Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
11ª Turma

APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0002225-68.2018.4.03.6102

RELATOR: Gab. 38 - DES. FED. FAUSTO DE SANCTIS

APELANTE: CLAUDEMIRO ROSA DE SOUZA

Advogado do(a) APELANTE: RODRIGO CALDANA CAMARGO - SP282710-N

APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
11ª Turma
 

APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0002225-68.2018.4.03.6102

RELATOR: Gab. 38 - DES. FED. FAUSTO DE SANCTIS

APELANTE: CLAUDEMIRO ROSA DE SOUZA

Advogado do(a) APELANTE: RODRIGO CALDANA CAMARGO - SP282710-N

APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS:

 

Trata-se de Apelação interposta por CLAUDEMIRO ROSA DE SOUZA (nascido em 06.10.1963), em face da r. sentença (ID nº 141940649), que julgou PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido de decreto condenatório formulado na denúncia para:

  1. absolver o acusado da prática do crime previsto no art. 29, § 1º, III, da Lei nº 9.605/1998 (manutenção da ave Bicudo-verdadeiro fêmea em cativeiro), com fulcro no art. 386, III, do Código de Processo Penal;

  2. condenar o acusado nas penas dos crimes do art. 29, § 1º, III, da Lei nº 9.605/1998, porém, conceder-lhe o benefício do perdão judicial (art. 29, § 2º, da Lei 9.605/1998);

  3. condenar o acusado nas penas do crime do art. 296, § 1º, III, do Código Penal, à pena de 02 (dois) anos de reclusão, em regime inicial ABERTO, além de 10 (dez) dias-multa, no patamar de 1/3 (um terço) do salário mínimo vigente à época dos fatos, substituída a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, quais sejam, 01 (um) salário mínimo a uma entidade pública ou privada com destinação social, a ser apontada pelo Juízo da Execução Penal à luz dos parâmetros delineados nos §§ 1º a 4º do art. 46 do Código Penal, durante todo o cumprimento da pena.

 

Narra a denúncia (ID nº 141940648) que:

No dia 02 de outubro de 2017, policiais do 4º Batalhão de Policiamento Ambiental compareceram à residência localizada à Alameda 5, nº 1461 A, no bairro Jardim Parisi, na cidade de Orlândia para a fiscalização de criador amadorista de passeriformes devidamente cadastrado no órgão ambiental competente.

Ali, foram recebidos pelo denunciado, criador amadorista de pássaros nativos. Após procedimento de vistoria e fiscalização, verificaram a existência de cinco aves sem anilhas invioláveis. Uma dessas aves, um Bicudo-verdadeiro fêmea, não estava inclusa na relação de passeriformes, sendo dado prazo de 15 dias para regularizá-la. No dia 28 de novembro de 2017, o denunciado apresentou à Polícia Civil relação de passeriforme (fl. 28), todavia sem a alteração exigida.

No dia 2 de outubro de 2017, verificaram, ainda, a existência de uma ave com anilha adulterada. A anilha indicava que a ave era da espécie Tempera-viola, mas, na verdade, era da espécie Trinca-ferro (ver fl. 25 dos autos – Boletim de Ocorrência ambiental). A anilha tinha gravação da numeração fora de alinhamento e estrutura com formato oval e afinamento da parede interna. A anilha tinha bitola interna de 4,57mm, enquanto deveria estar com 3,5mm (ver fls. 17/18 dos autos – relatório técnico da PM).

A ave com anilha adulterada foi depositada na sede do 1º Pelotão da Polícia Ambiental aguardando a perícia. Após o laudo foi destinada para o VITAS (Viveiro Transitório de Aves Silvestres) na cidade de Franca.

As anilhas são fornecidas pelo IBAMA aos criadores autorizados e apresentam inscrições alfanuméricas que identificam aves da fauna silvestre nascidas em cativeiro e mantidas em plantéis regularizados no Cadastro de Criadores de Passeriformes (SISPASS), o que permite ao IBAMA fiscalizar a criação, posse e comercialização dessas aves.

Trata-se de sinais identificadores públicos, colocados na perna dos filhotes entre 5 e 8 dias de vida (existe um diâmetro adequado a cada espécie de ave), não sendo mais possível coloca-los ou retirá-los após esse tempo, sob o risco de causar lesões nos animais.

O laudo pericial de fls. 11/14 comprova que a anilha encontrada no Trinca-ferro, identificado no auto de apreensão de fl. 06, é falsa. Conforme o laudo, foram constatadas adulterações quanto diâmetro interno com 4,57mm, desalinho na gravação dos caracteres, diferentes medidas no diâmetro interno formando um aspecto de afinamento da parede interna em uma das faces da anilha, e formato oval da anilha enquanto o padrão da peça é de circunferência uniforme.

O denunciado, portanto, consciente e voluntariamente, fez uso de um sinal atribuído a entidade de direito público (IBAMA), adulterado. O denunciado, ainda, tinha em cativeiro dois espécimes da fauna silvestre nativa, sem a devida licença do IBAMA (um não constante no relatório de passeriformes e um com anilha adulterada).

 

Diante disso, o Ministério Público Federal denunciou CLAUDEMIRO ROSA DE SOUZA como incurso nas penas do art. 29, § 1º, III, da Lei 9.605/1998 (por duas vezes, em concurso formal) bem como por uma vez no art. 296, § 1º, I, do Código Penal.  

 

A denúncia foi recebida em 05.06.2018 (f. 66- ID nº 141940648).

 

Processado regularmente o feito, sobreveio a r. sentença, cuja baixa em Secretaria deu-se em 06.05.2019 (ID nº 141940649).

 

Em suas razões de Apelação (ID nº 141940649), a defesa de CLAUDEMIRO ROSA DE SOUZA pleiteia: 1) a absolvição nos crimes do art. 296, § 1º, inciso III, do Código de Processo Penal; 2) a redução dos valores fixados no patamar de 1/3 (um terço) do salário mínimo para cada dia multa pela capacidade econômica do Apelante; 3) a não aplicação da pena de serviço comunitário; 4) a não aplicação do pagamento de 10 (dez) dias-multa, tendo em vista que foi condenado à prestação pecuniária; 4) a fixação da pena-base no mínimo legal.  

 

Em suas contrarrazões, o Ministério Público Federal requer o desprovimento da Apelação defensiva (ID nº 141940649).

 

A Procuradoria Regional da República, em seu parecer (ID nº142593463), opina pelo não provimento do recurso defensivo, mantendo-se integralmente a sentença a quo.

 

É o relatório.

À revisão.

 

 

 

 

 

 

 

 

 


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V O T O

 

 

O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS:

 

DA IMPUTAÇÃO

 

Narra a denúncia (ID nº 141940648) que:

No dia 02 de outubro de 2017, policiais do 4º Batalhão de Policiamento Ambiental compareceram à residência localizada à Alameda 5, nº 1461 A, no bairro Jardim Parisi, na cidade de Orlândia para a fiscalização de criador amadorista de passeriformes devidamente cadastrado no órgão ambiental competente.

Ali, foram recebidos pelo denunciado, criador amadorista de pássaros nativos. Após procedimento de vistoria e fiscalização, verificaram a existência de cinco aves sem anilhas invioláveis. Uma dessas aves, um Bicudo-verdadeiro fêmea, não estava inclusa na relação de passeriformes, sendo dado prazo de 15 dias para regularizá-la. No dia 28 de novembro de 2017, o denunciado apresentou à Polícia Civil relação de passeriforme (fl. 28), todavia sem a alteração exigida.

No dia 2 de outubro de 2017, verificaram, ainda, a existência de uma ave com anilha adulterada. A anilha indicava que a ave era da espécie Tempera-viola, mas, na verdade, era da espécie Trinca-ferro (ver fl. 25 dos autos – Boletim de Ocorrência ambiental). A anilha tinha gravação da numeração fora de alinhamento e estrutura com formato oval e afinamento da parede interna. A anilha tinha bitola interna de 4,57mm, enquanto deveria estar com 3,5mm (ver fls. 17/18 dos autos – relatório técnico da PM).

A ave com anilha adulterada foi depositada na sede do 1º Pelotão da Polícia Ambiental aguardando a perícia. Após o laudo foi destinada para o VITAS (Viveiro Transitório de Aves Silvestres) na cidade de Franca.

As anilhas são fornecidas pelo IBAMA aos criadores autorizados e apresentam inscrições alfanuméricas que identificam aves da fauna silvestre nascidas em cativeiro e mantidas em plantéis regularizados no Cadastro de Criadores de Passeriformes (SISPASS), o que permite ao IBAMA fiscalizar a criação, posse e comercialização dessas aves.

Trata-se de sinais identificadores públicos, colocados na perna dos filhotes entre 5 e 8 dias de vida (existe um diâmetro adequado a cada espécie de ave), não sendo mais possível coloca-los ou retirá-los após esse tempo, sob o risco de causar lesões nos animais.

O laudo pericial de fls. 11/14 comprova que a anilha encontrada no Trinca-ferro, identificado no auto de apreensão de fl. 06, é falsa. Conforme o laudo, foram constatadas adulterações quanto diâmetro interno com 4,57mm, desalinho na gravação dos caracteres, diferentes medidas no diâmetro interno formando um aspecto de afinamento da parede interna em uma das faces da anilha, e formato oval da anilha enquanto o padrão da peça é de circunferência uniforme.

O denunciado, portanto, consciente e voluntariamente, fez uso de um sinal atribuído a entidade de direito público (IBAMA), adulterado. O denunciado, ainda, tinha em cativeiro dois espécimes da fauna silvestre nativa, sem a devida licença do IBAMA (um não constante no relatório de passeriformes e um com anilha adulterada).

 

Diante disso, o Ministério Público Federal denunciou CLAUDEMIRO ROSA DE SOUZA como incurso nas penas do art. 29, § 1º, III, da Lei 9.605/1998 (por duas vezes, em concurso formal) bem como por uma vez no art. 296, § 1º, I, do Código Penal. 

 

Com relação à imputação referente à manutenção da ave Bicudo-verdadeiro fêmea em cativeiro sem autorização legal, o que implicaria o acusado no crime previsto no art. 29, § 1º, III, da Lei nº 9.605/1998, ressalte-se que houve a absolvição do acusado pelo r. juízo sentenciante, com fulcro no art. 386, III, do Código de Processo Penal, o que não foi impugnado pelo Ministério Público Federal.  

 

Assim, passo à análise das matérias devolvidas referentes exclusivamente à condenação de CLAUDEMIRO ROSA DE SOUZA quanto aos delitos art. 29, § 1º, III, da Lei nº 9.605/1998 e do art. 296, § 1º, III, do Código Penal exclusivamente relacionados à ave Trinca-ferro, que ostentava em seu tarso a anilha IBAMA OA 3,5 271302.

 

DA MATERIALIDADE DOS DELITOS

 

A materialidade delitiva tanto do delito ambiental como do crime de falsificação restou demonstrada pelos seguintes documentos: Boletim de Ocorrência (fl. 03); Auto de Exibição, Apreensão e entrega (fl. 06); Auto de Infração Ambiental (fls. 16/26) e Laudo Pericial referente à anilha OA 3,5 271302 (fls. 11/14), que certificou que a anilha em questão, encontrada no pássaro Trinca-Ferro, apresentava adulterações “à guisa de:  o diâmetro interno com 4,57mm, desalinho na gravação dos caracteres e, também verificou-se diferentes medidas no diâmetro interno, formando um aspecto do afinamento da parede interna em uma das faces da anilha. Por fim, o padrão da peça é de circunferência unifrome, contudo, a estrutura da anilha apresentava-se com formato oval”. Tal anilha, ademais, era originalmente destinada pelo IBAMA para a espécie Temperá-Viola, e não para a espécie Trinca-Ferro, como estava sendo utilizado no pássaro em questão.

 

DA AUTORIA E DO ELEMENTO SUBJETIVO DO DOLO

 

A autoria delitiva atribuída ao réu CLAUDEMIRO, bem como o elemento subjetivo exigido pelos tipos penais, igualmente, restaram demonstrados pelo conjunto probatório carreado aos autos, que reforçaram os fatos descritos na inicial acusatória no sentido de que, de fato, o acusado, com plena consciência de suas ações, CLAUDEMIRO mantinha em sua residência o pássaro Trinca-Ferro com anilha adulterada em seu tarso, gerando, por conseguinte, a manutenção da ave ao arrepio da legislação regulamentar competente.  

 

A esse respeito, a testemunha de acusação Rodolfo Paula Sousa, policial militar que participou da abordagem, ouvido em juízo, confirmou que, na residência do acusado, localizou um Trinca-Ferro com anilha com sinais de adulteração que, ademais, partencia, de fato, a uma ave Temperá-Viola. O policial explicou que tal anilha estava vinculada ao cadastro técnico de CLAUDEMIRO junto ao IBAMA e, como criador amador, cabia ao réu, ao adquirir a ave de outra pessoa, fazer o devido registro no sistema e verificar a espécie vinculada à anilha no prazo de 30 (trinta) dias. Acrescentou, ainda, que as duas espécies (Trinca-ferro e Temperá-viola) tem certa semelhança especialmente de coloração, diferenciando-se pelo formato do bico e pelo tamanho, mas que, para quem conhece aves, a diferença é notória.

 

As testemunhas de defesa, por sua vez, não acrescentaram nada de relevante quanto ao caso em específico, aduzindo apenas que também são criadores amadores e não sabiam a diferença entre um pássaro Trinca-Ferro e um Temperá-Viola.

 

Em seu termo de declarações perante a autoridade policial, CLAUDEMIRO ROSA DE SOUZA alegou que “os policiais militares foram até sua casa, mediram a anilha da ave e a levaram até esta unidade. Declarou que na época o vendedor disse que não teria problema a anilha com nome de um passarinho diferente do que ele estava levando, e que o processo daria no mesmo, que os dois passarinhso eram quase a mesma coisa. Declarou também que não é um criador de grande porte, apenas achou o passarinho bonito e comprou, não tendo muitos em sua casa (possui cinco pássaros ao todo), assim, declarou não saber sobre as penas aplicadas na adulteração da anilha, ficou sabendo pelos policiais militares. Declara ter comprado de um rapaz que não se recorda o nome, que este sujeito estaria próximo a sua casa com o passarinho e eles negociaram a compra” (fl. 10 – ID n. 141940647). À fl. 27, ratificou sua declaração prestada anteriormente, acrescentando que é cadastrado junto ao IBAMA.

 

Em seu interrogatório judicial, CLAUDEMIRO aduziu que é criador amador há mais de 40 anos e registrado pelo IBAMA desde 1998, e confirmou que, no dia da abordagem policial à sua residência, foi encontrado um pássaro Trinca-Ferro com anilha adulterada. Afirmou, entretanto, que desconhecia a adulteração da anilha de tal ave, que chegou até seu plantel por transferência com outro criador, que conheceu na casa de um colega e cujo nome não se recorda, sendo conhecido apenas como “Barriga”. O acusado afirmou, ainda, categoricamente que acreditou estar adquirindo uma ave Temperá-viola regularizada, não sabendo diferenciar as duas espécies. Por fim, confirmou ter ciência que, como criador pelo IBAMA, tem a obrigação de verificar se o pássaro está regular, porém não o fez no caso em concreto, não percendo que a anilha em questão estava larga do tarso da ave.

 

Ao contrário do alegado, resta nítido que o réu tinha conhecimento da adulteração da anilha em questão. O acusado já atuava há algum tempo como criador amador de pássaros (há 40 anos informalmente e desde 2005 devidamente registrado pelo IBAMA, pelo menos, conforme documento acostado à fl. 31, ou desde 1998, como afirmado por ele em juízo), assim sendo, com conhecimento acima do homem médio. De fato, de acordo com o documento de seu cadastro perante o IBAMA (fls. 33/44), constam, do período de 2006 a 2017, mais de 20 transferências solicitadas e mais de 40 transferências recebidas, o que demonstra a larga experiência do acusado em tais tipos de transações, reforçando que seu conhecimento acerca das exigências e especificidades das anilhas ultrapassava o senso comum, tendo plena consciência de sua responsabilidade enquanto criador amador para a devida regularização das aves perante os órgãos responsáveis.

 

Com efeito, a norma que regulamenta a criação amadora de passeriformes é a Instrução Normativa n.º 10, de 20.09.2011, do IBAMA, vigente à época dos fatos, sendo certo que nos termos do parágrafo 4º do artigo 1º somente os sistemas de controle adotados pelo IBAMA em todo o país serão aceitos para a comprovação da legalidade das atividades de criação, manutenção, treinamentos, exposição, transporte e realização de torneios com passeriformes da fauna silvestre.

 

Os criadores amadores e comerciais de passeriformes deverão manter atualizados os seus dados e do seu plantel por meio do SISPASS, disponível na rede mundial de computadores, no endereço eletrônico www.IBAMA.gov.br, cujo objetivo é a gestão das informações referentes às atividades de manutenção e criação de passeriformes, sendo de responsabilidade do criador as informações ali inseridas (artigo 33 da IN n.º 10, de 20.09.2011).

 

Nestes termos, ao manter os pássaros com anilhas adulteradas ou falsificadas sem examinar a adequação e a regularidade de sua procedência e tampouco buscar regularizá-los perante a administração ambiental, incorreu conscientemente no uso espúrio dos respectivos sinais identificadores. Como bem apontou o Ministério Público Federal, em seu parecer, como criador habilitado deveria, sob qualquer ótica, ter verificado a origem legal do pássaro e o seu regular cadastro perante o IBAMA. Assim, se o recorrente se dispôs a criar pássaros e habilitou-se perante o IBAMA para tanto, tinha a obrigação de instruir-se acerca do procedimento a ser adotado e tomar as devidas cautelas no momento de adquirir pássaros, sobretudo acerca da situação das aves perante o órgão fiscalizador.

 

Ressalte-se que, de acordo com o documento do IBAMA acostado às fls. 33/44 (ID n. 141940647), a ave em questão encontrava-se no plantel do acusado desde 23.01.2016, o que lhe dava tempo mais que suficiente para verificar adequadamente se a anilha e a transferência haviam sido feitas de maneira regular pelo antigo criador.

 

Inclusive, o apelante não apresentou qualquer explicação concreta sobre a identidade da pessoa com a qual adquiriu a ave com a anilha em questão, e, inclusive, apresentou versões contraditórias em sede policial e em juízo acerca de como teria conhecido tal pessoa. De fato, chama atenção também que, apesar do teor do relato do acusado no sentido de que desconhecia a pessoa que lhe cedeu a anilha OA 3,5 271302 adulterada, quando da análise do documento de seu plantel do IBAMA (fls. 33/44 – ID n. 141940647) é possível verificar-se que tal anilha foi proveniente do criador Mauro Cesar Sorati. E, ademais da transferência da ave relacionada aos presentes fatos, verifica-se a existência de várias outras transferências recebidas pelo réu advindas da mesma pessoa, desde o ano 2007, demonstrando, assim, regularidade no vínculo entre ambos.

 

Diante disso, não tendo o réu buscado comprovar, sequer convocando como testemunha de defesa a pessoa de Mauro Cesar Sorati, ou qualquer outra forma de comprovação que afastasse a irregularidade da aquisição da ave silvestre, tais como notas fiscais da compra ou provas de que a ave já foi adquirida anilhada, razão pela qual não se desincumbiu do ônus que lhe cabia, nos termos do art. 156 do Código de Processo Penal.

 

Nesse sentido colaciono os seguintes julgados:

PENAL. PROCESSO PENAL. ART. 296, § 1º, I, DO CÓDIGO PENAL. ART. 29, § 1º, III, DA LEI N. 9.605/98. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. DOSIMETRIA. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.

Materialidade e autoria comprovadas mediante prova documental.

O dolo da conduta exsurge da própria condição de criador do réu, a quem é dado o conhecimento da obrigação de registrar os pássaros em seu plantel e de tê-los anilhados para controle do IBAMA. Anoto que a defesa não fez prova em sentido contrário.

Reformada a dosimetria da pena para afastar os antecedentes penais e substituir a pena de prestação pecuniária.

(TRF3, ACR 00084674120124036106/SP, Rel. Desembargador Federal André Nekatschalow, QUINTA TURMA julgado em 11/04/2016)

 

PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ADULTERAÇÃO DE SELO OU SINAL PÚBLICO. CRIME AMBIENTAL. FAUNA SILVESTRE. PRESCRIÇÃO. CONSUNÇÃO INOCORRENTE. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO. DOSIMETRIA DA PENA.

1. Considerando-se que a prescrição da pretensão punitiva incide sobre cada crime isoladamente (CP, art. 119), as penas aplicadas prescrevem, respectivamente, em 4 (quatro) anos e em 3 (três) anos, nos termos do art. 109, V e VI, do Código Penal. Assim, tendo transcorrido período de tempo superior a 3 (três) anos entre a data da publicação da sentença penal condenatória (24.08.2016) e o presente momento, operou-se a prescrição da pretensão punitiva estatal pela pena aplicada para crime do art. 29, § 1º, III, da Lei nº 9.605/98.

2. Os delitos imputados ao acusado tutelam bens jurídicos diversos e decorrem de condutas igualmente diversas, não se podendo falar em absorção de um crime pelo outro. Além disso, para a manutenção irregular de espécimes silvestres, a falsificação ou adulteração de anilhas não é essencial, razão pela qual o delito previsto no art. 296, § 1º, I do Código Penal não exaure a sua potencialidade lesiva na prática de guarda de espécime silvestre sem a devida autorização, até porque tem pena mais grave do que aquela prevista para o crime ambiental. Princípio da consunção não aplicável. Precedentes da Turma.

3. A conduta de falsificar, adulterar ou alterar anilhas amolda-se ao tipo penal descrito no art. 296, § 1º, I, do Código Penal, uma vez que se trata de identificação sequenciada fornecida exclusivamente por órgão público, tendo como escopo auxiliar a fiscalização da criação, posse e comercialização de animais silvestres pela autoridade ambiental. Enquadra-se no critério de selo público.

4. Materialidade, autoria e dolo comprovados quanto ao crime previsto no art. 296, § 1º, III, do Código Penal.

5. A tese de falsificação grosseira e, por consequência, de crime impossível é infirmada pelo laudo pericial.

6. O apelante possuía carteira de criador amador de passeriformes, não se tratando, por isso, de pessoa leiga no assunto. Tinha o dever de conferir a regularidade da anilha de cada ave que estava em sua posse e de manter apenas pássaros devidamente anilhados. Quanto à falsificação, foi-lhe imputada a conduta de fazer uso de selo ou sinal falsificado. Criador registrado no IBAMA, agiu, no mínimo, com dolo eventual.

7. Dosimetria da pena mantida.

8. Apelações desprovidas.

(TRF 3ª Região, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, ApCrim - APELAÇÃO CRIMINAL - 70035 - 0000593-41.2014.4.03.6136, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO, julgado em 23/04/2020, e-DJF3 Judicial 1 DATA:07/05/2020)

 

APELAÇÃO CRIMINAL. ART. 29, §1º, III DA LEI 9.605/98. ART. 296, §1º, I DO CP. PRELIMINAR REJEITADA. CARÁTER NEGOCIAL DO ANPP. INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. EMENDATIO LIBELLI. USO DE SINAL PÚBLICO ADULTERADO. DOSIMETRIA. CONCURSO FORMAL. FIXAÇÃO DO PATAMAR DE AUMENTO CONFORME O NÚMERO DE INFRAÇÕES PRATICADAS. RECURSO DESPROVIDO.

O Juízo da 7ª Vara Federal de Ribeirão Preto condenou o réu pela prática do crime do artigo 296, II, do CP, em concurso formal, e pelo cometimento do delito do art. 29, §1º, III, da Lei 9.605198, mas em relação a esse último crime houve a concessão do perdão judicial, nos termos do art. 29, §2º da Lei 9.605/98.

O ANPP - Acordo de Não Persecução Penal foi incluído no Código de Processo Penal, em seu art. 28-A, pela Lei nº 13.964/2019, que entrou em vigor após a prolação da sentença condenatória nos presentes autos, razão pela qual não há nulidade a ser reconhecida.

Nesta Corte, o Ministério Público Federal manifestou-se pela inviabilidade de oferecimento de proposta de ANPP e pugnou pelo regular prosseguimento do feito.

O oferecimento de ANPP não é direito público subjetivo do investigado. Ao revés, tal instituto constitui poder-dever do titular da ação penal, a quem cabe analisar a possibilidade de sua aplicação. Diante disso, não cabe qualquer manifestação desta Corte quanto ao tema, dado esse caráter negocial do ANPP, que pressupõe a atuação da defesa e da acusação (ao Poder Judiciário cabe a verificação das condições e sua viabilidade e, se o caso, a homologação judicial).

Os tipos penais do art. 296 do CP e art. 29 da Lei 9.605/98 tutelam bens jurídicos distintos (o primeiro, a fé pública; o segundo, o meio ambiente ecologicamente equilibrado, destacadamente, a fauna silvestre), além de decorrerem de condutas diversas e autônomas, razão pela qual não se vislumbra, na presente hipótese, a incidência do princípio da consunção.

Extrai-se do laudo pericial que, embora verdadeiras, as anilhas estavam violadas, o que comprova a adulteração. Tais anilhas foram utilizadas em quatro pássaros silvestres em relação aos quais o réu não detinha autorização para criação. As imagens constantes do laudo demonstram claramente a existência de um corte na parede das anilhas.

As anilhas oficiais fornecidas pelo IBAMA aos criadores amadores de pássaros são consideradas sinais públicos de identificação.

No que se refere ao delito do art. 296, II do CP, mostra-se necessária a modificação da capitulação jurídica atribuída na denúncia, para que o réu seja condenado pelo uso de sinal falsificado, conduta que se amolda ao tipo penal do art. 296, §1º, I do CP, e que está devidamente descrita na denúncia, sendo perfeitamente cabível a modificação da classificação jurídica neste momento processual, considerando que o réu se defende dos fatos e não da capitulação jurídica.

Não há óbice em relação à aplicação da emendatio libelli em segundo grau, ainda que em exame de recurso exclusivo da defesa, desde que respeitado o montante final da pena fixada no édito recorrido, sob pena de inaceitável ofensa ao princípio do ne reformatio in pejus, e em linha com a prescrição do artigo 617 do Código de Processo Penal.

O réu possui larga experiência enquanto criador amador de passeriformes registrado no IBAMA há mais de quinze anos, com pleno conhecimento tanto em relação à proibição de adulterar a anilha fornecida pelo IBAMA como de utilizá-la em ave diversa.

Devidamente demonstrados a materialidade, autoria e dolo do apelante em relação à prática delitiva tipificada no artigo 296, §1º, I do CP e no artigo 29, § 1º, III da Lei 9.605/98.

Dosimetria. A fração de aumento decorrente do concurso formal de delitos deve ser fixada considerando a quantidade de infrações penais cometidas.

Apelação desprovida.

(TRF 3ª Região, 11ª Turma, ApCrim - APELAÇÃO CRIMINAL - 0009031-27.2015.4.03.6102, Rel. Desembargador Federal JOSE MARCOS LUNARDELLI, julgado em 30/04/2021, Intimação via sistema DATA: 04/05/2021)

 

PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ART. 296, §1º, INC. I, DO CP. USO DE SINAL FALSIFICADO. ANILHA. ART. 29, §1º, INC. III, DA LEI 9.605/98. CRIME CONTRA FAUNA. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO COMPROVADOS. DOSIMETRIA DAS PENAS MANTIDAS. RESIGNAÇÃO DA DEFESA. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. A materialidade dos crimes restou devidamente demonstrada pelo Auto de Apresentação e Apreensão, pelo Boletim de Ocorrência, pelo Auto de Infração Ambiental, pelo Termo de Entrega de Materiais) e pelo Laudo Pericial, que atestou a falsidade ou adulteração das anilhas encontradas nos pássaros apreendidos em poder do apelante. 2. Autoria e dolo comprovados pelo conjunto probatório carreado nos autos. 3. Sendo o réu um criador de pássaros, tem como dever, além de conferir o número e a regularidade da anilha ao adquirir cada ave, o de registrar todo o seu plantel junto ao IBAMA. Em assim sendo, não é crível que o réu não tivesse o conhecimento de que seus pássaros estavam com anilha falsas e/ou adulteradas e que outros sequer estavam registrados em seu nome. 4. Não há como se acolher a tese de erro de proibição do acusado, de modo a afastar o elemento subjetivo do tipo (o dolo), sobretudo porque o compulsar dos autos revela que o réu já esteve envolvido em fatos similares aos que ora estão sendo julgados, o que foi admitido em juízo por ele próprio, o que evidencia a consciência do réu quanto à ilicitude de sua conduta. 5. Ao não averiguar a regularidade das anilhas dos seus pássaros, tampouco de registrar devidamente a totalidade do seu plantel, pode-se afirmar que, no mínimo, o réu assumiu o risco do resultado, ensejando a condenação, ainda que pela caracterização do dolo eventual. 6. Dosimetria das penas mantidas. 7. Recurso não provido. (ACR 00020071120124036115, DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO FONTES, TRF3 - QUINTA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:25/11/2016)                                    

 

Ademais, é de ressaltar que as fotos constantes à fl. 13 evidenciam que as adulterações são perceptíveis a olho nu, dentre elas o alargamento da anilha quando comparado ao tarso da ave, além do afinamento da parte interna e desalinhamento da gravação da numeração.            

 

Não há que se falar, por conseguinte, em ausência de dolo por parte do acusado.

 

Verifica-se, portanto, que o conjunto probatório foi conclusivo no sentido de que a conduta perpetrada pelo réu amolda-se perfeitamente aos tipos penais delineados nos artigos 29, §1º, III, da Lei n.º 9.605/1998, e art. 296, § 1º, inciso III, do Código Penal.

 

DOSIMETRIA DA PENA

O decisum a quo condenou o acusado à pena definitiva no mínimo legal de 02 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa quanto ao delito do art. 296 do Código Penal, o que deve ser mantido porquanto adequado ao caso em concreto e à míngua de recurso da acusação, em respeito ao princípio da ne non reformatio in pejus.

 

 DA PENA DE MULTA

 

O número de dias-multa deve atender os critérios de proporcionalidade à pena privativa de liberdade, ao passo que o valor de cada dia-multa deve ser fixado dependendo da situação econômica dos condenados.

 

Assim, a condição econômica do réu deve ser devidamente levada em consideração, e, diferentemente do quanto procedido pelo r. juízo sentenciante, entendo não haver razão para a fixação dos dias-multa acima do mínimo legal, uma vez que, ao que consta das informações constantes no Boletim de Ocorrência e seu interrogatório judicial,  o acusado trabalha como metalúrgico e recebe salário mensal de R$ 3.000,00 (três mil reais), montante que não justifica a exasperação do valor do dia-multa.

 

Reduzido, dessa forma, o valor do dia-multa para o mínimo legal de 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo vigente à época dos fatos.

 

DO REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DE PENA

O regime inicial de cumprimento de pena reconhecido foi devidamente o regime ABERTO ante a pena definitiva estabelecida e a primariedade e circunstâncias do caso concreto, nos termos do art. 33, § 2º, alínea “c”, e § 3º do Código Penal.

 

DA SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR PENAS RESTRITIVAS DE DIREITO

 

O r. juízo sentenciante, nos termos do art. 44 do Código Penal, substituiu a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direito, quais sejam, prestação de serviços à comunidade, e pagamento de prestação pecuniária no valor de 01 (um) salário mínimo à entidade pública ou privada com destinação social indicada pelo Juízo das Execuções.

A defesa pleiteia que seja afastada a pena de prestação de serviços à comunidade ou de prestação pecuniária, ao que não assiste razão.

De fato, nos termos do art. 44, § 2º, do Código Penal, “se superior a um ano, a pena privativa de liberdade pode ser substituída por uma pena restritiva de direitos e multa ou por duas restritivas de direitos”. Assim, considerando-se o quantum da pena definitiva do acusado (2 anos de reclusão) agiu acerdatamente o r. juízo sentenciante ao substituir a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direito, que devem ser mantidas em seus exatos termos.

Ademais, com relação ao valor fixado para a prestação pecuniária, verifica-se que esta foi fixada no mínimo legal de 01 (um) salário mínimo, em conformidade com as circunstâncias do caso em concreto e com a condição econômica do acusado.

 

DISPOSITIVO

 

Ante o exposto, voto por DAR PARCIAL PROVIMENTO à Apelação de CLAUDEMIRO ROSA DE SOUZA, tão somente para  reduzir o valor do dia-multa para o mínimo legal de 1/30 (um trinta avos), restando sua definitiva fixada em pena de 02 (dois) anos de reclusão, em regime inicial ABERTO, e o pagamento de 10 (dez) dias-multa, cada qual no mínimo legal, mantendo-se, no mais, a sentença a quo, inclusive no que se refere à substituição da pena corporal.

 

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

PENAL. PROCESSUAL PENAL. ART. 29, § 1º, III, DA LEI 9.605/1998. ART. 296, § 1º, III, DO CÓDIGO PENAL. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVA COMPROVADAS. DOLO COMPROVADO. CONDENAÇÃO. DOSIMETRIA DA PENA NO MÍNIMO LEGAL. REGIME INICIAL ABERTO. SUBSTITUIÇÃO DE PENA RESTRITIVA DE DIREITOS. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE. PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA NO VALOR MÍNIMO DE 01 SALÁRIO MÍNIMO. APELAÇÃO DEFENSIVA PARCIALMENTE PROVIDA.

- A materialidade delitiva tanto do delito ambiental como do crime de falsificação restou demonstrada pelos seguintes documentos: Boletim de Ocorrência (fl. 03); Auto de Exibição, Apreensão e entrega (fl. 06); Auto de Infração Ambiental (fls. 16/26) e Laudo Pericial referente à anilha OA 3,5 271302 (fls. 11/14), que certificou que a anilha em questão, encontrada no pássaro Trinca-Ferro, apresentava adulterações “à guisa de:  o diâmetro interno com 4,57mm, desalinho na gravação dos caracteres e, também verificou-se diferentes medidas no diâmetro interno, formando um aspecto do afinamento da parede interna em uma das faces da anilha. Por fim, o padrão da peça é de circunferência unifrome, contudo, a estrutura da anilha apresentava-se com formato oval”. Tal anilha, ademais, era originalmente destinada pelo IBAMA para a espécie Temperá-Viola, e não para a espécie Trinca-Ferro, como estava sendo utilizado no pássaro em questão.

- A autoria delitiva atribuída ao réu, bem como o elemento subjetivo exigido pelos tipos penais, igualmente, restaram demonstrados pelo conjunto probatório carreado aos autos, que reforçaram os fatos descritos na inicial acusatória no sentido de que, de fato, o acusado, com plena consciência de suas ações, CLAUDEMIRO mantinha em sua residência o pássaro Trinca-Ferro com anilha adulterada em seu tarso, gerando, por conseguinte, a manutenção da ave ao arrepio da legislação regulamentar competente.  

- Ao contrário do alegado, resta nítido que o réu tinha conhecimento da adulteração da anilha em questão. O acusado já atuava há algum tempo como criador amador de pássaros (há 40 anos informalmente e desde 2005 devidamente registrado pelo IBAMA, pelo menos, conforme documento acostado à fl. 31, ou desde 1998, como afirmado por ele em juízo), assim sendo, com conhecimento acima do homem médio. De fato, de acordo com o documento de seu cadastro perante o IBAMA (fls. 33/44), constam, do período de 2006 a 2017, mais de 20 transferências solicitadas e mais de 40 transferências recebidas, o que demonstra a larga experiência do acusado em tais tipos de transações, reforçando que seu conhecimento acerca das exigências e especificidades das anilhas ultrapassava o senso comum, tendo plena consciência de sua responsabilidade enquanto criador amador para a devida regularização das aves perante os órgãos responsáveis.

- Com efeito, a norma que regulamenta a criação amadora de passeriformes é a Instrução Normativa n.º 10, de 20.09.2011, do IBAMA, vigente à época dos fatos, sendo certo que nos termos do parágrafo 4º do artigo 1º somente os sistemas de controle adotados pelo IBAMA em todo o país serão aceitos para a comprovação da legalidade das atividades de criação, manutenção, treinamentos, exposição, transporte e realização de torneios com passeriformes da fauna silvestre.

- Os criadores amadores e comerciais de passeriformes deverão manter atualizados os seus dados e do seu plantel por meio do SISPASS, disponível na rede mundial de computadores, no endereço eletrônico www.IBAMA.gov.br, cujo objetivo é a gestão das informações referentes às atividades de manutenção e criação de passeriformes, sendo de responsabilidade do criador as informações ali inseridas (artigo 33 da IN n.º 10, de 20.09.2011).

- Nestes termos, ao manter os pássaros com anilhas adulteradas ou falsificadas sem examinar a adequação e a regularidade de sua procedência e tampouco buscar regularizá-los perante a administração ambiental, incorreu conscientemente no uso espúrio dos respectivos sinais identificadores. Como bem apontou o Ministério Público Federal, em seu parecer, como criador habilitado deveria, sob qualquer ótica, ter verificado a origem legal do pássaro e o seu regular cadastro perante o IBAMA. Assim, se o recorrente se dispôs a criar pássaros e habilitou-se perante o IBAMA para tanto, tinha a obrigação de instruir-se acerca do procedimento a ser adotado e tomar as devidas cautelas no momento de adquirir pássaros, sobretudo acerca da situação das aves perante o órgão fiscalizador.

- Não tendo o réu buscado qualquer forma de comprovação que afastasse a irregularidade da aquisição da ave silvestre, tais como notas fiscais da compra ou provas de que a ave já foi adquirida anilhada, razão pela qual não se desincumbiu do ônus que lhe cabia, nos termos do art. 156 do Código de Processo Penal.

- Não há que se falar, por conseguinte, em ausência de dolo por parte do acusado. Verifica-se, portanto, que o conjunto probatório foi conclusivo no sentido de que a conduta perpetrada pelo réu amolda-se perfeitamente aos tipos penais delineados nos artigos 29, §1º, III, da Lei n.º 9.605/1998, e art. 296, § 1º, inciso III, do Código Penal.

- O decisum a quo condenou o acusado à pena definitiva no mínimo legal de 02 (dois) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa quanto ao delito do art. 296 do Código Penal, o que deve ser mantido porquanto adequado ao caso em concreto e à míngua de recurso da acusação, em respeito ao princípio da ne non reformatio in pejus.

- A condição econômica do réu deve ser devidamente levada em consideração, e, diferentemente do quanto procedido pelo r. juízo sentenciante, entendo não haver razão para a fixação dos dias-multa acima do mínimo legal, uma vez que, ao que consta das informações constantes no Boletim de Ocorrência e seu interrogatório judicial,  o acusado trabalha como metalúrgico e recebe salário mensal de R$ 3.000,00 (três mil reais), montante que não justifica a exasperação do valor do dia-multa.

- O regime inicial de cumprimento de pena reconhecido foi devidamente o regime ABERTO ante a pena definitiva estabelecida e a primariedade e circunstâncias do caso concreto, nos termos do art. 33, § 2º, alínea “c”, e § 3º do Código Penal.

- Nos termos do art. 44, § 2º, do Código Penal, “se superior a um ano, a pena privativa de liberdade pode ser substituída por uma pena restritiva de direitos e multa ou por duas restritivas de direitos”. Assim, considerando-se o quantum da pena definitiva do acusado (2 anos de reclusão) agiu acerdatamente o r. juízo sentenciante ao substituir a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direito, que devem ser mantidas em seus exatos termos.

- Apelação defensiva parcialmente provida.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Primeira Turma, por unanimidade, decidiu DAR PARCIAL PROVIMENTO à Apelação de CLAUDEMIRO ROSA DE SOUZA, tão somente para reduzir o valor do dia-multa para o mínimo legal de 1/30 (um trinta avos), restando sua definitiva fixada em pena de 02 (dois) anos de reclusão, em regime inicial ABERTO, e o pagamento de 10 (dez) dias-multa, cada qual no mínimo legal, mantendo-se, no mais, a sentença a quo, inclusive no que se refere à substituição da pena corporal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.