Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
5ª Turma

HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Nº 5011353-92.2021.4.03.0000

RELATOR: Gab. 15 - DES. FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW

PACIENTE: JOSE CARLOS BLAAUW JUNIOR
IMPETRANTE: GUILHERME CREMONESI CAURIN, LUNA FLORIANO AYRES

Advogados do(a) PACIENTE: LUNA FLORIANO AYRES - SP391329-A, GUILHERME CREMONESI CAURIN - SP272098-A

IMPETRADO: 2ª CÂMARA DE REVISÃO E COORDENAÇÃO E REVISÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Nº 5011353-92.2021.4.03.0000

RELATOR: Gab. 15 - DES. FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW

PACIENTE: JOSE CARLOS BLAAUW JUNIOR
IMPETRANTE: GUILHERME CREMONESI CAURIN, LUNA FLORIANO AYRES

Advogados do(a) PACIENTE: LUNA FLORIANO AYRES - SP391329, GUILHERME CREMONESI CAURIN - SP272098

IMPETRADO: 2ª CÂMARA DE REVISÃO E COORDENAÇÃO E REVISÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO

 

 

 R E L A T Ó R I O

 

 

Trata-se de habeas corpus impetrado em favor de José Carlos Blaauw Junior contra ato coator atribuído à 2ª Câmara de Revisão e Coordenação e Revisão do Ministério Público.

Alega-se, em síntese, o seguinte:

a) o paciente foi “denunciado pela suposta prática do delito previsto no art. 1º, inciso I, da Lei nº 8.137/90, na modalidade continuada (art. 71 do CP) e em concurso formal com ele mesmo (art. 70 do CP), pois segundo a acusação, o Paciente, na qualidade de sócio gerente da empresa Inipla Veículos LTDA. CNPJ 02.738.044/0001-93, durante os anos calendário de 1998, 1999, 2000, 2001 e 2002, teria omitido fatos geradores tributários em 14 DCTF s, e, por cinco vezes, omitido os mesmos fatos e bases de cálculo em Declarações de Ajustes Anuais de Pessoa Jurídica, reduzindo assim parte dos tributos IRPJ, CSLL, COFINS e PIS no valor total de R$ 487.062,04 (quatrocentos e oitenta e sete mil e sessenta e dois reais e quatro centavos)” (sic, fl. 4, Id n. 160060213) na Ação Penal n. 0001226-43.2017.4.03.6105;

b) considerando a introdução do art. 28-A do Código de Processo Penal pela Lei n. 13.964/19, a acusação foi instada propor o Acordo de Não Persecução Penal – ANPP;

c) o Procurador de Justiça recusou-se a propor o benefício, “alegando que o ANPP seria insuficiente para reprovação do delito objeto da persecução penal em trâmite, já que estaria presente no caso em análise uma “conduta criminal habitual”, apontando a sonegação fiscal como modus operandi profissional das atividades comerciais exercidas por JOSÉ CARLOS” (sic, fl. 5, grifos no original, Id n. 160060213);

d) a justificativa da acusação seria pelo fato de o paciente ter sido condenado em 1ª Instância na Ação Penal n. 0008710-90.2009.4.03.6105, atualmente aguardando julgamento de recurso de apelação;

e) foi ignorado pela acusação fatos que demonstram a boa-fé, ausência de habitualidade delituosa e primariedade do paciente;

f) os autos foram remetidos à 2ª Câmara de Coordenação e Revisão Criminal do Ministério Público Federal, o qual manteve a recusa em ofertar o ANPP pelo mesmo motivo inidôneo “consistente na existência de ação penal diversa em face do Paciente, a qual não transitara em julgado, violando o direito do Paciente à presunção de inocência disposto pelo art.5º, LVII, da CF” (sic, fl. 1, Id n. 160060213);

g) a decisão impugnada afronta o princípio da presunção de inocência do paciente, por considerar os efeitos de uma condenação em 1ª Instância e sem a ocorrência do trânsito em julgado;

h) “Não se ignora a existência de precedentes que compreendem que a oferta do acordo de não persecução penal é faculdade do Ministério Público Federal. Contudo, é igualmente certo o direito de o Paciente socorrer-se do Judiciário quando a recusa a realizar mencionada proposta se der por motivo inidôneo que afronte direitos e garantias individuais postos pela Constituição Federal, sob pena de legitimar-se um sistema arbitrário e inseguro juridicamente” (sic, fl. 7, Id n. 160060213);

i) impossibilitar a celebração de acordo, com base em condenação de primeira instância, vai de encontro aos princípios processuais introduzidos pela Lei n. 13.964/19, que visam a celeridade processual, o desafogamento do Poder Judiciário e das penitenciárias e a adoção de medidas sancionatórias diversas às penalizadoras nos próprios tipos penais;

j) em vista da recusa de propositura do benefício do ANPP por motivos inidôneos, deve ser reconhecida a nulidade da decisão proferida pela 2ª Câmara de Coordenação e Revisão Criminal do Ministério Público Federal;

k) estão presentes o fumus boni iuris e o periculum in mora;

l) requer que a Ação Penal n. 0001226-43.2017.4.03.6105 seja sobrestada até o julgamento deste writ (Id n. 160060213).

Foram juntados documentos (Ids n. 160060215 a n. 160060225).

Considerando o ato coator o impetrante foi intimado a justificar a competência deste Tribunal Regional Federal tendo em vista o que dispõe o art. 108, I, d, da Constituição da República (Id n. 160281996).

O impetrante justificou a competência deste Tribunal em vista dos Tribunais Superiores e precedentes desta Corte serem no sentido de que “o entendimento de que o artigo108, inciso I, alínea “d” da Carta Magna, que lhe confere competência para julgar habeas corpus quando a autoridade coatora for juiz federal, aplica-se, por extensão, a writ impetrado contra ato de Procurador da República” (sic, Id n. 160911536).

Os impetrantes foram intimados a esclarecer a autoridade coatora (Id n. 160994617), tendo se manifestado que “o ato coator praticado pela 2ª Câmara de Coordenação e Revisão Criminal do Ministério Público Federal deve ser equiparado àquele praticado pelo procurador do Ministério Público Federal que atua em primeira instância para fins de fixação da competência deste e. Tribunal Regional Federal da 3ª Região para julgar o presente writ” (sic, grifos no original, Id n. 161621678).

Os impetrantes foram intimados a esclarecer de quem deveriam ser requisitadas as informações (Id n. 161758411), tendo se manifestado que a 2ª Câmara de Coordenação e Revisão Criminal do Ministério Público Federal deve prestar as informações (Id n. 162939644).

A liminar foi indeferida (Id n. 162947362).

Foram prestadas as informações (Id n. 164220495).

O Ilustre Procurador Regional da República, Dr. Paulo Taubemblatt, manifestou-se pelo não conhecimento deste habeas corpus, ou caso conhecido, pela denegação da ordem (Id n. 164394130).

É o relatório.

 

 

 


HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Nº 5011353-92.2021.4.03.0000

RELATOR: Gab. 15 - DES. FED. ANDRÉ NEKATSCHALOW

PACIENTE: JOSE CARLOS BLAAUW JUNIOR
IMPETRANTE: GUILHERME CREMONESI CAURIN, LUNA FLORIANO AYRES

Advogados do(a) PACIENTE: LUNA FLORIANO AYRES - SP391329, GUILHERME CREMONESI CAURIN - SP272098

IMPETRADO: 2ª CÂMARA DE REVISÃO E COORDENAÇÃO E REVISÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO

 

 V O T O

 

 

Os impetrantes requerem o sobrestamento da Ação Penal n. 0001226-43.2017.4.03.6105 e o reconhecimento da nulidade da decisão proferida pela 2ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público que decidiu pela inviabilidade da propositura de Acordo de Não Persecução Penal com base em fundamentação inidônea.

A decisão impugnada foi ementada nos seguintes termos:

 

ANPP. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA (ART. 1º, I, DA LEI Nº 8.137/90). RECUSA DO PROCURADOR DA REPÚBLICA EM OFERECER ANPP. RECURSO DA DEFESA. APLICAÇÃO DO ART. 28-A, § 14, DO CPP. REITERAÇÃO DE CONDUTA. MEDIDA QUE NÃO SE MOSTRA, NO CASO, SUFICIENTE PARA A REPROVAÇÃO E PREVENÇÃO DO CRIME (CPP, ART. 28-A, §2º, II). ENTENDIMENTO DA 2ª CCR. PROSSEGUIMENTO DA AÇÃO PENAL.

1. Incidente de acordo de não persecução penal instaurado no âmbito de ação penal em que J.C.B.J. foi denunciado pela prática do crime previsto no art. 1º, I, da Lei nº 8137/90, combinado com os arts. 70 e 71 do Código Penal. Os créditos tributários foram constituídos no valor total de R$ 4.357.853,68.

2. Instado a se manifestar sobre a possibilidade de ANPP, o Procurador da República negou-se a oferecer o acordo, em razão da existência de condenação penal anterior por fatos análogos (ação penal nº 0008710-90.2009.403.6105) para o denunciado, o que indica a habitualidade na conduta criminosa e impede o oferecimento da medida, segundo o previsto no art. 28-A, §2°, II, do CPP.

3. Recurso da defesa e remessa dos autos à 2ª CCR, com base no art. 28-A, §14, do CPP.

4. O art. 28-A, §2°, II, do CPP dispõe que o benefício não se aplica na hipótese de ser o investigado reincidente ou se houver elementos que indiquem conduta criminal habitual, reiterada ou profissional, exceto se insignificantes as infrações penais pretéritas.

5. Considerando o referido artigo, a 2ª CCR firmou entendimento no sentido de que a existência de reiterações no nome do acusado constitui, em regra, óbice ao oferecimento do acordo de não persecução penal. Processo n° 1.29.000.002053/2020-43, Sessão de Revisão n° 773, de 09/06/2020; Processo n° 5012651-78.2020.4.04.7000, Sessão de Revisão n° 770, de 25/05/2020, unânime.

6. No caso, embora a defesa tenha sustentado que a condenação a que se refere a acusação esteja pendente de julgamento de recurso de apelação, essa circunstância, conforme entendimento prevalente na 2ª CCR, impede o oferecimento do ANPP, nos termos do art. 28-A, §2°, II, do CPP.

7. Inviabilidade do oferecimento de acordo de não persecução penal, nos termos do art. 28-A, caput e § 2°, II, do CPP.

8. Prosseguimento da ação penal. Devolução dos autos ao Juízo de origem para conhecimento e adoção das providências cabíveis

 

Em vista da decisão impugnada ter sido proferida pela 2ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público, os impetrantes foram intimados a esclarecer a competência desta Corte para julgar o presente writ (Id n. 160994617).

Os impetrantes justificaram a competência deste Tribunal em vista dos Tribunais Superiores e precedentes desta Corte serem no sentido de que “o entendimento de que o artigo108, inciso I, alínea “d” da Carta Magna, que lhe confere competência para julgar habeas corpus quando a autoridade coatora for juiz federal, aplica-se, por extensão, a writ impetrado contra ato de Procurador da República” (sic, Id n. 160911536) e que “o ato coator praticado pela 2ª Câmara de Coordenação e Revisão Criminal do Ministério Público Federal deve ser equiparado àquele praticado pelo procurador do Ministério Público Federal que atua em primeira instância para fins de fixação da competência deste e. Tribunal Regional Federal da 3ª Região para julgar o presente writ” (sic, grifos no original, Id n. 161621678).

No entanto, em que pese a alegação dos impetrantes de que o ato da autoridade coatora deva ser equiparado àquele praticado pelo procurador do Ministério Público Federal que atua em primeira instância, deve ser observado o parecer da Procuradoria Regional da República, em vista da incompetência deste Tribunal Regional Federal:

 

PRELIMINARMENTE, observa-se, de imediato, a flagrante ilegitimidade da autoridade apontada como coatora pelos impetrantes, porquanto o ato impugnado – decisão confirmando o não oferecimento de Acordo de Não Persecução Penal – não decorreu de ato de Procurador da República –como avaliam os impetrantes - mas de deliberação oriunda de um colegiado, que compõe a 2ª Câmara de Coordenação do Ministério Público Federal, formado por Subprocuradores-Gerais da República.

Nesse ponto, vale reproduzir o art. 43 da Lei Complementar nº 75/93:

Art. 43. São órgãos do Ministério Público Federal:

I – o Procurador-Geral da República;

II – o Colégio de Procuradores da República;

III - o Conselho Superior do Ministério Público Federal;

IV - as Câmaras de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal;

V - a Corregedoria do Ministério Público Federal;

VI - os Subprocuradores-Gerais da República;

VII - os Procuradores Regionais da República;

VIII -os Procuradores da República.

(...)

Pois bem.

Chamados a esclarecer o polo passivo do presente writ, os impetrantes informaram que, a competência para julgar habeas corpus quando a autoridade coatora for juiz federal, aplica-se, por extensão, a writ impetrado contra ato de Procurador da República (ID 160911536).

Figurando, pois, como suposta autoridade coatora a 2ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF, sediada em Brasília-DF, composta por Subprocuradores-Gerais da República, com atuação nos Tribunais Superiores, vislumbra-se a incompetência deste Juízo, uma vez que a competência para apreciação e julgamento do presente writ pertence ao Superior Tribunal de Justiça e encontra-se delimitada no seio da Lei Maior (artigo 105, I, “c”, da CF).

Assim, considerando que o Procurador da República, com atuação no primeiro grau, entendeu ser descabida a proposta de ANPP ao paciente, cuja nulidade ora se intenta, tem-se autoridade coatora diversa da impetrada neste habeas corpus, razão pela qual de rigor o não conhecimento do presente writ. (sic, fls. 3/4, Id n. 164394130)

 

Tendo em vista que a decisão impugnada foi proferida pela 2ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público, verifica-se que este Tribunal Regional Federal não é competente para julgar o presente writ em vista do disposto no art. 105, I, c, da Constituição da República, conforme observado pela Procuradoria Regional da República.

Ante o exposto, reconheço a incompetência deste Tribunal para julgar este habeas corpus e determino a remessa dos autos ao Superior Tribunal de Justiça.

É o voto.

 



E M E N T A

 

PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ART. 1º, I, DA LEI N. 8.137/90. ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL. ANPP. DECISÃO 2ª CÂMARA DE COORDENAÇÃO E REVISÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. INCOMPETÊNCIA DESTE TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL. REMESSA AO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.

1. O paciente foi denunciado pela suposta prática do delito previsto no art. 1º, I, da Lei n. 8.137/90.

2. O Procurador de Justiça de 1ª Instância recusou-se a propor o benefício o Acordo de Não Persecução Penal – ANPP, tendo sido os autos remetidos à 2ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal, que manteve a recusa em propor o acordo;

3. Tendo em vista que a decisão impugnada foi proferida pela 2ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público, verifica-se que este Tribunal Regional Federal não é competente para julgar o presente writ em vista do disposto no art. 105, I, c, da Constituição da República.

4. Reconhecida a incompetência deste Tribunal para julgar este habeas corpus e determinada a remessa ao Superior Tribunal de Justiça.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Turma, por unanimidade, decidiu, reconhecer a incompetência deste Tribunal para julgar este habeas corpus e determinar a remessa dos autos ao Superior Tribunal de Justiça, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.