APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5256408-92.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIO APARECIDO CATALDI
Advogados do(a) APELADO: CARLOS HENRIQUE PINHO BERTOLINO - SP317053-N, DIRCEU APARECIDO CARAMORE - SP119453-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5256408-92.2020.4.03.9999 RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: MARIO APARECIDO CATALDI Advogados do(a) APELADO: CARLOS HENRIQUE PINHO BERTOLINO - SP317053-N, DIRCEU APARECIDO CARAMORE - SP119453-N OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Demanda proposta objetivando a concessão de aposentadoria por idade a trabalhador rural, prevista no art. 143 da Lei n.º 8.213/91. O juízo a quo julgou procedente o pedido formulado, reconhecendo à parte autora o direito ao benefício pretendido, a partir da data do requerimento administrativo. Concedeu a tutela de urgência, determinando a implantação do benefício, “sob pena de aplicação de multa de R$100,00 (cem reais) por dia de descumprimento, até o limite de R$10.000,00 (dez mil reais)”. O INSS apela, requerendo, preliminarmente, o recebimento do recurso em seu duplo efeito. No mérito, pleiteia a reforma da sentença, sustentando, em síntese, o não cumprimento dos requisitos legais necessários à concessão em questão. Se vencido, insurge-se com relação ao termo inicial do benefício e a imposição de multa diária. Ao final, prequestiona a matéria. Com contrarrazões, subiram os autos. É o relatório. THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5256408-92.2020.4.03.9999 RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: MARIO APARECIDO CATALDI Advogados do(a) APELADO: CARLOS HENRIQUE PINHO BERTOLINO - SP317053-N, DIRCEU APARECIDO CARAMORE - SP119453-N OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Requer o INSS, em seu recurso de apelação, a concessão do efeito suspensivo, condicionando eventual implantação de benefício previdenciário após ocorrido o trânsito em julgado. Não lhe assiste razão. A alegação veiculada pelo INSS, concernente ao recebimento da apelação no duplo efeito, não se coloca na hipótese dos autos. A regra geral prevista no caput do art. 1.012 do Código de Processo Civil, segundo o qual “a apelação terá efeito suspensivo”, é excepcionada no § 1.º desse mesmo dispositivo legal, cujo inciso V expressamente determina que, “além de outras hipóteses previstas em lei, começa a produzir efeitos imediatamente após a sua publicação a sentença que confirma, concede ou revoga tutela provisória”. Não impedem, os recursos, a eficácia da decisão, salvo disposição legal ou decisão em sentido diverso, “se da imediata produção de seus efeitos houver risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, e ficar demonstrada a probabilidade de provimento do recurso” (CPC, art. 995, parágrafo único). Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução. APOSENTADORIA POR IDADE (RURAL) O benefício de aposentadoria por idade a trabalhador rural encontra-se disciplinado nos arts. 39, inciso I; 48, §§ 1.º e 2.º; e 143 da Lei n.º 8.213/91. Antes mesmo do advento da Lei de Benefícios, a Lei Complementar n.º 11, de 25 de maio de 1971, que instituiu o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural, em seu art. 4.º dispunha que a aposentadoria seria devida quando se completassem 65 anos de idade, cabendo a concessão do benefício apenas ao respectivo chefe ou arrimo de família (parágrafo único). Por sua vez, de acordo com o art. 5.º da Lei Complementar n.º 16/73, o trabalhador rural deveria comprovar a sua atividade pelo menos nos três últimos anos anteriores à data do pedido do benefício. Referidos dispositivos não foram recepcionados pela Constituição Federal de 1988, que passou para 60 anos, para homens, e 55, para mulheres, a idade mínima exigida para a concessão do benefício (art. 201, § 7.º, inciso II), excluindo a exigência da condição de chefe de família. Além do requisito etário (60 anos, se homem, e 55 anos, se mulher), o trabalhador rural deve comprovar o exercício de atividade rural, mesmo que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do benefício. O dispositivo legal citado deve ser analisado em consonância com o art. 142 da Lei de Benefícios. Não se exige do trabalhador rural o cumprimento de carência (art. 26, inciso III), como o dever de verter contribuição por determinado número de meses, senão a comprovação do exercício laboral durante o período respectivo. Vale dizer: em relação às contribuições previdenciárias, é assente, desde sempre, o entendimento de serem desnecessárias, sendo suficiente a comprovação do efetivo exercício de atividade no meio rural (STJ, REsp n.º 207.425, 5.ª Turma, j. em 21/9/1999, v.u., DJ de 25/10/1999, p. 123, Rel. Ministro Jorge Scartezzini; e STJ, RESP n. 502.817, 5.ª Turma, j. em 14/10/2003, v.u., DJ de 17/11/2003, p. 361, Rel. Ministra Laurita Vaz). Noutro passo, com relação ao art. 143 da Lei n.º 8.213/91, a regra transitória assegurou aos rurícolas o direito de requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos, contados da vigência da referida Lei. Assim, o referido prazo expiraria em 25/7/2006. Entretanto, em relação ao trabalhador rural enquadrado como segurado empregado ou como segurado contribuinte individual, que presta serviços de natureza rural, em caráter eventual, a uma ou mais empresas, sem relação de emprego, o aludido prazo foi prorrogado por mais 2 (dois) anos, estendendo-se até 25/7/2008, em face do disposto na MP n.º 312/06, convertida na Lei n.º 11.368/06. Posteriormente, a Medida Provisória n.º 410/07, convertida na Lei n.º 11.718/08, estabeleceu nova prorrogação para o prazo previsto no art. 143 da Lei n.º 8.213/91, ao determinar, em seu art. 2.º, que “Para o trabalhador rural empregado, o prazo previsto no art. 43 da Lei n.º 8.213/91, de 24 de julho de 1991, fica prorrogado até o dia 31 de dezembro de 2010” (art. 2.º) e, em seu art. 3.º, que “Na concessão de aposentadoria por idade do empregado rural , em valor equivalente ao salário mínimo, serão contados para efeito de carência: I - até 31 de dezembro de 2010, a atividade comprovada na forma do art. 143 da Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991; II - de janeiro de 2011 a dezembro de 2015, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 3 (três), limitado a 12 (doze) meses, dentro do respectivo ano civil; e III - de janeiro de 2016 a dezembro de 2020, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 2 (dois), limitado a 12 (doze) meses dentro do respectivo ano civil”. É de observar-se que, para os empregados rurais e contribuintes individuais eventuais, a regra permanente do art. 48 da Lei n.º 8.213/91 continua a exigir, para concessão de aposentadoria por idade a rurícolas, apenas a comprovação do efetivo exercício de "atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido", consoante §§ 1.º e 2.º do referido dispositivo. Essa comprovação do labor rural, nos termos dos arts. 48 e 143 da Lei de Benefícios, dar-se-á por meio de prova documental, ainda que incipiente, e, nos termos do art. 55, § 3.º, da retrocitada Lei, corroborada por prova testemunhal. Acrescente-se que a jurisprudência de longa data vem atentando para a necessidade dessa conjunção de elementos probatórios (início de prova documental e colheita de prova testemunhal), o que resultou até mesmo na edição do verbete n.º 149 da Súmula da Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:” "A prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário". DO CASO DOS AUTOS O requisito etário restou satisfeito, pois a parte autora completou a idade mínima em 20.08.2015, devendo fazer prova do exercício de atividade rural por 180 meses. Para demonstrar as alegações, juntou documentos, entre os quais destacam-se: - CTPS do autor, com registros de atividades em serviços rurais de 01.07.1985 a 05.08.1985, 01.07.1986 a 30.09.1986, 02.06.1987 a 08.10.1987, 06.06.1988 a 20.09.1988, 16.01.1989 a 06.06.1989, 19.06.1989 a 13.09.1989, 01.11.1989 a 01.05.1990, 18.06.1990 a 15.10.1990, 08.07.1991 a 24.10.1991, 01.08.1992 a 30.09.1992, 01.11.1992 a 24.06.1993, 30.06.2003 a 30.10.2003 e 01.08.2015 a 30.11.2015, bem como atividade urbana de 14.03.1994 a 11.02.2003, na empresa Cooperativa Agrícola Mista do Vale do Mogi Guaçu. - Declaração do Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento – Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA – Superintendência Regional de São Paulo, em nome do autor, constando que “reside na área comunitária n.º 01 do Projeto de Assentamento 2 de janeiro, localizado no Município de Descalvado, Estado de São Paulo, e exerce atividades em regime familiar, é regularmente cadastrado no Programa Nacional de Reforma Agrária – PNRA, desde 28/05/2014”. Cumpre mencionar que o autor e o INSS juntaram aos autos as informações do Sistema CNIS da Previdência Social, constando os registros indicados na CTPS exceto os períodos de 18.06.1990 a 15.10.1990, 08.07.1991 a 24.10.1991 e 01.08.1992 a 30.09.1992, bem como o recebimento de auxílio-doença de 20.07.1995 a 14.07.2002 e 30.07.2002 a 25.10.2002 e o recolhimento como contribuinte Facultativo de 01.12.2004 a 28.02.2005. Esclareça-se que o fato de o requerente possuir registro urbano, conforme revela a CTPS e a consulta acima mencionada, não altera a solução da causa, pois encontra-se acostado aos autos documentos indicando a predominância da atividade rural no período de carência. Insta asseverar que o fato de os vínculos empregatícios de 18.06.1990 a 15.10.1990, 08.07.1991 a 24.10.1991 e 01.08.1992 a 30.09.1992, indicados na CTPS não constar do Sistema CNIS da Previdência Social em nada impede o reconhecimento da veracidade dos registros. Frise-se que as anotações em CTPS gozam de presunção de veracidade juris tantum, devendo o INSS demonstrar a ocorrência de eventual irregularidade para desconsiderá-las. Vale dizer, à autarquia previdenciária cabe provar a falsidade das declarações inseridas na carteira de trabalho da parte autora, ou, em outras palavras, demonstrar a inexistência dos vínculos empregatícios nela constantes. Nesse sentido, já decidiu o Tribunal Regional do Trabalho da 2.ª Região: "Conquanto diga o Enunciado n° 12 do C. TST que as anotações apostas pelo empregador na carteira profissional do empregado não geram presunção "iure et iure", mas apenas "iures tantum", menos certo não é que anotada a carteira profissional do reclamante, inverte-se o ônus da prova incumbindo à reclamada, que reconhece a anotação, fazer prova das alegações da defesa." (RO proc. 95.02950368365; Relator: Braz José Mollica; 1ª Turma; DJ: 27.02.97) "...CTPS. Anotações. Valor probante. A presunção de relatividade quanto aos registros em carteira de trabalho não pode ser dissociada do princípio da condição mais benéfica (...) Se é certo que o erro de fato não gera direito, quando provado, não menos certo é que a condição anotada em CTPS e não infirmada reveste-se do caráter de direito adquirido." (RO proc. 20000587430; Relatora: Wilma Nogueira de Araujo Vaz da Silva; 8ª Turma; DJ: 20.08.2002) E levando-se em conta que, nos termos da alínea "a" do inciso I do artigo 30 da Lei n.º 8.212/91, compete à empresa arrecadar as contribuições previdenciárias dos segurados empregados a seu serviço, descontando-as da respectiva remuneração e repassando-as ao INSS, a que incumbe a fiscalização do devido recolhimento, é de se admitir como efetuadas as arrecadações relativas ao período de trabalho registrado em CTPS, visto que o empregado não pode ser prejudicado por eventual desídia do empregador e da autarquia, se estes não cumpriram as obrigações que lhes eram imputadas. Na linha do exposto é o entendimento firmado pela 8.ª Turma (ApCiv n.º 0031434-12-2010.4.03.9999 – Des. Fed. Newton De Lucca – Julgado em 05/08/2019 – Publicado em 19/08/2019; ApCiv n.º 5003185-82.2018.4.03.9999 – Des. Fed. Diva Malerbi – Julgado em 08/10/2019 – Publicado em 10/10/2019; ApCiv n.º 5001097-47.2018.4.03.6127 – Des. Fed. Tânia Marangoni – Julgado em 09/08/2019 – Publicado em 15/08/2019; ApCiv n.º 0033186-77.2014.4.03.9999 – Des. Fed. Luiz Stefanini – Julgado em 22/07/2019 – Publicado em 05/08/2019). Ressalte-se que o fato de o autor ter recolhido como contribuinte facultativo, conforme a consulta no Sistema CNIS acima mencionada, em nada afasta o trabalho campesino desempenhado, uma vez que os documentos juntados aos autos indicam que o demandante exerceu suas atividades no meio rural. Importante, ainda, acrescentar que tais contribuições servem a preservar a qualidade de segurado e não impedem a concessão do benefício vindicado, tendo sido efetuadas, no caso dos autos, sobre o valor de um salário mínimo. Nesse sentido, o art. 39, inciso II, da Lei n.º 8.213/91, autoriza o segurado especial a realizar recolhimentos previdenciários, como segurado facultativo, o que não afasta a sua condição de rurícola (9.ª Turma: Apelação Cível/SP 5651025-05.2019.4.03.9999 – Relatora: Desembargadora Federal MARISA FERREIRA DOS SANTOS – eDJF3 Judicial 1 02/03/2020; Apelação Cível/SP 5002327-30.2017.4.03.6105 – Relator: Juiz Federal Convocado RODRIGO ZACHARIAS – eDJF3 Judicial 12/07/2019). Cabe ressaltar a existência de prova oral. Na audiência realizada em 04.09.2019, as testemunhas declaram que conhecem a parte autora há bastante tempo e confirmam o alegado labor rural. Conforme restou enfatizado pelo magistrado sentenciante, in verbis: “O autor completou a idade mínima exigida para a obtenção da aposentadoria por idade. Trabalhou como rurícola durante anos, por período superior ao número de meses equivalente à carência do benefício pleiteado, conforme demonstra o início de prova material juntado nos autos, suficiente para demonstrar o vínculo com o ambiente rural, sendo amplamente reforçado pela prova oral colhida sob o crivo do contraditório, que se mostrou coerente e harmônica o bastante para convencer o juízo da presença dos requisitos necessários para a concessão do benefício pretendido. A testemunha Lairte Donizetti, declarou que conhece o autor a 30 anos e moravam próximos. Conta que trabalhou com ele de 2003 a 2015, na Fazenda Calumbi colhendo laranja e carpindo cana. Disse que trabalhou na Fazenda Bocaina, plantando cana, mas nunca trabalhou com carteira assinada. Conta que trabalhava um pouco em cada fazenda, uma ano em cada, três meses, e que trabalhou nesse período todo com o requerente (12 anos). Disse que no período de 2003 a 2015 o autor sempre trabalhou na roça, nunca na cidade, e que antes trabalhou na Cooperativa e depois trabalhavam juntos na roça. Disse que o irmão do autor era turmeiro e levava todos. A testemunha Jose Sebastião de Oliveira Parada, declarou que conhece o autor desde moleque quando eram vizinhos de fazenda. O autor morava na Fazenda Santa Margarida e morava com os pais, faz uns 40 anos. Disse que nunca trabalhou com o autor, sabe que o trabalho no frigorifico, e que de 86 a 87 veio para cidade e o autor já tinha mudado há cerca de 1 ano. Conta que de 2000 para cá o autor morava na cidade e ia trabalhar na roça, como turmeiro em varias fazendas, cortando cana, capinando nas Fazendas Boacaina e Calumbi, que mexia com leite, laranja, gados de criação. Disse que também trabalhavam o irmão e o primo do requerente, e que atualmente o autor mora no assentamento Horto Florestal. Questionado, disse que não tinha registro nas fazendas, só depois de 1985 /1986 que começaram a registrar”. É inconteste o valor probatório dos documentos de qualificação civil, dos quais é possível inferir a profissão exercida pela parte autora, à época dos fatos que se pretende comprovar. E os documentos juntados constituem início de prova material, o que foi corroborado pela prova testemunhal, confirmando a atividade campesina da parte autora. De rigor, portanto, o deferimento do benefício, porquanto comprovado o exercício de atividade rural pelo período de carência legalmente exigido. A aposentadoria corresponde ao valor de um salário mínimo mensal, nos termos do art. 143 da Lei n.º 8.213/91. O termo inicial do benefício previdenciário deve retroagir à data do requerimento administrativo, de acordo com a previsão contida no inciso II do art. 49 da Lei n.º 8.213/91. Na ausência de demonstração do requerimento, o termo inicial deve retroagir à data da citação, ocasião em que a autarquia tomou conhecimento da pretensão. No caso, existe comprovação de requerimento, devendo o termo inicial ser nele fixado. Devida a gratificação natalina, nos termos preconizados no art. 7.º, inciso VIII, da Constituição da República. Quer seja em relação aos juros moratórios, devidos a partir da citação, momento em que constituído o réu em mora; quer seja no tocante à correção monetária, incidente desde a data do vencimento de cada prestação, há que prevalecer tanto o decidido, sob a sistemática da repercussão geral, no Recurso Extraordinário n.º 870.947, de 20/9/2017, sob relatoria do Ministro Luiz Fux, quanto o estabelecido no Manual de Orientação de Procedimentos para Cálculos na Justiça Federal, em vigor por ocasião da execução do julgado, observada a rejeição dos embargos de declaração no âmbito do julgamento em epígrafe, em 03/10/2019. Quanto ao prequestionamento suscitado, saliente-se inexistir contrariedade alguma a legislação federal ou a dispositivos constitucionais. Passa-se a analisar o pedido de afastamento da multa diária. A imposição da multa diária como meio coercitivo para o cumprimento de obrigação de fazer tem respaldo nos arts. 536, § 1.º, e 537 do Código de Processo Civil, dos seguintes teores: “Art. 536. No cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de não fazer, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento, para a efetivação da tutela específica ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente, determinar as medidas necessárias à satisfação do exequente. § 1.º Para atender ao disposto no caput, o juiz poderá determinar, entre outras medidas, a imposição de multa, a busca e apreensão, a remoção de pessoas e coisas, o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva, podendo, caso necessário, requisitar o auxílio de força policial. Art. 537. A multa independe de requerimento da parte e poderá ser aplicada na fase de conhecimento, em tutela provisória ou na sentença, ou na fase de execução, desde que seja suficiente e compatível com a obrigação e que se determine prazo razoável para cumprimento do preceito. § 1.º O juiz poderá, de ofício ou a requerimento, modificar o valor ou a periodicidade da multa vincenda ou excluí-la, caso verifique que: I - se tornou insuficiente ou excessiva; II - o obrigado demonstrou cumprimento parcial superveniente da obrigação ou justa causa para o descumprimento. § 2.º O valor da multa será devido ao exequente. § 3.º A decisão que fixa a multa é passível de cumprimento provisório, devendo ser depositada em juízo, permitido o levantamento do valor após o trânsito em julgado da sentença favorável à parte. § 4.º A multa será devida desde o dia em que se configurar o descumprimento da decisão e incidirá enquanto não for cumprida a decisão que a tiver cominado. § 5.º O disposto neste artigo aplica-se, no que couber, ao cumprimento de sentença que reconheça deveres de fazer e de não fazer de natureza não obrigacional.” Em recentes julgamentos a respeito do tema, o Superior Tribunal de Justiça assim enfrentou o tema: “O Superior Tribunal de Justiça, como guardião da legislação federal e da segurança jurídica, deve zelar pela credibilidade do Poder Judiciário como um todo, dele devendo partir as diretrizes que dão sustento à força cogente das decisões judiciais em qualquer instância, e não servir de inspiração para o desacato premeditado das ordens que emanam desse Poder, cabendo aqui a máxima de que ‘ordem judicial não se discute, se cumpre’. Em um Estado Democrático de Direito, as ordens judiciais não são passíveis de discussão, senão pela via dos recursos cabíveis. O destinatário da ordem judicial deve ter em mente a certeza de que eventual desobediência lhe trará consequências mais gravosas que o próprio cumprimento da ordem, e não a expectativa de redução ou de limitação da multa a ele imposta, sob pena de tornar inócuo o instituto processual e de violar o direito fundamental à efetividade da tutela jurisdicional.” (STJ, REsp 1819069/SC, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, j. 26/05/2020, DJe 29/05/2020184) “A respeito do montante da multa diária, o Superior Tribunal de Justiça possui jurisprudência pacífica no sentido de que o valor das astreintes deve guardar relação de proporcionalidade com o interesse a ser protegido pela prestação da obrigação principal, evitando-se, assim, o desvirtuamento da medida coercitiva, que poderia i) ser mais atrativa ao demandado, por ser a transgressão mais lucrativa que o cumprimento da obrigação (insuficiência da penalidade), ou ii) ser mais vantajosa ao demandante, que enriqueceria abruptamente às custas do réu (penalidade excessiva). Com efeito, a multa cominatória tem por finalidade constranger o devedor a adotar um comportamento tendente à implementação da obrigação, e não servir de compensação pela deliberada inadimplência. Assim, para a apuração da razoabilidade e da proporcionalidade das astreintes, não é recomendável se utilizar apenas do critério comparativo entre o valor da obrigação principal e a soma total obtida com o descumprimento da medida coercitiva, sendo mais adequado, em regra, o cotejamento ponderado entre o valor diário da multa no momento de sua fixação e a prestação que deve ser adimplida pelo demandado recalcitrante. A esse respeito, confiram-se: REsp nº 1.475.157/SC, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, DJe 6/10/2014, e AgRg no AREsp nº 394.283/SC, Rel. Ministro Moura Ribeiro, DJe 26/2/2016. (...) No julgamento do AgInt no AgRg no AREsp nº 738.682/RJ, o Ministro Luis Felipe Salomão, ao discorrer acerca dos parâmetros normalmente admitidos pela jurisprudência desta Corte Superior para fins de fixação da multa cominatória, constatou que, por vezes, eles apresentam certa incompatibilidade: (...) Ao final de seu voto, destacou Sua Excelência que 'a vinculação das astreintes à obrigação principal ou à dimensão econômica do dever, apesar de parâmetro confiável, não é, por óbvio, critério absoluto, sendo apenas um dos elementos a ser levados em conta' (AgInt no AgRg no AREsp 738.682/RJ, Rel. p/ acórdão Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 17/11/2016, DJe 14/12/2016). Nessa mesma ocasião, foram elencados os seguintes parâmetros para a adequada fixação do valor das astreintes: i) valor da obrigação e importância do bem jurídico tutelado; ii) tempo para cumprimento (prazo razoável e periodicidade); iii) capacidade econômica e capacidade de resistência do devedor e iv) possibilidade de adoção de outros meios pelo magistrado e dever do credor de mitigar o próprio prejuízo (duty to mitigate de loss).” (STJ, REsp 1840693/SC, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, j. 26/05/2020, DJe 29/05/2020) Esta 8.ª Turma entende que a multa diária na proporção de 1/30 do benefício atende tanto a intimidação do devedor para a força cogente das decisões judiciais quanto à relação de proporcionalidade com o interesse a ser protegido pela prestação da obrigação principal, sem que se tenha o enriquecimento ilícito da parte, mormente à vista da natureza pública dos valores a serem pagos pelo INSS, não prosperando o pedido de sua exclusão. Considerando que o valor de “multa de R$100,00 (cem reais) por dia de descumprimento, até o limite de R$10.000,00 (dez mil reais)”, a título de astreintes, mostra-se em descompasso com esse entendimento, impõe-se sua redução nos moldes acima delineados, não prosperando, contudo, o pedido de sua exclusão, por atraso injustificado na implantação do benefício. Dessa forma, posto que cabível a imposição de astreintes ao INSS, deve ser fixada o valor da multa diária fixada em 1/30 do valor do benefício. Quanto ao prazo fixado para a implantação do benefício, dispõe o art. 537 do Código de Processo Civil o seguinte: "A multa independe de requerimento da parte e poderá ser aplicada na fase de conhecimento, em tutela provisória ou na sentença, ou na fase de execução, desde que seja suficiente e compatível com a obrigação e que se determine prazo razoável para cumprimento do preceito." Portanto, considerando-se que são normalmente necessários diversos procedimentos administrativos para cumprimento das diversas determinações judiciais, reputa-se razoável o prazo de até 45 (quarenta e cinco) dias, como dispõe o § 5.º, do art. 41-A, da Lei n.º 8.213/91: “§ 5.º O primeiro pagamento do benefício será efetuado até quarenta e cinco dias após a data da apresentação, pelo segurado, da documentação necessária a sua concessão.” Posto isso, dou parcial provimento à apelação, para fixar os critérios de incidência da multa diária, nos termos da fundamentação, supra. É o voto. THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE A TRABALHADOR RURAL. ART. 143 DA LEI N.º 8.213/91. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE DE RURÍCOLA NO PERÍODO ANTERIOR AO REQUERIMENTO. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. ASTREINTES. DESCUMPRIMENTO DE DECISÃO JUDICIAL. OBRIGAÇÃO DE FAZER PELO INSS. MULTA DIÁRIA CORRESPONDENTE A 1/30 DO VALOR DO BENEFÍCIO. ATENDIMENTO AOS FINS DA IMPOSIÇÃO DA MULTA.
- Prevalência da regra geral prevista no caput do art. 1.012 do Código de Processo Civil, porquanto não configuradas as hipóteses previstas no § 1.º do mesmo dispositivo legal.
- A atividade rural deve ser comprovada por meio de início de prova material, aliada à prova testemunhal.
- O conjunto probatório é suficiente para ensejar a concessão do benefício vindicado.
- Reconhecimento da procedência do pedido formulado.
- A imposição da multa diária como meio coercitivo para o cumprimento de obrigação de fazer tem respaldo nos arts. 536, § 1.º, e 537 do Código de Processo Civil. A jurisprudência também afirmou a possibilidade de cobrança de astreintes do INSS.
- Esta 8.ª Turma entende que a multa diária na proporção de 1/30 do benefício atende tanto a intimidação do devedor para a força cogente das decisões judiciais quanto a relação de proporcionalidade com o interesse a ser protegido pela prestação da obrigação principal. Quanto ao prazo fixado para a implantação do benefício, reputa-se razoável o prazo de até 45 (quarenta e cinco) dias, como dispõe o § 5.º, do art. 41-A, da Lei n.º 8.213/91.
- Apelação a que se dá parcial provimento.