APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5092016-04.2021.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ELIANE DOMINGOS DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: STELA HORTENCIO CHIDEROLI - SP264631-N
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APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5092016-04.2021.4.03.9999 RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: ELIANE DOMINGOS DA SILVA Advogado do(a) APELADO: STELA HORTENCIO CHIDEROLI - SP264631-N R E L A T Ó R I O Trata-se de apelação interposta em face de sentença que julgou procedente os embargos à execução fiscal, para declarar a inexistência da dívida cobrada e extinguir a execução fiscal, nos termos do artigo 487, I, do Código de Processo Civil. Condenou o embargado no pagamento das custas e despesas do processo, além dos honorários de sucumbência, arbitrados em R$ 1.000,00 (mil reais), por equidade. Inconformada, a autarquia interpôs recurso de apelação alegando, em síntese, a necessidade de ressarcimento, pela parte ré, dos valores indevidamente recebidos, sob pena de configuração de enriquecimento ilícito. Prequestiona a matéria. Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte. Os autos foram distribuídos originalmente à Primeira Turma desta Corte, tendo a Desembargadora Federal Marli Ferreira proferido a decisão pela qual determinou a redistribuição do presente feito a uma das Turmas desta Terceira Seção, considerando ser execução fiscal ajuizada pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS para cobrança da dívida de natureza não tributária, de origem não fraudulenta, decorrente do recebimento indevido do benefício de salário-maternidade. Os autos, então, foram redistribuídos e enviados a este gabinete. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5092016-04.2021.4.03.9999 RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: ELIANE DOMINGOS DA SILVA Advogado do(a) APELADO: STELA HORTENCIO CHIDEROLI - SP264631-N V O T O O Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) propôs ação de execução fiscal contra Eliane Domingos da Silva, com base em Certidão de Dívida Ativa (CDA n. 35.919.596-2), com anotação de inscrição do débito na dívida ativa em 17/2/2006, referente a valores pagos indevidamente a título de salário-maternidade no período de 6/9/2003 a 3/1/2004. Foram opostos embargos à execução pela parte executada, os quais foram acolhidos pela sentença recorrida, sob o fundamento da inexistência de comprovação da má-fé do segurado. Contudo, da análise da situação fática descrita, percebe-se que deve ser aplicado o entendimento pacificado pelo STJ no julgamento do REsp n. 1.350.804/PR, representativo da controvérsia, de que a inscrição em dívida ativa não é a forma de cobrança adequada para os valores indevidamente recebidos a título de benefício previdenciário previstos no artigo 115, II, da Lei n. 8.213/1991, que devem submeter-se à ação de cobrança por enriquecimento ilícito para apuração da responsabilidade civil. É importante ressaltar que, em virtude da ação de execução fiscal (0000349-54.2009.8.26.0077) ter sido distribuída em 13/1/2009, em obediência ao princípio tempus regit actum, não se aplica ao caso em exame a disposição contida no § 3º do artigo 115 da Lei n. 8.213/1991, com redação dada pela MP n. 780/2017, convertida na Lei n. 13.494/2017, que possibilita a inscrição em dívida ativa dos créditos constituídos pelo INSS em razão de benefício previdenciário ou assistencial pago indevidamente. Ademais, em 23/6/2021, a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça julgou os paradigmas do Tema n 1.064, resolvendo o mérito sobre possibilidade de inscrição em dívida ativa de valores a serem ressarcidos em razão do recebimento indevido de benefício previdenciário. O acórdão, publicado em 28/6/2021, restou assim ementado, destacado seu teor controvertido: “RECURSO INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DO CPC/2015. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO Nº 3. RECURSO REPETITIVO. TEMA CORRELATO AO TEMA N. 598 CONSTANTE DO REPETITIVO RESP. N. 1.350.804-PR. PROCESSUAL CIVIL. DIREITO FINANCEIRO E PREVIDENCIÁRIO. DISCUSSÃO ACERCA DA POSSIBILIDADE DE INSCRIÇÃO EM DÍVIDA ATIVA DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO INDEVIDAMENTE RECEBIDO, QUALIFICADO COMO ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. APLICABILIDADE DOS §§3º E 4º, DO ART. 115, DA LEI N. 8.213/91, COM A REDAÇÃO DADA PELA MEDIDA PROVISÓRIA N. 780/2017 (LEI N. 13.494/2017) E MEDIDA PROVISÓRIA N. 871/2019 (LEI N. 13.846/2019) AOS PROCESSOS EM CURSO DONDE CONSTAM CRÉDITOS CONSTITUÍDOS ANTERIORMENTE À VIGÊNCIA DAS REFERIDAS LEIS. IMPOSSIBILIDADE. 1. O presente repetitivo Tema/Repetitivo n. 1064 é um desdobramento do Tema/Repetitivo n. 598, onde foi submetida a julgamento no âmbito do REsp. n. 1.350.804-PR (Primeira Seção, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 12.06.2013) a "Questão referente à possibilidade de inscrição em dívida ativa de benefício previdenciário indevidamente recebido, qualificado como enriquecimento ilícito". Naquela ocasião foi definido que a inscrição em dívida ativa de valor decorrente de ilícito extracontratual deve ser fundamentada em dispositivo legal específico que a autorize expressamente, o que impossibilitava a inscrição em dívida ativa de valor indevidamente recebido, a título de benefício previdenciário do INSS, pois não havia lei específica que assim o dispusesse. Essa lacuna de lei tornava ilegal o art. 154, §4º, II, do Decreto n. 3.048/99 que determinava a inscrição em dívida ativa de benefício previdenciário pago indevidamente, já que não dispunha de amparo legal. 2. Pode-se colher da ratio decidendi do repetitivo REsp. n.1.350.804-PR três requisitos prévios à inscrição em dívida ativa: 1º) a presença de lei autorizativa para a apuração administrativa (constituição); 2º) a oportunização de contraditório prévio nessa apuração; e 3º) a presença de lei autorizativa para a inscrição do débito em dívida ativa. 3. Após o advento da Medida Provisória n. 780/2017 (convertida na Lei n. 13.494/2017) a que se sucedeu a Medida Provisória n. 871/2019 (convertida na Lei n. 13.846/2019), que alteraram e adicionaram os §§ 3º, 4º e 5º ao art. 115, da Lei n. 8.213/91, foi determinada a inscrição em dívida ativa pela Procuradoria-Geral Federal - PGF dos créditos constituídos pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS em decorrência de benefício previdenciário ou assistencial pago indevidamente ou além do devido, inclusive para terceiro beneficiado que sabia ou deveria saber da origem do benefício pago indevidamente em razão de fraude, dolo ou coação. 4. Considerando-se as razões de decidir do repetitivo REsp. n. 1.350.804-PR, as alterações legais não podem retroagir para alcançar créditos constituídos (lançados) antes de sua vigência, indiferente, portanto, que a inscrição em dívida ativa tenha sido feita depois da vigência das respectivas alterações legislativas. O processo administrativo que enseja a constituição do crédito (lançamento) há que ter início (notificação para defesa) e término (lançamento) dentro da vigência das leis novas para que a inscrição em dívida ativa seja válida. Precedentes: REsp. n. 1.793.584/SP, Segunda Turma, Rel. Min. Francisco Falcão, julgado em 02.04.2019; AREsp n. 1.669.577/SP, Segunda Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 04.08.2020; AREsp. n. 1.570.630 / SP, Segunda Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 12.11.2019; REsp. n. 1.826.472 / PE, Segunda Turma, Rel. Min. Francisco Falcão, julgado em 15.10.2019; AREsp. n. 1.521.461 / RJ, Segunda Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 03.10.2019; REsp. n. 1.776.760 / SP, Segunda Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 23.04.2019; AREsp n. 1.432.591/RJ, decisão monocrática, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, DJe 21.2.2019; REsp. n. 1.772.921/SC, Decisão monocrática, Rel. Min. Assusete Magalhães, DJe 18.2.2019. 5. Desta forma, propõe-se as seguintes teses: 5.1. "As inscrições em dívida ativa dos créditos referentes a benefícios previdenciários ou assistenciais pagos indevidamente ou além do devido constituídos por processos administrativos que tenham sido iniciados antes da vigência da Medida Provisória nº 780, de 2017, convertida na Lei n. 13.494/2017 (antes de 22.05.2017) são nulas, devendo a constituição desses créditos ser reiniciada através de notificações/intimações administrativas a fim de permitir-se o contraditório administrativo e a ampla defesa aos devedores e, ao final, a inscrição em dívida ativa, obedecendo-se os prazos prescricionais aplicáveis"; e 5.2. "As inscrições em dívida ativa dos créditos referentes a benefícios previdenciários ou assistenciais pagos indevidamente ou além do devido contra os terceiros beneficiados que sabiam ou deveriam saber da origem dos benefícios pagos indevidamente em razão de fraude, dolo ou coação, constituídos por processos administrativos que tenham sido iniciados antes da vigência da Medida Provisória nº 871, de 2019, convertida na Lei nº 13.846/2019 (antes de 18.01.2019) são nulas, devendo a constituição desses créditos ser reiniciada através de notificações/intimações administrativas a fim de permitir-se o contraditório administrativo e a ampla defesa aos devedores e, ao final, a inscrição em dívida ativa, obedecendo-se os prazos prescricionais aplicáveis". 6. Recurso especial não provido.” (REsp 1860018/RJ, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 23/6/2021, DJe 28/6/2021)” Uniformizado, portanto, o entendimento sobre a questão no âmbito do STJ, impõe-se a sua observância pelas instâncias ordinárias. Isso posto, inscrito o crédito exequendo em 17/2/2006, mantenho a decisão recorrida, por outros termos, porque em conformidade com o decidido no Tema 1.064 do STJ. Fica mantida a condenação do INSS a pagar honorários de advogado, cujo percentual majoro para R$ 1.200,00 (mil e duzentos reais), consoante os critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 11, do CPC. Quanto ao prequestionamento suscitado, assinalo não ter havido contrariedade alguma à legislação federal ou a dispostos constitucionais. Diante do exposto, anulo, de ofício, a sentença e extingo a execução fiscal, nos termos do artigo 485, IV, c/c artigo 803, I, do CPC. Prejudicado o recurso da exequente. É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. DEVOLUÇÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. VIA INADEQUADA. AJUIZAMENTO DA AÇÃO FISCAL EM 2009. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
I - A ação de execução fiscal não é o instrumento jurídico adequado para a cobrança de valores referentes a benefícios previdenciários supostamente pagos indevidamente, conforme entendimento pacificado pelo STJ no julgamento do REsp n.1.350.804/PR, representativo da controvérsia.
II - Em razão da ação de execução fiscal ter sido distribuída em 13/1/2009, em obediência ao princípio tempus regit actum, não se aplica ao caso em exame a disposição contida no § 3º do artigo 115 da Lei n. 8.213/91, com redação dada pela MP n. 780/2017, convertida na Lei n. 13.494/2017, que possibilita a inscrição em dívida ativa dos créditos constituídos pelo INSS em razão de benefício previdenciário ou assistencial pago indevidamente.
- As inscrições em dívida ativa dos créditos referentes a benefícios previdenciários ou assistenciais pagos indevidamente ou além do devido constituídos por processos administrativos que tenham sido iniciados antes da vigência da Medida Provisória n. 780, de 2017, convertida na Lei n. 13.494/2017 (antes de 22/5/2017) são nulas (Tema n. 1.064 do STJ).
- Fica mantida a condenação do INSS a pagar honorários de advogado, cujo percentual majoro para R$ 1.200,00 (mil e duzentos reais), consoante os critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 11, do CPC.
- Sentença anulada. Apelação prejudicada.