Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0017883-41.2009.4.03.6105

RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. WILSON ZAUHY

APELANTE: EMPRESA BRASILEIRA DE INFRA-ESTRUTURA AEROPORTUARIA, UNIÃO FEDERAL, MUNICIPIO DE CAMPINAS

Advogado do(a) APELANTE: THATIANA FREITAS TONZAR - SP290361-A

APELADO: ALZIRA CAMPOS OLIVEIRA SANCHES, IZABEL GAMERO SANTALIESTRA, CARMINE CAMPAGNONE, CARMEN SANCHES RUIS CAMPAGNONI, JOSE SANCHES RUIZ JUNIOR, ANDRE GONCALVES GAMERO, JOSE ANTONIO UNELLO NETTO

Advogado do(a) APELADO: VALDIRENE SALGADO SAES - SP291198
Advogado do(a) APELADO: VALDIRENE SALGADO SAES - SP291198
Advogado do(a) APELADO: LEILA REGINA ALVES - SP115090
Advogado do(a) APELADO: LEILA REGINA ALVES - SP115090
Advogado do(a) APELADO: VALDIRENE SALGADO SAES - SP291198

OUTROS PARTICIPANTES:

TERCEIRO INTERESSADO: ZEILAH GONCALVES GAMERO
 

ADVOGADO do(a) TERCEIRO INTERESSADO: VALDIRENE SALGADO SAES - SP291198

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0017883-41.2009.4.03.6105

RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. WILSON ZAUHY

APELANTE: EMPRESA BRASILEIRA DE INFRA-ESTRUTURA AEROPORTUARIA, UNIÃO FEDERAL, MUNICIPIO DE CAMPINAS

Advogado do(a) APELANTE: THATIANA FREITAS TONZAR - SP290361-A

APELADO: ALZIRA CAMPOS OLIVEIRA SANCHES, IZABEL GAMERO SANTALIESTRA, CARMINE CAMPAGNONE, CARMEN SANCHES RUIS CAMPAGNONI, JOSE SANCHES RUIZ JUNIOR, ANDRE GONCALVES GAMERO, JOSE ANTONIO UNELLO NETTO

Advogado do(a) APELADO: VALDIRENE SALGADO SAES - SP291198
Advogado do(a) APELADO: VALDIRENE SALGADO SAES - SP291198
Advogado do(a) APELADO: LEILA REGINA ALVES - SP115090
Advogado do(a) APELADO: LEILA REGINA ALVES - SP115090
Advogado do(a) APELADO: VALDIRENE SALGADO SAES - SP291198

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

R E L A T Ó R I O

 

Trata-se de recursos de apelação interpostos pela União e pela Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária - INFRAERO em face de sentença que, nos autos da ação de desapropriação por utilidade pública, julgou extinta a demanda, sem resolução de mérito, com fulcro no então vigente art. 267, inc. IV, do Código de Processo Civil de 1973, ao argumento de que estaria ausente pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, pois os decretos municipais que declararam o imóvel como de utilidade pública careceriam de competência declaratória para tanto. Houve condenação das expropriantes em honorários advocatícios fixados no importe de R$ 1.000,00, de forma solidária (ID 116851188, páginas 210-219).

Inconformados, ambos os apelantes sustentam, em linhas gerais, que o trâmite adotado para elaboração e execução do processo expropriatório foi o correto. Afirmam que a Municipalidade de Campinas/SP detinha competência para declarar o imóvel sujeito à expropriação como sendo de utilidade pública, e que a INFRAERO não delegou qualquer atribuição dessa natureza ao ente federado, porquanto este já detinha tal atribuição, consoante se verifica do art. 2º do Decreto-Lei n. 3.365/1941.

Defendem que, conquanto os serviços de infraestrutura aeroportuária consubstanciem atribuições de competência exclusiva da União, nada impediria que a Municipalidade de Campinas/SP expedisse decretos expropriatórios com a finalidade de atender interesses locais, em observância ao quanto preceituado pelo art. 30 da Constituição da República, ainda que tais decretos expropriatórios decorram de convênios firmados com outros entes federativos ou entidades da Administração Pública Indireta, como no caso concreto.

Pugnam pela reforma da sentença, para que se afaste a extinção do processo sem resolução de mérito e se determine o retorno dos autos à instância de origem, de molde a que o processo tramite em seus regulares termos até a prolação de sentença de mérito. A INFRAERO pugna, ainda, pelo afastamento da condenação em verba honorária (ID 116851188, páginas 239-255 e ID 116851189, páginas 3-22).

Não houve a apresentação de contrarrazões.

Os autos subiram a esta Corte Regional e vieram-me conclusos.

É o relatório.

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0017883-41.2009.4.03.6105

RELATOR: Gab. 02 - DES. FED. WILSON ZAUHY

APELANTE: EMPRESA BRASILEIRA DE INFRA-ESTRUTURA AEROPORTUARIA, UNIÃO FEDERAL, MUNICIPIO DE CAMPINAS

Advogado do(a) APELANTE: THATIANA FREITAS TONZAR - SP290361-A

APELADO: ALZIRA CAMPOS OLIVEIRA SANCHES, IZABEL GAMERO SANTALIESTRA, CARMINE CAMPAGNONE, CARMEN SANCHES RUIS CAMPAGNONI, JOSE SANCHES RUIZ JUNIOR, ANDRE GONCALVES GAMERO, JOSE ANTONIO UNELLO NETTO

Advogado do(a) APELADO: VALDIRENE SALGADO SAES - SP291198
Advogado do(a) APELADO: VALDIRENE SALGADO SAES - SP291198
Advogado do(a) APELADO: LEILA REGINA ALVES - SP115090
Advogado do(a) APELADO: LEILA REGINA ALVES - SP115090
Advogado do(a) APELADO: VALDIRENE SALGADO SAES - SP291198

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

V O T O

 

A questão que se coloca nos autos do presente recurso de apelação é a de se saber se o juízo de primeiro grau poderia ou não ter extinguido a demanda sem a resolução de mérito. A fim de dirimir a controvérsia que ora se coloca, tenho por imperativo traçar um breve panorama histórico dos eventos havidos na lide.

Com efeito, a demanda refere-se à ação de desapropriação por utilidade pública ajuizada pela Municipalidade de Campinas/SP, pela INFRAERO e pela União em face dos proprietários de imóvel descrito na peça exordial do feito, em que se buscava a imissão na posse do bem e, posteriormente, a sua incorporação ao patrimônio público, mediante o pagamento de indenização fixada em R$ 10.300,00, tudo com vistas a permitir a ampliação do Aeroporto Internacional de Viracopos.

Em momento mais adiante da marcha processual, o juízo de primeiro grau prolatou sentença em que considerou ausente pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo. Considerou o juízo a quo que a competência para levar a cabo uma desapropriação pode ser dividida em duas espécies distintas, a saber, a competência declaratória e a competência executória.

Pela competência declaratória, o imóvel de um particular poderia ser declarado como sendo de utilidade pública ou de interesse social, com vistas à futura desapropriação. Já pela competência executória, ter-se-ia a atribuição para promover a desapropriação propriamente dita, isto é, "providenciar todas as medidas e exercer todas as atividades que venham a conduzir à efetiva transferência da propriedade" (ID 116851188, página 215).

Na sequência de seu raciocínio, o juízo a quo ponderou que a competência declaratória somente está franqueada aos entes federativos, em especial ao Chefe do Poder Executivo de cada esfera (federal, estadual, distrital ou municipal). Apenas quando a lei dispusesse expressamente sobre a transferência de competência declaratória é que uma entidade da Administração Pública Indireta poderia se valer da atribuição de declarar um imóvel como sendo de utilidade pública ou interesse social.

Em arremate à sua argumentação, o juízo a quo assentou que, no caso concreto, a INFRAERO não recebeu por disposição legal expressa competência para declarar imóveis como sendo de utilidade pública ou interesse social. Sendo assim, a mencionada empresa pública federal não poderia ter firmado com a Municipalidade de Campinas/SP o Termo de Cooperação por meio da qual cedeu ao ente municipal a atribuição de declarar imóveis como de utilidade pública. Na visão do magistrado de primeira instância, a INFRAERO não poderia ceder, por qualquer forma, uma competência que não seria sua.

As ponderações do juízo de primeiro grau são objeto da insurgência dos recorrentes pela via dos presentes apelos. Os recorrentes aduzem que em nenhum momento a INFRAERO transferiu em favor da Municipalidade de Campinas/SP competência declaratória, porquanto o ente municipal, ao declarar o imóvel objeto do litígio como de utilidade pública, exerceu atribuição que já seria sua pelos termos constitucionais. O Termo de Cooperação firmado entre a INFRAERO e a Municipalidade de Campinas/SP teria apenas e tão somente estabelecido o que competiria a cada cooperado conforme os limites constitucionais.

Confrontado com as razões esposadas, por um lado, pelo juízo de primeiro grau e, por outro, pelos recorrentes, tenho que os fundamentos invocados por estes últimos são os que devem prevalecer nesta sede recursal. O art. 5º, inc. XXIV, da Constituição da República dispõe que a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos pela própria Carta Magna.

No plano infraconstitucional, o Decreto-Lei n. 3.365/1941 traz em seu bojo as normas pertinentes às desapropriações por utilidade pública. Seu art. 2º pontifica que, mediante declaração de utilidade pública, todos os bens poderão ser desapropriados pela União, pelos Estados, pelos Municípios, pelo Distrito Federal e pelos Territórios. Assim, pelos termos legais já se percebe que aos Municípios é franqueada a possibilidade de exercer a competência declaratória a que se reportou o juízo de primeira instância na sentença que prolatou.

Os Municípios devem declarar imóveis como sendo de utilidade pública, para que depois estes venham a ser alvo do subsequente processo expropriatório, quando a desapropriação seja relevante para a consecução de finalidades de interesse local, ex vi do que dispõe o art. 30 do texto constitucional, verbis:

"Art. 30. Compete aos Municípios:

I - legislar sobre assuntos de interesse local;

II - suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;

III - instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;

IV - criar, organizar e suprimir distritos, observada a legislação estadual;

V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial;

VI - manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação infantil e de ensino fundamental; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)

VII - prestar, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população;

VIII - promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano;

IX - promover a proteção do patrimônio histórico-cultural local, observada a legislação e a ação fiscalizadora federal e estadual." (grifei)

Não se desconhece que a competência para explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão, a infraestrutura aeroportuária é exclusiva da União, conforme preconiza o art. 21, inc. XII, alínea "c", da Constituição da República. Com o fito de bem exercer esta competência administrativa ou material, foi promulgada a Lei n. 5.862/1972, responsável por autorizar o Poder Executivo a constituir uma empresa pública denominada Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária - INFRAERO.

Contudo, mesmo tomando em conta a competência exclusiva do ente federal para levar a cabo as atribuições em comento, com o auxílio da INFRAERO, nada impede que os Municípios expeçam decretos expropriatórios que declarem como de utilidade pública determinados imóveis para auxiliar no processo de construção ou ampliação de aeroportos, tendo em vista que a adoção desta providência igualmente guarda relação com o atendimento de um interesse público local.

Em tais casos, as entidades da Administração Pública Indireta Federal podem firmar com as Municipalidades termos de cooperação ou convênios, visando efetivar as desapropriações da maneira mais organizada possível, consoante, aliás, estabelece o art. 36, inc. III, do Código Brasileiro de Aeronáutica:

"Art. 36. Os aeródromos públicos serão construídos, mantidos e explorados:

I - diretamente, pela União;

II - por empresas especializadas da Administração Federal Indireta ou suas subsidiárias, vinculadas ao Ministério da Aeronáutica;

III - mediante convênio com os Estados ou Municípios;

IV - por concessão ou autorização." (grifei)

A jurisprudência já firmada por esta Egrégia Primeira Turma dá conta de que não concorre nenhum impeditivo para que os Municípios declarem como de utilidade pública imóveis privados para o fim de ampliar o Aeroporto de Viracopos, localizado em Campinas/SP, verbis:

"AGRAVO DE INSTRUMENTO. DESAPROPRIAÇÃO. AMPLIAÇÃO DO AEROPORTO INTERNACIONAL DE VIRACOPOS. TERMO DE COOPERAÇÃO CELEBRADO ENTRE O MUNICÍPIO DE CAMPINAS E A INFRAERO. INTERESSE DA UNIÃO E DA INFRAERO NA LIDE. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. ART. 109, INCISO I, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.

1. É pressusposto indispensável à desapropriação a existência de ato administrativo, emanado do Chefe do Executivo, declarando de interesse público o bem expropriado. Essa declaração, vale dizer, não é privativa do Presidente da República, podendo se dar, igualmente, mediante decreto do Governador, Interventor ou Prefeito, consoante se infere do artigo 6º do Decreto 3365/41 - Lei de Desapropriação.

2. O Município de Campinas/SP tem legitimidade para editar decretos expropriatórios, lembrando-se que o próprio Código Brasileiro de Aeronáutica autoriza a participação municipal no processo de construção de aeroportos mediante convênio, nos termos do artigo 36, inciso III.

3. Com a celebração do Termo de Cooperação, firmado entre o Município de Campinas e a INFRAERO, com a finalidade de promover desapropriações de áreas necessárias à ampliação do Aeroporto Internacional de Viracopos.

4. Do acordo supramencionado evidencia-se, outrossim, o interesse federal de modo a atrair a competência da Justiça Federal para processar e julgar o feito, consubstanciado no comprometimento da INFRAERO em atender as despesas relativas à desapropriação de todas as áreas objeto do Termo, as quais serão adjudicadas, ao final, diretamente à União.

5. Verificado o interesse de ambos os entes federais no deslinde da demanda, apto a ensejar o ingresso na lide na qualidade de litisconsortes ativos, forçoso concluir pela competência da Justiça Federal para o processamento e julgamento do feito, nos termos do art. 109, inciso I, da Constituição Federal.

6. Agravo de Instrumento desprovido." (grifei)

(TRF-3, Agravo de Instrumento n. 0001549-35.2014.4.03.0000/SP, Rel. Des. Fed. Valdeci dos Santos, Primeira Turma, Data de Julgamento: 07.02.2017).

Outros julgados desta Egrégia Corte Regional atestam a regularidade dos decretos expropriatórios emitidos pela Municipalidade de Campinas/SP, como o que transcrevo na sequência:

"DIREITO PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. DESAPROPRIAÇÃO POR UTILIDADE PÚBLICA. AERPORTO DE VIRACOPOS. INTERESSE DA INFRAERO E DA UNIÃO CONFIGURADOS. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL.

1. Embora incomum, o procedimento adotado pelos agravantes para a desapropriação necessária à ampliação do aeroporto de Campinas encontra amparo no ordenamento jurídico.

2. O art. 6º do Decreto nº 3.365/41 autoriza o Chefe do Poder Executivo Municipal a declarar a utilidade pública de imóveis para fins de desapropriação. O fato de o serviço de infra-estrutura aeroportuária constituir monopólio da União não exige que a declaração de utilidade pública advenha exclusivamente do Presidente da República.

3.O Código Brasileiro de Aeronáutica (Lei nº 7.565/86), em seu artigo 36 autoriza expressamente que os aeródromos públicos sejam construídos, mantidos e explorados mediante convênio com Estados e Municípios, o que evidencia ser legítimo o Termo de Cooperação firmado entre a INFRAERO e o Município de Campinas e a expedição de decreto expropriatório pelo Chefe do Poder Executivo local.

(...)

6. Agravo de instrumento provido." (grifei)

(TRF 3ª Região, SEGUNDA TURMA, AI 0021590-62.2010.4.03.0000, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL COTRIM GUIMARÃES, julgado em 22/02/2011, e-DJF3 Judicial 1 DATA:03/03/2011 PÁGINA: 351)

Sucede que a extinção sem resolução de mérito do processo não poderia ter tido lugar no primeiro grau de jurisdição. Impõe-se, conseguintemente, a cassação da sentença, ante a regularidade dos decretos expropriatórios que foram emitidos pela Municipalidade de Campinas/SP. Levando em consideração o fato de que o feito não foi regularmente processado, sem que os trâmites processuais tenham avançado para a fase instrutória, a demanda deverá retornar ao primeiro grau de jurisdição, para que a marcha processual tenha regular seguimento (causa não madura para julgamento).

Ante o exposto, voto por dar provimento aos recursos de apelação interpostos, para o fim de anular a sentença e afastar a extinção do feito sem resolução de mérito, determinando o retorno dos autos à instância de origem para que por lá o processo tramite em seus ulteriores termos, em conformidade com a fundamentação supra.

É como voto.



E M E N T A

 

DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO POR UTILIDADE PÚBLICA. AMPLIAÇÃO DO AEROPORTO INTERNACIONAL DE VIRACOPOS. EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO PELO JUÍZO A QUO. ENTENDIMENTO PELA AUSÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO, CONSISTENTE NO DECRETO EXPROPRIATÓRIO. DESCABIMENTO. REGULARIDADE DO TERMO DE COOPERAÇÃO CELEBRADO ENTRE A MUNICIPALIDADE DE CAMPINAS/SP E A INFRAERO. COMPETÊNCIA DA MUNICIPALIDADE PARA EDITAR DECRETOS EXPROPRIATÓRIOS DECLARANDO COMO DE UTILIDADE PÚBLICA O IMÓVEL OBJETO DO LITÍGIO (ART. 30, INC. I, DA CF/1988 C/C ART. 2º DO DECRETO-LEI N. 3.365/1941 C/C ART. 36, INC. III, DO CÓDIGO BRASILEIRO DE AERONÁUTICA). APELAÇÕES PROVIDAS.

1. A demanda refere-se à ação de desapropriação por utilidade pública ajuizada pela Municipalidade de Campinas/SP, pela INFRAERO e pela União em face dos proprietários de imóvel descrito na peça exordial do feito, em que se buscava a imissão na posse do bem e, posteriormente, a sua incorporação ao patrimônio público, mediante o pagamento de indenização, tudo com vistas a permitir a ampliação do Aeroporto Internacional de Viracopos.

2. O juízo de primeiro grau prolatou sentença em que considerou ausente pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo. Considerou o juízo a quo que a competência para levar a cabo uma desapropriação pode ser dividida em duas espécies distintas, a saber, a competência declaratória e a competência executória. Pela competência declaratória, o imóvel de um particular poderia ser declarado como sendo de utilidade pública ou de interesse social, com vistas à futura desapropriação. Já pela competência executória, ter-se-ia a atribuição para promover a desapropriação propriamente dita, isto é, "providenciar todas as medidas e exercer todas as atividades que venham a conduzir à efetiva transferência da propriedade".

3. Na sequência de seu raciocínio, o juízo a quo ponderou que a competência declaratória somente está franqueada aos entes federativos, em especial ao Chefe do Poder Executivo de cada esfera (federal, estadual, distrital ou municipal). Apenas quando a lei dispusesse expressamente sobre a transferência de competência declaratória é que uma entidade da Administração Pública Indireta poderia se valer da atribuição de declarar um imóvel como sendo de utilidade pública ou interesse social.

4. Em arremate à sua argumentação, o juízo a quo assentou que, no caso concreto, a INFRAERO não recebeu por disposição legal expressa competência para declarar imóveis como sendo de utilidade pública ou interesse social. Sendo assim, a mencionada empresa pública federal não poderia ter firmado com a Municipalidade de Campinas/SP o Termo de Cooperação por meio da qual cedeu ao ente municipal a atribuição de declarar imóveis como de utilidade pública. Na visão do magistrado de primeira instância, a INFRAERO não poderia ceder, por qualquer forma, uma competência que não seria sua.

5. As ponderações do juízo de primeiro grau são objeto da insurgência dos recorrentes pela via do presente apelo. Os recorrentes aduzem que em nenhum momento a INFRAERO transferiu em favor da Municipalidade de Campinas/SP competência declaratória, porquanto o ente municipal, ao declarar o imóvel objeto do litígio como de utilidade pública, exerceu atribuição que já seria sua pelos termos constitucionais. O Termo de Cooperação firmado entre a INFRAERO e a Municipalidade de Campinas/SP teria apenas e tão somente estabelecido o que competiria a cada cooperado conforme os limites constitucionais.

6. Diante das razões esposadas, por um lado, pelo juízo de primeiro grau e, por outro, pelos recorrentes, tem-se que os fundamentos invocados por estes últimos são os que devem prevalecer nesta sede recursal. O Decreto-Lei n. 3.365/1941 traz em seu bojo as normas pertinentes às desapropriações por utilidade pública. Seu art. 2º pontifica que, mediante declaração de utilidade pública, todos os bens poderão ser desapropriados pela União, pelos Estados, pelos Municípios, pelo Distrito Federal e pelos Territórios. Assim, pelos termos legais já se percebe que aos Municípios é franqueada a possibilidade de exercer a competência declaratória a que se reportou o juízo de primeira instância na sentença que prolatou.

7. Os Municípios devem declarar imóveis como sendo de utilidade pública, para que depois estes venham a ser alvo do subsequente processo expropriatório, quando a desapropriação seja relevante para a consecução de finalidades de interesse local, ex vi do que dispõe o art. 30, inc. I, do texto constitucional. Não se desconhece que a competência para explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão, a infraestrutura aeroportuária é exclusiva da União (art. 21, inc. XII, "c", CF/1988). Com o fito de bem exercer esta competência administrativa ou material, foi promulgada a Lei n. 5.862/1972, responsável por autorizar o Poder Executivo a constituir uma empresa pública denominada Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária - INFRAERO.

8. Contudo, mesmo tomando em conta a competência exclusiva do ente federal para levar a cabo as atribuições em comento, com o auxílio da INFRAERO, nada impede que os Municípios expeçam decretos expropriatórios que declarem como de utilidade pública determinados imóveis para auxiliar no processo de construção ou ampliação de aeroportos, tendo em vista que a adoção desta providência igualmente guarda relação com o atendimento de um interesse público local. Em tais casos, as entidades da Administração Pública Indireta Federal podem firmar com as Municipalidades termos de cooperação ou convênios, visando efetivar as desapropriações da maneira mais organizada possível, consoante, aliás, estabelece o art. 36, inc. III, do Código Brasileiro de Aeronáutica.

9. A jurisprudência já firmada por esta Egrégia Primeira Turma dá conta de que não concorre nenhum impeditivo para que os Municípios declarem como de utilidade pública imóveis privados para o fim de ampliar o Aeroporto de Viracopos, localizado em Campinas/SP (TRF-3, Agravo de Instrumento n. 0001549-35.2014.4.03.0000/SP, Rel. Des. Fed. Valdeci dos Santos, Primeira Turma, Data de Julgamento: 07.02.2017). Sucede que a extinção sem resolução de mérito do processo não poderia ter tido lugar no primeiro grau de jurisdição. Impõe-se, conseguintemente, a cassação da sentença, ante a regularidade dos decretos expropriatórios que foram emitidos pela Municipalidade de Campinas/SP. Levando-se em consideração o fato de que o feito não foi regularmente processado, sem que os trâmites processuais tenham avançado para a fase instrutória, a demanda deverá retornar ao primeiro grau de jurisdição, para que a marcha processual tenha regular seguimento (causa não madura para julgamento).

10. Recurso de apelação a que se dá provimento, para afastar a extinção do feito sem resolução de mérito e determinar o seu retorno à instância de origem, de molde a que prossiga em seus ulteriores termos.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Primeira Turma, por unanimidade, deu provimento aos recursos de apelação interpostos, para o fim de anular a sentença e afastar a extinção do feito sem resolução de mérito, determinando o retorno dos autos à instância de origem para que por lá o processo tramite em seus ulteriores termos, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.