tem por objeto pedido de restituição de indébito de PIS, ainda que em sede de liquidação, é passível de manifestação de inconformidade pelo interessado, porquanto a diferença na forma de cálculo apresentada em relação ao definido no acórdão administrativo pode eventualmente implicar redução do valor a ser restituído ao interessado, conforme restou demonstrado. 

16. Vale mencionar que, em 23/08/2013, o interessado apresentou pedido de revisão de cálculos com fulcro no art. 32 do Decreto nº 70.235/72; e não manifestação de inconformidade, tratando-se, pois, de requerimentos distintos, à disposição do contribuinte com amparo legal.

17. Ademais, cumpre ressaltar a garantia constitucional ao contraditório e à ampla defesa ao contribuinte, pilares do devido processo legal administrativo.Nesse aspecto, norma infralegal não tem o condão de se sobrepor à garantia constitucional prevista no art. 5º, inc. LV, bem como nos artigos 2º, 56 e 57 da Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, e no art. 120 do Decreto nº 7.574, de 29 de setembro de 2011:

18. Portanto, verifica-se que assiste razão à recorrente no tocante ao alegado direito líquido ao processamento da manifestação de inconformidade apresentada em face da decisão administrativa impugnada, em observância aos princípios do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal administrativo.

19. Apelação provida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, A Turma, por unanimidade, deu provimento à apelação para determinar à autoridade impetrada o processamento e apreciação da manifestação de inconformidade apresentada pelo requerente na via administrativa, devendo a impetrada arcar com o ônus da sucumbência em relação ao ressarcimento das custas recolhidas antecipadamente pela impetrante, ora apelante, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.