Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Seção

AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 5002702-42.2019.4.03.0000

RELATOR: Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA

AUTOR: JESUINA ESTER PEIXOTO

Advogado do(a) AUTOR: DANIEL BENEDITO DO CARMO - SP144023-N

REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

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Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Seção
 

AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 5002702-42.2019.4.03.0000

RELATOR: Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA

AUTOR: JESUINA ESTER PEIXOTO

Advogado do(a) AUTOR: DANIEL BENEDITO DO CARMO - SP144023-N

REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

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R E L A T Ó R I O

 

Trata-se de ação rescisória, com pedido de tutela de urgência, proposta com fundamento no Art. 966, incisos IV, V, VII, do Código de Processo Civil, com vista à rescisão do acórdão proferido nos autos da apelação cível nº 0024622-41.2016.4.03.9999,  que deu provimento à apelação interposta pelo INSS para julgar improcedente o pedido de concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença.

O v. acórdão foi assim ementado:

"APELAÇÃO CÍVEL. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA OU APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. QUALIDADE DE SEGURADO NÃO COMPROVADA. INVERSÃO DO ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA.
1. Requisito de qualidade de segurado não comprovado. Benefício negado.
2. Inversão do ônus da sucumbência. Exigibilidade condicionada à hipótese prevista no artigo 12 da Lei nº 1.060/50.
3. Apelação do INSS provida".

A autora sustenta, em síntese, que logrou obter prova nova, apta a demonstrar a manutenção da sua qualidade de segurada no período de 12/2011 a 07/2016, concernente a extrato atualizado do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS. Aduz que o réu agiu com má-fé ao omitir do CNIS as contribuições recolhidas no referido período, e que a decisão rescindenda incorreu em violação manifesta de norma jurídica ao não lhe conceder o benefício requerido.

Pleiteia a desconstituição do julgado para que, em nova decisão, seja-lhe concedido o benefício de aposentadoria por invalidez e requer a antecipação da tutela para a imediata implantação do benefício. Pugna, ainda, pela condenação do INSS à pena por litigância de má-fé, com pedido cumulado de indenização por dano moral.

Em contestação, a autarquia argui as preliminares de incidência do enunciado de Súmula nº 343/STF e de ausência do interesse de agir, diante do caráter recursal atribuído à ação rescisória. No mérito, sustenta a inexistência de violação manifesta de norma jurídica.

Subsidiariamente, argumenta que a condenação não pode abranger período superior a 1 ano desde a perícia realizada na lide subjacente; e, ainda, que deve ser observada a prescrição quinquenal, contada do ajuizamento desta demanda; e que os juros de mora devem ser fixados nos termos da Súmula 2o4/STJ e da Lei 11.960/09.

Indeferida a tutela de urgência e concedida à parte autora a gratuidade da justiça.

A autora apresentou réplica à contestação.

Foi considerada desnecessária a produção de novas provas.

A parte autora fez juntar suas razões finais.

O Ministério Público Federal, após ter vista dos autos, deixou de se pronunciar sobre o mérito da causa, por não vislumbrar hipótese de intervenção obrigatória do Parquet.

É o relatório.

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
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AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 5002702-42.2019.4.03.0000

RELATOR: Gab. 34 - DES. FED. BAPTISTA PEREIRA

AUTOR: JESUINA ESTER PEIXOTO

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REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

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V O T O

 

As preliminares de incidência do enunciado de Súmula nº 343/STJ e de carência de ação, por ausência do interesse de agir, confundem-se com o mérito, âmbito em que devem ser analisadas.

Passo à análise em sede de juízo rescisório.

De início, observo que embora a parte autora tenha amparado o pedido inicial com base nos incisos IV, V e VII, do Art. 966, do CPC, os fatos narrados permitem concluir que pretende rescindir o julgado com esteio nos incisos III, V e VII, do mesmo artigo, o que orientará o exame a ser empreendido nesta demanda.

A controvérsia nos autos, portanto, cinge-se à questão sobre a obtenção de prova nova capaz de assegurar à parte autora o direito à concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, para a qual restaria demonstrado o preenchimento de todos os requisitos. Versa a causa ainda sobre as hipóteses de dolo da parte vencedora em detrimento da parte vencida e de violação manifesta de norma jurídica.

Com relação ao primeiro aspecto, dispõe o Art. 966, VII, do CPC que a sentença de mérito transitada em julgado pode ser rescindida quando, depois da decisão de mérito transitada em julgado, o autor obtiver prova nova, cuja existência ignorava ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si só, de lhe assegurar um pronunciamento favorável.

O atual Código de Processo Civil, ao preferir o termo "prova nova", em substituição ao "documento novo", constante no estatuto processual revogado, alargou o seu espectro de abrangência para o fim de admitir qualquer outra espécie de prova, além da documental.

Sobre o assunto, ressalta Humberto Theodoro Junior, que:

"O dispositivo atual, embora tenha ampliado a possibilidade de recorrer a provas novas, conserva a exigência de que (i) sua existência fosse ignorada pela parte; ou (ii) mesmo sendo de seu conhecimento, não lhe tenha sido possível utilizá-las antes do trânsito em julgado da sentença rescindenda. Logo, não será lícito pretender completar a força de convencimento do documento novo com outras provas cuja produção se intente realizar, originariamente, nos autos da ação rescisória".

(in: Curso de Direito Processual Civil. v. III. 53 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020)

Por outro ângulo, assinala o mesmo autor:

"Não se deve conservar o entendimento de que a prova constituída após a sentença não se presta para a rescisória. O que não se tolera é o não uso tempestivo da prova disponível, quando nada impedia a parte de produzi-la na instrução da causa, a tempo de influir no respectivo julgamento".

Outrossim, conforme ensina J.E. Carreira Alvim, a previsão de que a prova nova deve ter sido obtida posteriormente ao trânsito em julgado não possui o caráter restritivo que aparenta, uma vez que o  documento pode ter se tornado conhecido antes do trânsito em julgado, "mas num momento em que já não tem mais utilidade para a parte que pretende utilizá-lo, por haver, por exemplo, se encerrado a instrução da causa" (in: "Ação rescisória no novo CPC: de acordo com as reformas introduzidas pelas Leis 13.256/2016, 13.363/2016 e 13.465/2017". 2ª ed. Curitiba: Juruá, 2018).

Ressalte-se, por oportuno, que a prova nova deve ter a necessária aptidão para garantir um melhor resultado para o autor da ação rescisória, devendo reportar-se a fato já alegado anteriormente mas não suficientemente demonstrado, por circunstâncias alheias à vontade da parte a quem aproveita.

Nesse sentido, assinala a doutrina que:

"É necessário que a prova nova trazida à baila seja suficiente para a alteração da decisão rescindenda, ou seja, na demanda rescisória, tenha um resultado favorável.

A prova confeccionada ou constituída após finalizado o processo rescindendo, uma vez findo o seu desiderato cognitivo, não se revestirá da necessária novidade para efeitos rescisórios. A prova nova para a ação rescisória não poderá ser constituída em um fato novo, produzido após a decisão rescindenda, quiçá após o trânsito em julgado material. Portanto, até mesmo o fato novo afasta o cabimento da ação rescisória.

O fato que autoriza a ação rescisória é aquele que foi alegado tempestivamente no processo em que proferida a decisão rescindenda, porém em que restou ausente a respectiva prova. A novidade da prova afasta a tentativa da parte desidiosa de propor a rescisão, ou seja, será ônus do autor demonstrar que não teve oportunidade de acesso a tal prova antes da sentença ou acórdão.

E mais, a parte interessada deve demonstrar existência ignorada até então da prova ou, se conhecida, a impossibilidade da apresentação, no processo rescindendo. Não o fazendo, de futuro, a ação rescisória não será admitida".

(SOARES, Marcelo Negri; RORATO, Izabella Freschi; "Petição Inicial: Generalidades", p. 115 -178. In: Ação Rescisória. São Paulo: Blucher, 2019).

Diante dessas premissas, é possível inferir que o extrato atualizado do CNIS apresentado pela parte autora não se qualifica como prova nova, por não ter a capacidade de lhe proporcionar uma decisão favorável.

Como se extrai dos autos, o julgado assinalou que a autora não detinha a qualidade de segurado necessária à concessão do benefício requerido na data do início da incapacitação para o trabalho, o que foi afirmado nos seguintes termos:

"A Lei nº 8.213/91, em seu artigo 42, estabelece os requisitos necessários para a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, quais sejam: qualidade de segurado, cumprimento da carência, quando exigida, e moléstia incapacitante e insuscetível de reabilitação/para atividade que lhe garanta a subsistência. O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos artigos 59 a 63 da Lei nº 8.213/91, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária.

A autora, 56 anos, do lar, afirma ser portadora de esquizofrenia.

Recebe pensão por morte desde 12/2012 (fls. 79 e 81).

Após exame médico pericial (19/1/2015 - fls. 113), o Expert concluiu que a parte autora é portadora de esquizofrenia paranoide, com sintomatologia relevante desde 2008, que acarreta incapacidade total e temporária para o trabalho (fls. 114).

No entanto, o extrato CNIS de fls. 79 comprova que a autora efetuou sua última contribuição em 3/2004, perdendo a qualidade de segurado em 2005.

O fato de a parte autora ter passado e receber pensão por morte a partir de 12/2012 não lhe restabelece a qualidade de segurada para fins de benefício por invalidez.

Anoto que a qualidade de segurado é requisito essencial para a concessão do benefício, de modo que o fato de o INSS não ter alegado em contestação a falta desse requisito não impede o juiz de verificar seu cumprimento.

Portanto, a parte autora não faz jus ao benefício de aposentadoria por invalidez.

Considerando que a parte autora não comprovou a qualidade de segurada, torna-se despicienda a análise da carência".

Isso porque o laudo produzido naquela demanda, referente ao exame pericial realizado em 19/01/2015, atestou ser a autora portadora de esquizofrenia paranoide, apresentando incapacidade total e temporária para o trabalho, indicando-se o ano de 2008 como data de início da incapacidade  (Id 30331168, pp. 113/115).

Com efeito, registrou o perito, na anamnese, que o quadro psiquiátrico da pericianda "surgiu há 10 anos, inicialmente caracterizado por choro excessivo, tristeza, isolamento" (o que remonta ao ano de 2005), e que "houve piora do estado psíquico em 2008, quando passou a se tornar agressiva, a escutar vozes e a ter sensações persecutórias". Ademais, em referência ao quesito formulado pelo INSS sobre a fixação do termo inicial da moléstia, respondeu "aparentemente em 2008".

Entre os documentos que instruíram aquela lide, tem-se o prontuário médico do Centro de Atenção Psicossocial da Secretaria Municipal de Saúde da Prefeitura da Estância Turística de Itu/SP, que indica que a autora iniciou tratamento naquela instituição no mês agosto de 2008. Depreende-se ainda que, em 27/09/2012, foi realizado um novo encaminhamento para sua avaliação e inserção nesse serviço, e em 02/09/2013, emitiu-se atestado declarando que a autora encontrava-se incapacitada para o trabalho, em decorrência de quadro grave de depressão, por ser portadora da enfermidade identificada no CID F31.2.

Por outro lado, os dados constantes do extrato do CNIS apresentado como prova nova revelam que seu último vínculo formal de trabalho ocorreu no período de 04/07/1997 a 14/07/1997, tendo ela voltado a verter contribuições a partir de 01/12/2011, como contribuinte facultativo, ininterruptamente até 31/07/2016, e estando todos esses recolhimentos com o indicativo IREC-INDPEND (recolhimentos com indicadores/pendência - Id 30331168, p. 172).

Nesse contexto, forçoso reconhecer que na época do início da incapacidade, em 2008, a autora não mantinha a qualidade de segurada da Previdência Social, incidindo, na espécie, a previsão contida nos Arts. 42, § 2º, e 59, § 1º, da Lei 8.213/91, segundo a qual o segurado que, ao filiar-se ao Regime Geral de Previdência Social, já era portador da doença ou da lesão invocada como causa para o benefício, não faz jus à concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez; salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou da lesão, o que não restou demonstrado nos autos.

A constatação que o novo extrato do CNIS é inservível para os fins pretendidos leva ainda à dedução de que não houve dolo da parte vencedora em detrimento da parte vencida, na medida em que eventual ocultação pelo INSS das contribuições vertidas no período de 12/2011 a 07/2016 foi irrelevante para o deslinde da causa subjacente.

Oportuno acrescentar que a decisão rescindenda, ao julgar improcedente o pedido originário, apenas deu aplicação à legislação de regência, motivo de se afastar, igualmente, a alegação de violação manifesta de norma jurídica. 

Saliente-se, por fim, que concluir de forma diversa demandaria o revolvimento do quadro fático-probatório produzido na ação matriz, o que não pode ser admitido, sob pena de se atribuir à ação rescisória a finalidade de mero recurso.

Destarte, por qualquer ângulo que se analise, a improcedência do pedido inicial é medida que se impõe, devendo a autoria arcar com honorários advocatícios de 10% sobre o valor atualizado da causa, que ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade, a teor do Art. 98, § 3º, do CPC, por se tratar de beneficiária da gratuidade da justiça.

Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido de rescisão do julgado.

É o voto.

 



E M E N T A

PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. HIPÓTESES DOS INCISOS III, V E VII, DO ART. 966, DO CPC. NÃO CARACTERIZAÇÃO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. QUALIDADE DE SEGURADO NÃO DEMONSTRADA. INCIDÊNCIA  DOS ARTS. 42, § 2º, E 59, § 1º, DA LEI 8.213/91.
1. O documento apresentado pela parte autora, como prova nova, para o fim demonstrar  o recolhimento de contribuições previdenciárias no período de 12/2011 a 07/2016, não se mostra capaz de lhe assegurar um pronunciamento favorável, na forma exigida pelo inciso VII, do Art. 966, do CPC.
2. O julgado rescindendo assinalou que a autora não mantinha a qualidade de segurada no ano de 2008, data do início da incapacitação para o trabalho, o que não é infirmado pelo extrato atualizado do CNIS de que pretende ela se valer nesta demanda.
3. Inexistência de dolo da parte vencedora em detrimento da parte vencida, na medida em que eventual ocultação pelo INSS das contribuições vertidas no intervalo destacado foi irrelevante para o deslinde da causa subjacente.
4. Incidência, na espécie, da previsão contida nos Arts. 42, § 2º, e 59, § 1º, da Lei 8.213/91, segundo a qual o segurado que, ao filiar-se ao Regime Geral de Previdência Social, já era portador da doença ou da lesão invocada como causa para o benefício, não faz jus à concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez; salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou da lesão, o que não restou demonstrado nos autos, motivo de se afastar a hipótese de violação manifesta de norma jurídica. 
5. Pedido inicial que se julga improcedente.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Seção, por unanimidade, decidiu julgar improcedente o pedido de rescisão do julgado, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.