AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 5019223-62.2019.4.03.0000
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. BATISTA GONÇALVES
AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
REU: MARIO FERREIRA DOS REIS
Advogado do(a) REU: FERNANDA PASQUALINI MORIC - SP257886-A
OUTROS PARTICIPANTES:
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 5019223-62.2019.4.03.0000 RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. BATISTA GONÇALVES AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS REU: MARIO FERREIRA DOS REIS Advogado do(a) REU: FERNANDA PASQUALINI MORIC - SP257886-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Cuida-se de ação rescisória ajuizada, em 29/07/2019, pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS em face de MARIO FERREIRA DOS REIS, com fundamento no artigo 966, inciso V, do NCPC, objetivando desconstituir provimento jurisdicional exarado pela 7ª Turma desta e. Corte, em autos de ação de concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, mediante averbação de período comum e reconhecimento da insalubridade de ofício desempenhado pelo réu. Alega o demandante, nesse sentido, que: i) no feito subjacente, a d. Turma julgadora não conheceu do reexame necessário, sob o argumento de que o valor da condenação não alcançava a importância de 60 salários mínimos; contudo, uma vez estabilizado o julgado, o credor, na fase de cumprimento de sentença, ofereceu cálculos de liquidação no total de R$ 397.910,64, ao passo que a contadoria judicial apurou o valor de R$ 385.149,52; ii) o proveito econômico alcançado no feito subjacente mostra-se significativamente superior a 60 salários mínimos, de modo que o acórdão rescindendo incidiu em equívoco ao dispensar o duplo grau obrigatório e, por consequência, incorreu em ofensa ao artigo 475, I, §2º, do CPC/1973 e ao artigo 10 da Lei 9.469/97; iii) conforme pacífico entendimento do c. STJ, a dispensa de reexame necessário não se aplica a sentenças ilíquidas, bem como, tratando-se de ato judicial proferido sob a vigência do CPC/1973, mostra-se necessária a observância das regras de admissibilidade recursal previstas no aludido diploma legislativo; e iv) ante a ausência de controvérsia jurisprudencial sobre a temática, resta afastada a incidência da Súmula 343 do STF. No que tange à eventual juízo rescisório, alega o INSS que o segurado deixou de comprovar o exercício de atividade especial no período de 06/03/1997 a 18/11/2003 e, por esse motivo, não satisfaz os requisitos necessários à concessão da aposentadoria almejada, razão pela qual entende de rigor a decretação da improcedência do pedido. Caso assim não se compreenda, propugna, subsidiariamente, pela fixação de consectários legais nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, com limitação dos honorários advocatícios à data da sentença, em respeito ao entendimento firmado na Súmula STJ n. 111. Pelo provimento ID 86075292, foi deferida a tutela de urgência pleiteada, com o fim de suspender a execução do aresto impugnado, no que concerne aos valores controversos, até o julgamento final do feito, sem prejuízo da continuidade do recebimento da aposentadoria por tempo de serviço/contribuição. Determinou-se, outrossim, a citação do requerido, fixando-se o prazo de 30 (trinta) dias para a resposta. Em consequência, a Subsecretaria expediu o competente ofício citatório (ID 87511556), sobrevindo a juntada de AR negativo (ID 89858365), apresentando a anotação de “endereço insuficiente” (ID 89858366). Na sequência, a e. Relatora oficiante proferiu despacho ordenando a manifestação autárquica a respeito (ID 94730558). Por sua vez, o INSS peticionou indicando o endereço completo inserido em seu banco de dados, reiterando a efetivação da diligência (ID 99461833). Novo ofício foi, então, emitido (ID 107328939). Ato contínuo, sobreveio informação da Subsecretaria alertando quanto ao não retorno do Aviso de Recebimento referente ao ofício citatório, bem como noticiando a obtenção da remessa do comprovante de entrega, após contato com os Correios (ID 124580071). Diante da resposta encaminhada pelos Correios, a d. Relatoria reputou devidamente cientificado o réu e, tendo em vista a não apresentação de peça defensiva, considerou-o revel, nos termos do art. 344 do CPC, afastados, contudo, os efeitos da presunção de veracidade (ID 125413120). Após, sobrevieram petições do demandado, incluindo a contestação a afirmar a descaracterização da revelia. Em um primeiro momento, foi determinada a regularização da representação processual do réu (ID 133122654), o que foi realizado (ID 133625508). Em seguida, no despacho ID 135444395, esclareceu-se que a manifestação do requerido foi juntada após o término do rito cabível, de forma a impossibilitar que fosse recebida como contestação, sobretudo ao se considerar que o despacho que determinou a revelia restou irrecorrido pela via do agravo regimental, faculdade prevista no art. 250 do RITRF3. No entanto, a fim de evitar eventual cerceamento de defesa, a petição foi recebida como memoriais e facultada idêntica providência à parte contrária, no prazo de quinze dias (ID 135444395). Intimado, o autor reiterou os termos da inicial (ID 138625092). A seu turno, o réu opôs embargos de declaração (ID 135444395). Com o pronunciamento do demandante, sobreveio a decisão ID 145364468, em que foi rejeitado o integrativo, sob o fundamento de que a decretação da revelia não decorreu de deliberação realizada na decisão objeto dos aclaratórios, referindo-se, em verdade, a provimento jurisdicional exarado pela d. Relatoria anterior, que restou irrecorrido. Na oportunidade, ressaltou-se a inexistência de qualquer gravame decorrente da recepção da aludida peça como memoriais, recordando que a revelia reconhecida não é de molde a produzir seu efeito processual típico, qual seja, o reconhecimento da veracidade das alegações formuladas pelo autor. É o relatório.
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 5019223-62.2019.4.03.0000 RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. BATISTA GONÇALVES AUTOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS REU: MARIO FERREIRA DOS REIS Advogado do(a) REU: FERNANDA PASQUALINI MORIC - SP257886-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Inicialmente, constato a tempestividade da ação rescisória, dado que a decisão rescindenda transitou em julgado em 18/08/2017 (ID 84885864 - p. 50) e o ajuizamento da presente demanda remonta a 29/07/2019 (ID 84885845). Superado esse aspecto, mostra-se oportuna a transcrição da ementa do aresto guerreado (proc. reg. nº 2009.61.83.010877-8): “PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. PROCESSUAL CIVIL. RAZÕES DISSOCIADAS. NÃO CONHECIMENTO. Valor da condenação inferior a 60 salários mínimos. Remessa necessária não conhecida. 2. Incumbe ao apelante a adequada e necessária impugnação à sentença, com a exposição dos fundamentos de fato e de direito, de modo a demonstrar as razões do seu inconformismo em relação à decisão recorrida. 3. Não se conhece do recurso quando as razões deduzidas estão dissociadas da fundamentação. 4. Remessa necessária e Apelação não conhecidas”. Para melhor compreensibilidade, tragam-se, outrossim, as seguintes passagens do voto do e. Relator: “Considerando que a sentença foi proferida sob a égide do Código de Processo Civil de 1973, passo ao exame da admissibilidade da remessa necessária prevista no seu artigo 475. Embora não seja possível, de plano, aferir-se o valor exato da condenação, pode-se concluir, pelo termo inicial do benefício (18/06/2008), seu valor aproximado e a data da sentença (20/10/2010), que o valor total da condenação não alcança a importância de 60 (sessenta) salários mínimos estabelecida no § 2º. Assim, é nítida a inadmissibilidade, na hipótese em tela, da remessa necessária. (...)”. Retomados esses aspectos, verifico que o INSS alega, em sua petição inicial, a imperatividade do duplo grau necessário na hipótese em análise, razão pela qual conclui que sua subtração acarretou a violação a diversos preceitos legais. Nesses termos, entendo necessárias algumas ponderações quanto à aceitabilidade da ação rescisória. De fato, não se ignora que esta e. Seção, em ocasiões anteriores, entendeu por obstar a apreciação meritória de feitos rescindentes semelhantes, sob a justificativa de que não houve a estabilização da decisão contrastada, exatamente em função de sua não submissão ao reexame necessário, estágio indispensável à formação do respectivo trânsito em julgado. Anoto, nesse sentido, alguns precedentes deste e. Colegiado: “PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. REVISÃO DE BENEFÍCIO. TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA. AUSÊNCIA. REMESSA OFICIAL. CONDIÇÃO DE EFICÁCIA DO "DECISUM". ARTIGO 485 DO CPC. EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. REQUISITO INDISPENSÁVEL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1. A ação rescisória é o remédio processual (art. 485 do CPC) do qual a parte dispõe para invalidar sentença de mérito transitada em julgado, dotada de eficácia imutável e indiscutível (art. 467 do CPC), o que não se verifica na hipótese. 2. No caso, não há como aferir de pronto o valor da condenação ou da controvérsia jurídica, de tal sorte que deveria a sentença ter sido submetida a remessa oficial, em consonância ao disposto no artigo 475, I, § 2º, do CPC. 3. A remessa oficial é uma condição de eficácia da sentença, sendo certo que esta não produzirá efeitos senão após sua confirmação pelo Tribunal. 4. Sem o trânsito em julgado da sentença, incabível é a ação rescisória. 5. Extinção do processo, sem resolução de mérito, nos termos do art. 267, IV, CPC. 6. Em virtude do princípio da causalidade, condeno o INSS ao pagamento de honorários advocatícios arbitrados em R$550,00.(TRF 3ª Região, TERCEIRA SEÇÃO, AR - AÇÃO RESCISÓRIA - 5699, 0096614-04.2007.4.03.0000, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL DALDICE SANTANA, julgado em 25/08/2011, e-DJF3 Judicial 1 DATA:02/09/2011 PÁGINA: 197) AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AUSÊNCIA DE TRÂNSITO EM JULGADO DO ACÓRDÃO. REMESSA OFICIAL NÃO CONHECIDA. CONDIÇÃO DE EFICÁCIA. SÚMULA Nº 423, DO STF. RESCISÓRIA E RECONVENÇÃO EXTINTAS. I- A condição indispensável para o ajuizamento da rescisória -- trânsito em julgado do decisum que se pretende desconstituir -- não se encontra presente no caso concreto em análise, fazendo incidir a Súmula nº 423, do C. Supremo Tribunal Federal, in verbis: "Não transita em julgado a sentença por haver omitido o recurso 'ex officio', que se considera interposto 'ex lege'." II- Ontologicamente, a situação retratada nos autos não é diferente daquela descrita nos precedentes desta Terceira Seção (AgRg em AR nº 2012.03.00.030896-1 e o AgRg em AR nº 2008.03.00.038714-6). III- O fato de o colegiado não ter conhecido da remessa oficial ou o fato de o juiz de primeiro grau não submeter a sentença ao reexame necessário levam à mesma conclusão: a inexistência do trânsito em julgado da decisão rescindenda. IV- Rescisória e reconvenção julgadas extintas sem exame do mérito, nos termos do art. 485, inc. VI, do CPC. (AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0011648-74.2008.4.03.0000/SP, 2008.03.00.011648-5/SP Rel. p/ acórdão Desembargador Federal Newton De Lucca, j. 08 de fevereiro de 2018). No entanto, posteriormente, esta c. Terceira Seção deliberou, em votação majoritária em sede de embargos infringentes, pela aceitação de tais ações desconstitutivas, em deferência à celeridade procedimental, nas hipóteses em que o julgado rescindendo é expresso quanto ao afastamento do reexame necessário e seja esse, justamente, o embasamento da ação rescisória – hipótese dos autos em apreço. Confira-se o aludido caso paradigmático: “PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. REEXAME NECESSÁRIO EXPRESSAMENTE DISPENSADO PELO MAGISTRADO PROLATOR DA SENTENÇA PROFERIDA NO FEITO SUBJACENTE. QUESTÃO QUE CONSTITUI UM DOS CAPÍTULOS DA SENTENÇA, SUJEITA A COISA JULGADA. SENTENÇA EFICAZ. EMBARGOS INFRINGENTES REJEITADOS. 1. A divergência objeto dos embargos em apreço cinge-se à questão do cabimento ou não da extinção da ação rescisória sem julgamento do mérito, em razão da não submissão da sentença proferida no feito subjacente ao reexame necessário. 2. A interpretação sistemática do artigo 475, do CPC/1973, permite que dele se extraiam as seguintes normas jurídicas: (i) em regra, as sentenças contrárias à Fazenda Pública, nos termos do artigo 475, I e II, do CPC/73, não produzem efeitos se não forem submetidas ao reexame necessário; (ii) excepcionalmente, as sentenças contrárias à Fazenda Pública produzem efeitos e fazem coisa julgada, inclusive quanto ao reexame, quando configurada uma das hipóteses dos parágrafos segundo e terceiro do CPC/1973, exigindo-se, em casos tais, que o magistrado expressamente dispense o reexame. 3. É que, como a regra é que a sentença contrária à Fazenda Pública não produza efeitos se não for submetida ao reexame, é preciso que se demonstre a excepcionalidade que justifique a dispensa da remessa. Ademais, quando o magistrado dispensa o reexame, essa questão passa a formar um capítulo da sentença, o que não se verifica no caso de a decisão ser omissa sobre o tema. Na primeira situação, a dispensa do reexame pode configurar um error in judicando, o qual deve ser impugnado, sob pena de preclusão e formação de coisa julgada, atacável até mesmo por rescisória. Na segunda, no caso de omissão sobre a necessidade ou não do reexame, há um error in procedendo, não se podendo falar em coisa julgada, já que não há decisão judicial sobre o reexame necessário. Conclui-se que (i) se o magistrado omitir-se sobre o reexame necessário, a sentença não produzirá efeitos, notadamente no que tange à formação da coisa julgada; (ii) se o juiz enfrentar o tema do reexame, haverá um comando judicial sobre essa questão processual que constituirá um capítulo da sentença, o qual, se não for impugnado, ficará acobertado pela coisa julgada, assim como toda a sentença em si. 4. A sentença contrária à Fazenda Pública só não se sujeitará à preclusão se ela for omissa no que tange à necessidade de reexame; havendo manifestação sobre o cabimento ou não da remessa, existirá um capítulo na sentença sobre o tema, o qual, se não impugnado, fará coisa julgada, além de assegurar eficácia para toda a sentença. Isso, inclusive, é o que se infere da Súmula 343 do STF, que condiciona a ineficácia da sentença à omissão quanto à necessidade do reexame: "Não transita em julgado a sentença por haver omitido o recurso ex officio, que se considera interposto ex lege". 5. Considerando que a sentença proferida no processo subjacente expressamente enfrentou o tema do reexame, tendo o magistrado o dispensado por entender que a hipótese de referido feito amoldava-se a situação prevista no artigo 475, §3°, do CPC/73, conclui-se que tal decisão judicial não pode ser considerada ineficaz, na forma do artigo 475, caput, mas sim que a dispensa da remessa necessária constitui um capítulo da sentença, o qual, assim como os demais, sujeita-se à preclusão, inclusive à máxima. Por conseguinte, não há que se falar em extinção da presente ação rescisória sem julgamento do mérito, sendo de se frisar que a questão da remessa necessária, por ter transitado em julgado, poderia, em tese, ter sido impugnada na via da rescisória, conforme bem pontuado no voto condutor. 6. Embargos infringentes rejeitados”. (EMBARGOS INFRINGENTES Nº 0026165-16.2010.4.03.0000/SP, 2010.03.00.026165-0/SP RELATORA: Desembargadora Federal INÊS VIRGÍNIA AR j. 24 de janeiro de 2019) Em julgado recente, a e. Seção tornou a admitir demanda desconstitutiva nesse contexto, como se denota da ementa a seguir transcrita: “PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. REEXAME NECESSÁRIO. ART. 475, § 2.º, DO CPC DE 1973. VIOLAÇÃO A LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. - Sentença recorrida proferida em 18/11/2010, razão pela qual incidem, no tocante à análise dos requisitos de admissibilidade do recurso, as disposições contidas no Código de Processo Civil de 1973 (CPC/1973). Precedentes. - O julgamento desfavorável à Fazenda Pública, anteriormente à edição da Lei n.º 10.352/2001, deve submeter-se ao reexame necessário independentemente da observância ao limite de 60 salários-mínimos, aplicável a condenações que lhe sejam posteriores. Precedentes. - A circunstância de o valor da condenação imposta na sentença exceder o limite legal, considerando-se a determinação de retroação da DIB de 2009 para 1995, com o pagamento dos valores atrasados desde maio de 2004, justifica a rescisão parcial do acórdão proferido no feito subjacente. - Alinhamento dos consectários legais (juros de mora e correção monetária) à jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal, bem como ao Manual de Cálculos da Justiça Federal. - Ação rescisória cujo pedido se julga procedente, para, em sede de juízo rescindendo, desconstituir parcialmente o acórdão quanto ao não conhecimento da remessa oficial, e, no âmbito do juízo rescisório, conhecer da remessa oficial e dar-lhe parcial provimento, para fixar critérios de incidência da correção monetária e dos juros de mora, nos termos da fundamentação constante do voto”. (AR nº 5011880-49.2018.4.03.0000Rel. p/ acórdão THEREZINHA CAZERTA Desembargadora Federal, j. 28/01/2021). Dessa forma, compreendo de rigor o reconhecimento da aceitabilidade da medida judicial intentada frente aos atuais precedentes desta e. Seção, razão pela qual passo ao mérito da presente ação rescisória. Como conhecido, sob o pálio do permissivo insculpido no artigo 966, V, do NCPC, serão infirmadas apenas decisões judiciais frontalmente em descompasso com a ordem positiva, portadoras de interpretações verdadeiramente aberrantes e injustificáveis, sob qualquer ponto de vista jurídico. Por outra medida, se a exegese adotada pelo julgado guarda algum vestígio de plausibilidade, detectando-se que o julgador encampou uma das interpretações possíveis ao caso posto em desate, ainda quando não se afigure a mais escorreita, justa ou mesmo adequada, ter-se-á por inibida a via rescisória. Não se trata de sucedâneo recursal, tampouco se vocaciona à mera substituição de interpretações judiciais ou mesmo ao reexame do conjunto probatório, em busca de prolação de provimento jurisdicional favorável ao demandante. No que respeita à incidência do enunciado 343 do C. STF, segundo o qual normas de interpretação controvertida nos Tribunais não são de molde a propiciar rescisória fundada em agressão à lei, conhecido que esta E. Seção vem historicamente afastando tal óbice quando em causa matéria de natureza constitucional. Citem-se, a título de ilustração, os seguintes precedentes: Ação Rescisória nº 0024566-13.2008.4.03.0000/SP, Relator Desembargador Federal Gilberto Jordan, D.E. 22/3/2017; Ação Rescisória nº 0003236-76.2016.4.03.0000, Relator Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias, D.E. 22/3/2017, Ação Rescisória nº 0020097-45.2013.4.03.0000, Relator Desembargador Federal Fausto de Sanctis, e-DJF3 Judicial 1 DATA:21/10/2016; Ação Rescisória nº 0018824-60.2015.4.03.0000, Relatora Desembargadora Federal. Marisa Santos, e-DJF3 Judicial 1 DATA:05/09/2016. A persistência da postura quanto ao afastamento do referido enunciado em matéria constitucional intensifica-se quando não se divisa reversão de posicionamento no âmbito do próprio c, STF sobre o tema em comento. Com essas delimitações preliminares, entendo configurado o permissivo destacado ao desfazimento pretendido. De fato, assiste razão à autarquia quando assevera que a sentença contrastada efetivamente se sujeitava ao reexame obrigatório. De início, saliento que a data da prolação da decisão de Primeira Instância é anterior à vigência do NCPC e, portanto, do novo limite legal de mil salários mínimos – sendo cediço que o momento da sentença é o marco temporal para a verificação da necessidade de sua submissão à remessa necessária e do teto de dispensa a tanto aplicável. Há, inclusive, os Enunciados Administrativos nºs. 2 e 3 do c. STJ nesse sentido. Assentada, portanto, a incidência do limite de sessenta salários-mínimos, ressai que o julgado rescindendo, ao afastar o duplo grau obrigatório, sem prévia possibilidade de conhecimento acerca do exato valor da condenação e consequente dúvida quanto à superação do teto aplicável, encampou posicionamento contrário à Súmula STJ 490 (“A dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas”; v. DJ-e 1-8-2012) e, por conseguinte, minoritário, potencialmente lesivo a expresso texto legal. Ademais, observo que a Corte Especial do c. STJ, quando do julgamento dos Embargos de Divergência nº 934.642/PR, em sessão realizada em 30/6/2009, seguindo a linha do voto do relator, Ministro Ari Pargendler, entendeu que o cabimento do exame obrigatório é regra, admitindo-se a sua dispensa apenas nos casos em que o valor da condenação é certo e não excede a sessenta salários mínimos, o que não é o caso dos autos. O aresto encontra-se assim ementado: “PROCESSO CIVIL. REEXAME NECESSÁRIO. SENTENÇA ILÍQUIDA. A sentença ilíquida proferida contra a União, o Estado, o Distrito Federal, o Município e as respectivas autarquias e fundações de direito público está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal; a exceção contemplada no § 2º do art. 475 do Código de Processo Civil supõe, primeiro, que a condenação ou o direito controvertido tenham valor certo e, segundo, que o respectivo montante não exceda de 60 (sessenta) salários mínimos. Embargos de divergência conhecidos e providos”. Concluo, enfim, que a decisão contrastada deveria efetivamente submeter-se à remessa oficial, dado que ilíquida, ou seja, de valor não certo. Com efeito, somente se reputa líquido o ato judicial revestido de certeza e determinação no que concerne ao “quantum debeatur”, não possuindo esse atributo o provimento que não individualiza tal importe (cf. o seguinte precedente desta e. Seção: AR 2008.03.00.039843-0/SP. Rel. Des. Fed. Baptista Pereira, j. 27/09/2012) – convém recordar, ademais, que na hipótese em tela o ora suplicado percebeu, durante significativo período laboral, proventos correspondentes a quatro salários mínimos, fato que, efetivamente, já colocava sob forte dúvida a subsunção da condenação ao teto de 60 salários mínimos. Destarte, não comprovado cuidar-se, na origem, de benefício de valor mínimo – havendo, inclusive, controvérsia no feito originário sobre a correta expressão monetária do benefício, quando do cumprimento da antecipação de tutela, tendo a então autoria reivindicado em quatro ocasiões a regularização da benesse implantada pelo Instituto –, circunstância que permitiria a estimativa de valores, resulta configurada a literal violação de norma jurídica declinada na inicial, visto que o provimento rescindendo, ao afastar o duplo grau obrigatório, adotou entendimento dissonante das normas processuais então em vigor. Quanto ao juízo rescisório, com a devida vênia dos que entendem em sentido contrário, creio inadequada a apreciação, nesta oportunidade, da remessa oficial. De fato, se não houve, na demanda originária, o reexame que era inicialmente devido, de rigor a devolução do feito matriz à d. Turma para a análise que lhe compete – apreciação da remessa – lembrando que a ação rescisória permite o rejulgamento da causa primitiva, não o próprio julgamento (no caso, do recurso “ex officio”), sob pena de usurpação de competência recursal do órgão jurisdicional próprio (Turma) – o qual, de resto, não realizou incursão alguma no mérito da questão vertida na demanda subjacente, já que o recurso voluntário teve seu conhecimento obstado, dado que divorciado da discussão desenvolvida no feito subjacente. Renovada vênia, raciocinar-se de modo distinto, em especial diante das particularidades da hipótese, poderia ocasionar ofensa ao devido processo legal e ao princípio do juiz natural, atribuindo à via rescindente característica recursal (esquadrinhamento originário da remessa oficial). Recolho, no que importa à presente análise, alguns precedentes deste e. Tribunal: DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. PRAZO BIENAL PARA O AJUIZAMENTO. OBSERVÂNCIA. APRESENTAÇÃO DE PETIÇÃO SIMPLES E CONTESTAÇÃO NO PRAZO PARA RESPOSTA. PRECLUSÃO CONSUMATIVA. NÃO OCORRÊNCIA. CONDIÇÃO DA AÇÃO. CONHECIMENTO EM QUALQUER TEMPO E GRAU DE JURISDIÇÃO. DECISÃO RESCINDENDA PROFERIDA NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 11.457/2007. AÇÃO DE ORIGEM RELATIVA À COBRANÇA DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. REPRESENTAÇÃO JUDICIAL PELA UNIÃO FEDERAL. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO INSS PARA A RESCISÓRIA. CABIMENTO DA RESCISÓRIA. ERRO DE FATO. CONFIGURAÇÃO. JUÍZO RESCINDENDO. DESCONSTITUIÇÃO DA DECISÃO DE EXTINÇÃO DO FEITO. INVIABILIDADE DE PROLAÇÃO DE JUÍZO RESCISÓRIO. COMPETÊNCIA DA TURMA DESTE TRIBUNAL. (…) 10. Estão presentes os requisitos necessários e suficientes ao reconhecimento da ocorrência do erro de fato. 11. Não pode esta E. Seção debruçar-se sobre o tema dos recursos e do reexame necessário, isto é, sobre a matéria de fundo deduzida nos embargos de origem, vez que compete à C. Primeira Turma tal enfrentamento, ainda não ultimado por aquele órgão julgador em razão da homologação da renúncia que ora se desconstitui. Inviabilizado, portanto, a prolação de juízo rescisório nestes autos. (...)”. (AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0019619-03.2014.4.03.0000/SP, RELATOR Desembargador Federal WILSON ZAUHY, j. 06 de julho de 2017). “PROCESSO CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. ACÓRDÃO RESCINDENDO QUE NÃO APRECIOU TODA A MATÉRIA DEVOLVIDA. CABIMENTO. ARTIGO 485, V DO CPC. A r. decisão que não esgotou a prestação jurisdicional, deixando de analisar toda a matéria devolvida, viola o artigo 475, I, do CPC. Ação Rescisória provida, para rescindir a r. decisão monocrática fulcrada no artigo 557 do CPC, com retorno dos autos à Turma julgadora para que seja apreciada a remessa, nos termos invocados pela autora (artigo 475, I do CPC), no que pertine à legalidade e exigência da Lei nº 9.715/98. Honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) do valor da causa, corrigido”. (AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0015024-92.2013.4.03.0000/SP, 2013.03.00.015024-5/SP, RELATORA : Desembargadora Federal MARLI FERREIRA, j. 05 de maio de 2015”. Entendo, assim, mais adequado o retorno dos autos à respectiva Turma julgadora, para a apreciação da remessa necessária pelo órgão jurisdicional competente, não havendo margem ao pronto esquadrinhamento pela própria e. Seção. Consigno, por derradeiro, que não há que se cogitar em restituição dos valores pagos em função do julgado ora rescindido. Com efeito, ressalto que quando os dispêndios ao segurado derivam de decisão (ainda que presumidamente) transitada em julgado, forçoso reconhecer a supremacia da “res iudicata”. Ademais, cumpre esclarecer que o réu persistirá no percebimento da aposentadoria, até que a d. Turma Julgadora se pronuncie de modo distinto, já que a tutela antecipada foi concedida na sentença (ID 84885856 - p. 11) e os provimentos jurisdicionais exarados neste e. Tribunal, antecedentes ao aresto combatido, mantiveram seu cumprimento. Ante todo o exposto, ratificando o provimento preambular anteriormente deferido, JULGO PROCEDENTE O PEDIDO formulado na ação rescisória, ordenando o retorno dos autos subjacentes à Turma Julgadora para apreciação do reexame necessário. Fixo os honorários advocatícios em desfavor do polo particular em R$ 1.000,00, consoante precedentes da Terceira Seção desta E. Corte, observando-se a gratuidade judiciária concedida. É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. AFASTAMENTO DA REMESSA OFICIAL QUE, NA HIPÓTESE, APRESENTAVA-SE DEVIDA. VIOLAÇÃO MANIFESTA A NORMA JURÍDICA. HIPÓTESE CONFIGURADA. PROCEDÊNCIA DA AÇÃO RESCISÓRIA. RETORNO DOS AUTOS ORIGINÁRIOS À TURMA PARA APRECIAÇÃO DA MEDIDA.
1. Aceitabilidade da ação rescisória, já que o reexame necessário foi expressamente afastado pela decisão contrastada e tal circunstância constitui o próprio embasamento do feito rescindente. Precedentes desta Seção.
2. Verificada a aduzida ofensa à norma jurídica. Tratando-se de sentença ilíquida e não havendo condições de aferição prévia do “quantum debeatur”, imprescindível a apreciação da remessa oficial. Súmula STJ 490.
3. Determinação de retorno dos autos à Turma Julgadora, para apreciação do recurso “ex officio”, cujo julgamento pela própria Seção se afigura obstado, em função do devido processo legal e das exigências do juiz natural.
4. O polo particular remanescerá na titularidade da aposentadoria até posterior manifestação da Turma, dada a tutela antecipada concedida na sentença exarada na demanda matriz.
5. Procedência do pedido formulado na ação rescisória.