Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
5ª Turma

APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0008347-11.2006.4.03.6105

RELATOR: Gab. 15 - DES. FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW

APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, DEMETRIUS ELI MODOLO DE SOUZA DIAS

Advogado do(a) APELANTE: CARLOS EDUARDO DELMONDI - SP165200-A

APELADO: DEMETRIUS ELI MODOLO DE SOUZA DIAS, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

Advogado do(a) APELADO: CARLOS EDUARDO DELMONDI - SP165200-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0008347-11.2006.4.03.6105

RELATOR: Gab. 15 - DES. FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW

APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, DEMETRIUS ELI MODOLO DE SOUZA DIAS

Advogado do(a) APELANTE: CARLOS EDUARDO DELMONDI - SP165200-A

APELADO: DEMETRIUS ELI MODOLO DE SOUZA DIAS, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

Advogado do(a) APELADO: CARLOS EDUARDO DELMONDI - SP165200-A
 

 R E L A T Ó R I O

 

Trata-se de recurso de apelação interposto pela acusação e pela defesa do acusado Demetrius Eli Modolo de Souza Dias em face da sentença que:

a) absolveu a acusada Derlane Alves de Oliveira da imputação relativa à prática do delito do art. 1º, I, c. c. o art. 12, I, ambos da Lei n. 8.137/90, com fundamento no art. 386, VII, do Código de Processo Penal;

b) absolveu o acusado Mauro Lepes Guilhem da imputação relativa à prática do delito do art. 1º, I, c. c. o art. 12, I, ambos da Lei n. 8.137/90, com fundamento no art. 386, VII, do Código de Processo Penal;

c) condenou o acusado Demetrius Eli Modolo de Souza Dias a 3 (três) anos, 2 (dois) meses e 26 (vinte e seis) dias de reclusão, em regime inicial aberto, e a 67 (sessenta e sete) dias-multa, no valor unitário de 1 (um) salário mínimo vigente à época dos fatos, pela prática do delito do art. 1º, I, c. c. o art. 12, I, ambos da Lei n. 8.137/90, substituída a pena privativa de liberdade por 2 (duas) restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, por igual período, e prestação pecuniária de 67 (sessenta e sete) salários mínimos, direcionada ao Centro Infantil de Investigações Hematológicas Dr. Domingos A. Boldrini (Id n. 154774854, pp. 1-28).

O Ministério Público Federal recorreu com os seguintes argumentos:

a) a denúncia imputou a Demetrius Eli Modolo de Souza Dias as condutas de, no período de janeiro a setembro de 1999, em continuidade delitiva, de forma consciente e voluntária, na qualidade de sócio-administrador da Jumbo Distribuidora de Combustíveis Ltda., ter suprimido e reduzido tributos federais (IRPJ e CSLL), mediante fraude à fiscalização tributária consistente na inserção de elementos inexatos nos livros contábeis e fiscais da empresa e na prestação de falsas informações nas declarações de imposto de renda pessoa jurídica (DIPJ) relativas aos rendimentos auferidos, oferecendo à tributação valores muito inferiores aos devidos, o que foi objeto do Procedimento Administrativo Fiscal n. 10830.007261/2004-73, que abrangeu não apenas tais trimestres, mas o crédito tributário relativo a todo o ano calendário de 1999 e de 2000;

b) embora o PAF n. 10830.007261/2004-73 tivesse por objeto os anos-calendário de 1999 e 2000, ou seja, oito trimestres (janeiro a março, abril a junho, julho a setembro e outubro a dezembro de 1999 e de 2000), Demetrius foi acusado de praticar sonegação fiscal somente nos três primeiros trimestres de 1999 (janeiro a março, abril a junho e julho a setembro);

c) o MM. Juízo a quo proferiu sentença condenatória, que resultou na aplicação, ao réu Demetrius, da pena de 3 (três) anos, 2 (dois) meses e 26 (vinte e seis) dias de reclusão, substituídos por penas restritivas de direitos, ocorrendo que, a partir do exame de sua fundamentação, verifica-se desconformidade entre a imputação e a condenação, vale dizer, além da condenação pelos fatos imputados a Demetrius na denúncia, este foi condenado também por fatos que não lhe haviam sido imputados correspondentes à totalidade das condutas objeto do PAF n. 10830.007261/2004-73, abrangendo, integralmente, os anos-calendário de 1999 e de 2000;

d) após análise do conjunto probatório, o Ministério Publico Federal constatou que a Demetrius, que saíra da empresa em 20.10.99, eram imputáveis os fatos ocorridos até tal data, envolvendo tão somente os tributos pertinentes aos três primeiros trimestres do ano-calendário de 1999;

e) fixada a imputação, não é dado ao Juízo, salvo diante de novas provas e valendo-se do procedimento previsto no artigo 384 do Código de Processo Penal, estendê-la a fatos não constantes da denúncia, sob pena de nulidade e, sendo assim, considerando que, no presente caso, o Juízo não se valeu de qualquer expediente formal destinado a alargar a imputação e tampouco indicou novas provas que fundamentariam a condenação de Demetrius pelos cinco trimestres restantes, deve ser a sentença reformada, absolvendo-se Demetrius da prática de todas as condutas posteriores a outubro de 1999;

f) parece equivocar-se também o Juízo a quo no que tange à periodicidade da conduta objeto de condenação, pois, conforme imputado na denúncia, a conduta consistia na inserção de elementos inexatos nos livros contábeis e fiscais da empresa e na consolidação de tais informações nas declarações de imposto de renda pessoa jurídica (DIPJ), conjunto de fatos que adquiria relevo trimestralmente, tendo em vista ser esta a periodicidade de pagamento do tributo e, assim, tendo permanecido à frente da empresa durante 3 (três) trimestres, o acusado Demetrius responsabilizou-se pela inserção de informações falsas em livros contábeis ao longo de 9 (nove) meses, reduzindo os tributos devidos em 3 (três) ocasiões distintas, correspondentes ao fechamento de cada um dos trimestres, não tendo razão o Juízo a quo quando considera a periodicidade anual da conduta, o que também merece reforma;

g) também não se concorda com a conclusão do Juízo a quo no que tange ao afastamento do concurso formal, tendo em vista que à unicidade de condutas aliou-se a pluralidade de resultados, consubstanciados na sonegação de múltiplos tributos, merecendo ser reformada a sentença também nesse aspecto, com os reflexos na pena aplicada;

h) na dosimetria das penas do acusado Demetrius, não foi valorada a culpabilidade na fixação da pena-base, o que merece reparo, tendo em vista que Demetrius é empresário experiente, atuante no segmento petrolífero há anos;

i) não é devida a incidência da atenuante da confissão espontânea, pois o acusado Demetrius limitou-se a reconhecer que estava à frente da empresa, mas negou que comandasse o seu setor financeiro, o que demonstra sua intenção de não assumir responsabilidade pelo delito em questão;

j) a soma da quantia sonegada de IRPJ e CSLL nos três primeiros trimestres de 1999, sem juros e sem multa, resulta em R$ 2.115.667,69 (dois milhões, cento e quinze mil, seiscentos e sessenta e sete reais e sessenta e nove centavos), atualizados até 30.11.04, o que enseja a incidência da causa de aumento de pena do art. 12, I, da Lei n. 8.137/90 em proporção mais elevada (Id n. 154774854, pp. 31-39).

A defesa do acusado Demetrius Eli Modolo de Souza Dias recorreu, a seu turno, com os seguintes argumentos:

- Preliminarmente:

a) requer-se seja declarada a nulidade processual, à vista da ilicitude dos elementos informativos que embasaram a ação penal, consistentes na movimentação financeira da empresa Jumbo, obtida por quebra de sigilo bancário, sendo tais informações compartilhadas entre a Receita Federal e o Ministério Público Federal sem a devida autorização judicial;

a’) os dados financeiros do contribuinte, embora possam ser acessados pela União, não podem ser compartilhados do Fisco para outros órgãos do Estado, pois permanecem sob a denominada reserva de jurisdição, o que significa dizer que o alcance dessas informações pelo Ministério Público Federal só pode ser autorizado pelo Poder Judiciário;

a’’) mesmo considerando que a quebra do sigilo bancário do contribuinte pela Receita Federal foi lícita, a utilização desta informação neste processo penal, sem que se tenha havido prévia autorização judicial, é vedada pelo ordenamento pátrio, mormente pelo art. 5.º, LVI, da Constituição da República;

- No mérito:

b) requer-se a absolvição em observância ao princípio in dubio pro reo, considerando a ausência de comprovação mínima da materialidade delitiva;

c) os Processos Administrativo-fiscais n. 10830.007261/2004-73 e 10830.004087/2005-98 foram lavrado com base em presunção e arbitramento fiscal, sendo insuficiente para comprovar a materialidade delitiva, não tendo o Ministério Público indicado a fraude adotada pelo acusado, o que enseja absolvição com fulcro no art. 386, II, do Código de Processo Penal, por não haver prova suficiente da existência do crime;

d) não houve elementos probatórios produzidos em Juízo que corroborassem a existência da suposta fraude alegada pelo Ministério Público e pelo juiz sentenciante, sendo que o Auto de Infração e o Processo Administrativo Fiscal são apenas elementos informativos não submetidos ao contraditório, devendo o acusado ser absolvido nos moldes do art. 386, VII, do Código de Processo Penal, por não haver prova suficiente para a condenação;

e) entendendo-se pela comprovação da materialidade delitiva, deve-se reconhecer a extinção da punibilidade em razão do erro de proibição indireto, ou justificativa putativa, na medida em que o acusado, orientado, tecnicamente, por seu contador e advogado, acreditava agir licitamente, considerando que “existia uma discussão de Direito sobre a incidência do IRPJ e da CSLL nas operações com derivados de petróleo, combustíveis e minerais do País” (Id n. 158759107, p. 22) e que “esses profissionais da área devidamente habilitados adotavam o entendimento da imunidade do IRPJ e da CSLL nas operações com derivados de petróleo e demais combustíveis” (Id n. 158759107, p. 24), isentando-se o réu da pena, com fulcro no §1º do art. 20 do Código Penal;

f) de acordo com o art. 155, § 3º da Constituição da República, apenas o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), o Imposto sobre a Importação (II) e o Imposto sobre a Exportação (IE) poderão incidir sobre operações relativas aos derivados de petróleo e combustíveis do País e esta limitação constitucional ao poder de tributar é o que imporia a não incidência do Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL);

g) ao pretender cobrar o IRPJ e a CSLL sobre o faturamento obtido por meio de atividades imunes a outros impostos, que não o ICMS e os impostos sobre o comércio exterior, a União estaria fora de sua competência, já que seu agir arremete contra o princípio constitucional da rígida discriminação das competências tributárias;

h) não se fale que a Emenda Constitucional n. 31/2001 liberou a União para exigir o IRPJ e a CSLL das distribuidoras de combustíveis e derivados do petróleo, porquanto é pacífico que tais contribuições por não terem a esperada vinculação legal são tidas pela doutrina e jurisprudência como verdadeiros impostos disfarçados;

i) a incerteza quanto ao pagamento ou não do IRPJ e da CSLL é fato comprovado pela instrução probatória deste processo penal, sendo confirmado pelas testemunhas de defesa e, até mesmo, pelo Auditor Fiscal, testemunha arrolada pela acusação, todas elas sob o compromisso da verdade;

j) mantida a condenação, requer-se o reajustamento das penas pela desconsideração dos aumentos decorrentes da causa de aumento de pena do art. 12, I, da Lei n. 8.137/90 e da continuidade delitiva, resultando a pena final de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão com a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos;

k) o suposto dano à coletividade deveria estar pormenorizado e empiricamente demonstrado na sentença condenatória, o que não ocorreu, sendo impossível o aumento de pena com base em mera presunção;

l) não há se falar em continuidade delitiva, tendo em vista que o lançamento do tributo se dá por meio de um único ato, consistente na constituição definitiva do crédito fiscal, havendo crime único;

m) requer-se a redução da pena de multa, cujo arbitramento não foi adequadamente fundamentado e não é condizente com a situação econômica do acusado;

n) pleiteia-se que as intimações sejam endereçadas, exclusivamente, ao subscritor, Dr. Carlos Eduardo Delmondi (Id n. 158759107).

Foram apresentadas contrarrazões recursais pela defesa do acusado Demetrius Eli Modolo de Souza Dias (Id n. 154774866).

Este feito foi inicialmente distribuído à relatoria do Des. Fed. Nino Toldo, da 11ª Turma deste Tribunal (Id n. 155422450), sendo, posteriormente, redistribuído a minha relatoria, em razão do reconhecimento da prevenção, tendo em vista que a precedente ACR n. 0015070-46.2006.4.03.6105, de minha relatoria, e este feito referem-se aos fatos apurados no âmbito do Processo Administrativo-Fiscal n. 10830.004087/2005-98 (Id n. 156249520 e 156645531).

O Ministério Público Federal não apresentou contrarrazões. Conforme decisão do Colegiado do Núcleo Criminal da Procuradoria Regional da República da 3ª Região, recebeu os autos para elaboração de parecer (Id n. 159106658, p. 4).

O Ilustre Procurador Regional da República, Dr. Marcus Vinicius de Viveiros Dias, manifestou-se pelo provimento do recurso de apelação da acusação e pelo desprovimento do recurso de apelação da defesa (Id n. 159106658).

O Ilustre Procurador Regional da República, Dr. Alvaro Luiz de Mattos Stipp, ressaltou que não serão apresentadas contrarrazões recursais, considerando que a decisão emanada da 2ª CCR-MPF possui caráter meramente opinativo e não vinculativo, de modo a preservar a atuação da Procuradoria Regional da República nos estritos termos do princípio do promotor natural, como já reconhecido pelo E. STF (REXTR nº 638.757, Relator Ministro Luiz Fux, 1ª Turma,j. em 09/04/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-078 DIVULG 25-04-2013 PUBLIC 26-04-2013). Acrescentou que a ausência de contrarrazões pela acusação configura mera irregularidade, não constituindo óbice ao julgamento do recurso face a inexistência de prejuízo à defesa. Reiterou o parecer (Id n. 160808015).

É o relatório.

Encaminhem-se os autos à revisão, nos termos regimentais.

 

 

 


APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0008347-11.2006.4.03.6105

RELATOR: Gab. 15 - DES. FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW

APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, DEMETRIUS ELI MODOLO DE SOUZA DIAS

Advogado do(a) APELANTE: CARLOS EDUARDO DELMONDI - SP165200-A

APELADO: DEMETRIUS ELI MODOLO DE SOUZA DIAS, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

Advogado do(a) APELADO: CARLOS EDUARDO DELMONDI - SP165200-A

 
 

 V O T O

 

Imputação. O acusado Demetrius Eli Modolo de Souza Dias, entre outros, foi denunciado pela prática do delito do art. 1º, I, c. c. o art. 12, I, ambos da Lei n. 8.137/90, na forma dos arts. 70 e 71, ambos do Código Penal, pelos seguintes fatos:

 

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, pelo Procurador da República infra-assinado, no exercício de suas atribuições constitucionais e legais, vem, à presença de Vossa Exceliáricia, oferecer DENÚNCIA em face de:

JOSÉ RILDO LIMA FEITOSA, brasileiro, filho de Raimundo Feitosa Sobrinho e Sebastiana Rocha Lima Feitosa, nascido aos 15/07/1958, natural de Santa Cruz do Capibaribe/PE, portador da cédula de identidade RG nº 1.447.328-SSP/PE, CPF nº 211.461.794-72, residente na Av. Trasv QD 23 Conj B Lote 30 Futura, CEP 71.572- 302, Bairro Paranoá, em Brasília/DF;

MAURO LEPES GUILHEM, brasileiro, casado, assistente financeiro, portador da cédula de identidade RG rnº 1.159.068-SSP/PR, CPF nº 280.817.909-00, residente na Rua Celso Camparotti, nº 624, Jardim Okinawa. CEP 13140-900, em Paulínia/SP, telefone: (19) 3888-2123;

DERLANE ALVES DE OLIVEIRA (ou DARLENE ALVES DE OLIVEIRA - fotografia na fl. 492), brasileira, filha de Sebastião Planes de Oliveira e Odete Alves de Oliveira, nascida aos 10/07/1975, natural de Manga/MG, portadora do RG nº M-7.530.798-SSP/MG, CPF nº 965.841.176-00, com endereços conhecidos na Rua Olegário Maciel, nº 1386, CEP 39460-000, Manga/MG, ou na Rua Cedro, nº 481, Centro, CEP 75828-000, Chapadão do Céu/GO;

CARLOS EDUARDO DE CARVALHO MELO, brasileiro, casado, consultor, filho de Emiliano de Carvalho Meio e Leonor de Mattos Meio, portador da cédula de identidade RG nº 7.545.806-8-SSPISP, CPF nº 889.623.268-88, residente na Rua Maria das Dores Leal de Queiroz, nº 695, Jardim Calegari, CEP 13140-000, ou na Rua Dom Francisco de Campos Barreto, nº 108, Vila Brenassi, CEP 13140-490, em Paulínia/SP, tel.: (81) 9692-7177;

PAULO HENRIQUE DA CRUZ ALVES, brasileiro, filho de Hely da Cruz Alves e de Doracy Prado Alves, casado, empresário, portador da cédula de identidade RG nº 3.021.776-4 SSP/SP, residente na Rua Benjamin Zerbato, nº 586, Jardim Alvorada, Santa Rita do Passa Quatro/SP, telefone: (19) 3582-27174;

DEMETRIUS ELI MODOLO DE SOUZA DIAS, brasileiro, filho de Osvaldo de Souza Dias Filho e de Nadir Aparecida Modolo de Souza Dias, portador do RG nº 24.531.925-6-SSPISP, CPF nº 172.806.018-47, com endereços conhecidos na Avenida Goitacazes, nº 318 ou nº 289, Jardim Itapoan; Avenida José Paulino, nº 3645; Rua Javaes, nº 289; e na Rua Silvino de Godoy, nº 545, Jardim Itapuã, todos em Paulínia/SP,

em razão da prática dos seguintes fatos delituosos:

1-) SÍNTESE DAS IMPUTAÇÕES PENAIS

No período de janeiro de 1999 a dezembro de 2000 (anos-calendário de 1999 e 2000), JOSÉ RILDO LIMA FEITOSA, PAULO HENRIQUE DA CRUZ ALVES e DEMETRIUS ELI MODOLO DE SOUZA DIAS, de forma consciente e voluntária, na qualidade de sócios-administradores, cada um deles à época em que esteve na gerência e administração da pessoa jurídica JUMBO DISTRIBUIDORA DE COMBUSTÍVEIS LTDA. (doravante denominada apenas JUMBO), inscrita no CNPJ/MF sob nº 01.825.62610001-08, com sede na Rua José Paulino, nº 807, sala 05, Centro, no município de Paulínia/SP, em continuidade delitiva, suprimiram e reduziram tributos federais (Imposto de Renda Pessoa Jurídica - IRPJ e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL), mediante fraude à fiscalização tributária consistente na inserção de elementos inexatos nos livros contábeis e fiscais da empresa e na prestação de falsas informações nas declarações de imposto de renda pessoa jurídica (DIPJ) relativas aos rendimentos auferidos por ela, oferecendo à tributação valores muito inferiores aos devidos.

JOSÉ RILDO LIMA FEITOSA, DERLANE ALVES DE OLIVEIRA, CARLOS EDUARDO DE CARVALHO MELO e MAURO LEPES GUILHEM, os dois primeiros na qualidade de sócios-administradores e os dois últimos na condição de procuradores/gestores, todos atuando na administração da empresa supracitada, agindo em concurso e com unidade de desígnios, em continuidade delitiva, no período de janeiro de 2001 a dezembro de 2003 (anos-calendário de 2001 a 2003), suprimiram e reduziram tributos federais (Imposto de Renda Pessoa Jurídica - IRPJ, Contribuição para o Programa de Integração Social - PIS/Pasep, Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social - COFINS, Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL e Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI), mediante fraude à fiscalização tributária, ao omitirem do fisco federal receitas decorrentes da atividades da empresa.

2-) DOS FATOS RELATIVOS AO PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL Nº 10830.007291/2004-73 - ANOS-CALENDÁRIO DE 1999 E 2000 (VOLUMES 3 E 4 DO APENSO DE DOCUMENTOS)

A fiscalização tributária em questão em face da JUMBO foi levada a efeito no processo administrativo fiscal nº 10830.007291/2004-73.

No início da ação fiscal, a contribuinte foi intimada a apresentar, em relação aos anos-calendário 1999 e 2000, dentre outros, os Livros Diário e Razão, toda documentação que deu suporte à respectiva escrituração, Livro de Registro de Entrada e Salda, Livro Registro de Inventário e os comprovantes de entrega das Declarações de Informações Econômico-Fiscais (DIPJ) e das Declarações de Débitos e Créditos Tributários Federais (DCTF) (conforme Termo de Início de Fiscalização de fl. 440 do Apenso).

Sob justificativas diversas, apenas parte da documentação acima foi disponibilizada pela fiscalizada. Por meio da análise dos documentos entregues, a Receita Federal constatou que foram inseridos, nos livros contábeis e fiscais da JUMBO, elementos inexatos na escrituração nas operações da empresa com o claro propósito de reduzir a base de cálculo dos tributos devidos, o que levou o órgão fiscal a considerar a escrita contábil e fiscal imprestável para apuração e demonstração do lucro real do período. Foram apontadas as seguintes irregularidades, incoerências e inconsistências na escrituração da empresa, consoante Termo de Verificação Fiscal de fls. 491-502 do Apenso, que passa a fazer parte integrante desta denúncia:

"4.1 que o contribuinte efetuou a escrituração do Livro Diário/Razão, dos fatos contábeis ocorridos nas contas CAIXA, BANCOS C/ MOVIMENTO, COMPRAS MERCADORIAS e VENDAS DE MERCADORIAS à revelia das exigências formais intrínsecas, mais especificamente, efetuou os registros de todas as compras e revendas de mercadorias de forma consolidada no último dia de cada mês, a crédito e débito da conta CAIXA respectivamente, sem a devida discriminação detalhada dos documentos fiscais/faturas/fornecedores vinculados a cada operação e sem a devida observância do rigor cronológico/sequencial exigido no registro dos fatos, de tal forma a resultar, inclusive, saldos credores da conta CAIXA em diversos períodos. Tal procedimento, sem a devida exibição de relatórios/livros auxiliares, inviabiliza a auditoria da evolução/exatidão dos saldos das respectivas contas;

4.1.2 a conta CAIXA apresentou, de forma sucessiva e reiterada ao longo de todos os meses do período de 1999 a 2000, diversos lançamentos de saques em espécie estapafúrdios e infactíveis na prática de serem operacionalizados, chegando, por exemplo, no dia 08/12/99, a quantia de R$ 1.133.930,00 (Banco do Brasil) e R$ 294.568,77 (Banco Itaú), resultando o saldo final neste dia o montante inimaginável de R$ 1.592.802,25 em espécie. Tais fatos, considerados inviáveis, vem corroborar a convicção preliminar desta fiscalização, quanto as fortes inconsistências e incoerências até aqui verificadas nas escritas fiscais/contábeis (fl. 494 do Apenso - grifos do original)

A Receita Federal também analisou as DIPJs dos anos - calendário de 1999 e 2000 (exercícios 2000 e 2001) entregues pela JUMBO (fls. 549- 643 do Apenso) e encontrou falsas informações que resultaram na majoração indevida dos custos e, por conseguinte, prejuízos fictícios à empresa que resultaram na redução indevida das bases de cálculo dos tributos federais devidos.

Dentre as informações falsas apontadas pela fiscalização, constatou-se que o estoque final em 31/12/1998 declarado pela JUMBO na DIPJ 1999/1998 (R$ 73.794,00) é divergente do estoque inicial (01/01/1999) referente ao 1º trimestre/1999 (R$ 897.007,26), acarretando na majoração de estoque inicial de R$ 823.213,26. Outras inconsistências semelhantes foram encontradas de forma contínua nas DIPJs de 1999 e 2000, nas quais a JUMBO, na apuração do "Custo de Mercadorias Revendidas", declara estoque inicial de valor aleatório, sem qualquer vínculo com a evolução histórica dos inventários apurados ao final de cada período antecedente, irregularidades estas detalhadas nas fls. 495-496 do Apenso.

Além disso, a empresa apresentou expressivo saldo na conta CAIXA no encerramento dos dois exercícios, embora tenha apurado prejuízo contábil/fiscal nos dois anos -calendário.

Dessa forma, a Receita Federal recorreu ao arbitramento do lucro de ofício, com base nas receitas de revendas declaradas nas DIPJs e escrituradas nos respectivos Livros Diário de 1999 e 2000, conforme quadros abaixo (reproduzidos nas fis. 500 e 501 do Apenso):

(...)

Dessa forma, restou evidente que os acusados fraudaram o Fisco Federal ao inserirem elementos inexatos nos seus livros contábeis e fiscais (Diário e Razão) e ao prestarem falsas informações nas DIPJs dos anos - calendário de 1999 e 2000, ocultando do Fisco receitas auferidas e forjando resultados negativos com a majoração indevida dos "Custos de Mercadorias Revendidas", sem qualquer critério lógico, ao revel da legislação fiscal, acarretando a redução indevida das bases de cálculo dos tributos federais devidos.

A Delegacia da Receita Federal de Julgamento de Campinas/SP julgou procedentes os autos de infração, apenas reduzindo a multa de ofício de 150% para 75%, decisão esta confirmada pelo 1º Conselho de Contribuintes (fls. 766-770 do Apenso), os quais foram consolidados da seguinte forma:

(...)

De acordo com a Receita Federal, os créditos tributários mantidos foram transferidos para o processo administrativo fiscal nº 10830.004461/2005-55, os quais foram definitivamente constituídos em 19/05/2008 (fl. 833 do Apenso). A Procuradoria da Fazenda Nacional informou que o valor do crédito tributário atualizado é de R$ 31.149.217,689.

A autoria delitiva é certa e recai sobre JOSÉ RILDO LIMA FEITOSA, PAULO HENRIQUE DA CRUZ ALVES e DEMETRIUS ELI MODOLO DE SOUZA DIAS.

De acordo com a 3ª alteração do contrato social da JUMBO (fls. 904-906 do Apenso), em relação ao período desta denúncia, os acusados PAULO HENRIQUE e DEMETRIUS ELI foram sócios -administradores da empresa de janeiro de 1999 a 20 de outubro de 1999, sendo que a administração incumbia a ambos, em conjunto ou isoladamente, encarregados de todas as obrigações contraídas pela empresa, conforme alteração realizada na cláusula oitava do contrato social (fl. 905 do Apenso).

Consoante a 4ª alteração do contrato social (fls. 907-910 do Apenso), arquivada na Junta Comercial de São Paulo em 21/10/1999, os acusados PAULO HENRIQUE e DEMETRIUS ELI se retiraram da sociedade, ingressando em seus lugares o denunciado JOSÉ RILDO LIMA FEITOSA, que permaneceu na qualidade de sócio-gerente pelo restante do período da denúncia, ao lado da empresa INVERSIONES & PETROLEO INC. (off shore constituída nas Ilhas Virgens Britânicas), a qual possuía como procurador CLAUDIO LUIZ FABRI até 29/05/2000, quando então esta função passou a ser ocupada por ANTONIO FERNANDO CANDIDO até 22/02/2001, ambos funcionários da JUMBO à época.

Ao lado disso, os acusados PAULO HENRIQUE e DEMETRIUS ELI foram condenados pela 1ª Vara Federal desta Subseção Judiciária de Campinas nos autos da ação penal nº 2003.61.05.011212-2 por crimes tributários praticados neste mesmo período em que estiveram à frente da empresa JUMBO (cópia nos volumes I e II do Apenso). Ao depor naqueles autos, DEMETRIUS ELI admitiu que ele e PAULO HENRIQUE, ambos sócios, dirigiam em conjunto a empresa até a venda, ocorrida no fim de outubro de 1999. PAULO HENRIQUE também foi ouvido no inquérito policial que embasa esta denúncia, oportunidade em que confirmou que administrou e gerenciou a empresa, ao lado de DEMETRIUS ELI, até vendê-la, em setembro de 1999, ao acusado JOSÉ RILDO.

A autoria em relação à JOSÉ RILDO, de igual modo, é inconteste. O depoimento de PAULO HENRIQUE, retrocitado, deixou expresso que transferiu, em setembro de 1999, para JOSÉ RILDO, a empresa JUMBO. Os depoimentos colhidos em sede policial de ANTONIO FERNANDO CANDIDO, CLAUDIO LUIS FABRI, RUY PAMPLONA e MAURO GUILHEM atestam que JOSÉ RILDO administrou a empresa no período narrado. A par destes depoimentos, a autoria delitiva de JOSÉ RILDO também é comprovada pelo contrato social da JUMBO, no qual consta que ele foi sócio -gerente da empresa desde então com amplos poderes de administração, pelas fichas cadastrais de abertura das duas contas-correntes da empresa onde foram recebidos os créditos bancários omitidos da Receita Federal, nas quais constam que ele possui, isolada ou conjuntamente, todos os poderes inerentes a este cargo, como assinar cheques e utilizar os créditos abertos.

Mediante as condutas acima descritas, os acusados obtiveram a redução indevida de dois tributos distintos (IRPJ e CSLL), razão pela qual há de se aplicar a regra do artigo 70 do Código Penal (crime formal). Além disso, a obrigação de apuração e pagamento dos tributos era trimestral, conforme se denota do processo administrativo fiscal nº 10830.007291/2004-73, de modo que sendo 08 (oito) os trimestres em que houve a fraude, tem-se a prática da conduta por oito vezes em continuidade delitiva (artigo 71 do Código Penal).

Os acusados PAULO HENRIQUE e DEMETRIUS ELI estiveram à frente da JUMBO no período de janeiro de 1999 a setembro de 1999, o que totaliza três semestres. JOSÉ RILDO era o efetivo administrador da empresa de outubro de 1999 a dezembro de 2000, ou seja, em cinco semestres.

3-) DOS FATOS RELATIVOS AO PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL Nº 10830.004087/2005-98 - ANOS-CALENDÁRIO DE 2001 A 2003 (VOLUMES 5 A 8 DO APENSO DE DOCUMENTOS)

Diante dos indícios da prática reiterada de sonegação fiscal, a fiscalização mencionada no tópico precedente foi estendida para abranger os anos-calendário de 2001 a 2003, resultando no processo administrativo fiscal nº 10830.004087/2005-98, período em que a empresa foi administrada e gerida pelos acusados JOSÉ RILDO LIMA FEITOSA, DERLANE ALVES DE OLIVEIRA, CARLOS EDUARDO DE CARVALHO MELO e MAURO LEPES GUILHEM.

Apurou-se que a JUMBO entregou à Receita Federal as Declarações de Informações Econômico-Fiscais (DIPJ) com tributação pelo lucro real e as Declarações de Débitos e Créditos Tributários Federais (DCTF) referentes aos anos-calendário de 2001 a 2003, porém todas com valores iguais a zero em relação às suas receitas/custas e despesas (fis. 1347-1543 do Apenso).

Diante da manifesta incompatibilidade entre a movimentação financeira da JUMBO no período (mais de R$ 50 milhões), apurada com base na CPMF, e a entrega das DIPJs com valores zerados, a Receita Federal intimou a contribuinte a apresentar documentos e esclarecimentos.

Diante da ausência de manifestação, a Receita Federal, mediante a análise dos extratos de movimentação das contas bancárias titularizadas pela JUMBO no período de janeiro de 2001 a dezembro de 2003, no Unibanco S/A (ag. 361, conta 1126.610-7) e no Banco do Brasil S/A (ag. 2417, contas 20007-7 e 93288-2), constatou o recebimento de créditos (depósitos bancários) de origem não comprovada e que caracterizam receita auferida pela empresa nos termos do artigo 42 da Lei 9.430/96, e que, no entanto, não foram informados à Receita Federal nas Declarações de Informações Econômico -fiscais da Pessoa Jurídica (DIPJs) referentes ao período.

Os depósitos/créditos recebidos pela empresa, apurados por meio dos extratos bancários (fls. 987-1238 e 1248-1320 do Apenso), encontram-se descritos no demonstrativo de fls. 950-986, em relação aos quais não houve comprovação mediante documentação hábil e idônea acerca da origem dos recursos. A verificação dos depósitos/créditos bancários permitiu à fiscalização apurar o montante de receitas omitidas pelos denunciados por meio do expediente descrito, o qual totalizou R$ 73.127.733,57 (setenta e três milhões, cento e vinte e sete mil, trezentos e trinta e três reais e cinquenta e sete centavos), conforme quadro abaixo (detalhado na fl. 1345 do Apenso):

(...)

Em razão da ausência de informação dessas receitas nas declarações fiscais, na forma narrada acima, os denunciados lograram omitir da tributação receitas auferidas pela JUMBO, acarretando na redução indevida das bases de cálculo do IRPJ, PIS, CSLL e COFINS, o que culminou na lavratura de créditos tributários (autos de infração) no valor total de R$ 13.715.617,40 (treze milhões, setecentos e quinze mil, seiscentos e dezessete reais e quarenta centavos), discriminados na tabela abaixo:

(...)

Mediante as condutas acima descritas, os acusados obtiveram a redução indevida de quatro tributos distintos, razão pela qual há de se aplicar a regra do artigo 70 do Código Penal (crime formal). Além disso, a obrigação de apuração e pagamento dos tributos era trimestral, de modo que sendo 12 (doze) os trimestres em que houve a omissão de informações sobre as receitas auferidas, tem-se a prática da conduta por doze vezes em continuidade delitiva (artigo 71 do Código Penal).

A Procuradoria da Fazenda Nacional informou que o crédito tributário acima tornou-se definitivamente constituído na esfera administrativa em 14/10/2005.

A autoria delitiva também está delimitada de forma induvidosa nos elementos de prova dos autos.

Em relação a JOSÉ RILDO, reitera-se o exposto acima em relação à sua participação na administração e gerência da empresa JUMBO, ressaltando que ele era sócio-gerente em todo o período em questão. Ao lado disso, as assinaturas dele nos Livros Diário e Razão da JUMBO comprovam que ele administrou a empresa e praticou todos os atos inerentes ao cargo de gerência por todo o período delitivo narrado acima.

A autoria de DERLANE ALVES (nominada em algumas oportunidades como DARLENE) também restou evidenciada. Verifica-se que esta acusada constituiu, juntamente com o acusado JOSÉ RILDO, a sociedade empresária JUMBO, em 28/04/1997, tendo dela se retirado em 23/11/1998 (fl. 149). Posteriormente, voltou a participar do quadro societário, em 22/02/2001, na qualidade de gerente delegada/procuradora da sócia INVERSIONES & PETROLEO, permanecendo nesta condição até 31/07/2001. Em 08/06/2002, DERLANE ALVES retorna ao quadro societário da JUMBO na condição de sócia -gerente, permanecendo até o final do período delitivo narrado, retirando-se da sociedade somente em 24/03/2005 (conforme ficha cadastral da JUCESP de fls. 148-158). Corroborando a sua participação na administração da empresa, a acusada consta na ficha cadastral da JUMBO, no Banco do Brasil, como autorizada a assinar isoladamente pela empresa, bem como emitir cheques e utilizar o crédito aberto, dentre outros poderes. Ao depor em sede policial, o acusado MAURO GUILHEM disse que "uma outra sócia" aparecia na empresa JUMBO, a qual, pelos documentos dos autos, é a acusada DERLANE ALVES. Além destes elementos, a ligação de DERLANE com os negócios escusos de JOSÉ RILDO também é demonstrada pelas duas empresas que JOSÉ RILDO teve na cidade de Manga/MG, cidade natal de DERLANE.

MAURO LEPES GUILHEM também participou ativamente da sonegação fiscal. Em seu depoimento em sede policial (fl. 438), disse, em síntese, que trabalhou na JUMBO de 1999 a 2005, sendo o responsável pelos pagamentos da empresa. De acordo com RUY PAMPLONA CORREA, advogado contratado da JUMBO, o acusado MAURO GUILHEM atuava no setor de contas a pagar e era o responsável por efetuar os pagamentos de seus honorários (fl. 422). Segundo a ficha cadastral e o cartão de autógrafos da conta bancária da JUMBO no Unibanco, MAURO GUILHEM passou, a partir de agosto de 2002, a ter isoladamente todos os poderes para a movimentação da conta, por onde transitaram receitas milionárias omitidas do Fisco Federal. Na aludida ficha cadastral MAURO GUILHEM identificou-se com a profissão de comerciante (fl. 1328v do Apenso), diferentemente da função declarada em seu depoimento policial. Da mesma forma, MAURO GUILHEM consta como a pessoa de contato da JUMBO junto ao Banco do Brasil, conforme informações cadastradas naquela instituição financeira (fl. 1240 do Apenso).

CARLOS EDUARDO DE CARVALHO MELO também atuava na administração da JUMBO e participou das condutas imputadas nesta denúncia. Verifica-se que a JUMBO, por intermédio dos acusados JOSÉ RILDO e DERLANE ALVES, outorgou, em 12/03/2002, procuração por instrumento público para JOÃO THURET DE MELLO JUNIOR, conferindo-lhe os mais amplos poderes de administração, abrangendo a abertura e a movimentação de contas bancárias, a assunção de obrigações, a realização das mais diversas operações comerciais, a representação perante órgãos públicos etc. (fl. 125). Por meio de substabelecimento, também por instrumento público, JOÃO THURET DE MELLO JUNIOR transferiu para o acusado CARLOS EDUARDO, em 14/08/2002, os poderes que lhe foram conferidos pela JUMBO, sem reserva de iguais poderes (fl. 124). Com o uso deste substabelecimento, CARLOS EDUARDO passou a administrar efetivamente a JUMBO, tendo sido o responsável por atender a fiscalização (fls. 396-418 e 440-442 do Apenso). Além disto, praticava outros atos de gestão, como a contratação do advogado RUY PAMPLONA CORREA (fl. 422). CARLOS EDUARDO foi o responsável por subscrever individualmente, em nome e por procuração dos dois sócios -gerentes (JOSÉ RILDO e DERLANE ALVES), pelo menos 04 (quatro) alterações do contrato social da JUMBO no período de janeiro de 2003 a julho de 2004 (7ª, 13ª e 14ª alterações juntadas em anexo e 17ª constante nas fls. 415-418 do Apenso). Sabido que o contrato social é o documento mais importante quanto ao regramento da sociedade empresária e a sua alteração é ato de suma relevância para a vida da empresa, não há dúvidas de que CARLOS EDUARDO participava efetivamente da gestão da JUMBO. Aliás, em sua oitiva policial (fl. 123), este denunciado não nega que atuou como procurador da JUMBO nas questões tributárias da empresa.

4-) DO GRAVE DANO À COLETIVIDADE

O elevado valor dos débitos tributários apurados caracteriza grave dano causado à coletividade. Deveras, o prejuízo que os denunciados causaram aos cofres públicos, à época (2005), foi no montante total de R$ 30.839.182,63 (trinta milhões, oitocentos e trinta e nove mil, cento e oitenta e dois reais e sessenta e três centavos). Este valor sonegado estratosférico equivale a mais de 100.000 (cem mil) salários mínimos vigentes à época. São recursos criminosamente solapados do erário público e que deixaram de ser aplicados nas políticas públicas, desfalcando áreas de singular interesse social como a educação, saúde, habitação etc.

5-) CONCLUSÃO E REQUERIMENTOS

Ante o exposto, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL denuncia:

5.1-) JOSÉ RILDO LIMA FEITOSA pela prática:

a-) do delito descrito no artigo 1º, inciso I, c/c artigo 12, inciso I, ambos da Lei nº 8.137/90, em concurso formal por 02 (duas) vezes (artigo 70 do Código Penal) e em continuidade delitiva por 05 (cinco) vezes (artigo 71 do Código Penal), em razão da conduta relativa ao PAF nº 10830.007291/2004-73 (tópico 2);

b) do delito descrito no artigo 1º, incisos I e II, c/c artigo 12, inciso I, ambos da Lei nº 8.137/90, em concurso formal por 04 (quatro) vezes (artigo 70 do Código Penal) e em continuidade delitiva por 12 (doze) vezes (artigo 71 do Código Penal), em razão da conduta relativa ao PAF nº 10830.004087/2005-98 (tópico 3), em concurso material (artigo 69 do Código Penal) com a conduta mencionada na letra "a" acima;

5.2-) PAULO HENRIQUE DA CRUZ ALVES pela prática do delito descrito no artigo 1º, inciso I, c/c artigo 12, inciso I, ambos da Lei nº 8.137190, em concurso formal por 02 (duas) vezes (artigo 70 do Código Penal) e em continuidade delitiva por 03 (três) vezes (artigo 71 do Código Penal), em razão da conduta relativa ao PAF nº 10830.007291/2004-73 (tópico 2);

5.3-) DEMETRIUS ELI MODOLO DE SOUZA DIAS pela prática do delito descrito no artigo 1º, inciso I, c/c artigo 12, inciso I, ambos da Lei nº 8.137190, em concurso formal por 02 (duas) vezes (artigo 70 do Código Penal) e em continuidade delitiva por 03 (três) vezes (artigo 71 do Código Penal), em razão da conduta relativa ao PAF n" 10830.007291/2004-73 (tópico 2);

5.4-) DERLANE ALVES DE OLIVEIRA pela prática do delito descrito no artigo 1º, incisos I e II, c/c artigo 12, inciso I, ambos da Lei nº 8.137/90, em concurso formal por 04 (quatro vezes (artigo 70 do Código Penal) e em continuidade delitiva por 09 (nove) vezes (artigo 71 do Código Penal), em razão da conduta relativa ao PAF nº 10830.004087/2005-98 (tópico 3);

5.5-) MAURO LEPES GUILHEM pela prática do delito descrito no artigo 1º, incisos I e II, c/c artigos 11, caput, e 12, inciso I, todos da Lei nº 8.137/90, em concurso formal por 04 (quatro) vezes (artigo 70 do Código Penal) e em continuidade delitiva por 12 (doze) vezes (artigo 71 do Código Penal), em razão da conduta relativa ao PAF nº 10830.004087/2005-98 (tópico 3);

5.13-) CARLOS EDUARDO DE CARVALHO MELO pela prática do delito descrito no artigo 1º incisos I e II, c/c artigos 11, caput, e 12, inciso I, todos da Lei nº 8.137/90, em concurso formal por quatro (quatro) vezes (artigo 70 do Código Penal) e em continuidade delitiva por 05 (cinco) vezes (artigo 71 do Código Penal), em razão da conduta relativa ao PAF nº 10830.004087/2005-98 (tópico 3);

Requer, após recebida e autuada esta, sejam os denunciados citados e intimados a apresentar resposta escrita à acusação, prosseguindo-se nos ulteriores atos processuais, ouvindo-se as testemunhas abaixo arroladas, até final condenação. (destaques originais, Id 154774849, pp. 3-17)

Do processo. Foi reconhecida a litispendência com o Processo-Crime n. 2006.6105.015070-7 da 1ª Vara Federal de Campinas (SP) e, por consequência, extinto o processo em relação aos acusados José Rildo Lima Feitosa e Paulo Henrique da Cruz Alves. Em relação ao acusado Demetrius Eli Modolo de Souza Dias, a denúncia não foi recebida nos Autos n. 2006.6105.015070-7, razão pela qual o presente feito prosseguiu em relação a ele (Id n. 154774849, pp. 52-53).

O acusado Carlos Eduardo de Carvalho Melo foi citado por edital e, decorrido o prazo, não compareceu, nem constituiu advogado, sendo determinado o desmembramento do processo em relação a ele (Id n. 154774851, p. 30).

A acusada Derlane Alves de Oliveira mudou-se de endereço sem informar ao Juízo, sendo determinado o prosseguimento do feito sem sua presença, nos termos do art. 367 do Código de Processo Penal (Id n. 154774852, p. 68).

Na Ação Penal n. 0011212-12.2003.403.6105, os acusados Paulo Henrique da Cruz Alves e Demetrius Eli Modolo de Souza Dias também foram denunciados, na condição de sócio-gestores da Jumbo Distribuidora de Combustíveis Ltda., pela prática do delito do art. 1º, I, da Lei n. 8.137/90, precisamente pela redução da contribuição para o Programa de Integração Social – PIS, omitindo os valores devidos em Declarações de Débitos e Créditos Tributários Federais – DCTFs, relativamente ao período de fevereiro a outubro de 1999, objeto de apuração do Processo Administrativo-Fiscal n. 10830-004771/00-11 (Id n. 154770526).

Neste feito, a acusada Derlane Alves de Oliveira e o acusado Mauro Lepes Guilhem foram absolvidos da imputação relativa à prática do delito do art. 1º, I, c. c. o art. 12, I, ambos da Lei n. 8.137/90, com fundamento no art. 386, VII, do Código de Processo Penal (Id n. 154774854, pp. 1-28), ausente recurso do Ministério Público Federal para reforma da sentença neste aspecto.

Preliminar. Sigilo bancário. Processo administrativo. Quebra. Admissibilidade. A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial Representativo de Controvérsia n. 1.134.665/SP, firmou o entendimento de que é lícito ao Fisco receber informações sobre a movimentação bancária dos contribuintes sem a necessidade de prévia autorização judicial, desde que seja resguardado o sigilo das informações, a teor do art. 1º, § 3º, VI, c. c. o art. 5º, caput, da Lei Complementar n. 105/01, c. c. o art. 11, §§ 2º e 3º, da Lei n. 9.311/96:

 

PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ARTIGO 543-C, DO CPC. TRIBUTÁRIO. QUEBRA DO SIGILO BANCÁRIO SEM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. CONSTITUIÇÃO DE CRÉDITOS TRIBUTÁRIOS REFERENTES A FATOS IMPONÍVEIS ANTERIORES À VIGÊNCIA DA LEI COMPLEMENTAR 105/2001. APLICAÇÃO IMEDIATA. ARTIGO 144, § 1º, DO CTN. EXCEÇÃO AO PRINCÍPIO DA IRRETROATIVIDADE.

1. A quebra do sigilo bancário sem prévia autorização judicial, para fins de constituição de crédito tributário não extinto, é autorizada pela Lei 8.021/90 e pela Lei Complementar 105/2001, normas procedimentais, cuja aplicação é imediata, à luz do disposto no artigo 144, § 1º, do CTN.

2. O § 1º, do artigo 38, da Lei 4.595/64 (revogado pela Lei Complementar 105/2001), autorizava a quebra de sigilo bancário, desde que em virtude de determinação judicial, sendo certo que o acesso às informações e esclarecimentos, prestados pelo Banco Central ou pelas instituições financeiras, restringir-se-iam às partes legítimas na causa e para os fins nela delineados.

3. A Lei 8.021/90 (que dispôs sobre a identificação dos contribuintes para fins fiscais), em seu artigo 8º, estabeleceu que, iniciado o procedimento fiscal para o lançamento tributário de ofício (nos casos em que constatado sinal exterior de riqueza, vale dizer, gastos incompatíveis com a renda disponível do contribuinte), a autoridade fiscal poderia solicitar informações sobre operações realizadas pelo contribuinte em instituições financeiras, inclusive extratos de contas bancárias, não se aplicando, nesta hipótese, o disposto no artigo 38, da Lei 4.595/64.

4. O § 3º, do artigo 11, da Lei 9.311/96, com a redação dada pela Lei 10.174, de 9 de janeiro de 2001, determinou que a Secretaria da Receita Federal era obrigada a resguardar o sigilo das informações financeiras relativas à CPMF, facultando sua utilização para instaurar procedimento administrativo tendente a verificar a existência de crédito tributário relativo a impostos e contribuições e para lançamento, no âmbito do procedimento fiscal, do crédito tributário porventura existente.

5. A Lei Complementar 105, de 10 de janeiro de 2001, revogou o artigo 38, da Lei 4.595/64, e passou a regular o sigilo das operações de instituições financeiras, preceituando que não constitui violação do dever de sigilo a prestação de informações, à Secretaria da Receita Federal, sobre as operações financeiras efetuadas pelos usuários dos serviços (artigo 1º, § 3º, inciso VI, c/c o artigo 5º, caput, da aludida lei complementar, e 1º, do Decreto 4.489/2002).

6. As informações prestadas pelas instituições financeiras (ou equiparadas) restringem-se a informes relacionados com a identificação dos titulares das operações e os montantes globais mensalmente movimentados, vedada a inserção de qualquer elemento que permita identificar a sua origem ou a natureza dos gastos a partir deles efetuados (artigo 5º, § 2º, da Lei Complementar 105/2001).

7. O artigo 6º, da lei complementar em tela, determina que: "Art. 6º As autoridades e os agentes fiscais tributários da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios somente poderão examinar documentos, livros e registros de instituições financeiras, inclusive os referentes a contas de depósitos e aplicações financeiras, quando houver processo administrativo instaurado ou procedimento fiscal em curso e tais exames sejam considerados indispensáveis pela autoridade administrativa competente.

Parágrafo único. O resultado dos exames, as informações e os documentos a que se refere este artigo serão conservados em sigilo, observada a legislação tributária." 8. O lançamento tributário, em regra, reporta-se à data da ocorrência do fato ensejador da tributação, regendo-se pela lei então vigente, ainda que posteriormente modificada ou revogada (artigo 144, caput, do CTN).

9. O artigo 144, § 1º, do Codex Tributário, dispõe que se aplica imediatamente ao lançamento tributário a legislação que, após a ocorrência do fato imponível, tenha instituído novos critérios de apuração ou processos de fiscalização, ampliado os poderes de investigação das autoridades administrativas, ou outorgado ao crédito maiores garantias ou privilégios, exceto, neste último caso, para o efeito de atribuir responsabilidade tributária a terceiros.

10. Conseqüentemente, as leis tributárias procedimentais ou formais, conducentes à constituição do crédito tributário não alcançado pela decadência, são aplicáveis a fatos pretéritos, razão pela qual a Lei 8.021/90 e a Lei Complementar 105/2001, por envergarem essa natureza, legitimam a atuação fiscalizatória/investigativa da Administração Tributária, ainda que os fatos imponíveis a serem apurados lhes sejam anteriores (Precedentes da Primeira Seção: EREsp 806.753/RS, Rel. Ministro Herman Benjamin, julgado em 22.08.2007, DJe 01.09.2008; EREsp 726.778/PR, Rel. Ministro Castro Meira, julgado em 14.02.2007, DJ 05.03.2007; e EREsp 608.053/RS, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, julgado em 09.08.2006, DJ 04.09.2006).

11. A razoabilidade restaria violada com a adoção de tese inversa conducente à conclusão de que Administração Tributária, ciente de possível sonegação fiscal, encontrar-se-ia impedida de apurá-la.

12. A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 facultou à Administração Tributária, nos termos da lei, a criação de instrumentos/mecanismos que lhe possibilitassem identificar o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte, respeitados os direitos individuais, especialmente com o escopo de conferir efetividade aos princípios da pessoalidade e da capacidade contributiva (artigo 145, § 1º).

13. Destarte, o sigilo bancário, como cediço, não tem caráter absoluto, devendo ceder ao princípio da moralidade aplicável de forma absoluta às relações de direito público e privado, devendo ser mitigado nas hipóteses em que as transações bancárias são denotadoras de ilicitude, porquanto não pode o cidadão, sob o alegado manto de garantias fundamentais, cometer ilícitos. Isto porque, conquanto o sigilo bancário seja garantido pela Constituição Federal como direito fundamental, não o é para preservar a intimidade das pessoas no afã de encobrir ilícitos.

14. O suposto direito adquirido de obstar a fiscalização tributária não subsiste frente ao dever vinculativo de a autoridade fiscal proceder ao lançamento de crédito tributário não extinto.

15. In casu, a autoridade fiscal pretende utilizar-se de dados da CPMF para apuração do imposto de renda relativo ao ano de 1998, tendo sido instaurado procedimento administrativo, razão pela qual merece reforma o acórdão regional.

16. O Supremo Tribunal Federal, em 22.10.2009, reconheceu a repercussão geral do Recurso Extraordinário 601.314/SP, cujo thema iudicandum restou assim identificado: "Fornecimento de informações sobre movimentação bancária de contribuintes, pelas instituições financeiras, diretamente ao Fisco por meio de procedimento administrativo, sem a prévia autorização judicial. Art. 6º da Lei Complementar 105/2001." 17. O reconhecimento da repercussão geral pelo STF, com fulcro no artigo 543-B, do CPC, não tem o condão, em regra, de sobrestar o julgamento dos recursos especiais pertinentes.

18. Os artigos 543-A e 543-B, do CPC, asseguram o sobrestamento de eventual recurso extraordinário, interposto contra acórdão proferido pelo STJ ou por outros tribunais, que verse sobre a controvérsia de índole constitucional cuja repercussão geral tenha sido reconhecida pela Excelsa Corte (Precedentes do STJ: AgRg nos EREsp 863.702/RN, Rel. Ministra Laurita Vaz, Terceira Seção, julgado em 13.05.2009, DJe 27.05.2009; AgRg no Ag 1.087.650/SP, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 18.08.2009, DJe 31.08.2009; AgRg no REsp 1.078.878/SP, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 18.06.2009, DJe 06.08.2009; AgRg no REsp 1.084.194/SP, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 05.02.2009, DJe 26.02.2009; EDcl no AgRg nos EDcl no AgRg no REsp 805.223/RS, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Quinta Turma, julgado em 04.11.2008, DJe 24.11.2008; EDcl no AgRg no REsp 950.637/MG, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 13.05.2008, DJe 21.05.2008; e AgRg nos EDcl no REsp 970.580/RN, Rel. Ministro Paulo Gallotti, Sexta Turma, julgado em 05.06.2008, DJe 29.09.2008).

19. Destarte, o sobrestamento do feito, ante o reconhecimento da repercussão geral do thema iudicandum, configura questão a ser apreciada tão somente no momento do exame de admissibilidade do apelo dirigido ao Pretório Excelso.

20. Recurso especial da Fazenda Nacional provido. Acórdão submetido ao regime do artigo 543-C, do CPC, e da Resolução STJ 08/2008.

(STJ, REsp n. 1134665, Rel. Min. Luiz Fux, j. 25.11.09, para fins do art. 543-C do CPC)

 

A controvérsia cinge-se ao emprego dessa prova para fins de instrução de processo-crime, pois há entendimento tanto no sentido de que para isso seria imprescindível decisão judicial para a quebra do sigilo bancário (STJ, HC n. 243.034, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 26.08.14, AGRESP n. 201300982789, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 19.08.14, RHC n. 201303405552, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 11.02.14), quanto no sentido de que, tendo sido a prova produzida validamente no âmbito administrativo, não há como invalidá-la posteriormente. Filio-me a esse entendimento, dado não se conceber nulidade a posteriori: a autoridade fiscal tem o dever jurídico (vinculado) de, ao concluir o lançamento de crédito constituído em decorrência de crime fiscal, proceder à respectiva comunicação ao Ministério Público para a propositura de ação penal. Não se compreende como, ao assim fazer, acabe por inviabilizar a persecutio criminis:

 

HABEAS CORPUS (...). QUADRILHA E CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA (ARTIGO 288 DO CÓDIGO PENAL E ARTIGO 1º, INCISOS I E II, DA LEI 8.137/1990). ALEGADA NULIDADE DA AÇÃO PENAL. PROCESSO CRIMINAL QUE TERIA SIDO DEFLAGRADO A PARTIR DE PROVAS ILÍCITAS. AVENTADA IMPOSSIBILIDADE DE QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO SEM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. LEI COMPLEMENTAR 105/2001. PERMISSÃO DE FORNECIMENTO DE INFORMAÇÕES PELAS INSTITUIÇÕES BANCÁRIAS DIRETAMENTE À RECEITA FEDERAL. NORMA NÃO DECLARADA INCONSTITUCIONAL. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO CARACTERIZADO.

1. O Supremo Tribunal, nos autos do RE 601.314/SP reconheceu a repercussão geral do tema referente à possibilidade de as instituições financeiras fornecerem, diretamente ao Fisco, informações sobre a movimentação bancária dos contribuintes.

2. Todavia, esta Corte Superior de Justiça firmou entendimento no sentido de que o reconhecimento de repercussão geral pelo Supremo Tribunal Federal não enseja o sobrestamento dos recursos especiais e ações em trâmite neste Sodalício.

3. O trancamento de ação penal ou de inquérito policial em sede de habeas corpus é medida excepcional, só admitida quando restar provada, inequivocamente, sem a necessidade de exame valorativo do conjunto fático-probatório, a atipicidade da conduta, a ocorrência de causa extintiva da punibilidade, ou, ainda, a ausência de indícios de autoria ou de prova da materialidade do delito.

4. A 1ª Seção desta Corte Superior de Justiça, no julgamento do REsp 1.134.655/SP, submetido ao rito do artigo 543-C do Código de Processo Civil, consolidou o entendimento de que a quebra do sigilo bancário sem prévia autorização judicial, para fins de constituição de crédito tributário é autorizada pela Lei 8.021/1990 e pela Lei Complementar 105/2001, normas procedimentais cuja aplicação é imediata.

5. No caso dos autos, não se vislumbra qualquer ilegalidade no procedimento adotado pela autoridade fiscal que, com base nas normas legais vigentes, solicitou as informações que os investigados não prestaram diretamente às instituições financeiras, a despeito de terem sido para tanto intimados.

6. Habeas corpus não conhecido.

(STJ, HC n. 281.588, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 17.12.13)

CRIMINAL. HC. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. TRANCAMENTO DE AÇÃO PENAL. DENÚNCIA BASEADA EM PROVAS ILÍCITAS. INOCORRÊNCIA. LEI COMPLEMENTAR N.º 105/2001. RETROATIVIDADE. DADOS BANCÁRIOS COLHIDOS PELA AUTORIDADE FISCAL. UTILIZAÇÃO NA SEARA PENAL. POSSIBILIDADE. APRESENTAÇÃO DOS EXTRATOS PELO PRÓPRIO RÉU. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA A AÇÃO PENAL NÃO EVIDENCIADA. LEI COMPLEMENTAR N.º 105/2001. INCONSTITUCIONALIDADE. QUESTÃO NÃO ANALISADA PELO TRIBUNAL A QUO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. ORDEM PARCIALMENTE CONHECIDA E DENEGADA.

No campo tributário, esta Corte tem se orientado pela possibilidade de retroação do art. 6º da Lei Complementar n.º 105/2001 para atingir fatos geradores verificados anteriormente à sua vigência.

Precedentes da Primeira e Segunda Turmas.

Não havendo, a princípio, qualquer ilegalidade no procedimento adotado pelo fisco, nada impede que os resultados das diligências sejam encaminhados ao representante do Ministério Público Federal, o qual, visualizando possível incursão do paciente no tipo previsto no art. 1º, inciso I, da Lei n.º 8.137/90, busque a melhor averiguação dos fatos.

Se a conduta do acusado, consolidada ainda entre os anos de 1997 e 2000, já constituída, à época, suposto crime, o conhecimento posterior desse fato pelo Parquet, em decorrência de atividade legalmente autorizada à fiscalização tributária, não pode ser considerado ilícito, a inquinar de nulidade todas as provas posteriores e inviabilizar a investigação policial.

Descabido o argumento de impossibilidade de os dados fiscais do indiciado serem encaminhados ao Ministério Público, pois resta evidenciado que o próprio acusado colaborou com as investigações fiscais, apresentando os extratos bancários que, posteriormente, serviram de motivação para a constituição de crédito tributário e para a denúncia.

Se o argumento referente à inconstitucionalidade do art. 6º da Lei Complementar n.º 105/2001 não foi objeto de debate e decisão por parte de órgão colegiado do Tribunal de origem, sobressai a flagrante incompetência desta Corte para a análise desta parte da irresignação, sob pena de indevida supressão de instância.

Ordem parcialmente conhecida e, nesta extensão, denegada.

(STJ, HC n. 48.059, Rel. Min. Gilson Dipp, j. 12.06.06)

 

Resta confirmada a validade da aplicação imediata da Lei Complementar n. 105/01 em relação a fatos ocorridos anteriormente a sua vigência, pois se trata de norma caráter procedimental:

 

PENAL. TRIBUTÁRIO. HABEAS CORPUS. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. 1. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. INVIABILIDADE. MEDIDA EXCEPCIONAL. 2. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA A AÇÃO PENAL. UTILIZAÇÃO DE INFORMAÇÕES OBTIDAS A PARTIR DA ARRECADAÇÃO DA CPMFPARA A CONSTITUIÇÃO DE CRÉDITO REFERENTE A OUTROS TRIBUTOS. ARTS. 6º DA LC 105/2001 E 11, § 3º, DA LEI Nº 9.311/1996 NA REDAÇÃO DADA PELA LEI Nº 10.174/2001. NORMAS DE CARÁTER PROCEDIMENTAL. APLICAÇÃO RETROATIVA. POSSIBILIDADE. INTERPRETAÇÃO DO ART. 144, § 1º, DO CTN. 3. ORDEM DENEGADA (...).

2. A Lei Complementar nº 105/2001 revogou expressamente o art. 38 da Lei nº 4.595/1964, que autorizava a quebra de sigilo bancário apenas por meio de requerimento judicial.

3. Com o advento da Lei nº 9.311/1996, que instituiu a CPMF , determinou-se que as instituições financeiras responsáveis pela retenção dessa contribuição prestassem informações à Secretaria da Receita Federal, especificamente, sobre a identificação dos contribuintes e os valores globais das respectivas operações efetuadas, vedando, contudo, no seu § 3º a utilização desses dados para constituição do crédito relativo a outras contribuições ou impostos.

4. Todavia a Lei nº 10.174/2001 revogou o § 3º do art. 11 da Lei n.º 9.311/1991, permitindo a utilização das informações prestadas para a instauração de procedimento administrativo-fiscal a fim de possibilitar a cobrança de eventuais créditos tributários referentes a outros tributos.

5. O art. 144, § 1º, do CTN prevê que as normas tributárias procedimentais ou formais têm aplicação imediata, ao contrário daquelas de natureza material que somente alcançariam fatos geradores ocorridos durante a sua vigência.

6. Os dispositivos que autorizam a utilização de dados da CPMF pelo Fisco para apuração de eventuais créditos tributários referentes a outros tributos são normas procedimentais e, por essa razão, não se submetem ao princípio da irretroatividade das leis, ou seja, incidem de imediato, ainda que relativas a fato gerador ocorrido antes de sua entrada em vigor. Precedentes.

7. Habeas corpus denegado.

(STJ, HC n. 118.849, Rel. Min. Marco Aurélio Belizze, j. 07.08.12)

 

Anoto que o Plenário do Supremo Tribunal Federal pronunciou-se sobre a constitucionalidade do referido procedimento no RE n. 601.314, com acórdão publicado em 16.09.16, bem como nas ADIs ns. 2390, 2859, 2397 e 2386, publicados os respectivos acórdãos em 21.10.16.

Ministério Público. Sigilo bancário. Requisição diretamente à Receita Federal. Admissibilidade. O Supremo Tribunal Federal admitiu a transferência do sigilo bancário ao Fisco, o que não atentaria contra a intimidade do contribuinte, na medida em que as informações sigilosas remanesceriam cobertas pela aludida proteção. Assim, os dados bancários permaneceriam insuscetíveis de divulgação. Ressalvou, contudo, que o Fisco pode utilizar tais dados, não apenas no âmbito administrativo (o processo administrativo fiscal tem caráter sigiloso), como também para que sejam usados pela Advocacia-Geral da União em Juízo:

 

Ação direta de inconstitucionalidade. Julgamento conjunto das ADI nº 2.390, 2.386, 2.397 e 2.859. Normas federais relativas ao sigilo das operações de instituições financeiras. Decreto nº 4.545/2002. Exaurimento da eficácia. Perda parcial do objeto da ação direta nº 2.859. Expressão “do inquérito ou”, constante no § 4º do art. 1º, da Lei Complementar nº 105/2001. Acesso ao sigilo bancário nos autos do inquérito policial. Possibilidade. Precedentes. Art. 5º e 6º da Lei Complementar nº 105/2001 e seus decretos regulamentadores. Ausência de quebra de sigilo e de ofensa a direito fundamental. Confluência entre os deveres do contribuinte (o dever fundamental de pagar tributos) e os deveres do Fisco (o dever de bem tributar e fiscalizar). Compromissos internacionais assumidos pelo Brasil em matéria de compartilhamento de informações bancárias. Art. 1º da Lei Complementar nº 104/2001. Ausência de quebra de sigilo. Art. 3º, § 3º, da LC 105/2001. Informações necessárias à defesa judicial da atuação do Fisco. Constitucionalidade dos preceitos impugnados. ADI nº 2.859. Ação que se conhece em parte e, na parte conhecida, é julgada improcedente. ADI nº 2.390, 2.386, 2.397. Ações conhecidas e julgadas improcedentes.

1. Julgamento conjunto das ADI nº 2.390, 2.386, 2.397 e 2.859, que têm como núcleo comum de impugnação normas relativas ao fornecimento, pelas instituições financeiras, de informações bancárias de contribuintes à administração tributária.

(...)

4. Os artigos 5º e 6º da Lei Complementar nº 105/2001 e seus decretos regulamentares (Decretos nº 3.724, de 10 de janeiro de 2001, e nº 4.489, de 28 de novembro de 2009) consagram, de modo expresso, a permanência do sigilo das informações bancárias obtidas com espeque em seus comandos, não havendo neles autorização para a exposição ou circulação daqueles dados. Trata-se de uma transferência de dados sigilosos de um determinado portador, que tem o dever de sigilo, para outro, que mantém a obrigação de sigilo, permanecendo resguardadas a intimidade e a vida privada do correntista, exatamente como determina o art. 145, § 1º, da Constituição Federal.

5. A ordem constitucional instaurada em 1988 estabeleceu, dentre os objetivos da República Federativa do Brasil, a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, a erradicação da pobreza e a marginalização e a redução das desigualdades sociais e regionais. Para tanto, a Carta foi generosa na previsão de direitos individuais, sociais, econômicos e culturais para o cidadão. Ocorre que, correlatos a esses direitos, existem também deveres, cujo atendimento é, também, condição sine qua non para a realização do projeto de sociedade esculpido na Carta Federal. Dentre esses deveres, consta o dever fundamental de pagar tributos, visto que são eles que, majoritariamente, financiam as ações estatais voltadas à concretização dos direitos do cidadão. Nesse quadro, é preciso que se adotem mecanismos efetivos de combate à sonegação fiscal, sendo o instrumento fiscalizatório instituído nos arts. 5º e 6º da Lei Complementar nº 105/ 2001 de extrema significância nessa tarefa.

6. O Brasil se comprometeu, perante o G20 e o Fórum Global sobre Transparência e Intercâmbio de Informações para Fins Tributários (Global Forum on Transparency and Exchange of Information for Tax Purposes), a cumprir os padrões internacionais de transparência e de troca de informações bancárias, estabelecidos com o fito de evitar o descumprimento de normas tributárias, assim como combater práticas criminosas. Não deve o Estado brasileiro prescindir do acesso automático aos dados bancários dos contribuintes por sua administração tributária, sob pena de descumprimento de seus compromissos internacionais.

7. O art. 1º da Lei Complementar 104/2001, no ponto em que insere o § 1º, inciso II, e o § 2º ao art. 198 do CTN, não determina quebra de sigilo, mas transferência de informações sigilosas no âmbito da Administração Pública. Outrossim, a previsão vai ao encontro de outros comandos legais já amplamente consolidados em nosso ordenamento jurídico que permitem o acesso da Administração Pública à relação de bens, renda e patrimônio de determinados indivíduos.

8. À Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, órgão da Advocacia-Geral da União, caberá a defesa da atuação do Fisco em âmbito judicial, sendo, para tanto, necessário o conhecimento dos dados e informações embasadores do ato por ela defendido. Resulta, portanto, legítima a previsão constante do art. 3º, § 3º, da LC 105/2001.

9. Ação direta de inconstitucionalidade nº 2.859/DF conhecida parcialmente e, na parte conhecida, julgada improcedente. Ações diretas de inconstitucionalidade nº 2390, 2397, e 2386 conhecidas e julgadas improcedentes. Ressalva em relação aos Estados e Municípios, que somente poderão obter as informações de que trata o art. 6º da Lei Complementar nº 105/2001 quando a matéria estiver devidamente regulamentada, de maneira análoga ao Decreto federal nº 3.724/2001, de modo a resguardar as garantias processuais do contribuinte, na forma preconizada pela Lei nº 9.784/99, e o sigilo dos seus dados bancários.

 (STF, Tribunal Pleno, ADI 2.390, 2.386, 2.397 e 2.859, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 24.02.16)

 

No julgamento em referência, no que tange à impugnação aos arts. 5º e 6º da Lei Complementar n. 105/01, ponto central das ações diretas de inconstitucionalidade, o Relator Ministro Dias Toffoli destacou que a transferência de dados para outro órgão da administração pública não desnatura o caráter sigiloso da movimentação bancária do contribuinte:

 

(...) iniciei a divergência, para destacar que o § 1º do art. 145 da CF/88 dispõe, em síntese, que a administração tributária poderá “identificar, respeitados os direitos e garantias individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte”. E concluí que a lei em questão se mostrava consentânea com os direitos dos cidadãos, uma vez que previa a manutenção do sigilo.

No mesmo sentido, votou a Ministra Cármen Lúcia – que se manifestou pela ausência de quebra da privacidade, “uma vez que não [se] está autorizado por lei a dar a público, mas apenas a transferir para um outro órgão da administração, para o cumprimento das finalidades da Administração Pública, aqueles dados”. Também na mesma direção, se posicionou o Ministro Ayres Britto, que destacou:

“[A] conjugação do inciso XII com o inciso X da Constituição abona a tese de que o que se proíbe não é o acesso a dados, mas a quebra do sigilo, é o vazamento do conteúdo de dados. É o vazamento, é a divulgação. E, no caso, as leis de regência, ao falar das transferências de dados sigilosos, é evidente que elas impõem ao órgão destinatário desses dados a cláusula da confidencialidade, cuja quebra implica a tipificação ou o cometimento de crime.”

(...)

A previsão de circulação dos dados bancários, todavia, inexiste nos dispositivos impugnados, que consagram, de modo expresso, a permanência do sigilo das informações obtidas com espeque em seus comandos. É o que expressam o § 5º do art. 5º e o parágrafo único do art. 6º. Vide a íntegra dos dispositivos citados:

“Art. 5º O Poder Executivo disciplinará, inclusive quanto à periodicidade e aos limites de valor, os critérios segundo os quais as instituições financeiras informarão à administração tributária da União, as operações financeiras efetuadas pelos usuários de seus serviços.

(...)

§ 5º As informações a que refere este artigo serão conservadas sob sigilo fiscal, na forma da legislação em vigor.

Art. 6º As autoridades e os agentes fiscais tributários da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios somente poderão examinar documentos, livros e registros de instituições financeiras, inclusive os referentes a contas de depósitos e aplicações financeiras, quando houver processo administrativo instaurado ou procedimento fiscal em curso e tais exames sejam considerados indispensáveis pela autoridade administrativa competente.

Parágrafo único. O resultado dos exames, as informações e os documentos a que se refere este artigo serão conservados em sigilo, observada a legislação tributária.”

Soma-se a isso o art. 10 da própria lei complementar, que estabelece que a divulgação de informações bancárias pelas instituições financeiras fora das hipóteses previstas na lei constitui crime, o qual é apenado com reclusão, de um a quatro anos, e multa. Além disso, a lei fixa, no art. 11, a responsabilização civil do servidor público que “utilizar ou viabilizar a utilização de qualquer informação obtida em decorrência da quebra de sigilo de que trata esta Lei Complementar”, respondendo “pessoal e diretamente pelos danos decorrentes, sem prejuízo da responsabilidade objetiva da entidade pública, quando comprovado que o servidor agiu de acordo com orientação oficial”.

A determinação de sigilo se estende, ainda, pela legislação tributária, apontada nos dispositivos questionados.

Observe-se que o Código Tributário Nacional, no art. 198, “[veda] a divulgação, por parte da Fazenda Pública ou de seus servidores, de informação obtida em razão do ofício sobre a situação econômica ou financeira do sujeito passivo ou de terceiros e sobre a natureza e o estado de seus negócios ou atividades”.

Questiono, então: de que tratam todos esses dispositivos, senão do sigilo das informações? Na percuciente definição da eminente Ministra Ellen Gracie, exposta durante o julgamento da AC nº 33, “o que ocorre não é propriamente a quebra de sigilo, mas a ‘transferência de sigilo’ dos bancos ao Fisco. Os dados, até então protegidos pelo sigilo bancário, prosseguem protegidos pelo sigilo fiscal”.

Nessa transmutação, importa salientar que inexiste qualquer distinção entre uma e outra espécie de sigilo que possa apontar para uma menor seriedade do sigilo fiscal em face do bancário. Ao contrário, os segredos impostos às instituições financeiras (muitas das quais, de natureza privada), se mantêm, com ainda mais razão, com relação aos órgãos fiscais integrantes da Administração Pública, submetidos que são à mais estrita legalidade. (...).

Trata-se, desse modo, de uma transferência de dados sigilosos de um determinado portador, que tem o dever de sigilo, para outro, que mantém a obrigação de sigilo.

Note-se que, ao se dizer que há mera transferência de informações, não se está por desconsiderar a possibilidade de utilização dos dados pelo Fisco. Está-se, contudo, a dizer que essa utilização não desnatura o caráter sigiloso da movimentação bancária do contribuinte, e, dessa forma, não tem o condão de implicar violação de sua privacidade.

(...)

E, enquanto a atividade do Fisco se desenvolver sob esses limites (sigilo e utilização devida), está respaldada pela previsão constitucional inserta no art. 145, § 1º, da CF/88:

“Art. 145. (...)

§ 1º Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.”.

 

No mesmo julgamento, relativamente à impugnação ao art. 3º, § 3º, da Lei Complementar n. 105/01, que prevê que o Banco Central do Brasil e a Comissão de Valores Mobiliários forneçam à Advocacia-Geral da União “as informações e documentos necessários à defesa da União nas ações que seja parte”, registrou o Relator Ministro Dias Toffoli:

 

É que o acesso pelo Fisco aos dados e informações bancárias podem, legitimamente, resultar em notificações dos contribuintes e mesmo em lançamento tributário, situações em que, havendo pretensão resistida, a questão será judicializada. À Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, órgão da Advocacia-Geral da União, caberá a defesa da atuação do Fisco em âmbito judicial, sendo, para tanto, necessário o conhecimento dos dados e informações embasadores do ato por ela defendido.

Tal previsão, ressalte-se, já é prática recorrente: os órgãos de defesa da União solicitam aos órgãos federais envolvidos em determinada lide informações destinadas a subsidiar a elaboração de contestações, recursos e outros atos processuais.

(...)

De nada adiantaria a possibilidade de acesso dos dados bancários pelo Fisco se não fosse possível que essa utilização legítima fosse objeto de defesa em juízo por meio do órgão por isso responsável, a Advocacia-Geral da União, razão pela qual entendo que o art. 3º, § 3º, da LC 105/2001 é constitucional.

 

Confira-se esse mesmo entendimento no julgamento do RE n. 601314:

 

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. DIREITO TRIBUTÁRIO. DIREITO AO SIGILO BANCÁRIO. DEVER DE PAGAR IMPOSTOS. REQUISIÇÃO DE INFORMAÇÃO DA RECEITA FEDERAL ÀS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. ART. 6º DA LEI COMPLEMENTAR 105/01. (...) 6. Fixação de tese em relação ao item “a” do Tema 225 da sistemática da repercussão geral: “O art. 6º da Lei Complementar 105/01 não ofende o direito ao sigilo bancário, pois realiza a igualdade em relação aos cidadãos, por meio do princípio da capacidade contributiva, bem como estabelece requisitos objetivos e o translado do dever de sigilo da esfera bancária para a fiscal”. (...) 8. Recurso extraordinário a que se nega provimento.

(STF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Edson Fachin, j. 24.02.16)

 

Não se concebe que, admitida a “judicialização” pelo Supremo Tribunal Federal, seja ela válida somente para a cobrança do crédito tributário, mas não para a punição do respectivo sonegador. Cumpre destacar, como o fez o Relator Ministro Dias Toffoli, “(...) que o instrumento fiscalizatório instituído nos arts. 5º e 6º da Lei Complementar nº 105/2001 se mostra de extrema significância ao efetivo combate à sonegação fiscal no país” (destaques originais). É certo que os dados bancários, de qualquer modo, permaneceriam sob sigilo, igualmente imposto ao Ministério Público.

Se é possível a transferência do sigilo bancário da instituição financeira ao Fisco para que este intente por seu órgão competente a ação cabível, não há razão ponderável para se excluir a ação penal.

Por essa razão que não fica obstado ao Ministério Público Federal, que tem garantida, para o exercício de suas atribuições, a requisição de diligências investigatórias a que aludem os arts. 129, VIII, da Constituição da República e 8º da Lei Complementar n. 75, de 20.05.93, requisitar diretamente informações bancárias à Receita Federal.

Sendo certo que o sigilo é transferido, sem autorização judicial, da instituição financeira ao Fisco e deste à Advocacia-Geral da União, para cobrança do crédito tributário, bem como ao Ministério Público, sempre que, no curso de ação fiscal de que resulte lavratura de auto de infração de exigência de crédito de tributos e contribuições, constate-se fato que configure, em tese, crime contra a ordem tributária (Decreto n. 2.730, de 10.08.98, art. 1º e Lei n. 9.430/96, art. 83), a iniciativa deste não é fato jurídico pelo qual se institui um requisito anteriormente inexistente.

Entendimento que se concilia com a jurisprudência deste Tribunal Regional:

 

DIREITO PENAL. PROCESSO PENAL. EMBARGOS INFRINGENTES. SIGILO BANCÁRIO. PRIVACIDADE. CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. ARTIGO 5º, INCISO X. BANCO CENTRAL. CONTROLE. MERCADO DE CÂMBIO. ACESSO A DADOS ESPECÍFICOS. POSSIBILIDADE. TRANSMISSÃO DE DOCUMENTOS SIGILOSOS AO MINISTÉRIO PÚBLICO. AUTORIZAÇÃO LEGAL. LEI 7.492/86, ARTIGO 28. CONSTITUCIONALIDADE. PROVAS VÁLIDAS. EMBARGOS DESPROVIDOS.

1. O sigilo bancário ostenta proteção constitucional, o que se dá no âmbito do direito fundamental à privacidade (Constituição da República, art. 5º, X). Trata-se de resguardo da Lei Maior ao indivíduo em sua esfera pessoal e, por conseguinte, ao trato privado de seus assuntos, atividades e interesses. Não obstante isso, pode a legislação infraconstitucional disciplinar hipóteses específicas de levantamento dessa proteção, de maneira a conciliá-la com a tutela de outros interesses igualmente protegidos constitucionalmente, desde que assegurada a mínima intervenção possível nos direitos individuais, e a necessidade concreta da medida.

2. Incumbe ao Banco Central do Brasil (Decreto 23.258/33; Decreto-lei 9.025/46; Lei 4.131/64; Lei 4.595/64 - art. 11, III, bem como arts. 56 e 57, a serem conjugados com disposições pretéritas -; Lei 4.728/65; Lei 9.069, art. 65) fiscalizar o mercado de operações de remessa internacional de recursos em moeda nacional, bem como complementar de maneira técnica sua normatização. Foi no exercício dessa atribuição, ou seja, de fiscalizar as transações internacionais feitas em moeda nacional com crédito em contas tituladas por terceiros residentes no exterior, que o BACEN se deparou com operação aparentemente inconsistente, exigindo (o que também lhe cabe) dados complementares, fornecidos pela instituição financeira. Portanto, foi válida a obtenção direta, pela autarquia, das informações protegidas.

3. A conduta dos agentes da autarquia foi tomada com base no art. 28 da Lei 7.492/86 (em disposição que foi repetida no art. 8º da Lei Complementar 105/2001, lei esta que não havia sido promulgada ao tempo dos fatos). O ato de transferência previsto na disposição em questão constitui modo de garantir a efetividade do ordenamento jurídico, e a própria interação entre órgãos estatais que, nas suas esferas e plexos de atribuições, fiscalizam ou investigam a ocorrência de ilícitos. É incontroverso que a efetividade da Lei Penal e a garantia de higidez de condutas ligadas à regulação de operações financeiras são temas de relevância constitucional e cuja proteção determina a Constituição da República (arts. 21, VIII; 48, XIII; e 192).

4. Constatada por autoridades competentes, no exercício impessoal de suas atribuições normativas, a possível ocorrência de ilícitos penais, não há inconstitucionalidade no comando legal que prevê a remessa dessas informações aos órgãos estatais competentes para a análise das informações, a requisição de diligências que se fizerem necessárias, e a eventual provocação do Estado-juiz na matéria: os órgãos do Ministério Público.

5. A reserva de jurisdição só existe em caso de o próprio texto constitucional assim prever, como ocorre no caso de intervenções estatais específicas no caso de ingresso compulsório nas casas de indivíduos (Constituição Federal, art. 5º, XI), ou de interceptações em dispositivos telefônicos (Constituição Federal, art. 5º, XII). Nessas hipóteses, considerou o Constituinte ser essencial a intervenção prévia do Estado-juiz, sem o que não poderá agir nenhuma autoridade estatal. Quanto a outros casos, permite-se a dispensa de tal autorização prévia, o que de forma alguma significa ignorar o próprio âmbito de proteção dos direitos fundamentais sem a mencionada cláusula. O que deverá haver é um respeito a tais direitos, mas sem a submissão obrigatória e prévia à autoridade jurisdicional.

6. Provas válidas. Ação penal sem nulidades. Embargos desprovidos.

(TRF 3ª Região, Rel. Des. Fed. José Lunardelli, EIfNu n. 2000.61.81.006960-0, j. 17.08.17)

 

Do caso dos autos. A defesa requer seja declarada a nulidade processual, à vista da ilicitude dos elementos informativos que embasaram a ação penal, consistentes na movimentação financeira da empresa Jumbo, obtida por quebra de sigilo bancário, sendo tais informações compartilhadas entre a Receita Federal e o Ministério Público Federal sem a devida autorização judicial.

Sustenta que os dados financeiros do contribuinte, embora possam ser acessados pela União, não podem ser compartilhados do Fisco para outros órgãos do Estado, pois permanecem sob a denominada reserva de jurisdição, o que significa dizer que o alcance dessas informações pelo Ministério Público Federal só pode ser autorizado pelo Poder Judiciário.

Aduz que, mesmo considerando que a quebra do sigilo bancário do contribuinte pela Receita Federal foi lícita, a utilização desta informação neste processo penal, sem que se tenha havido prévia autorização judicial, é vedada pelo ordenamento pátrio, mormente pelo art. 5.º, LVI, da Constituição da República.

Não procede a insurgência defensiva, contudo.

O Ministério Público Federal requereu o compartilhamento das informações obtidas em decorrência da quebra de sigilo bancário e fiscal procedida nos Autos n. 2005.03.00.072993-7, considerando que as investigações relativas às distribuidoras de combustíveis vinham demonstrando constituição dessas empresas em nome de laranjas, encontrando-se José Rildo Lima Feitosa desaparecido, com CPF e título eleitoral cancelados (Id n. 154774845, pp. 94-95), sendo a medida indeferida, com a requisição da íntegra dos procedimentos administrativos-fiscais à Receita Federal (Id n. 154774845, pp. 96-97).

O Termo de Verificação Fiscal relata o procedimento de arbitramento do lucro de ofício, com base nas receitas de revendas registradas nos Livros Diário:

 

DO HISTÓRICO/DA FISCALIZADA

1) A presente ação foi motivada pela representação fiscal de 20/06/2003, movida contra atos ilícitos ocorridos no ano de 1999 envolvendo a contribuinte DISPETRO-DISTRIBUIDORA DE COMBUSTÍVEIS E DERIVADOS DE PETRÓLEO CNPJ 00.537.42810001-78;

2) Neste período, conforme provas obtidas no curso da investigação policial, c fiscalizado apresentou indícios de ter atuado como arrendatário da empresa sob investigação: DISPETRO;

3) Trata-se pessoa jurídica, com atividades de revenda e distribuição de combustíveis e derivados de petróleo, apresentando o seguinte histórico de composição acionária:

Período de 16/11/98 a 21/10/99

Sócio gerente Paulo Henrique da Cruz Alves, CPF 647.670.609-82

Sócio gerente Dennetrus Eli Modolo de Souza Dias CPF 172.807.018-47

Período de 21/10/99 a 08/0512002

INVERSIONES & PETROLEO INC (ESTRANGEIRA)

Quadro Societário atual

Sócio gerente José Rildo Lima Feitosa - CPF 211.461.794-72 (desde 21/10/99)

Sócio gerente Darlene Alves, de Oliveira CPF 965.841.146-00 (desde 08/05/02)

4) A presente ação fiscal visou inicialmente averiguar a regularidade na apuração dos Custos de Mercadorias Revendidas, em relação aos anos-calendário 1999 e 2000, no entanto, haja vista os indícios de sonegação fiscais apurados no curso desta ação fiscal, teve seu período estendido para os anos calendário 2001, 2002 e 2003;

5) Em relação aos anos-calendário 1999 e 2000, a empresa fiscalizada entre ou- regularmente as respectivas Declarações de Informações Económico FiscE Pi, na forma de tributação do lucro: LUCRO REAL, bem como as respectivas DCTFs;

DOS FATOS/AÇÃO FISCAL

1) Em 01/07/2004, o contribuinte em epígrafe, representado pelo seu procurador Carlos Eduardo de Melo, tomou ciência do Termo de Inicio de Fiscalização lavrado em seu estabelecimento no qual o contribuinte foi intimado dentre outras;

Em relação ao ano calendário 1999 e 2000

1.1 Apresentar os livros Diário e Razão onde consta de toda movimentação financeira, inclusive bancária, devidamente escriturada nos ditames da legislação vigente;

1.2 Exibir e disponibilizar, no estabelecimento do fiscalizado, toda documentação. que lhe deu suporte â respectiva escrituração (Notas fiscais de vendas 1 compras, recibos, boletos, comprovantes de pagamento ato);

1.3 Disponibilizar Livro Registro de Entrada e Saída/Apuração ICMS;

1.4 Apresentar Livro Registro de Inventário, no qual deverão constar registrados os estoques existentes no término dos respectivos anos - calendário;

1.5 Comprovar, mediante apresentação do comprovante de entrega, a apresentação da Declaração de Informações Econômico -Fiscais (DIPJ) e Declaração de Tributos Federais (DCTF)

Em relação aos anos -calendário 2001, 2002, 2003 e 2004 (até maio/2004), objetivando as verificações preliminares:

Disponibilizar as mesmas informações/ documentos/livros solicitadas nos itens 1.1 a 1.5 acima já discriminados;

2) Por ocasião da lavratura do Termo retro, verificou-se, que o estabelecimento encontrava-se em novo domicílio fiscal à rua Lídia Giorge Vedovelo, 80 Jd Calegaris – Paulínia/CEP 13.140-000 -SP, cujo evento consta da última alteração contratual exibida pelo contribuinte naquela ocasião, mas até então não informado à Receita Federal; Ressalta-se, porém que, em 18/08/04, o contribuinte mais uma vez alterou seu domicílio fiscal para rua 31 de Março 81 Santa Cecilia - Paulínia/SP.

3) Em 30/08/2004, em resposta ao citado Temo de Inicio de Fiscalização, o fiscalizado apresentou carta resposta e disponibilizou parte dos documentos solicitados conforme a seguir detalhado:

Documentos entregues à Receita Federal.

a. Livro diário nº 3 e razão nº 3 referente ao ano calendário 1999;

b. Livro diário nº 4-a (jan a mar/2000), 4-b (abr a junho/2000), 4-c (jul a set/2000) e 4-d (out a dez/2000);

c. Livro razão nº 4-a (jan a mar/2000), 4-b (abr a junho/2000), 4-c (jul a set/2000) e 4-d (out a dez/2000);

d. Notas fiscais de despesas, recibo, comprovantes de pagamentos, contas (água, luz, telefone etc.) referente aos anos calendários 1999 a 2002;

e.  DCTFs 1º ao 4º trimestre dos anos calendários 1999, 2000 e 2003;

f. Recibo de entrega das DCTFs 1º ao 4º trimestre do ano calendário 2001;

g. Recibo de entrega das DCTF 1º ao 3º trimestre do ano calendário 2002;

h. DCTF do 4º trimestre do ano calendário 2002;

i. Recibo de entrega DIPJ 1999/98;

j. DIPJ referente aos anos calendários 1999 a 2003;

k. Contrato social e alterações (cópias).

Documentos à disposição da Receita Federal no estabelecimento do contribuinte

l. Notas fiscais de entrada e saída referente ao período de jan/99 a dez/2000;

m. Notas fiscais de entrada e salda referente ao período de jan/02 a dez/2002;

n. Notas fiscais de saída (5ª via) referente ao período de jan/03 a dez/2003;

o. Notas fiscais de entrada e saída referente ao período de jan/04 a mai/2004;

Documentos Pendentes de entrega à Receita Federal

p. Livro diário e razão referente aos anos calendário 2001 a 2004 (até jun/2004) (em elaboração/contabilização);

q. Livros de entrada e salda de mercadoria/Apuração de ICMS referente ao período de jan/99 a dez/03; (em poder da Fiscalização Estadual);

r. Livros de entrada e saída de mercadoria/Apuração de ICMS referente ao período de jan/99 a jun/04; (em elaboração/contabilização);

s. Livro de Registro de Inventário dos estoques referente aos anos calendário 1999 a 2004(até jun/2004);

t Notas Fiscais de entrada e saída referente ao ano calendário 2001 (em poder da Fiscalização Estadual);

u. Notas Fiscais de entrada referente ao ano calendário 2003 (em poder da Fiscalização Estadual);

v. Extratos bancários de conta corrente e investimento (todos os bancos) referente à movimentação financeira de jan/99 a dez/2000;

w. Relação das ações judiciais em curso;

4) Mediante analise dos documentos, livros exibidos e disponibilizados, pelo contribuinte em relação aos anos calendário 1999 e 2000, esta fiscalização considerou as respectivas escritas fiscais/contábil imprestável para apuração/demonstração do LUCRO REAL, com base nos seguintes argumentos:

4.1 que o contribuinte efetuou a escrituração do livro Diário/Razão, dos fatos contábeis ocorridos nas contas CAIXA, BANCOS C/MOVIMENTO, MERCADORIAS e VENDAS DE MERCADORIAS, a revelia das exigências formais intrínsecas, mais especificamente, efetuou os registros de todas as compras e revendas de mercadorias de forma consolidada no último dia de cada mês, a crédito e débito da conta CAIXA respectivamente, sem a devida discriminação detalhada dos documentos fiscais/faturas/ fornecedores vinculados a cada operação e sem a devida observância do rigor cronológico/seqüencial exigido no registro dos fatos, de tal forma a resultar, inclusive, saldos credores da conta CAIXA em diversos períodos. Tal procedimento, sem a devida exibição de relatórios/livros auxiliares, inviabiliza a auditoria da evolução/exatidão dos saldos das respectivas contas;

4.2 a conta CAIXA apresenta, de forma sucessiva e reiterada ao longo de todos os meses do período de 1999 a 2000, diversos lançamentos de saques (em espécie) estapafúrdios e infactíveis na prática de serem operacionalizados, chegando, por exemplo no dia 08/12/99, a quantia de R$ 1.133.930,00 (Banco do Brasil) e R$ 294.568,77 (Banco Itaú), resultando o saldo final neste dia o montante inimaginável de R$ 1.592.802,26 em espécie. Tais fatos, considerados inviáveis, vem corroborar a convicção preliminar desta fiscalização, quanto as fortes inconsistências e incoerências até aqui verificadas nas escritas fiscais/contábeis, considerando-as, no mínimo, duvidosas;

5) Continuando a argumentação, o contribuinte sob o regime obrigatório de tributação do IRPJ-LUCRO REAL, estando obrigado à apuração de Custos de Mercadorias Revendidas, adotou sistemática de "Inventário Periódico" dos estoques (trimestral), efetuando portanto lançamento misto na conta COMPRAS MERCADORIAS;

(...)

ANO CALENDÁRIO 1999 (CUSTOS MERCADORIAS REVENDIDAS)

6.1 em pese a impossibilidade de análise do Livro de Registro de Inventário de Estoques ficou constatado erros grosseiros, que resultaram na majoração indevida dos custos, por conseguinte prejuízos fictícios e finalmente, lesão ao Fisco Federal;

6.2 estoque final em 31/12/98 declarado pelo contribuinte na DIRPJ 1999/1998(R$ 73.794,00) é divergente do estoque inicial (01/01/99) referente ao 1º Trimestre/99 declarado na linha 23 da ficha 5 A (R$ 897.007,26) --> majoração de estoque inicial de R$ 823.213, 26;

6.3 o estoque final referente ao 1º trimestre (31/03/1999) declarado na linha 26 da ficha 5A (R$ 1.093.888,65) é divergente do estoque final declarado no Balancete de Verificação contido na folha 36 do Livro Diário nº 3 de 1999 (R$ 354.172,56);

6.4 No 2º trimestre o Custo das Mercadorias Revendida declarado na ficha 5 A pag4, compreendem aos custos acumulados aferidos para período de 01/01/99 a 30/06/1999. Por sua vez, o valor declarado na linha 24 da ficha 5 A pag4- Compras de Mercadorias à vista, reflete o saldo de compras acumuladas realizadas no período de 01/01/99 a 30/06/99;

6.5 Portanto, na apuração de Custo de Mercadorias Revendidas deste trimestre, o estoque inicial do período, deve ser o saldo de estoque inicial em 01/01/1999(R$73.794,00), o que diverge do valor declarado na linha23 ficha 5 A - Estoque no Inicio do Período Base - R$ 2.732.152,24;

6.6 O mesmo erro é repetido sucessivamente nos dois trimestres subseqüentes distorcendo e comprometendo da apuração do CUSTO DE MERCADORIAS REVENDIDAS declarados e conseqüentemente a averiguação quanto à exatidão do resultado contábil/fiscal apresentado;

(...)

7) Através do Demonstrativo de Análise balanço/Origem e Aplicação de Recursos, realizada de forma comparativa em relação ao balancete de 1999x1998 e 2000x1999, constata-se:

7.1 Apresenta expressivo saldo na conta CAIXA no encerramento dos dois exercícios;

7.2 Embora tenha apurado prejuízo contábil/fiscal nos dois anos calendário. apresenta grande disponibilidade de recursos financeiros, tendo que exclusivamente como fonte de origem destes. a manutenção do passivo "Impostos a Pagar (ICMS-SP)":

ICMS A PAGAR

EM 31/12/99- R$ 1.802.676,00

EM 31/12/00- R$ 6.105.646,00

8) Em face a argumentação acima suscitada, foi lavrado o devido Termo de constatação e Intimação Fiscal, visando dar ciência ao contrbuinte dos fatos acima apurados que implicaram na DESCLASSIFICAÇÃO DA ESCRITA (ANO 1999 e 2000);

9) Neste mesmo Termo, o contribuinte foi intimado conforme transcrição do texto a seguir :

"Diante dos fatos constatados no item 4, 5, 6 e 7 retro e das pendências suscitada nos ítens 3. p à w e já tendo decorrido 76 dias desde o inicio da ação fiscal em curso, resolve esta fiscalização intimar o contribuinte em epígrafe nos prazos abaixo especificados, a contar da ciência do presente Termo:

9.1 Apresentar Livros Registro de Entrada e Saída de Mercadorias/Apuração ICMS e respectivo Livro de Registro de Inventário,

Prazos Anos Calendário 1999 e 2000 (10 dias)

Anos Calendário 2001 a 2004 (30 dias)

Obs: Em relação aos livros que se encontram em poder da Fiscalização Estadual -SP, requisitar e apresentar cópias autenticadas pela Autoridade Fazendária Estadual das falhas dos livros fiscais; incluindo aquelas referentes a Termos de abertura e encerramento. Apresentar documento formal (Termos) que comprove a retenção dos respectivos livros fiscais pela citada Autoridade Fazendária;

9.2 Tendo em vista a imprestabilidade acima declarada em relação às escritas fiscal/contábil dos anos calendário 1999 e 2000 (Livros Diário e Razão), efetuar a re-escrituração, de todo período de 1999 a 2000 em conformidade com os Livros de Registra de Entradas e Saída de Mercadorias/Apuração do ICMS e Livro de Registro de Inventário de Estoques ; estes por sua vez, fidedigno à movimentação de notas fiscais de compras e vendas de mercadorias e finalmente todas movimentações financeiras (recebimentos e pagamentos) contempladas, de forma a espelhar os extratos bancários e o Livro Caixa da empresa;

9.3 Todos os livros acima deverão ser re-escriturados, observando as normas contábeis e fiscais, as exigências formais intrínsecas (registro na ordem cronológica dos fatos, continuidade e consistência dos saldos etc.) e extrínsecas (encadernação, seqüência da numeração das folhas, registro na JUCESP etc) sendo de suma importância observar:

a) A conta CAIXA e a conta BANCOS c/Movimento devem refletir a exatidão da movimentação financeira na sua ordem cronológica possibilitando a auditoria de seus saldos diários, sendo impreterível a discriminação de histórico, nº de documento/cheque;

b) Relativo a movimentação de COMPRAS DE MERCADORIAS p/ REVENDA, devem constar à identificação de seus fornecedores ou ao menos das notas fiscais/faturas relacionadas ao fato contábil, ou na sua impossibilidade de detalhamento, poderão ser lançados em valor consolidado a cada dia, desde que estejam discriminadas as respectivas notas fiscais individualmente, no Livro Registro de Entrada de Mercadoria, devendo o montante consolidado no dia (compras a vista - a prazo) ser idêntico ao somatório das notas ficais do mesmo dia registrado neste Livro;

c) Da mesma forma a movimentação de VENDAS DE MERCADORIAS deverá ser registrada com transparência e vinculação aos documentos fiscais que lhe deu suporte, devendo constar impreterivelmente o nº da nota fiscal de venda, ou na sua impossibilidade, o valor consolidado da movimentação do dia deverá ser idêntica ao somatório das notas fiscais (vendas a vista - vendas a prazo) registradas no Livro Registro de Saída de Mercadoria;

d) Em relação aos saldos de estoques registrados Livro de Registro de Inventário de Estoque de Mercadorias, deverão estar coerentes (quantidade e valor) com as movimentações de entradas e saídas registradas através das notas fiscais de compras e vendas respectivamente;

e) Resumindo, ao final dos prazos concedidos por esta fiscalização, deverá o contribuinte exibir os Livros Diário/Razão, Livros Registro de Entradas e Saídas de Mercadoria e Apuração ICMS (ainda que cópias autenticadas) e Livro de Registro de Inventário relativo aos anos calendário 1999 e 2000, todos devidamente re-escriturados, cujas escritas deverão permitir, de forma transparente e consistente, aferir a exatidão dos resultados e saldo das contas contábeis mediante o cruzamento dos documentos fiscais / comprobatórios, a tal forma a evitar o recurso extremo do ARBITRAMENTO DO LUCRO;

Prazo para exibição de todos os Livros Fiscais citados no item 9.2 e reiterados no item 9.3, devidamente escriturados:

Ano calendário 1999 -20 dias

Ano calendário 2000-30 dias

9.4 Em relação aos anos calendário de 2001 a 2004 (junho/04), exibir os Livros Diário e Razão (em fase de elaboração/escrituração), dentro do rigor formal intrínseco exigido de praxe na escrituração dos respectivos livros;

Prazo

Em relação ao período de 01/01/01 a 30/06/2004 (20 dias)

9.5 Em relação a período de 01/01/99 a 31/12/2000, apresentar cópia de todos extratos bancários (conta corrente e investimentos) que deram suporte a escrituração contábil/fiscal do mesmo período;

Prazo (10 dias)

9.6 Apresentar todos demais documentos/informações, pendentes.

Prazo (20 dias)

9.7 Providenciar junto a Secretaria da Receita Federal, alteração do domicílio fiscal conforme última alteração contratual de 25/05/2004;

9.8 Esclarecer através de demonstrativos, o motivo da existência dos montantes de ICMS a Pagar identificados no Item 7.2 acima e informando qual sua origem:

a) ICMS - substituição tributária do varejista cobrada e não recolhida, ou

b) ICMS-s/ vendas da empresa - tributação direta”

DA REINTIMAÇÃO

10) Em 21/10/2004, não tendo recebido resposta ao Termo retro citado, esta fiscalização lavrou novo Temo de Constatação e Re-Intimaçâo, no qual reintimou o fiscalizado a apresentar uma nova escrita fiscal/contábil, devidamente re-escriturada nos moldes da legislação em vigor, retratando a realidade dos fatos contábeis relativo aos anos de 1999 e 2000, evitando assim o ARBITRAMENTO DE OFICIO DO LUCRO;

11) Na data de 28/10/2004, o contribuinte apresentou carta resposta ao Termo retro, limitando-se a re-exibir os mesmos livros anteriormente apresentados em relação aos anos calendários 1999 e 2000, os quais já haviam sido considerados imprestáveis para apuração/demonstração do Lucro Real:

(...)

12) Nesta, não tendo sido trazido novos fatos/documentos em relação aos anos - calendário 1999 e 2000, esta fiscalização não tem alternativa senão de recorrer ao ARBITRAMENTO DO LUCRO de ofício, com base nas Receitas de Revendas abaixo apuradas conforme valores registrados nos respectivos Livro Diário a seguir:

(...)

DA MAJORAÇÃO DAS PENALIDADES NOS CASOS DE EVIDENTE INTUITO DE FRAUDE

13) Torna-se evidente o intuito de fraude constatado no presente procedimento fiscal e está caracterizado, conforme os fatos acima já descritos, pela prática sistemática e reiterada adotada pelo contribuinte em omitir rendimentos do Fisco em ambos anos-calendário até aqui fiscalizados.

14) É claro e evidente o intuito doloso do contribuinte no sentido de impedir, ou ao menos entravar temporariamente, o alcance, por parte desta fiscalização, às infrações tributárias praticadas sistemática e reiteradamente no período de jan/99 a dez/00, o qual sucessivamente se valeu de artifícios protelatórios, para ocultar a realidade dos rendimentos auferidos, uma vez que havia oferecido à tributação, através das respectivas DIPJ e DCTF, valores muito inferiores e distorcidos em relação ao devido ao Fisco Federal;

15) Verifica-se que em tese, embora venha efetuar o registro de suas receitas de revendas de mercadores, tenta, em tese, forjar resultados nega praticando a majoração dos CUSTOS DE MERCADORIAS REVENDIDAS, sem qualquer critério lógico, a revel das técnicas e procedimentos de praxe preconizados pela legislação contábil/fiscal;

16) Apesar de mais de 80 dias de prazo concedido por esta fiscalização, para que re-escrituração de sua escrita contábil/fiscal, considerada imprestável para apuração/demonstração do LUCRO REAL, o contribuinte não aproveitou a oportunidade para tentar ao menos provar/ derrubar as argumentações desta fiscalização, limitando-se tão somente a devolver os mesmo livros fiscais ora apresentados (...) (destaques originais, Id n. 154774843, pp. 61-72)

Como se vê, verifica-se que apenas parte da documentação requisitada pela Receita Federal foi disponibilizada pela empresa fiscalizada. E a partir da análise dos documentos entregues, a Receita Federal constatou que foram inseridos, nos livros contábeis e fiscais da Jumbo, elementos inexatos na escrituração das operações da empresa com o propósito de redução da base de cálculo dos tributos devidos, ensejando que a Autoridade Fazendária considerasse a escrita contábil e fiscal imprestável para demonstração do lucro real do período.

Além disso, a Receita Federal analisou as Declarações de Informações Econômico-Fiscais da Pessoa Jurídica (DIPJ) dos anos-calendário de 1999 e 2000 entregues pela Jumbo, identificando falsas informações consistentes na majoração indevida dos custos e no apontamento de prejuízos fictícios, também com a finalidade de redução indevida da base de cálculo dos tributos federais devidos.

A empresa apresentou expressivo saldo na conta Caixa no encerramento dos anos-calendário de 1999 e 2000, embora tenha apurado prejuízo contábil/fiscal no período. A conta Caixa apresentou, de forma sucessiva e reiterada, ao longo de todos os meses de 1999 e 2000, lançamentos de saques, em espécie, de valores superiores a R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais).

A Receita Federal procedeu então ao arbitramento do lucro de ofício, com base nas receitas de revendas declaradas nas DIPJs e escrituradas nos respectivos Livros Diário de 1999 e 2000.

No tocante à ilicitude das provas repassadas ao Ministério Público Federal pela Receita Federal, a MM. Magistrada sentenciante assinalou:

 

A defesa alegou que as provas apresentadas pela acusação seriam ilícitas porque repassadas ao Ministério Público pela Receita Federal sem prévia autorização judicial.

Não há violação ao disposto no art. 5º, X (direito à intimidade) e XII (sigilo de dados) da Constituição Federal no repasse de informações relativas à CPMF pelas instituições financeiras à Receita Federal, previsto no parágrafo 3º do artigo 11 da Lei n. 9.311/1996, alterado pela Lei n. 10.174/2001.

A solicitação de informações relativas aos anos anteriores à vigência da Lei n. 10.174/2001 não vulnera o princípio da irretroatividade das leis, uma vez que se referem a procedimentos investigativos iniciados depois de sua vigência e não a nova hipótese de incidência do tributo.

Igualmente, detectada pelo Fisco alguma ilicitude passível de persecução penal, o órgão fiscal possui o dever jurídico de comunicar o Ministério Público para adoção das providências cabíveis, sem necessidade de prévia autorização judicial, sob pena de inviabilizar a persecutio criminis. Desnecessária, pois, autorização judicial para o repasse de informações bancárias nessa hipótese, não restando configurada prova ilícita no processo criminal. (Id n. 154774854, pp. 9-10)

 

No que concerne à utilização dos dados da CPMF - Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira, a Lei n. 9.311/1996, que instituiu a CPMF, determinou que as instituições financeiras responsáveis pela retenção dessa contribuição prestassem informações à Secretaria da Receita Federal, especificamente, sobre a identificação dos contribuintes e os valores globais das respectivas operações efetuadas, proibindo, contudo, no § 3º do art. 11, a utilização desses dados para constituição do crédito relativo a outras contribuições ou impostos.

A Lei n. 10.174/2001 revogou o § 3º do art. 11 da Lei n. 9.311/1991, permitindo a utilização das informações prestadas para a instauração de procedimento administrativo-fiscal tendente a verificar a existência de crédito tributário relativo a impostos e contribuições e para lançamento, no âmbito do procedimento fiscal, do crédito tributário porventura existente.

Considerando que o art. 144, § 1º, do Código Tributário Nacional prevê que as normas tributárias procedimentais têm aplicação imediata e que os dispositivos que autorizam a utilização de dados da CPMF pelo Fisco para apuração de eventuais créditos tributários referentes a outros tributos são normas procedimentais, conclui-se que incidem de imediato, ainda que relativas a fato gerador ocorrido antes de sua entrada em vigor (TRF 3ª Região, ACR n. 2002.61.06.007391-1, Rel. Des. Fed. Mauricio Kato, j. 07.12.15).

Ademais, a Lei Complementar n. 105/01 prevê que, recebidas as informações de ilícito fiscal, as autoridades fazendárias poderão requisitar às instituições financeiras, as informações e os documentos de que necessitar, sem prévia autorização judicial, e desde que haja processo administrativo-fiscal em curso (art. 5º, § 4º e art. 6º).

O Plenário do Supremo Tribunal Federal pronunciou-se sobre a constitucionalidade do referido procedimento no RE n. 601.314, com acórdão publicado em 16.09.16, bem como nas ADIs ns. 2390, 2859, 2397 e 2386, publicados os respectivos acórdãos em 21.10.16.

No que concerne à matéria, no julgamento das ADI n. 2.390, 2.386, 2.397 e 2.859, o Supremo Tribunal Federal referiu à verdadeira "transferência do sigilo bancário" das instituições financeiras ao Fisco, sem que se desnature, com ela, o caráter sigiloso da movimentação bancária do contribuinte, observados os limites do art. 145, § 1º, da Constituição da República, percorrida a possibilidade de o acesso a tais informações resultar em lançamento tributário e, em casos de pretensão resistida, na judicialização da matéria, com a defesa do Fisco, em juízo, pela Advocacia-Geral da União.

Assim, admitida a judicialização pelo Supremo Tribunal Federal, não se concebe seja ela válida somente para a cobrança do crédito tributário, mas não para a punição do respectivo sonegador, sendo certo que ao Ministério Público também é imposto o dever de sigilo dos dados bancários compartilhados.

Do mesmo modo como o sigilo é transferido, sem autorização judicial, da instituição financeira ao Fisco e deste à Advocacia-Geral da União, para cobrança do crédito tributário, também o é ao Ministério Público, sempre que, no curso de ação fiscal de que resulte lavratura de auto de infração de exigência de crédito de tributos e contribuições, constate-se fato que configure, em tese, crime contra a ordem tributária (Decreto n. 2.730, de 10.08.98, art. 1º e Lei n. 9.430/96, art. 83).

Não se entrevê ilicitude no compartilhamento dos dados protegidos pelo sigilo bancário com a Receita Federal, bem como com o Ministério Público Federal.

Desse modo, inexiste ilegalidade no encaminhamento das cópias dos procedimentos administrativo-fiscais instaurados no âmbito da Receita Federal em face da Jumbo Distribuidora de Combustíveis Ltda. ao Ministério Público Federal, os quais constituíram as Peças Informativas protocolizadas na Procuradoria da República em Campinas (SP) sob o n. 1.34.004.000157/2006-65, dando ensejo à instauração do inquérito policial que embasou a presente ação (Id n. 154774841, pp. 18-90).

Nesse sentido manifestou-se o Ilustre Procurador Regional da República, Dr. Marcus Vinicius de Viveiros Dias (Id n. 159106658, pp. 1-12).

Preliminar que se rejeita.

Passo à apreciação das demais alegações recursais.

Materialidade. A materialidade delitiva encontra-se satisfatoriamente demonstrada pelo Procedimento Administrativo-fiscal n. 10830.007261/2004-73.

A denúncia menciona, por equívoco, o Procedimento Administrativo-fiscal n. 10830.007291/2004-73, quando os fatos imputados, especificamente, ao acusado Demetrius Eli Modolo de Souza Dias, constituem objeto apenas do Procedimento Administrativo-Fiscal n. 10830.007261/2004-73, precisamente no período compreendido entre janeiro e setembro do ano-calendário de 1999, correspondente à gerência que exerceu na Jumbo Distribuidora de Combustíveis Ltda., conforme a inicial acusatória e as razões recursais do Parquet.

O Procedimento Administrativo-fiscal n. 10830.007261/2004-73 abrange os fatos ocorridos nos anos-calendário de 1999 e 2000, porém dizem respeito ao acusado Demetrius apenas os fatos que se deram entre janeiro e setembro de 1999.

O Procedimento Administrativo-fiscal n. 10830.004087/2005-98 compreende os fatos ocorridos nos anos-calendário de 2001 a 2003, não se dirigindo, portanto, ao acusado Demetrius.

Sobressaem os seguintes elementos de convicção:

a) Demonstrativo Consolidado do Crédito Tributário do Processo, apurado crédito total, com juros e multa, de R$ 22.122.027,84 (vinte e dois milhões, cento e vinte e dois mil, vinte e sete reais e oitenta e quatro centavos) e demonstrativos de apuração do Imposto de Renda Pessoa Jurídica - IRPJ e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL (Id n. 154770529, pp. 27-47);

b) Declaração de Informações Econômico-Fiscais da Jumbo Distribuidora de Combustíveis Ltda. dos anos-calendário de 1999 e 2000 (Id n. 154770530, pp. 4-98);

c) Termo de Encerramento, com data de 10.12.04 (Id n. 154770531, p. 2);

d) Acórdão n. 9.292, de 03.05.05, da Delegacia da Receita Federal de Julgamento de Campinas (SP), que julgou parcialmente procedente o lançamento apenas para reduzir a multa de ofício (Id n. 154770531, pp. 57-77);

e) Acórdão n. 108-09.092, de 08.11.06, da 8ª Câmara do 1º Conselho de Contribuintes, que negou provimento ao recurso de ofício (Id n. 154770531, pp. 123-127);

f) Despacho n. 108-104/2008, de 12.05.08, do Presidente da 8ª Câmara do 1º Conselho de Contribuintes, que negou seguimento ao recurso especial da Fazenda contra o Acórdão n. 108-09.092 (Id n. 154770531, p. 190);

g) Extrato de Encerramento do Procedimento Administrativo-fiscal n. 10830.007291/2004-73, com arquivamento determinado em 11.06.08 (Id n. 154770531, pp. 194-200);

h) Autos de Infração do Imposto de Renda Pessoa Jurídica – IRPJ e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL, relativos aos anos de 1999 e 2000 (Id n. 154774841, pp. 39-58);

i) Ofício n. 176/2007, de 13.06.07, da Delegacia da Receita Federal do Brasil de Campinas (SP), de acordo com o qual, no Procedimento Administrativo-fiscal n. 10830.007291/2004-73, o contribuinte foi cientificado em 09.08.05 do acórdão da DRJ/CPS n. 9.292/05, que extinguiu parcialmente o débito, sendo a parte mantida do lançamento transferida para o Processo n. 10830.004461/2005-55, encaminhado para inscrição em Dívida Ativa em 21.09.05 (Id n. 154774843, p. 59);

j) Termo de Verificação Fiscal – Encerramento Parcial, alusivo ao Procedimento Administrativo-fiscal n. 10830.007291/2004-73 (Id n. 154774843, pp. 61-72);

k) Ofício n. 153/2011, de 23.02.11, da Procuradoria Seccional da Fazenda Nacional em Campinas (SP), o qual informou que a dívida atualizada para fevereiro de 2001 resultava na importância de R$ 31.149.217,68 (trinta e um milhões, cento e quarenta e nove mil, duzentos e dezessete reais e sessenta e oito centavos), ensejando as inscrições em Dívida Ativa da União n. 80.2.05.041314-41 e 80.6.05.075938-87, sem registros de pagamento ou de parcelamento (Id n. 154774845, pp. 39-40).

Quando da decisão de recebimento da denúncia, o MM. Magistrado a quo consignou, quanto ao Procedimento Administrativo-fiscal n. 10830.007291/2004-73 (leia-se: Procedimento Administrativo-Fiscal n. 10830.007261/2004-73), que a constituição definitiva do crédito deu-se em 19.05.08 (Id n. 154774849, p. 20 e Id n. 154770531, p. 190). A Delegacia da Receita Federal de Julgamento de Campinas (SP) julgou procedentes os autos de infração, apenas reduzindo a multa de ofício de 150% (cento e cinquenta por cento) para 75% (setenta e cinco por cento), decisão confirmada pelo 1º Conselho de Contribuintes. Constituído o crédito tributário, foi indeferido o pedido formulado pela defesa do acusado Demetrius de realização de perícia (Id n. 154774851, pp. 33-35), o que se revelou acertado pelo conjunto dos demais elementos probatórios reunidos nos autos.

As provas produzidas no âmbito do procedimento administrativo-fiscal e no inquérito, submetidas ao contraditório em Juízo, são hábeis à fundamentação da condenação, não havendo se falar em contrariedade ao disposto no art. 155 do Código de Processo Penal.

Autoria. A Jumbo Distribuidora de Combustíveis Ltda. foi constituída em 15.05.97, por José Rildo Lima Feitosa e Darlene Alves de Oliveira, voltando-se ao comércio atacadista de combustíveis. Em 23.11.98, José Rildo Lima Feitosa e Darlene Alves de Oliveira retiraram-se da sociedade, nela ingressando Paulo Henrique da Cruz Alves e Demetrius Eli Modolo de Souza Dias, os quais saíram da sociedade, por sua vez, em 21.10.99, sendo readmitido José Rildo Lima Feitosa e admitida a Inversiones & Petroleo Inc., situada nas Ilhas Virgens Britânicas, com Claudio Luiz Fabbri como procurador desta empresa (Id n. 154774843, pp. 22-32).

Segundo consta do Instrumento da 3ª Alteração Contratual da Jumbo Distribuidora de Combustíveis Ltda., registrado na JUCESP em 11.06.99, Paulo Henrique da Cruz Alves e o acusado Demetrius Eli Modolo de Souza Dias eram ambos sócios-administradores da empresa (cláusula 8ª) (Id n. 154770529, pp. 11-13). A retirada de ambos consta do Instrumento da 4ª Alteração Contratual da empresa (Id n. 154770529, pp. 14-17 e 154774837, pp. 38-41).

Encontram-se juntadas aos autos procurações outorgadas pela empresa Jumbo, representada por José Rildo Lima Feitosa e por Derlane Alves de Oliveira, a João Thuret de Mello Junior, com data de 12.03.02, e a Ruy Pamplona Correa, com data de 23.08.04 (Id n. 154770529, pp. 19-20). Consta também substabelecimento de João Thuret de Mello Junior a Carlos Eduardo de Carvalho Melo, com data de 14.08.02 (Id n. 154774848, p. 18).

Interrogado em Juízo, o acusado Demetrius Eli Modolo de Souza Dias disse que é empresário, tem 2 (dois) filhos menores, responde a outros processos criminais não transitados em julgado e aufere R$ 5.000,00 (cinco mil reais) mensais. Foi sócio administrador da Jumbo, de janeiro a outubro de 1999. No ano de 2000, não estava mais ligado a essa empresa. Houve problema com seu sócio à época, Paulo Henrique da Cruz Alves, que passou a discordar de sua gestão. Operava na área comercial. Chegou a faturar R$ 7.000.000,00 (sete milhões de reais) mensais. Quando se retirou da empresa, José Rildo assumiu em seu lugar. Após sua saída da Jumbo, voltou a ter empresa no setor de combustíveis, a Cruzeiro do Sul, o que se deu por volta do ano de 2001 até o ano de 2006. Não outorgou procuração com poderes de administração da Jumbo a terceiro. Paulo Henrique era responsável pelo setor financeiro da empresa, enquanto se ocupava do setor comercial, sendo os dois sócios administradores. A Petróleo Contabilidade era o escritório de contabilidade contratado e o Dr. Fábio Bigler era o advogado contratado da Jumbo. Na época dos fatos, compravam combustível da Petrobrás. Em algumas instituições financeiras, caso efetuassem depósito em conta para a Petrobrás, levavam até 4 (quatro) dias para receber o produto, então optavam por efetuar pagamento em espécie para receberem o produto em até 1 (um) dia. Acontecia então de realizarem saques em um determinado dia e pagarem no dia seguinte, em espécie, pois esses 3 (três) dias de vantagem no recebimento do produto faziam diferença no faturamento. Mauro Lepes Guilhem era funcionário da empresa, do setor administrativo (Id n. 154770525).

Interrogado em Juízo, o corréu Mauro Lepes Guilhem declarou que trabalhou na Jumbo, nunca como sócio. José Rildo Feitosa requereu que fosse procurador da empresa, com o que consentiu. Não tinha conhecimento das consequências dessa condição de procurador. Trabalhou na Jumbo de 1999 a 2005, como assistente administrativo. Sua relação com o acusado Demetrius era de patrão e empregado, não sabendo precisar o tempo em que Demetrius permaneceu na empresa, recordando-se que foi um curto período. Foi José Rildo quem requereu figurasse como procurador da empresa, desconhecendo se outras pessoas assinaram procuração. Não tem conhecimento de outras empresas do acusado Demetrius. Derlane, esposa de José Rildo, não comparecia à sede da empresa. A partir de agosto de 2002, passou a ter poderes amplos para movimentar as contas da empresa. Eram realizados pagamentos em valores elevados às usinas. José Rildo que ordenava os pagamentos. No período em que Demetrius foi sócio, era subordinado dele. A partir de 2001, Demetrius ingressou em outra empresa. Havia escritório de contabilidade contratado, assim como escritório de advocacia que prestava serviços para a empresa, não sabendo declinar quais fossem (Id n. 154770524).

Inquirido perante a Autoridade Policial, Mauro Lepes Guilhem disse que atualmente trabalha na parte administrativa da empresa Romeiro Turismo, a qual não possui qualquer relação com a empresa investigada. Trabalhou na Jumbo Distribuidora entre os anos de 1999 e 2005. José Rildo era quem o autorizava a realizar os pagamentos da empresa, a fornecedores, bem como de água, luz, etc. Os pagamentos relativos a tributos cabiam à diretoria. José Rildo era o diretor de fato da empresa, embora houvesse outra sócia, que praticamente não comparecia à empresa (Id n. 154774846, pp. 119-120).

Na fase judicial, Márcio Roberto Carvalho Martins Junior, Auditor Fiscal da Receita Federal, declarou que trabalhou na fiscalização da Jumbo, motivada pela constatação de movimentações financeiras incompatíveis com as declarações de receitas auferidas (DIPJ e DCTF). Houve a quebra do sigilo bancário da empresa e de seus sócios. No curso da fiscalização, foi dada oportunidade ao contribuinte para justificar tais movimentações, mas não foi obtido êxito na comprovação da origem desses recursos, de modo que foi lavrado auto de infração por arbitramento. O contribuinte atendeu parcialmente ao requerimento da fiscalização de apresentação dos extratos bancários, sendo então expedidas requisições de movimentação financeira ao Itaú Unibanco e ao Banco do Brasil. Rui Pamplona acompanhou a fiscalização. Não se recordou, precisamente, de discussão acerca da imunidade de PIS e COFINS para distribuidoras de combustíveis, declarando que tal discussão abrangeria, inclusive, o teor de mistura da gasolina no combustível, desconhecendo o seu desfecho (Id n. 154770520 e 154770521).

Em Juízo, Antônio Fernando Cândido aduziu que trabalhou na Jumbo, de 1999 a 2001, como técnico contábil. Havia escritório de contabilidade externo responsável pela elaboração de toda a contabilidade da empresa. Sua atribuição era reunir os documentos, entregando-os ao escritório de contabilidade contratado, a Petróleo Contabilidade, e, quando de sua devolução, entregando-os aos setores internos correspondentes. Também elaborava as alterações contratuais da empresa, de retirada e ingresso de sócios. Não se recorda da fiscalização no período em que trabalhou na empresa, vindo a tomar conhecimento dela posteriormente. No que concerne às contribuições ao PIS e COFINS, agiam sob a orientação de advogados, de escritório externo, recordando-se de discussão sobre a matéria. Ratificou as declarações prestadas na fase inquisitiva. Desconhece se a empresa efetuava saques de elevados valores de suas contas bancárias, movimentando, em espécie, mais de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais). Na Petróleo Contabilidade, era atendido por Flávio. No escritório de advogados contratado, era atendido pelo Dr. Flávio. Não participou de reuniões com o Dr. Flávio sobre a questão envolvendo a imunidade tributária. Conhece o acusado Demetrius, que foi seu superior hierárquico na Jumbo, nada declarando que o desabone. Mauro Guilhem trabalhava no departamento financeiro, sendo subordinado dos sócios para efetuar pagamentos, não se recordando se detinha poderes de gerência. A empresa contava com, aproximadamente, 10 (dez) funcionários. No período em que Demetrius era sócio da empresa, recebia ordens dele, como sendo seu superior hierárquico. Demetrius retirou-se da empresa em meados do ano 2000. Mauro Guilhem era subordinado de Demetrius e, com a retirada deste, passou a ser subordinado de José Rildo Feitosa. Não tem conhecimento se Mauro Guilhem era procurador da empresa. Demetrius trabalhava no ramo do petróleo. Na época em que foi sócio da Jumbo, não era sócio de outras empresas do ramo (Id n. 154770522).

Na fase policial, Antonio Fernando Cândido aduziu que trabalhou na Jumbo entre maio de 1999 e outubro de 2000, sendo José Rildo Feitosa o único sócio responsável pela empresa, com poderes de decisão sobre o recolhimento dos tributos devidos. Não tinha acesso ao setor financeiro da empresa, desconhecendo sobre a quitação ou impugnação da dívida fiscal (Id n. 154774844, p. 23).

Ouvido em Juízo, Cláudio Luís Fabri aduziu que conhece o acusado Demetrius, tendo trabalhado com ele entre 1999 e 2001, não se recordando com precisão da data. Ratificou o depoimento prestado perante a Autoridade Policial. Atuava como vendedor na empresa. Não sabe dizer se a empresa sacava elevadas quantias, superiores a R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), em espécie, de contas bancárias. Mauro Guilhem desempenhava suas funções na área administrativa e não tinha poder de gerência dentro da empresa. Recebia ordens do acusado Demetrius até que este se retirou da sociedade, tendo ingressado, em seu lugar, José Rildo Feitosa. A empresa contava com 8 (oito) pessoas. Havia escritório de contabilidade contratado. Foi procurador da empresa, na época em que José Rildo assumiu sua administração (Id n. 154770523).

Na Polícia, Cláudio Luís Fabri declarou que foi vendedor da empresa Jumbo. Em outubro de 1999, José Rildo, sócio da empresa, solicitou que figurasse como procurador, com o que consentiu, permanecendo na empresa até maio de 2000. Não tinha acesso ao setor financeiro da empresa, não podendo informar sobre o recolhimento de tributos, sobre os quais José Rildo detinha poderes decisórios (Id n. 154774844, p. 26).

Ouvido na Polícia, o corréu Carlos Eduardo de Carvalho Melo, procurador da empresa Jumbo a partir de agosto de 2002, aduziu que a empresa teve decisão favorável em mandado de segurança que lhe permitia o recolhimento da COFINS nos moldes da Lei Complementar n. 70/91 (Id n. 154774842, p. 50).

Ouvido na fase policial, Ruy Pamplona Correa afirmou que foi advogado da Jumbo Distribuidora de Combustíveis Ltda., entre os anos de 2002 e 2005, representando-a em causas trabalhistas, tributárias e administrativas, sendo contratado por Carlos Eduardo Carvalho Melo, procurador da empresa na época. Os sócios proprietários eram José Rildo Lima Feitosa e Derlane Alves de Oliveira, sendo o primeiro o sócio-administrador, não sabendo dizer se ele também era o responsável pelo recolhimento de tributos devidos. A empresa contava com setor de contas a pagar, cujo responsável era o funcionário Mauro Lepes Guilhem, responsável pelo pagamento de seus honorários, não sabendo esclarecer se também era ele o responsável pelo recolhimento dos tributos da empresa. Acompanhou a ação fiscal da Receita Federal que culminou nas autuações da empresa, tendo apresentado defesa administrativa em primeira instância. Acredita que a empresa realmente deixou de recolher os tributos constantes no procedimento fiscal, pois solicitou as guias de recolhimento ao contador, contudo tais guias não lhe foram entregues, desconhecendo os motivos do não recolhimento. Não soube elucidar se José Rildo e Derlane eram realmente os sócios-proprietários ou tão somente sócios-laranjas. Nas vezes em que esteve na empresa, nunca os encontrou no local. Não era o responsável pelo recolhimento de tributos da empresa (Id n. 154774846, p. 101).

Na Polícia, o corréu Paulo Henrique da Cruz Alves afirmou que foi sócio da empresa Jumbo Distribuidora de Combustível Ltda., entre o ano de 1998 a 1999, não se recordando do mês em que se tornou sócio e nem do mês em que saiu da sociedade. Disse desconhecer o Auto de infração. Sua função na sociedade era externa, ou seja, negociava contratos com a Petrobrás e com a ANP, enquanto ao seu sócio Demetrius Eli Modolo incumbia a parte comercial. No desempenho de sua função de negociar contratos, tinha poderes de gerência, sendo que, no geral, tanto ele, como seu sócio Demetrius tinham poderes de gerência. A sociedade durou até meados de setembro de 1999, quando venderam a empresa para um grupo, sendo um dos sócios desse grupo José Rildo Lima Feitosa. No ano de 1999, vendeu todas as suas empresas, com exceção da empresa Petropalmas Distribuidora de Petróleo Ltda, a qual funcionou efetivamente entre 2006 e 2007 e, atualmente, está tentando reativá-la. Desconhece a existência de sócios-laranjas na empresa Jumbo, bem como nega qualquer tipo de participação nesta fraude. Iniciou atuação no ramo de combustíveis no ano de 1988, quando abriu a primeira empresa de distribuição de óleo diesel e, em seguida, quando da superveniência de exigência da ANP/PETROBRAS de que os distribuidores teriam que ter postos próprios ou contratos com terceiros, começou a comprar e arrendar alguns postos, o que levou o declarante a se associar a inúmeras empresas, mas somente a Jumbo (1998 à 1999) e a Petropalmas (2006 à 2007) funcionaram efetivamente. Nunca teve sócios-laranjas, nunca sonegou tributos, nem se beneficiou da prática de sonegação fiscal (Id n. 154774847, pp. 18-19).

A prova da autoria e do dolo é satisfatória.

O acusado Demetrius não negou que foi sócio-administrador da Jumbo Distribuidora de Combustíveis Ltda., no período de janeiro a setembro de 1999, condição assinalada nos instrumentos contratuais registrados perante a Junta Comercial do Estado de São Paulo (SP), sendo seu poder de gerência e de decisão sobre os subordinados, que perfaziam número aproximado de 10 (dez) funcionários, também confirmado pelo seu sócio à época, o corréu Paulo Henrique da Cruz Alves, bem como pelo corréu Mauro Lepes Guilhem e por Antônio Fernando Cândido e Cláudio Luís Fabri, seus funcionários.

As procurações constantes dos autos não foram outorgadas pelo acusado Demetrius, mas por José Rildo Lima Feitosa e por Derlane Alves de Oliveira, que o sucederam na condução da sociedade, não podendo ser invocadas para isentá-lo de sua responsabilidade pelos atos de gestão, no período dos fatos.

No caso, a fraude encontra-se comprovada e vem descrita no Termo de Verificação Fiscal:

 

DA MAJORAÇÃO DAS PENALIDADES NOS CASOS DE EVIDENTE INTUITO DE FRAUDE

13) Torna-se evidente o intuito de fraude constatado no presente procedimento fiscal e está caracterizado, conforme os fatos acima já descritos, pela prática sistemática e reiterada adotada pelo contribuinte em omitir rendimentos do Fisco em ambos anos-calendário até aqui fiscalizados.

14) É claro e evidente o intuito doloso do contribuinte no sentido de impedir, ou ao menos entravar temporariamente, o alcance, por parte desta fiscalização, às infrações tributárias praticadas sistemática e reiteradamente no período de jan/99 a dez/00, o qual sucessivamente se valeu de artifícios protelatórios, para ocultar a realidade dos rendimentos auferidos, uma vez que havia oferecido à tributação, através das respectivas DIPJ e DCTF, valores muito inferiores e distorcidos em relação ao devido ao Fisco Federal;

15) Verifica-se que em tese, embora venha efetuar o registro de suas receitas de revendas de mercadores, tenta, em tese, forjar resultados nega praticando a majoração dos CUSTOS DE MERCADORIAS REVENDIDAS, sem qualquer critério lógico, a revel das técnicas e procedimentos de praxe preconizados pela legislação contábil/fiscal;

16) Apesar de mais de 80 dias de prazo concedido por esta fiscalização, para que re-escrituração de sua escrita contábil/fiscal, considerada imprestável para apuração/demonstração do LUCRO REAL, o contribuinte não aproveitou a oportunidade para tentar ao menos provar/ derrubar as argumentações desta fiscalização, limitando-se tão somente a devolver os mesmo livros fiscais ora apresentados (Id n. 154774843, pp. 71-72)

 

Não se admite que o acusado Demetrius, responsável pela administração de distribuidora de combustíveis que chegou a faturar R$ 7.000.000,00 (sete milhões de reais) mensais, como constou de seu interrogatório judicial, com o amparo de escritório de contabilidade e de advocacia contratados, não detivesse conhecimento da escrituração contábil e fiscal da empresa e das informações sobre rendimentos auferidos prestadas às autoridades fazendárias.

A Lei n. 4.502, de 30.11.64, art. 71, conceitua a sonegação como "tôda ação ou omissão dolosa tendente a impedir ou retardar, total ou parcialmente, o conhecimento por parte da autoridade fazendária: I - da ocorrência do fato gerador da obrigação tributária principal, sua natureza ou circunstâncias materiais; II - das condições pessoais de contribuinte, suscetíveis de afetar a obrigação tributária principal ou o crédito tributário correspondente". A mesma Lei, no seu art. 72, conceitua a fraude como "tôda ação ou omissão dolosa tendente a impedir ou retardar, total ou parcialmente, a ocorrência do fato gerador da obrigação tributária principal, ou a excluir ou modificar as suas características essenciais, de modo a reduzir o montante do impôsto devido a evitar ou diferir o seu pagamento".

O tipo penal descrito no art. 1º, I, da Lei n. 8.137/90 prescinde de dolo específico, sendo suficiente, para sua caracterização, a presença do dolo genérico, consistente na omissão voluntária do recolhimento, no prazo legal, do valor devido aos cofres públicos. É sancionada penalmente a conduta daquele que não se queda meramente inadimplente, mas omite um dever que lhe é exigível, consistente na declaração de fatos geradores de tributo à repartição fazendária, na periodicidade prevista em lei, de modo que restou satisfatoriamente demonstrado o dolo do acusado.

É de rigor, assim, a manutenção da condenação do acusado Demetrius Eli Modolo de Souza Dias pela prática do delito do art. 1°, I, da Lei n. 8.137/90, considerando a comprovação satisfatória da materialidade, autoria e do dolo, relativamente ao período de janeiro a setembro do ano-calendário de 1999, reformando-se, neste aspecto a sentença, que o condenou por todas as condutas relativas ao Procedimento Administrativo-Fiscal n. 10830.007261/2004-73, abrangendo, integralmente, os anos-calendário de 1999 e de 2000.

Erro de proibição. Antecedentes. Descaracterização. Para configurar o erro de proibição é necessário que o agente suponha, por erro, que seu comportamento é lícito, vale dizer, há um juízo equivocado sobre aquilo que lhe é permitido fazer na vida em sociedade, consoante Julio Fabbrini Mirabete, in verbis:

 

“O agente, no erro de proibição, faz um juízo equivocado sobre aquilo que lhe é permitido fazer na vida em sociedade. Evidentemente, não se exige de todas as pessoas que conheçam exatamente todos os dispositivos legais, mas o erro só é justificável quando o sujeito não tem condições de conhecer a ilicitude de seu comportamento.”

(Mirabete, Julio Fabbrini, Manual de direito penal, São Paulo, Atlas, 2003, p. 201)

 

Assentada essa premissa, é possível afirmar que a existência de antecedentes criminais do agente afasta o erro de proibição, dado que seguramente ele é informado do caráter ilícito de sua conduta nos procedimentos instaurados anteriormente.

Do caso dos autos. A defesa pleiteia o reconhecimento da extinção da punibilidade em razão do erro de proibição indireto, ou justificativa putativa, na medida em que o acusado, orientado, tecnicamente, por seu contador e advogado, acreditava agir licitamente, considerando que “existia uma discussão de Direito sobre a incidência do IRPJ e da CSLL nas operações com derivados de petróleo, combustíveis e minerais do País” (Id n. 158759107, p. 22) e que “esses profissionais da área devidamente habilitados adotavam o entendimento da imunidade do IRPJ e da CSLL nas operações com derivados de petróleo e demais combustíveis” (Id n. 158759107, p. 24), isentando-se o réu da pena, com fulcro no §1º do art. 20 do Código Penal.

Argumenta que, de acordo com o art. 155, § 3º da Constituição da República, apenas o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), o Imposto sobre a Importação (II) e o Imposto sobre a Exportação (IE) poderão incidir sobre operações relativas aos derivados de petróleo e combustíveis do País e esta limitação constitucional ao poder de tributar é o que imporia a não incidência do Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e, sendo assim, ao pretender cobrar o IRPJ e a CSLL sobre o faturamento obtido por meio de atividades imunes a outros impostos, que não o ICMS e os impostos sobre o comércio exterior, a União estaria fora de sua competência, já que seu agir arremete contra o princípio constitucional da rígida discriminação das competências tributárias.

Sustenta que a Emenda Constitucional n. 31/2001 liberou a União para exigir o IRPJ e a CSLL das distribuidoras de combustíveis e derivados do petróleo, porquanto é pacífico que tais contribuições por não terem a esperada vinculação legal são tidas pela doutrina e jurisprudência como verdadeiros impostos disfarçados.

Afirma, por fim, que a incerteza quanto ao pagamento ou não do IRPJ e da CSLL é fato comprovado pela instrução probatória deste processo penal, sendo confirmado pelas testemunhas de defesa e, até mesmo, pelo Auditor Fiscal, testemunha arrolada pela acusação, todas elas sob o compromisso da verdade.

Não lhe assiste razão, todavia.

Quando ouvido em Juízo, Antônio Fernando Cândido, técnico contábil da empresa Jumbo, de 1999 a 2001, recordou-se de discussão concernente às contribuições ao PIS e COFINS, limitando-se a afirmar que agiam sob a orientação de advogados, de escritório externo (Id n. 154770522).

Márcio Roberto Carvalho Martins Junior, Auditor Fiscal da Receita Federal responsável pela fiscalização da empresa Jumbo, não se recordou, precisamente, de discussão acerca da imunidade de PIS e COFINS para distribuidoras de combustíveis, declarando que tal discussão abrangeria, inclusive, o teor de mistura da gasolina no combustível, desconhecendo o seu desfecho (Id n. 154770520 e 154770521).

Ouvido na Polícia, o corréu Carlos Eduardo de Carvalho Melo, procurador da empresa Jumbo a partir de agosto de 2002, aduziu que a empresa teve decisão favorável em mandado de segurança que lhe permitia o recolhimento da COFINS nos moldes da Lei Complementar n. 70/91 (Id n. 154774842, p. 50).

A obrigatoriedade do recolhimento de PIS e COFINS consta de Termo de Verificação Fiscal colacionado aos autos:

 

4. DO DIREITO

A época da ocorrência das infrações as legislações das contribuições já referidas determinavam seus cálculos da seguinte forma, em relação aos contribuintes distribuidores de combustíveis, em suas vendas aos comerciantes varejistas:

Em relação aos fatos geradores ocorridos a partir de 1º de fevereiro de 1999 a legislação das contribuições tornou-se única, e os artigos pertinentes são o 5º e o 6º da Lei nº 9.718, de 27 de novembro de 1998, abaixo transcritos:

"Art. 5º As distribuidoras de álcool para fim carburantes ficam obrigadas a cobrar e a recolher. na condição de contribuintes substitutos, as contribuições referidas no artigo 2º, devidas pelos comerciantes varejistas do referido produto, relativamente às vendas que lhes fizerem.

Parágrafo único. Na hipótese deste artigo. a contribuição será calculada sobre o preço de venda do distribuidor, multiplicado por um inteiro e quatro décimos.

Art. 6º As distribuidoras de combustíveis ficam obrigadas ao pagamento das contribuições a que se refere o art. 2º sobre o valor do álcool que adicionarem à gasolina, como contribuintes e como contribuintes substitutos relativamente às vendas para comerciantes varejistas do produto misturado."

Parágrafo único. Na hipótese deste artigo, os valores das contribuições deverão ser calculados, relativamente à parcela devida na condição de:

I - contribuinte: tomando por base o valor resultante da aplicação do percentual de mistura, fixado em lei, sobre o valor da venda;

II - contribuinte substituto: tomando por base o valor resultante da aplicação do percentual de mistura, fixado em lei, sobre o valor da venda, multiplicado pelo coeficiente de um inteiro e quatro décimos.

Ora, da análise da legislação acima transcrita não resta dúvidas quanto a serem os distribuidores de combustíveis sujeitos às contribuições ao PIS na condição de contribuintes, quanto as suas próprias vendas, e na condição de substitutos, quanto às vendas aos comerciantes varejistas. As alterações com a mudança da legislação, a partir da Lei nº 9.718198, com efeitos a partir de fevereiro de 1999, foi que a incidência das contribuições foi mantida apenas para as vendas de álcool para fins carburantes e do álcool que adicionarem a gasolina, na condição de contribuinte, e de substitutos das mesmas contribuições nas vendas que efetuarem aos comerciantes varejistas.

5. DOS VALORES LANÇADOS:

Os valores lançados da contribuição do Pis nos períodos de apuração de 02/1999 a 10/1999 na condição de Substituto Tributário e na condição de Contribuinte em Operações Próprias, são os já anteriormente discriminados em Quadros. Estes valores foram recolhidos a menor para a Receita Federal, e não foram declarados em DCTF.

O contribuinte foi intimado através do Termo de Intimação Fiscal em 05/05/2000 a discriminar mês a mês os valores recolhidos a titulo de (Pis e Cofins) Operações Próprias e Substituição Tributária. O contribuinte em atendimento à Intimação acima respondeu em 12/05/2000, apresentando um demonstrativo de recolhimento das contribuições, discriminando os valores mês a mês por contribuição. Vale salientar que os recolhimentos efetuados pela empresa foram considerados e compensados com os valores devidos. Em decorrência das compensações da contribuição do Pis Substituição Tributária ficou constatado a insuficiência dos recolhimentos em relação aos valores destacados e cobrados nas Notas Fiscais de Saída desta empresa para os comerciantes varejistas, ficando caracterizado neste caso Apropriação Indébita por parte do Contribuinte.

(...)

5. DA MEDIDA JUDICIAL

A empresa possui uma liminar em Mandado de Segurança, Processo nº 1999. 61.00.004128-0, com efeito a partir do mês de março de 1999, cuja Decisão foi descrita nos seguintes termos: “É imperioso concluir a impossibilidade de manutenção, no sistema normativo, de dispositivo legal que altere o direito da impetrante, de não se sujeitar ao recolhimento da COFINS. É dispositivo que visa modificar, ainda que indiretamente, tratamento constitucional especializado conferido a determinadas atividades. Assim vislumbra-se a presença dos requisitos constantes do art. 7º da Lei 1533/51, razão pela qual concedo o pedido efetuado em sede de medida liminar. Desta forma, determino ao Delegado da Receita Federal que se abstenha de exigir que as refinarias cobrem antecipadamente a Cofins devida pela empresa, com base no art. 4º da Lei 9.718/98, mantendo-se a sistemática de recolhimento antecipado pelas companhias distribuidoras, nos moldes da Lei Complementar nº 70/91".

6. DOS VALORES LANÇADOS:

Os valores lançados da contribuição Cofins em razão de Medida Judicial nos períodos de apuração de 03/1999 a 10/1999 correspondem a diferença entre os valores apurados da Cofins que não foi retida pela Refinaria de Petróleo de acordo com a Lei 9718/98, com os valores apurados da Cofins Substituição Tributária mais Operações Próprias, nos moldes da Lei Complementar 70/91. A diferença apurada acarretará lançamento de oficio com suspensão da exigibilidade por força do art. 151, inciso IV, do CTN, devendo a autoridade administrativa se abster de tomar toda e qualquer medida tendente a exigir o crédito tributário, enquanto persistir a condição suspensiva. (destaques originais, Id n. 154774841, pp. 76-79)

Ademais, neste feito, restou demonstrado que o acusado Demetrius suprimiu e reduziu Imposto de Renda Pessoa Jurídica – IRPJ e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL, nos 3 (três) primeiros trimestres do ano-calendário de 1999 (janeiro a setembro), mediante fraude à fiscalização tributária consistente na inserção de elementos inexatos nos livros contábeis e fiscais da empresa e na prestação de falsas informações nas declarações submetidas às autoridades fazendárias (DIPJ) relativamente aos rendimentos auferidos, oferecendo à tributação valores muito inferiores aos devidos, de modo que não lhe favorece suscitar a existência de discussão sobre a exigência de PIS e COFINS, a cujo recolhimento estava obrigada, de acordo com o Termo de Verificação Fiscal supracitado, considerando que desborda do objeto da imputação descrita na denúncia em relação ao acusado Demetrius, constituindo matéria atinente ao Procedimento Administrativo-Fiscal n. 10830.004087/2005-98.

Outrossim, para a persecução penal contra o acusado Demetrius, basta a constituição definitiva do crédito tributário levada a efeito no Procedimento Administrativo-Fiscal n. 10830.007261/2004-73, não se observando tenha sido a imunidade do IRPJ e da CSLL nas operações com derivados de petróleo alegada na impugnação administrativa apresentada (Id n. 154770531, pp. 6-24).

Importa consignar que o processo criminal não é a via adequada para a impugnação de eventuais nulidades ocorridas no procedimento administrativo-fiscal (STJ, AgRg no AREsp n. 469.137, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 05.12.17 e STJ, AgRg no AREsp n. 1.058.190, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, j. 21.11.17). Além disso, eventuais vícios no procedimento administrativo-fiscal, enquanto não reconhecidos na esfera cível, são irrelevantes para o processo penal em que se apura a ocorrência de crime contra a ordem tributária (STJ, RHC n. 14.459, Rel. Min. Gilson Dipp, j. 16.09.04).

Não se entrevê a caracterização do erro de proibição, portanto.

Dosimetria. Considerando as circunstâncias do art. 59 do Código Penal, notadamente os antecedentes do acusado, a MMa. Magistrada a quo fixou a pena-base em 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão.

Reconheceu a incidência da atenuante da confissão espontânea prevista no art. 65, III, d, do Código Penal, reduzindo a pena em 1/6 (um sexto) para 2 (dois) anos e 1 (um) mês de reclusão.

Sem agravantes.

Ausentes causas de diminuição de pena.

Majorou a pena em decorrência da causa de aumento de pena prevista no art. 12, I, da Lei n. 8.137/90, à vista da sonegação da elevada quantia de R$ 3.943.997,63 (três milhões, novecentos e quarenta e três mil, novecentos e noventa e sete reais e sessenta e três centavos), sem juros e multa, na proporção de 1/3 (um terço), perfazendo 2 (dois) anos, 9 (nove) meses e 10 (dez) dias de reclusão.

Exasperou a pena em razão da continuidade delitiva, à razão de 1/6 (um sexto), por considerar que foram 2 (duas) as omissões imputadas ao acusado, relativamente aos anos-calendário de 1999 e de 2000, resultando em 3 (três) anos, 2 (dois) meses e 26 (vinte e seis) dias de reclusão.

Arbitrou a pena de multa em 67 (sessenta e sete) dias-multa e o valor unitário do dia-multa em 1 (um) salário mínimo vigente à época dos fatos, corrigidos monetariamente pelo índices oficiais até o pagamento.

Tornou definitivas as penas de 3 (três) anos, 2 (dois) meses e 26 (vinte e seis) dias de reclusão e 67 (sessenta e sete) dias-multa.

Estabeleceu o regime inicial aberto.

Presentes os requisitos do art. 44 do Código Penal, substituiu a pena privativa de liberdade por 2 (duas) restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, por igual período, e na prestação pecuniária de 67 (sessenta e sete) salários mínimos, direcionada ao Centro Infantil de Investigações Hematológicas Dr. Domingos A. Boldrini, CNPJ nº 50.046.887/0001-27, com endereço na Rua Dr. Gabriel Porto, nº 1270 – Cid. Universitária, Campinas/SP.

Concedeu ao acusado o direito de recorrer em liberdade.

O Ministério Público Federal recorreu com os seguintes objetivos:

a) reforma da sentença quanto ao reconhecimento da periodicidade anual da conduta imputada ao acusado, que é trimestral, sendo o acusado Demetrius responsabilizado pela inserção de informações falsas em livros contábeis ao longo de 9 (nove) meses, reduzindo os tributos devidos em 3 (três) ocasiões distintas, correspondentes ao fechamento de cada um dos trimestres (janeiro a setembro de 1999);

b) aplicação do concurso formal de crimes, tendo em vista que à unicidade de condutas aliou-se a pluralidade de resultados, consubstanciados na sonegação de múltiplos tributos;

c) valoração da culpabilidade na fixação da pena-base, tendo em vista que Demetrius é empresário experiente, atuante no segmento petrolífero há anos;

d) exclusão da diminuição de pena decorrente da atenuante da confissão espontânea, pois o acusado Demetrius limitou-se a reconhecer que estava à frente da empresa, mas negou que comandasse o seu setor financeiro, o que demonstra sua intenção de não assumir responsabilidade pelo delito em questão;

e) incidência da causa de aumento de pena do art. 12, I, da Lei n. 8.137/90 em proporção mais elevada, considerando que a soma da quantia sonegada de IRPJ e CSLL nos três primeiros trimestres de 1999, sem juros e sem multa, resulta em R$ 2.115.667,69 (dois milhões, cento e quinze mil, seiscentos e sessenta e sete reais e sessenta e nove centavos), atualizados até 30.11.04 (Id n. 154774854, pp. 31-39).

A defesa do acusado Demetrius Eli Modolo de Souza Dias recorreu, a seu turno, com os seguintes objetivos:

a) o reajustamento das penas pela desconsideração dos aumentos decorrentes da causa de aumento de pena do art. 12, I, da Lei n. 8.137/90 e da continuidade delitiva, resultando a pena final de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de reclusão, com a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos;

b) o suposto dano à coletividade deveria estar pormenorizado e empiricamente demonstrado na sentença condenatória, o que não ocorreu, sendo impossível o aumento de pena com base em mera presunção;

c) não há se falar em continuidade delitiva, tendo em vista que o lançamento do tributo se dá por meio de um único ato, consistente na constituição definitiva do crédito fiscal, havendo crime único;

d) requer-se a redução da pena de multa, cujo arbitramento não foi adequadamente fundamentado e não é condizente com a situação econômica do acusado (Id n. 158759107).

Os recursos de apelação da acusação e da defesa merecem parcial provimento.

A pena-base foi arbitrada acima do mínimo legal na sentença, considerando os antecedentes do acusado:

 

Na primeira fase de aplicação da pena, no exame da culpabilidade, considerada como juízo de reprovação exercido sobre o autor de um fato típico e ilícito, verifico que sua intensidade se manteve nos lindes normais ao tipo, apesar do requerimento ministerial em sentida diverso.

No tocante à conduta social e personalidade do acusado, à míngua de elementos nos autos, deixo de valorá-los.

Os motivos e as circunstâncias são normais à espécie. Não há que se falar, no presente caso, em comportamento da vitima. As consequências, apesar de serem graves, são objeto de norma especial. Por esta razão, serão examinadas na terceira fase, e não podem ser consideradas neste momento para evitar o bis in idem.

O réu possui antecedentes criminais, conforme se infere do apenso próprio (fl. 37).

Posto isso, com observância das diretrizes dos artigos 59 e 60 do Código Penal, fixo a pena-base acima do mínimo legal em 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de reclusão. (Id n. 154774854, p. 23)

 

Verifico que não servem os registros criminais constantes do Anexo 11 (Id n. 154774840) como antecedentes criminais hábeis à exasperação da pena-base. Segundo consta do Anexo 11, foram reunidas informações de processos por fatos contemporâneos ou posteriores aos narrados nestes autos, que, ainda que contassem com trânsito em julgado – o que não foi comunicado – , não caracterizariam maus antecedentes.

Com efeito, a condenação, ainda que com trânsito em julgado, por fato posterior àquele descrito na denúncia não pode ser considerada mau antecedente (STJ, HC n. 401.463/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 17.08.17, HC n. 338.378/RS, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 01.12.15, HC n. 332.040/SC, Rel. Min. Gurgel de Faria, j. 24.11.15 e HC n. 275.663/SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, j. 24.02.15; TRF 3ª Região, ACR n. 0000931-69.2017.4.03.6181, Rel. Des. Fed. Paulo Fontes, j. 19.02.18 e ACR n. 0003547-27.2013.4.03.6126, Rel. Des. Fed. Nino Toldo, j. 06.02.18).

O Ministério Público Federal assinala que a soma da quantia sonegada de IRPJ e CSLL nos três primeiros trimestres de 1999, sem juros e sem multa, resulta em R$ 2.115.667,69 (dois milhões, cento e quinze mil, seiscentos e sessenta e sete reais e sessenta e nove centavos), atualizados até 30.11.04.

Não obstante o valor do débito justifique a majoração da pena-base, a título de consequências do delito, na primeira fase da dosimetria das penas, observo que incidiu a causa de aumento prevista no art. 12, I, da Lei n. 8.137/90 (gravidade do dano), na terceira fase da dosimetria das penas, o que obsta a incidência da circunstância judicial.

A jurisprudência considera inadmissível bis in idem valorar negativamente a gravidade do dano na primeira fase da determinação da pena-base como circunstância judicial (CP, art. 59, caput) e, depois, também como causa de aumento (Lei n. 8.137, art. 12, I) (STJ, HC n. 200602476529, Min. Rel. Gilson Dipp, j. 08.05.07; TRF 3ª Região, ACR n. 04006814619964036103, Juiz Fed. Convocado Márcio Mesquita, j. 04.12.07; TRF 2ª Região, ACR n. 200650020003508, Des. Fed. Vigdor Teitel, j. 18.08.10; TRF 4ª Região, ACR n. 200271000166146, Des. Fed. Paulo Afonso Brum Vaz, j.  28.03.07; TRF 4ª Região, ACR n. 200004010006151, Des. Fed. Élcio Pinheiro de Castro, j.  20.08.03).

A culpabilidade do acusado Demetrius é significativa, pois, como empresário experiente do ramo petrolífero e sócio-gestor de distribuidora de combustíveis detentora de expressivo faturamento mensal, que, ele próprio afirmou ter alcançado R$ 7.000.000,00 (sete milhões de reais), no período, era dele esperado lisura e correção na escrituração contábil e fiscal das atividades operacionais e nas declarações de rendimentos efetuadas às autoridades fazendárias.

As demais circunstâncias judiciais revelam-se naturais à espécie delitiva.

Desse modo, sopesada a presença da circunstância judicial desfavorável relacionada à culpabilidade, reduzo a pena-base para 2 (dois) anos e 4 (quatro) meses de reclusão.

Reputo devida a manutenção da incidência da atenuante da confissão espontânea, prevista no art. 65, III, d, do Código Penal, pois mesmo se considerando que o acusado Demetrius limitou-se a afirmar que atuava na área comercial da Jumbo Distribuidora de Combustíveis Ltda, no período de janeiro a setembro de 1999, sem ter, expressamente, assumido sua responsabilidade pelas decisões relacionadas aos pagamentos de tributos da empresa, é certo que declarou que ele e seu sócio Paulo Henrique da Cruz Alves eram ambos os seus administradores no referido período, conforme se extrai do seu interrogatório judicial (Id n. 154770525) e da sentença (Id n. 154774854, p. 18).

Sem agravantes.

Na segunda fase da dosimetria das penas, mantenho a redução de pena decorrente do reconhecimento da atenuante da confissão, resultando em 2 (dois) anos de reclusão.

Sem causas de diminuição de pena.

Mantenho a incidência da causa de aumento de pena do art. 12, I, da Lei n. 8.137/90, tendo em vista o expressivo valor do débito tributário, indicado pelo Parquet, sem juros e multa (R$ 2.115.667,69), que considero a título de dano à coletividade.

Majoro as penas em proporção superior à estabelecida na sentença, em 2/5 (dois quintos), totalizando 2 (dois) anos, 9 (nove) meses e 18 (dezoito) dias de reclusão.

Na hipótese de Imposto de Renda Pessoa Jurídica sujeito à declaração de ajuste anual, considera-se o ano-calendário para fins de continuidade delitiva, não as antecipações realizadas ao longo do período de apuração (STJ, AREsp n. 1225680 PR 2017/0325047-2, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, j. 17.05.18; TRF 3ª Região, ACR n. 0000808-57.2007.4.03.6105, Rel. Des. Fed. Maurício Kato, j. 13.11.17; TRF 4ª Região, ACR n. 0001403-08.2008.4.04.7006, Rel. Márcio Antônio Rocha, j. 04.11.15)

Assim, conforme constou da sentença, deve ser considerada a periodicidade anual da conduta (Id n. 154774854, p. 24), o acusado reduziu e suprimiu o Imposto de Renda Pessoa Jurídica - IRPJ e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL referentes aos 3 (três) primeiros trimestres do ano-calendário de 1999 (janeiro a março; abril a junho e julho a setembro).

Não incide, por conseguinte, o aumento de pena decorrente do art. 71 do Código Penal, considerando que a sonegação deu-se por apenas um exercício financeiro, a despeito da apuração trimestral da tributação.

Na terceira fase da dosimetria a pena resulta fixada em 2 (dois) anos, 9 (nove) meses e 18 (dezoito) dias de reclusão.

 

Dado que tanto a pena privativa de liberdade quanto a pena de multa sujeitam-se a critérios uniformes para a sua determinação, é adequada a exasperação proporcional da sanção pecuniária (TRF da 3ª Região, EI n. 0004791-83.2006.4.03.6110, Rel. Des. Fed. André Nekatschalow, j. 16.02.17; TRF da 3ª Região, ACR n. 0002567-55.2013.4.03.6102, Des. Fed. Cecilia Mello, j. 20.09.16; TRF da 3ª Região, ACR n. 0003484-24.2012.4.03.6130, Rel. Des. Fed. Mauricio Kato, j. 11.04.16).

Assim, fixo a pena de multa em 14 (quatorze) dias-multa.

Torno definitivas as penas de 2 (dois) anos, 9 (nove) meses e 18 (dezoito) dias de reclusão e 14 (quatorze) dias-multa.

 

Mantenho o valor unitário do dia-multa fixado na sentença em 1 (um) salário mínimo vigente à época do fato, corrigido quando do pagamento, que reputo compatível com os ganhos mensais do acusado Demetrius, que declarou auferir R$ 5.000,00 (cinco mil reais) mensais.

Conservo o regime inicial aberto.

Presentes os requisitos do art. 44 do Código Penal, conservo também a substituição da pena privativa de liberdade por 2 (duas) restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, por igual período, e na prestação pecuniária de 67 (sessenta e sete) salários mínimos, direcionada ao Centro Infantil de Investigações Hematológicas Dr. Domingos A. Boldrini, CNPJ nº 50.046.887/0001-27, com endereço na Rua Dr. Gabriel Porto, nº 1270 – Cid. Universitária, Campinas/SP.

No que tange ao valor da prestação pecuniária, cabe readequação.

Dado que a prestação pecuniária associa tanto a punição quanto a reparação, os critérios para sua quantificação devem, na medida do possível, abranger tanto uma quanto outra dessas funções. Para esse efeito, cumpre atentar à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social do agente, às circunstâncias do crime (CP, art. 44, II; CP, art. 59, caput), mas também às consequências, dado que a prestação pecuniária é primordialmente um pagamento em dinheiro à vítima (CP, art. 45, § 1º, c. c. art. 59, caput, do CP).

Reputo adequada a redução da prestação pecuniária para 20 (vinte) salários mínimos, o que guarda proporcionalidade com a pena substituída e com a valoração desfavorável das circunstâncias do delito acima exposta, em atenção ao disposto no art. 59 do Código Penal.

Ressalte-se que a forma de pagamento da prestação pecuniária é estabelecida pelo Juízo das Execuções Criminais, competente para determinar a forma de cumprimento da pena restritiva de direitos, a teor do art. 66 da Lei n. 7.210/84.

Restam mantidos os demais termos da sentença recorrida, que não merecem reparo.

Ante o exposto, REJEITO a preliminar e DOU PARCIAL PROVIMENTO aos recursos de apelação do Ministério Público Federal e da defesa do acusado Demetrius Eli Modolo de Souza Dias para, mantida sua condenação pela prática do delito do art. 1º, I, da Lei n. 8.137/90, afastar a exasperação da pena-base em razão dos antecedentes, majorar a pena-base em razão da culpabilidade, exasperar o aumento decorrente da causa de aumento do art. 12, I, da Lei n. 8.137/90, afastar o aumento decorrente da continuidade delitiva, reduzir, proporcionalmente, a pena de multa, bem como a pena substitutiva de prestação pecuniária, cominando-lhe, em definitivo, as penas de 2 (dois) anos, 9 (nove) meses e 18 (dezoito) dias de reclusão, em regime inicial aberto, e 14 (quatorze) dias-multa, no valor unitário de 1 (um) salário mínimo vigente à época dos fatos, corrigido monetariamente quando do pagamento, substituída a pena privativa de liberdade por 2 (duas) restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, por igual período, e na prestação pecuniária de 20 (vinte) salários mínimos, direcionada ao Centro Infantil de Investigações Hematológicas Dr. Domingos A. Boldrini, CNPJ nº 50.046.887/0001-27, com endereço na Rua Dr. Gabriel Porto, nº 1270 – Cid. Universitária, Campinas/SP, mantidos os demais termos da sentença recorrida.

A defesa do acusado Demetrius Eli Modolo de Souza Dias pleiteia que as intimações sejam endereçadas, exclusivamente, ao subscritor, Dr. Carlos Eduardo Delmondi, OAB/SP n. 165.200 (Id n. 158759107, p. 37). Defiro. Anote-se.

É o voto.



E M E N T A

 

PENAL. PROCESSUAL PENAL. DELITO DO ART. 1º, I, C. C. O ART. 12, I, AMBOS DA LEI N. 8.137/90. SIGILO BANCÁRIO. PROCESSO ADMINISTRATIVO. QUEBRA. ADMISSIBILIDADE. MINISTÉRIO PÚBLICO. SIGILO BANCÁRIO. REQUISIÇÃO DIRETAMENTE À RECEITA FEDERAL. ADMISSIBILIDADE. MATERIALIDADE. AUTORIA. DOLO. ERRO DE PROIBIÇÃO. LANÇAMENTO. VALIDADE. INSTÂNCIAS TRIBUTÁRIA E PENAL. INDEPENDÊNCIA. DOSIMETRIA. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS. CONDENAÇÃO. FATO POSTERIOR. CULPABILIDADE. ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA. CAUSA DE AUMENTO DO ART. 12, I, DA LEI N. 8.137/90. CONTINUIDADE DELITIVA. IRPJ. DECLARAÇÃO DE AJUSTE. PENA DE MULTA. PROPORCIONALIDADE. VALOR UNITÁRIO DO DIA-MULTA. PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA.

1. A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial Representativo de Controvérsia n. 1.134.665/SP, firmou o entendimento de que é lícito ao Fisco receber informações sobre a movimentação bancária dos contribuintes sem a necessidade de prévia autorização judicial, desde que seja resguardado o sigilo das informações, a teor do art. 1º, § 3º, VI, c. c. o art. 5º, caput, da Lei Complementar n. 105/01, c. c. o art. 11, §§ 2º e 3º, da Lei n. 9.311/96.

2. A controvérsia cinge-se ao emprego dessa prova para fins de instrução de processo-crime, pois há entendimento tanto no sentido de que para isso seria imprescindível decisão judicial para a quebra do sigilo bancário (STJ, HC n. 243.034, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 26.08.14, AGRESP n. 201300982789, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 19.08.14, RHC n. 201303405552, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 11.02.14), quanto no sentido de que, tendo sido a prova produzida validamente no âmbito administrativo, não há como invalidá-la posteriormente. Filio-me a esse entendimento, dado não se conceber nulidade a posteriori: a autoridade fiscal tem o dever jurídico (vinculado) de, ao concluir o lançamento de crédito constituído em decorrência de crime fiscal, proceder à respectiva comunicação ao Ministério Público para a propositura de ação penal. Não se compreende como, ao assim fazer, acabe por inviabilizar a persecutio criminis (STJ, HC n. 281.588, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 17.12.13; HC n. 48.059, Rel. Min. Gilson Dipp, j. 12.06.06).

3. Resta confirmada a validade da aplicação imediata da Lei Complementar n. 105/01 em relação a fatos ocorridos anteriormente a sua vigência, pois se trata de norma caráter procedimental (STJ, HC n. 118.849, Rel. Min. Marco Aurélio Belizze, j. 07.08.12).

4. Anoto que o Plenário do Supremo Tribunal Federal pronunciou-se sobre a constitucionalidade do referido procedimento no RE n. 601.314, com acórdão publicado em 16.09.16, bem como nas ADIs ns. 2390, 2859, 2397 e 2386, publicados os respectivos acórdãos em 21.10.16.

5. O Supremo Tribunal Federal admitiu a transferência do sigilo bancário ao Fisco, o que não atentaria contra a intimidade do contribuinte, na medida em que as informações sigilosas remanesceriam cobertas pela aludida proteção. Assim, os dados bancários permaneceriam insuscetíveis de divulgação. Ressalvou, contudo, que o Fisco pode utilizar tais dados, não apenas no âmbito administrativo (o processo administrativo fiscal tem caráter sigiloso), como também para que sejam usados pela Advocacia-Geral da União em Juízo.

6. Não se concebe que, admitida a “judicialização” pelo Supremo Tribunal Federal, seja ela válida somente para a cobrança do crédito tributário, mas não para a punição do respectivo sonegador. Cumpre destacar, como o fez o Relator Ministro Dias Toffoli, “(...) que o instrumento fiscalizatório instituído nos arts. 5º e 6º da Lei Complementar nº 105/2001 se mostra de extrema significância ao efetivo combate à sonegação fiscal no país” (destaques originais). É certo que os dados bancários, de qualquer modo, permaneceriam sob sigilo, igualmente imposto ao Ministério Público.

7. Se é possível a transferência do sigilo bancário da instituição financeira ao Fisco para que este intente por seu órgão competente a ação cabível, não há razão ponderável para se excluir a ação penal.

8. Por essa razão que não fica obstado ao Ministério Público Federal, que tem garantida, para o exercício de suas atribuições, a requisição de diligências investigatórias a que aludem os arts. 129, VIII, da Constituição da República e 8º da Lei Complementar n. 75, de 20.05.93, requisitar diretamente informações bancárias à instituição financeira.

9. Sendo certo que o sigilo é transferido, sem autorização judicial, da instituição financeira ao Fisco e deste à Advocacia-Geral da União, para cobrança do crédito tributário, bem como ao Ministério Público, sempre que, no curso de ação fiscal de que resulte lavratura de auto de infração de exigência de crédito de tributos e contribuições, constate-se fato que configure, em tese, crime contra a ordem tributária (Decreto n. 2.730, de 10.08.98, art. 1º e Lei n. 9.430/96, art. 83), a iniciativa deste não é fato jurídico pelo qual se institui um requisito anteriormente inexistente.

10. Entendimento que se concilia com a jurisprudência deste Tribunal Regional (TRF 3ª Região, Rel. Des. Fed. José Lunardelli, EIfNu n. 2000.61.81.006960-0, j. 17.08.17).

11. A materialidade delitiva encontra-se satisfatoriamente demonstrada pelo Procedimento Administrativo-fiscal n. 10830.007261/2004-73.

12. Quando da decisão de recebimento da denúncia, o MM. Magistrado a quo consignou, quanto ao Procedimento Administrativo-fiscal n. 10830.007291/2004-73 (leia-se: Procedimento Administrativo-Fiscal n. 10830.007261/2004-73), que a constituição definitiva do crédito deu-se em 19.05.08 (Id n. 154774849, p. 20 e Id n. 154770531, p. 190). A Delegacia da Receita Federal de Julgamento de Campinas (SP) julgou procedentes os autos de infração, apenas reduzindo a multa de ofício de 150% (cento e cinquenta por cento) para 75% (setenta e cinco por cento), decisão confirmada pelo 1º Conselho de Contribuintes. Constituído o crédito tributário, foi indeferido o pedido formulado pela defesa do acusado Demetrius de realização de perícia (Id n. 154774851, pp. 33-35), o que se revelou acertado pelo conjunto dos demais elementos probatórios reunidos nos autos.

13. O acusado Demetrius não negou que foi sócio-administrador da Jumbo Distribuidora de Combustíveis Ltda., no período de janeiro a setembro de 1999, condição assinalada nos instrumentos contratuais registrados perante a Junta Comercial do Estado de São Paulo (SP), sendo seu poder de gerência e de decisão sobre os subordinados, que perfaziam número aproximado de 10 (dez) funcionários, também confirmado pelo seu sócio à época, o corréu Paulo Henrique da Cruz Alves, bem como pelo corréu Mauro Lepes Guilhem e por Antônio Fernando Cândido e Cláudio Luís Fabri, seus funcionários.

14. O tipo penal descrito no art. 1º, I, da Lei n. 8.137/90 prescinde de dolo específico, sendo suficiente, para sua caracterização, a presença do dolo genérico, consistente na omissão voluntária do recolhimento, no prazo legal, do valor devido aos cofres públicos. É sancionada penalmente a conduta daquele que não se queda meramente inadimplente, mas omite um dever que lhe é exigível, consistente na declaração de fatos geradores de tributo à repartição fazendária, na periodicidade prevista em lei, de modo que restou satisfatoriamente demonstrado o dolo do acusado.

15. Para configurar o erro de proibição é necessário que o agente suponha, por erro, que seu comportamento é lícito. A prática anterior do mesmo delito, embora sem sentença transitada em julgado, impossibilita o reconhecimento da excludente.

16. Restou demonstrado que o acusado Demetrius suprimiu e reduziu Imposto de Renda Pessoa Jurídica – IRPJ e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL, nos 3 (três) primeiros trimestres do ano-calendário de 1999 (janeiro a setembro), mediante fraude à fiscalização tributária consistente na inserção de elementos inexatos nos livros contábeis e fiscais da empresa e na prestação de falsas informações nas declarações submetidas às autoridades fazendárias (DIPJ) relativamente aos rendimentos auferidos, oferecendo à tributação valores muito inferiores aos devidos, de modo que não lhe favorece suscitar a existência de discussão sobre a exigência de PIS e COFINS, a cujo recolhimento estava obrigada, de acordo com o Termo de Verificação Fiscal supracitado, considerando que desborda do objeto da imputação descrita na denúncia em relação ao acusado Demetrius, constituindo matéria atinente ao Procedimento Administrativo-Fiscal n. 10830.004087/2005-98.

17. Para a persecução penal contra o acusado Demetrius, basta a constituição definitiva do crédito tributário levada a efeito no Procedimento Administrativo-Fiscal n. 10830.007261/2004-73, não se observando tenha sido a imunidade do IRPJ e da CSLL nas operações com derivados de petróleo alegada na impugnação administrativa apresentada (Id n. 154770531, pp. 6-24).

18. O processo criminal não é a via adequada para a impugnação de eventuais nulidades ocorridas no procedimento administrativo-fiscal (STJ, AgRg no AREsp n. 469.137, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 05.12.17 e STJ, AgRg no AREsp n. 1.058.190, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, j. 21.11.17). Além disso, eventuais vícios no procedimento administrativo-fiscal, enquanto não reconhecidos na esfera cível, são irrelevantes para o processo penal em que se apura a ocorrência de crime contra a ordem tributária (STJ, RHC n. 14.459, Rel. Min. Gilson Dipp, j. 16.09.04).

19. A condenação, ainda que com trânsito em julgado, por fato posterior àquele descrito na denúncia não pode ser considerada mau antecedente  (STJ, HC n. 401.463/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 17.08.17, HC n. 338.378/RS, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 01.12.15, HC n. 332.040/SC, Rel. Min. Gurgel de Faria, j. 24.11.15 e HC n. 275.663/SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, j. 24.02.15; TRF 3ª Região, ACR n. 0000931-69.2017.4.03.6181, Rel. Des. Fed. Paulo Fontes, j. 19.02.18 e ACR n. 0003547-27.2013.4.03.6126, Rel. Des. Fed. Nino Toldo, j. 06.02.18).

20. A culpabilidade do acusado Demetrius é significativa, pois, como empresário experiente do ramo petrolífero e sócio-gestor de distribuidora de combustíveis detentora de expressivo faturamento mensal, que, ele próprio afirmou ter alcançado R$ 7.000.000,00 (sete milhões de reais), no período, era dele esperado lisura e correção na escrituração contábil e fiscal das atividades operacionais e nas declarações de rendimentos efetuadas às autoridades fazendárias.

21. Mantida a incidência da atenuante da confissão espontânea, prevista no art. 65, III, d, do Código Penal, pois mesmo se considerando que o acusado Demetrius limitou-se a afirmar que atuava na área comercial da Jumbo Distribuidora de Combustíveis Ltda, no período de janeiro a setembro de 1999, sem ter, expressamente, assumido sua responsabilidade pelas decisões relacionadas aos pagamentos de tributos da empresa, é certo que declarou que ele e seu sócio Paulo Henrique da Cruz Alves eram ambos os seus administradores no referido período, conforme se extrai do seu interrogatório judicial (Id n. 154770525) e da sentença (Id n. 154774854, p. 18).

22. Mantida a incidência da causa de aumento de pena do art. 12, I, da Lei n. 8.137/90, tendo em vista o expressivo valor do débito tributário, indicado pelo Parquet, sem juros e multa (R$ 2.115.667,69), que considero a título de dano à coletividade. Majorado o aumento respectivo para 2/5 (dois quintos).

23. Na hipótese de Imposto de Renda Pessoa Jurídica sujeito à declaração de ajuste anual, considera-se o ano-calendário para fins de continuidade delitiva, não as antecipações realizadas ao longo do período de apuração (STJ, AREsp n. 1225680 PR 2017/0325047-2, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, j. 17.05.18; TRF 3ª Região, ACR n. 0000808-57.2007.4.03.6105, Rel. Des. Fed. Maurício Kato, j. 13.11.17; TRF 4ª Região, ACR n. 0001403-08.2008.4.04.7006, Rel. Márcio Antônio Rocha, j. 04.11.15)

24. Dado que tanto a pena privativa de liberdade quanto a pena de multa sujeitam-se a critérios uniformes para a sua determinação, é adequada a exasperação proporcional da sanção pecuniária (TRF da 3ª Região, EI n. 0004791-83.2006.4.03.6110, Rel. Des. Fed. André Nekatschalow, j. 16.02.17; TRF da 3ª Região, ACR n. 0002567-55.2013.4.03.6102, Des. Fed. Cecilia Mello, j. 20.09.16; TRF da 3ª Região, ACR n. 0003484-24.2012.4.03.6130, Rel. Des. Fed. Mauricio Kato, j. 11.04.16). Fixada a pena de multa em 16 (dezesseis) dias-multa.

25. Mantido o valor unitário do dia-multa fixado na sentença em 1 (um) salário mínimo vigente à época do fato, corrigido quando do pagamento, compatível com os ganhos mensais do acusado Demetrius, que declarou auferir R$ 5.000,00 (cinco mil reais) mensais.

26. Adequada a redução da prestação pecuniária para 20 (vinte) salários mínimos, o que guarda proporcionalidade com a pena substituída e com a valoração desfavorável das circunstâncias do delito acima exposta, em atenção ao disposto no art. 59 do Código Penal.

27. Rejeitada a preliminar. Recursos de apelação parcialmente providos.

 

 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Turma, por unanimidade, decidiu REJEITAR a preliminar e DAR PARCIAL PROVIMENTO aos recursos de apelação do Ministério Público Federal e da defesa do acusado Demetrius Eli Modolo de Souza Dias para, mantida sua condenação pela prática do delito do art. 1º, I, da Lei n. 8.137/90, afastar a exasperação da pena-base em razão dos antecedentes, majorar a pena-base em razão da culpabilidade, exasperar o aumento decorrente da causa de aumento do art. 12, I, da Lei n. 8.137/90, afastar o aumento decorrente da continuidade delitiva, reduzir, proporcionalmente, a pena de multa, bem como a pena substitutiva de prestação pecuniária, cominando-lhe, em definitivo, as penas de 2 (dois) anos, 9 (nove) meses e 18 (dezoito) dias de reclusão, em regime inicial aberto, e 14 (quatorze) dias-multa, no valor unitário de 1 (um) salário mínimo vigente à época dos fatos, corrigido monetariamente quando do pagamento, substituída a pena privativa de liberdade por 2 (duas) restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, por igual período, e na prestação pecuniária de 20 (vinte) salários mínimos, direcionada ao Centro Infantil de Investigações Hematológicas Dr. Domingos A. Boldrini, CNPJ nº 50.046.887/0001-27, com endereço na Rua Dr. Gabriel Porto, nº 1270 - Cid. Universitária, Campinas/SP, mantidos os demais termos da sentença recorrida, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.