APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0023213-40.2010.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: NEIDE XAVIER DE OLIVEIRA
Advogado do(a) APELADO: ANTONIO FRENEDA NETO - SP229922
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0023213-40.2010.4.03.9999 RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: NEIDE XAVIER DE OLIVEIRA Advogado do(a) APELADO: ANTONIO FRENEDA NETO - SP229922 OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O A Excelentíssima Senhora Juíza Federal convocada Leila Paiva (Relatora): Cuida-se de recurso de apelação interposto pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS - contra r. decisão proferida em demanda previdenciária, não submetida à remessa oficial, que julgou procedente o pedido de pensão por morte pleiteado por Neide Xavier de Oliveira, em face do falecimento de seu companheiro. Foi concedida a tutela antecipatória. A autarquia federal sustenta, em síntese, o seguinte: a) inexistência de prova material da união estável; b) fragilidade da prova oral, pois o depoimento da testemunha Sra. Maria Isabel foi contraditório; c) que a DIB seja fixada na data da citação; d) a aplicação do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com redação introduzida pela Lei nº 11.960/09, no cálculo dos juros de mora e da correção monetária; e) redução da verba honorária por se tratar de demanda de pouca complexidade. Com contrarrazões, vieram os autos a esta E. Corte Regional. É o relatório.
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0023213-40.2010.4.03.9999 RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: NEIDE XAVIER DE OLIVEIRA Advogado do(a) APELADO: ANTONIO FRENEDA NETO - SP229922 OUTROS PARTICIPANTES: V O T O A Excelentíssima Senhora Juíza Federal convocada Leila Paiva (Relatora): DA REMESSA OFICIAL A r. sentença foi publicada em 28/11/2016 (ID 90366054 – p. 20), portanto na vigência do CPC de 2015 (após 18/03/2016), razão pela qual aplica-se o Enunciado Administrativo nº 3, do Colendo Superior Tribunal de Justiça, que dispõe: " Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC". Depreende-se do artigo 496, inciso I, § 3º, inciso I, que apenas as causas cuja condenação alcançar 1.000 (mil) salários mínimos devem ser submetidas à remessa necessária. Não se desconhece que, sob a égide do CPC de 1973, o C. STJ cristalizou o entendimento no sentido de que era obrigatória a remessa necessária na hipótese de sentença ilíquida contra a União e suas autarquias, inclusive o INSS, conforme o precedente emanado do julgamento do Recurso Especial nº 1.101.727/PR, sob a técnica dos repetitivos (Rel. Min. Hamilton Carvalhido, Corte Especial, j. 04/11/2009). Tendo, inclusive, editado a Súmula 490 que estabelece que: "A dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas" (STJ, Corte Especial, j. 28/06/2012). Verifica-se, entretanto, que o C. STJ, aplicando a técnica do overrinding, em homenagem à redação do artigo 496, inciso I, § 3º, inciso I, do CPC de 2015, revisitou o tema anteriormente professado no Recurso Especial nº 1.101.727/PR, quanto às demandas previdenciárias, considerando que as condenações nesses casos, ainda que ilíquidas, regra geral não superam o valor de 1.000 (mil) salários mínimos, concluindo, assim, pela dispensa da remessa necessária. Precedentes: STJ, REsp 1844937/PR, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 12/11/2019, DJe 22/11/2019; TRF 3ª Região, 9ª Turma, Remessa Necessária Cível - 6078868-74.2019.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal GILBERTO RODRIGUES JORDAN, j. 02/04/2020. Nesse diapasão, ainda que aparentemente ilíquida a sentença, resta evidente que a condenação ou o proveito econômico pretendido pela parte autora não excede o novo valor de alçada do CPC de 2015, consistente em mil salários mínimos. Assim sendo, não conheço da remessa oficial. DA PENSÃO POR MORTE A pensão por morte é benefício previdenciário assegurado pelo artigo 201, inciso V, da Constituição da República, consistente em prestação de pagamento continuado. A concessão do benefício, em princípio, depende do reconhecimento da presença de três requisitos básicos: o óbito, a qualidade de segurado do falecido e a dependência econômica em relação a ele na data do falecimento. Do óbito O óbito do Sr. Otávio augusto Omiya ocorrido em 20/08/1999 (ID 90366053 – p. 13). Assim, em atenção ao princípio tempus regit actum, previsto na súmula 340 do Colendo Superior Tribunal de Justiça (STJ), a pensão por morte reger-se-á pela lei vigente na data do falecimento, aplicando-se ao caso as normas dos artigos 16, 26, e 74 a 79, da Lei nº 8.213, de 24/07/1991, com a redação em vigor na data do falecimento. Da qualidade de segurado A concessão do benefício requer a demonstração da qualidade de segurado ou o preenchimento dos requisitos para a concessão da aposentadoria, na forma do artigo 102 da Lei nº 8.213, de 24/07/1991, bem como do teor da súmula 416 do C. STJ: “É devida a pensão por morte aos dependentes do segurado que, apesar de ter perdido essa qualidade, preencheu os requisitos legais para a obtenção de aposentadoria até a data do seu óbito”. (STJ, Terceira Seção, julgado em 09/12/2009, DJe 16/12/2009). Na hipótese, a qualidade de segurado restou comprovada pois o falecido era aposentado por invalidez desde 01/04/1977 (ID 90366053 – p. 20). Da dependência econômica da autora A qualidade de companheira pressupõe a existência de união estável. A união estável é reconhecida constitucionalmente como entidade familiar (art. 226, § 3º da CF) e seus parâmetros estão previstos no artigo 1.723 do Código Civil, que assim dispõe: Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família. Desse modo, a identificação do momento preciso em que se configura a união estável, deve se examinar a presença cumulativa dos requisitos de convivência pública (união não oculta da sociedade), de continuidade (ausência de interrupções), de durabilidade e a presença do objetivo de estabelecer família, nas perspectivas subjetiva (tratamento familiar entre os próprios companheiros) e objetiva (reconhecimento social acerca da existência do ente familiar). Com relação à previdência, o artigo 16, I e § 4º, da Lei nº 8.213/91, estabelece a companheira como beneficiária do segurado, cuja dependência econômica é presumida. Assim, a comprovação da qualidade de companheira do falecido na data do óbito é o suficiente para legitimá-la ao recebimento da pensão por morte, sendo irrelevante a prova da dependência econômica dela. É esse o entendimento do Tribunal da Cidadania: PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. PENSÃO POR MORTE. EXTENSÃO DO BENEFÍCIO À COMPANHEIRA DO FALECIDO. POSSIBILIDADE. COMPROVAÇÃO DE DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. DESNECESSIDADE. PRESUNÇÃO CONFIGURADA. PRECEDENTES DO STJ. (...) 2. Outrossim, extrai-se do acórdão objurgado que o entendimento do Tribunal de origem está em consonância com a orientação do STJ de que a existência de união estável faz presumir à companheira sua dependência econômica quanto ao falecido, legitimando-a à percepção de pensão por morte. (g. m.) 3. Recurso Especial não provido. (REsp 1678887/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 19/09/2017, DJe 09/10/2017) No mesmo sentido, confira-se o julgado desta E. 9ª. Turma: PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. COMPANHEIRA. UNIÃO ESTÁVEL COMPROVADA. CORREÇÃO MONETÁRIA. (...) - A dependência econômica da companheira é presumida, consoante o disposto no art. 16, § 4º, da Lei n. 8.213/1991, mas a existência da união estável deve ser comprovada. (g. m.) - Conjunto probatório apto a demonstrar a existência de união estável na ocasião do óbito. É devido o benefício. (...) (TRF 3ª Região, 9ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5019872-39.2018.4.03.6183, Rel. Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA, julgado em 04/06/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 09/06/2020) DO CASO DOS AUTOS A autora sustenta que conviveu em união estável com o de cujus por cerca de 21 (vinte e um) anos, até o passamento, sendo que da união nasceu um filho do casal. De fato, as provas materiais são frágeis e não logram êxito na demonstração da união estável. Nesse sentido, a demanda de reconhecimento de união estável ajuizada em face do filho Anderson, acompanhada somente da declaração dos padrinhos de batismo e da respectiva certidão (ID 90366053 – p. 16), sem a oitiva de testemunhas, é insuficiente à comprovação da união more uxório. Todavia, consoante ao entendimento do C. Superior Tribunal de Justiça, o início da prova material não é essencial à comprovação da união estável para fins de concessão de pensão por morte, de modo que referida prova pode ser exclusivamente testemunhal. Confira-se: PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. UNIÃO ESTÁVEL COMPROVADA PELA PROVA TESTEMUNHAL. POSSIBILIDADE. ACÓRDÃO RECORRIDO CONTRÁRIO À JURISPRUDÊNCIA DO STJ. RESTABELECIMENTO DA SENTENÇA DE PRIMEIRO GRAU. 1. Na hipótese dos autos, o Tribunal de origem indeferiu o pedido de pensão por morte, porquanto não ficou comprovada a condição de dependente da autora em relação ao de cujus. Asseverou (fl. 160, e-STJ): "As testemunhas arroladas as fls. 81/82 e 103, foram uníssonas em comprovar que a autora vivia em união estável com o de cujus e ele custeava os gastos familiares, porem somente a prova testemunhal é insuficiente para comprovar o alegado". 2. No entanto, o entendimento acima manifestado está em confronto com a jurisprudência do STJ de que a legislação previdenciária não exige início de prova material para a comprovação de união estável, para fins de concessão de benefício de pensão por morte, sendo bastante, para tanto, a prova testemunhal, uma vez que não cabe ao julgador criar restrições quando o legislador assim não o fez.(g. m.) 3. Nesse sentido, os seguintes precedentes: AgRg no REsp. 1.536.974/RJ, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe 18.12.2015; AR 3.905/PE, Terceira Seção, Rel. Min. conv. Campos Marques, DJe 1.8.2013; AgRg no REsp. 1.184.839/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJe 31.5.2010; REsp. 783.697/GO, Sexta Turma, Rel. Min. Nilson Naves, DJU 9.10.2006, p. 372. 4. Recurso Especial de Cleuza Aparecida Balthazar provido para restabelecer a sentença de primeiro grau. Agravo do INSS prejudicado. (REsp 1824663/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/09/2019, DJe 11/10/2019) Em oitiva, as testemunhas asseveraram o seguinte: ID 160364684 – Sra. Maria Isabel: “conhece a autora e o falecido, que eles viviam juntos, por uns 20/ 25 anos, que quando ele morreu não estavam juntos, ele saiu, depois retornou, que quando ele morreu estava morando com ela.” ID 160364685 – Sr. Nicola: “que é cunhado da autora, casado com a irmã dela; não sabe exatamente quanto tempo viveram juntos, mas provavelmente uns 21 anos; que quando conheceu a autora ela já convivia com o falecido; que quando os conheceram eles moravam na capital, depois mudaram para o interior, ...; que eles viviam juntos, eram um casal, que eles não chegaram a se separar, ao que sabe ele se afastava de casa ultimamente, mas voltava; ...; que não foi no enterro dele; diz que ele saia de vez em quando, mas ele voltava; ...; acho que ele saia desorientado; ...; ele ficava dias ausente; ...” ID 160364687 – Sra. Marta: “que é irmã da autora; que conheceu o falecido; que ela morava na casa da avó, era vizinho do autor e acabaram tendo um relacionamento; que eles viveram juntos em São Paulo, depois Jacareí e após em Santa Isabel; ...; continuando juntos, mas as vezes brigavam e ele ia para a mãe dele; “ficava nesse vai e volta”, eram poucos dias; “que as cabeça dos dois não funcionava muito bem”; .. “mas eles não conseguiam se deixar”; ..; para a sociedade eram casados, pois para nós ela era a esposa dele; ...; quando do falecimento eles ficaram numa situação muito difícil, estavam abandonados, ...eu trouxe o filho dela para ficar comigo; ..., que a irmã teve que ser internada e ela foi “buscar o menino”; que eles brigaram e ele foi para a casa da mãe, daí ele sumiu; ...” O caso é peculiar. Depreende-se dos depoimentos que o casal tinha uma convivência conturbada, já que o falecido costumava sair de casa, indo para a casa da genitora, tanto que foi ela quem noticiou a autora o desaparecimento dele. Entretanto, mesmo desconsiderando os depoimentos do Sr. Nicola e da Sra. Marta, em razão da relação de parentesco com a autora, restou evidenciado pelas afirmativas da Sra. Maria Isabel que ele sempre retornava ao lar conjugal, bem como que estavam juntos quando do passamento dele. Desse modo, a autora demostrou a existência de união estável entre o casal, nos moldes do artigo 1.723 do Código Civil, até dia do passamento, encontrando-se, assim, escorreita a concessão do benefício de pensão por morte. DA DATA INICIAL DO BENEFÍCIO Não tendo a autora acostado documento hábil e comprobatório do requerimento administrativo, necessário à fixação da data inicial do benefício (artigo 74, I e II, da Lei nº 8.213/91), ele é devido desde a data da citação, por ser a data em que a autarquia federal tomou ciência da ação. Neste ponto, assiste razão à autarquia federal. DA CORREÇÃO MONETÁRIA Há incidência de correção monetária na forma da Lei n. 6.899, de 08/04/1981 e da legislação superveniente, conforme preconizado pelo Manual de Cálculos da Justiça Federal, consoante os precedentes do C. STF no julgamento do RE n. 870.947 (Tema 810), bem como do C. STJ no julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905). DOS JUROS DE MORA A incidência de juros de mora deve observar a norma do artigo 240 do CPC de 2015, correspondente ao artigo 219 do CPC de 1973, de modo que são devidos a partir da citação, à ordem de 6% (seis por cento) ao ano, até a entrada em vigor da Lei nº 10.406/02; após, à razão de 1% ao mês, por força do art. 406 do Código Civil e, a partir da vigência da Lei nº 11.960/2009 (art. 1º-F da Lei 9.494/1997), de acordo com a remuneração das cadernetas de poupança, conforme determinado na Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947 (Tema 810) e no Recurso Especial Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905). DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS Mantida a condenação do INSS na verba sucumbencial, na forma em que arbitrada, por guardar consonância com os critérios previstos nos parágrafos 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, do CPC/2015. Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação do INSS. É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. COMPANHEIRA. UNIÃO ESTÁVEL COMPROVADA. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. DATA INICIAL DO BENEFICIO. CITAÇÃO.
1. A concessão do benefício, em princípio, depende do reconhecimento da presença de três requisitos básicos: o óbito, a qualidade de segurado do falecido e a dependência econômica em relação a ele na data do falecimento.
2. Demonstrados o óbito e a qualidade de segurado do falecido.
3. A união estável é reconhecida constitucionalmente como entidade familiar (art. 226, § 3º da CF) e seus parâmetros estão previstos no artigo 1.723 do Código Civil.
4. Com relação à previdência, o artigo 16, I e § 4º, da Lei nº 8.213/91, estabelece a companheira como beneficiária do segurado, cuja dependência econômica é presumida.
5. A autora logrou êxito na comprovação da existência de união estável com o falecido, nos moldes do artigo 1.723 do Código Civil, que perdurou até o passamento.
6. Não tendo a autora acostado documento hábil e comprobatório do requerimento administrativo, necessário à fixação da data inicial do benefício (artigo 74, I e II, da Lei nº 8.213/91), ele é devido desde a data da citação, por ser a data em que a autarquia federal tomou ciência da ação.
7. Recurso parcialmente provido.