Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0054385-77.1998.4.03.6100

RELATOR: Gab. 21 - DES. FED. JOHONSOM DI SALVO

APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, UNIÃO FEDERAL, ESTADO DE SAO PAULO, DALTON DE ALENCAR FISCHER CHAMONE, PAULO ROSSETTI OLIVEIRA CABRAL, MARCELO PUPKIN PITTA, PEDRO ENRIQUE DORLHIAC LLACER

Advogado do(a) APELANTE: JULIANA CAMPOLINA REBELO HORTA - SP301795-B
Advogado do(a) APELANTE: SAMUEL MAC DOWELL DE FIGUEIREDO - SP29393
Advogado do(a) APELANTE: SAMUEL MAC DOWELL DE FIGUEIREDO - SP29393
Advogado do(a) APELANTE: SAMUEL MAC DOWELL DE FIGUEIREDO - SP29393
Advogado do(a) APELANTE: CLAUDIO MAURO HENRIQUE DAOLIO - SP172723-A

APELADO: UNIÃO FEDERAL, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, DALTON DE ALENCAR FISCHER CHAMONE, PAULO ROSSETTI OLIVEIRA CABRAL, MARCELO PUPKIN PITTA, PEDRO ENRIQUE DORLHIAC LLACER, ESPÓLIO DE WESLEY WEY JUNIOR
REPRESENTANTE: MARIA APARECIDA DE SOUZA WEY

Advogado do(a) APELADO: SAMUEL MAC DOWELL DE FIGUEIREDO - SP29393
Advogado do(a) APELADO: SAMUEL MAC DOWELL DE FIGUEIREDO - SP29393
Advogado do(a) APELADO: SAMUEL MAC DOWELL DE FIGUEIREDO - SP29393
Advogado do(a) APELADO: CLAUDIO MAURO HENRIQUE DAOLIO - SP172723-A
Advogados do(a) APELADO: FERNANDA PASQUARIELLO MONTEIRO - SP357201-A, BRUNO SANCHEZ BELO - SP287404-A, ANTONIO CELSO FONSECA PUGLIESE - SP155105-A,

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma
 

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0054385-77.1998.4.03.6100

RELATOR: Gab. 21 - DES. FED. JOHONSOM DI SALVO

APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, UNIÃO FEDERAL, ESTADO DE SAO PAULO, DALTON DE ALENCAR FISCHER CHAMONE, PAULO ROSSETTI OLIVEIRA CABRAL, MARCELO PUPKIN PITTA, PEDRO ENRIQUE DORLHIAC LLACER

Advogado do(a) APELANTE: JULIANA CAMPOLINA REBELO HORTA - SP301795-B
Advogado do(a) APELANTE: SAMUEL MAC DOWELL DE FIGUEIREDO - SP29393
Advogado do(a) APELANTE: SAMUEL MAC DOWELL DE FIGUEIREDO - SP29393
Advogado do(a) APELANTE: SAMUEL MAC DOWELL DE FIGUEIREDO - SP29393
Advogado do(a) APELANTE: CLAUDIO MAURO HENRIQUE DAOLIO - SP172723-A

APELADO: UNIÃO FEDERAL, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, DALTON DE ALENCAR FISCHER CHAMONE, PAULO ROSSETTI OLIVEIRA CABRAL, MARCELO PUPKIN PITTA, PEDRO ENRIQUE DORLHIAC LLACER, ESPÓLIO DE WESLEY WEY JUNIOR
REPRESENTANTE: MARIA APARECIDA DE SOUZA WEY

Advogado do(a) APELADO: SAMUEL MAC DOWELL DE FIGUEIREDO - SP29393
Advogado do(a) APELADO: SAMUEL MAC DOWELL DE FIGUEIREDO - SP29393
Advogado do(a) APELADO: SAMUEL MAC DOWELL DE FIGUEIREDO - SP29393
Advogado do(a) APELADO: CLAUDIO MAURO HENRIQUE DAOLIO - SP172723-A
Advogados do(a) APELADO: FERNANDA PASQUARIELLO MONTEIRO - SP357201-A, BRUNO SANCHEZ BELO - SP287404-A, ANTONIO CELSO FONSECA PUGLIESE - SP155105-A,

OUTROS PARTICIPANTES:

  

 

R E L A T Ó R I O

 

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOHONSOM DI SALVO, RELATOR:

 

Trata-se de REEXAME NECESSÁRIO e APELAÇÕES interpostas pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, pela UNIÃO FEDERAL, pela FAZENDA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, por DALTON DE ALENCAR FISCHER CHAMONE, PAULO ROSSETTI OLIVEIRA CABRAL e MARCELO PUPKIN PITTA, e por PEDRO ENRIQUE DORLHIAC LLACER contra a sentença de parcial procedência da AÇÃO CIVIL PÚBLICA calcada na Lei nº 8.429/92.

 

De acordo com a inicial e documentação anexa, em apertada síntese,

 

(1) essa ação civil pública está subsidiada, principalmente, no inquérito civil público nº 2/98, instaurado em 21/1/1998 pela PROCURADORIA DA REPÚBLICA em São Paulo/SP para apuração de fatos relacionados à FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO e à FUNDAÇÃO DO SANGUE, especialmente na gestão e administração de recursos públicos federais, celebração de convênios e intermediação de serviços;

 

(2) a FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO, fundação pública estadual, vinculada à Secretaria de Estado de Saúde, é parte integrante do Sistema Único de Saúde (SUS), recebendo recursos federais;

 

(3) a FUNDAÇÃO DO SANGUE, fundação de direito privado, sem fins lucrativos, funcionava como intermediária das atividades da FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO no mercado privado e, fundamentalmente, para gerenciar seus recursos e patrimônio à margem das normas pertinentes à Administração Pública, conforme convênio firmado em 1/11/1995;

 

(4) apurou-se que a FUNDAÇÃO DO SANGUE promovia a contratação de pessoal para trabalhar na FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO, sem concurso público;

 

(5) apurou-se que a FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO repassava à FUNDAÇÃO DO SANGUE recursos federais para pagamento da folha de salários e encargos trabalhistas, bem como para a remuneração de diretores/funcionários vinculados às duas fundações;

 

(6) apurou-se que a FUNDAÇÃO DO SANGUE promovia a aquisição de produtos e serviços para a FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO, sem licitação, com valor superfaturado e, em vários casos, beneficiando financeiramente diretores/funcionários vinculados às duas fundações;

 

(7) apurou-se que a FUNDAÇÃO DO SANGUE "comprava" notas fiscais de algumas empresas para justificar as comissões pagas aos funcionários da sua área comercial;

 

(8) apurou-se que a empresa CCLBS pertencente ao médico AMADEO SÁEZ ALQUÉZAR, Superintendente de Sorologia da FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO e funcionário da FUNDAÇÃO DO SANGUE, utilizava os laboratórios da fundação pública para prestar serviços à fundação privada;

 

(9) apurou-se que a FUNDAÇÃO DO SANGUE contratou em 9/1997 a empresa GRUNASE - GRUPO NACIONAL DE SERVIÇOS LTDA para prestação de serviços de lobby;

 

(10) apurou-se que a empresa SOMATO DIAGNÓSTICO CLÍNICO S/C LTDA, que tinha entre os sócios o médico DALTON DE ALENCAR FISCHER CHAMONE, Diretor-Presidente da FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO, e sua esposa, utilizava gratuitamente os serviços da fundação pública;

 

(11) apurou-se que a FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO comercializava hemocomponentes para a rede hospitalar privada e, ao mesmo tempo, requisitava recursos públicos para aumentar sua produção e deixava de atender satisfatoriamente a rede hospitalar pública;

 

(12) apurou-se que a FUNDAÇÃO DO SANGUE, como representante da AMERICAN NATIONAL RED CROSS e como contratada da empresa PANAMERICAN MEDICAL SUPPLY, pertencente a MARCELO PUPKIN PITTA, participou de concorrência pública internacional para a comercialização de hemoderivados no Brasil (licitação CEME 001/97), eivada por inúmeras irregularidades;

 

(13) apurou-se que a FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO vendeu bolsas de plasma à empresa LIPP - LABORATÓRIO PLASMÁTICO S/A, sediada no Rio Grande do Sul, entre 2/1995 e 2/1997, contrariando o artigo 199, §4º, da Constituição Federal;

 

(14) apurou-se que os responsáveis por esses fatos são:

 

(a) o médico DALTON DE ALENCAR FISCHER CHAMONE, Diretor-Presidente da FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO, que comandava extraoficialmente a FUNDAÇÃO DO SANGUE, incorrendo nos artigos 9º, caput e VIII, XI e XII, 10, caput e I, V, VIII, IX e XI, e 11, caput e I e IV, da Lei nº 8.429/92;

 

(b) o administrador de empresas MARCELO PUPKIN PITTA, Diretor-Presidente a partir de 16/5/1997 e ex-Superintendente Comercial da FUNDAÇÃO DO SANGUE e ex-Diretor de Relações Externas da FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO, incorrendo nos artigos 9º, caput e I e XI, 10, caput e I, V, VIII, IX e XI, e 11, caput e I, c/c artigo 3º da Lei nº 8.429/92;

 

(c) o médico PEDRO ENRIQUE DORLHIAC LLACER, Diretor Técnico-Científico da FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO, incorrendo nos artigos 9º, caput e VIII e XI, 10, caput e I, V, VIII, IX e XI, e 11, caput e I, da Lei nº 8.429/92;

 

(d) o administrador de empresas PAULO ROSSETTI OLIVEIRA CABRAL, Diretor de Relações Externas e ex-Diretor Administrativo da FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO, incorrendo nos artigos 9º, caput e VIII e XI, 10, caput e I, V, VIII, IX e XI, e 11, caput e I, da Lei nº 8.429/92;

 

(e) o administrador de empresas WESLEY WEI JÚNIOR, Diretor Administrativo e ex-Diretor de Relações Externas da FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO, incorrendo nos artigos 10, caput e I, V, VIII, IX e XI, e 11, caput e I, da Lei nº 8.429/92.

 

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL requereu a condenação dos réus nas penas previstas no artigo 12 da Lei nº 8.429/92, dando à causa o valor de R$ 100.000,00. Também alegou conexão com a ação civil pública nº 0049250-84.1998.4.03.6100 (ID 104511852/v.1 – fls. 9/27).

 

Em 18/12/1998 o feito foi distribuído a 14ª Vara Federal de São Paulo/SP, por dependência à ação civil pública nº 0013452-28.1999.4.03.6100.

 

Em 29/1/1999 o pedido liminar foi parcialmente deferido para determinar a indisponibilidade de bens dos réus (ID 104511852/v.1 – fls. 179/186).

 

Contra essa decisão, DALTON DE ALENCAR FISCHER CHAMONE, MARCELO PUPKIN PITTA, PAULO ROSSETTI OLIVEIRA CABRAL e WESLEY WEI JÚNIOR interpuseram o agravo de instrumento nº 0007352-24.1999.4.03.0000 e PEDRO ENRIQUE DORLHIAC LLACER o agravo de instrumento nº 0007351-39.1999.4.03.0000, distribuídos nesse TRF3R à relatoria da Desembargadora Federal Salette Nascimento, que concedeu o efeito suspensivo. Posteriormente, ambos os recursos foram desprovidos pela Sexta Turma dessa Corte (ID 104518326/v.2A – fls. 14/89, 90/106, ID 104518319/v.9A – fls. 158/168, ID 104548262/v.12 – fls. 57/65).

 

Os réus apresentaram contestação e o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, réplica (ID 104518326/v.2A – fls. 164/210, ID 104511854/v.5A – fls. 209/214, ID 104511855/v.5B – fls. 1/73, ID 104518322/v.6A – fls. 3/12, ID 104548268/v.11A – fls. 195/218).

 

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO expressou desinteresse em compor a lide (ID 104511851/v.10B – fls. 82/88).

 

Em 1/10/1999 o Juízo a quo declarou a preclusão da preliminar de ilegitimidade ativa do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL; afastou as preliminares de incompetência da Justiça Federal, de inépcia da inicial, de carência da ação; deferiu liminarmente o afastamento de DALTON DE ALENCAR FISCHER CHAMONE, PEDRO ENRIQUE DORLHIAC LLACER, PAULO ROSSETTI OLIVEIRA CABRAL e WESLEY WEI JÚNIOR dos cargos que ocupam na FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO SÃO PAULO (ID 104511851/v.10B – fls.  90/108).

 

Contra essa decisão, DALTON DE ALENCAR FISCHER CHAMONE, PAULO ROSSETTI OLIVEIRA CABRAL e WESLEY WEI JÚNIOR interpuseram o agravo de instrumento nº 0049574-07.1999.4.03.0000 (1999.03.00.049574-2), e PEDRO ENRIQUE DORLHIAC LLACER o agravo de instrumento nº 0053982-41.1999.4.03.0000 (1999.03.00.053982-4), distribuídos nesse TRF3R à relatoria da Desembargadora Federal Salette Nascimento, que concedeu o efeito suspensivo. Posteriormente, ambos os recursos foram parcialmente providos pela Sexta Turma dessa Corte (ID 104511851/v.10B – fls. 122/147, 173/180, ID 104548268/v.11A – fls. 3/29, 31/39, 158/170, 331, ID 104548269/v.11B – fls. 1/14).

 

A UNIÃO FEDERAL foi incluída no polo ativo, como assistente simples (ID 104548268/v.11A – fls. 246).

 

Contra a decisão que rejeitou a impugnação ao pedido de assistência da UNIÃO FEDERAL, DALTON DE ALENCAR FISCHER CHAMONE, PAULO ROSSETTI OLIVEIRA CABRAL e WESLEY WEI JÚNIOR interpuseram agravo retido (ID 104548268/v.11A – fls. 251/256).

 

O ESTADO DE SÃO PAULO foi incluído no polo ativo, como litisconsorte (ID 104548268/v.11A – fls. 259).

 

Contra essa decisão, PEDRO ENRIQUE DORLHIAC LLACER interpôs agravo retido (ID 104548268/v.11A – fls. 274/276).

 

Em 1/6/2004 o Juízo a quo saneou o processo, mantendo as decisões interlocutórias objeto de agravo retido; fixando os pontos controversos; deferindo a produção de perícia contábil, de prova testemunhal e documental e o depoimento pessoal dos réus (ID 104548268/v.11A – fls. 294/297).

 

Em 9/2/2006 o feito foi redistribuído a 25ª Vara Federal de São Paulo/SP (fls. 104548262/v.12 – fls. 16).

 

Foi realizada a perícia contábil (ID 104552001 – fls. 3/249, ID 104552001 – fls. 1/4, ID 104548263/v.15 – fls. 3/57, ID 104550769/v.17 – fls. 88/150, 210/218).

 

Em 10/4/2014 foi realizada audiência de instrução, com coleta de depoimento pessoal dos réus e oitiva de testemunhas (ID 104551999/v.18 – fls. 111/142).

 

As partes apresentaram alegações finais (ID 104551999/v.18 – fls. 162/172, 218/226, 228/230, 231/254, 255/275, ID 104548264/v.19A – fls. 3/17).

 

Em 18/11/2015 foi proferida a sentença de parcial procedência:

 

...Diante de tudo que foi exposto:

A) JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados, para condenar:

O réu DALTON DE ALENCAR FISCHER CHAMONE às sanções de i) perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio em razão da prática da conduta descrita no subitem 6.1.2, nos termos do art. 9º, VIII e XI da LIA; ii) ressarcimento integral do dano em razão da prática das condutas descritas nos subitens 6.1.4 e 6.1.5, nos termos do art. 10, I, V, IX e XI da LIA, de forma solidária consoante fundamentação supra; iii) pagamento de multa civil de duas vezes o valor do acréscimo patrimonial indevido e iv) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de dez anos.

O réu PEDRO ENRIQUE DORLHIAC LLACER às sanções de i) perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio em razão da prática da conduta descrita no subitem 6.1.2, nos termos do art. 9º, VIII e XI da LIA; ii) pagamento de multa civil de uma vez o valor do acréscimo patrimonial indevido e iii) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de dez anos."

O réu PAULO ROSSETTI DE OLIVEIRA CABRAL às sanções de i) perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio em razão da prática da conduta descrita no subitem 6.1.2, nos termos do art. 9º, VIII e XI da LIA; ii) ressarcimento integral do dano em razão da prática das condutas descritas no subitem 6.1.5, nos termos do art. 10, I, IX e XI da LIA, de forma solidária consoante fundamentação supra; iii) pagamento de multa civil de uma vez o valor do acréscimo patrimonial indevido e iv) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de dez anos.

O réu MARCELO PUPKIN PITTA às sanções de i) perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio em razão da prática da conduta descrita no subitem 6.3.1, nos termos do art. 9º, I e XI da LIA; ii) ressarcimento integral do dano em razão da prática das condutas descritas nos subitens 6.1.4 e 6.1.5, nos termos do art. 10, I, V, IX e XI da LIA, de forma solidária consoante fundamentação supra; iii) pagamento de multa civil de duas vezes o valor do acréscimo patrimonial indevido e iv) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de dez anos.

B) JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados em face do corréu WESLEY WEY JÚNIOR.

Os valores referentes às sanções de perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, ressarcimento integral do dano e pagamento de multa civil deverão sofrer a incidência de correção monetária e juros de mora, a partir da citação, pelos índices constantes do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal.

Custas ex lege.

...

Bem por isso é que, no seio do E. STJ, tornou-se firme o entendimento de que, por critério de simetria, não é cabível a condenação da parte vencida ao pagamento de honorários advocatícios em favor da parte autora nos autos de ação civil pública, salvo comprovada má-fé, o que também não vislumbro ...

Logo, com esteio em tal posicionamento, não haverá a fixação de qualquer valor a título de honorários advocatícios.

Já no que concerne aos honorários periciais, o ordenamento jurídico não estabelece qualquer isenção às partes, somente dispensando os legitimados à propositura de ação coletiva do seu adiantamento.

No caso em apreço a verba pericial foi inteiramente custeada pelos requeridos (fls. 4490/4497).

Com efeito, considerando a sucumbência recíproca, o Parquet Federal e o Estado de São Paulo deverão ressarcir, de forma pro rata, os réus DALTON DE ALENCAR FISCHER CHAMONE, PEDRO ENRIQUE DORLHIAC LLACER , PAULO ROSSETTI DE OLIVEIRA CABRAL e MARCELO PUPKIN PITTA em 50% (cinquenta por cento) do valor por eles dispendido a título de honorários periciais.

Também condeno o MPF e o Estado de São Paulo a restituirem ao réu WESLEY WEY JÚNIOR a totalidade do montante por ele dispendido a título de verba pericial, tendo em vista o julgamento de improcedência da ação.

...

Aplicando-se referida tese à situação ora em apreço, competirá à UNIÃO FEDERAL (Fazenda Pública) o pagamento dos honorários periciais atribuídos ao MPF, devendo, pois, ressarcir a parte requerida das despesas realizadas, consoante art. 20, caput, do Código de Processo Civil.

Deixo de condenar a UNIÃO FEDERAL, na condição de assistente simples, ao pagamento da verba pericial, nos termos do art. 32 do Código de Processo Civil.

Sentença sujeita a reexame necessário...

(ID 104548264/v.19A – fls. 19/164)

 

A sentença ainda afastou a conexão entre esse feito e a ação civil pública nº 0013452-28.1999.4.03.6100, reconhecida pelo Juízo da 14ª Vara Federal de São Paulo/SP, mantendo apenas a reunião física dos processos, no envio a essa instância (ID 104548264/v.19A – fls. 19/164).

 

PEDRO ENRIQUE DORLHIAC LLACER, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a UNIÃO FEDERAL e DALTON DE ALENCAR FISCHER CHAMONE, PAULO ROSSETTI OLIVEIRA CABRAL e MARCELO PUPKIN PITTA opuseram embargos de declaração, assim decididos:

 

...No mais, em razão do acolhimento parcial dos embargos de declaração opostos por PEDRO ENRIQUE DORLHIAC LLACER e UNIÃO FEDERAL, assim como o acolhimento total do recurso oposto pelo Parquet Federal, retifico a sentença proferida para que passe a constar:

(...)

B) JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados em face do corréu WESLEY WEY JÚNIOR.

Mantenho os efeitos da decisão que decretou a indisponibilidade dos bens dos réus, tendo em vista a remessa necessária a que está sujeita a presente sentença.

Os valores referentes às sanções de perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, ressarcimento integral do dano e pagamento de multa civil deverão sofrer a incidência de correção monetária e juros de mora pelos índices constantes do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela Resolução CJF n.º 134, de 21/12/2010 (itens 4.2.1.1 e 4.2.2), os quais adoto integralmente.

O termo inicial da correção monetária é a ocorrência do evento danoso, uma vez que, "a correção monetária não é um plus que se acrescenta, mas um minus que se evita. Outra motivação não tem e em nada mais importa senão em uma mera manutenção do valor aquisitivo da moeda, que se impõe por razões econômicas, morais e jurídicas, em nada se relacionando com pena decorrente da mora" (STJ, REsp 244296/RJ, rel. Ministro César Asfor Rocha; DJ 05/08/2002). O termo inicial dos juros de mora é a citação, nos termos do art. 219, caput, do Código de Processo Civil então vigente e art. 405 do Código Civil.

No mais, a sentença permaneça tal como lançada...

(ID 104548264/v.19A – fls. 203/220).

 

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, nas razões de apelação, requer (1) a declaração da ilegalidade na contratação e remuneração de profissionais com recursos públicos, sem prévia aprovação em concurso público; (2) a declaração da ilegalidade no emprego de verba pública sem processo licitatório, por meio da FUNDAÇÃO DO SANGUE, de "fachada"; (3) a condenação de WESLEY WEI JÚNIOR com fulcro artigos 10, caput e I, V, VIII, IX e XI, e 11, caput e I, da Lei nº 8.429/92; (4) o afastamento da obrigação de pagar, por meio da UNIÃO FEDERAL, 50% dos honorários periciais e de ressarcir 100% do valor adiantado por WESLEY WEI JÚNIOR, pois não houve sucumbência recíproca; (5) a manutenção da indisponibilidade dos bens dos corréus (ID 104548264/v.19A – fls. 223/236).

 

A UNIÃO FEDERAL, nas razões de apelação, reitera o recurso do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e requer (1) a incidência de juros de mora a partir do evento danoso, nos termos do artigo 398 do Código de Processo Civil e da Súmula 54 do STJ; (2) o afastamento da sucumbência recíproca e do princípio da simetria, com a condenação dos corréus ao pagamento de honorários, custas e despesas processuais em seu favor; (3) subsidiariamente, a exclusão do reembolso dos honorários periciais, conforme artigo 18 da Lei nº 7.347/85 e jurisprudência do STJ; (4) subsidiariamente, a condenação do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, que possui orçamento próprio, ao reembolso dos honorários periciais (ID 104548264/v.19A – fls. 239/262).

 

A FAZENDA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, nas razões de apelação, requer (1) a declaração da ilegalidade das compras realizadas sem licitação pela FUNDAÇÃO DO SANGUE, com recursos públicos; (2) a condenação de WESLEY WEI JÚNIOR nos termos da inicial; (3) a condenação dos corréus a perda da função pública; (4) o afastamento da sucumbência recíproca e do princípio da simetria, com a condenação dos corréus ao pagamento de honorários, custas e despesas processuais em seu favor e da UNIÃO FEDERAL; (5) em relação aos juros de mora, a aplicação do artigo 398 do Código Civil (ID 104548264/v.19A – fls. 265/273).

 

DALTON DE ALENCAR FISCHER CHAMONE, PAULO ROSSETTI OLIVEIRA CABRAL e MARCELO PUPKIN PITTA, nas razões de apelação, requerem (1) preliminarmente, a anulação da sentença pela incompetência absoluta da Justiça Federal, que se cuida de matéria de ordem pública e não está preclusa; (2) preliminarmente, o reconhecimento da ilegitimidade ativa do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL; (3) no mérito, a reforma integral da sentença, uma vez que (a) foi desconsiderada a distinção entre os recursos da FUNDAÇÃO DO SANGUE vinculados e não vinculados ao Convênio nº 01/95, atribuindo improbidade administrativa a atos que foram praticados exclusivamente com recursos privados; (b) improcedem as imputações de improbidade administrativa; (c) nos casos de responsabilidade extracontratual e em que a existência e o valor da obrigação se tornam conhecidos apenas com a prolação da sentença, não cabe a condenação em juros de mora e correção monetária contados a partir da citação; (d) é inadmissível impor a incidência de encargos de vulto sobre a obrigação, por período de tempo que não deram causa e no qual a demanda se estendeu por responsabilidade do Poder Judiciário; (e) a multa civil aplicada é desproporcional (ID 104548264/v.19A – fls. 274/297, ID 104548265/v.19B – fls. 1/17). 

 

PEDRO ENRIQUE DORLHIAC LLACER, nas razões de apelação, requer (1) preliminarmente, a anulação da sentença pela incompetência absoluta da Justiça Federal, que se cuida de matéria de ordem pública e não está preclusa; (2) preliminarmente, o reconhecimento da ilegitimidade ativa do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL; (3) no mérito, a sua absolvição, uma vez que (a) não praticou qualquer ato improbo ao assessorar na FUNDAÇÃO DO SANGUE a produção científica em hematologia e hemoterapia, no interesse da FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO e sem relação com sua produção acadêmica; (b) a FUNDAÇÃO DO SANGUE possuía recursos próprios, de natureza privada, suficientes para remunerar seu trabalho, em valor compatível com sua qualificação profissional; (c) a própria sentença reconheceu que a UNIÃO FEDERAL não sofreu qualquer prejuízo; (d) não agiu com dolo; (4) subsidiariamente, a exclusão dos acréscimos legais na multa civil ou sua aplicação a partir da publicação da sentença (ID 104551996/v.20A – fls. 3/29). 

 

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a UNIÃO FEDERAL, DALTON DE ALENCAR FISCHER CHAMONE, PAULO ROSSETTI OLIVEIRA CABRAL e MARCELO PUPKIN PITTA, WESLEY WEI JÚNIOR, a FAZENDA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO apresentaram contrarrazões (ID 104551996/v.20A – fls. 139/146, 150, 164/168, ID 104551997/v.20B – fls. 1/7, 8/20, 24/33, 37/65, ID 104551992/v.21 – fls. 7/15).

 

Em 11/12/2018 o feito foi distribuído nessa Corte, a minha relatoria, apensados às ações civis públicas nº 0049250-84.1998.4.03.6100 e nº 0013452-28.1999.4.03.6100 (ID 104551992/v.21 – fls. 53).

 

A PROCURADORIA REGIONAL DA REPÚBLICA, no parecer, opinou pelo provimento do recurso do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e da FAZENDA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, pelo parcial provimento do recurso da UNIÃO FEDERAL e pelo desprovimento dos recursos dos corréus (ID 104551992/v.21 – fls. 54/66).

 

Adiei o julgamento do feito, incluso na pauta de julgamento da Sexta Turma de 5/9/2019, para 3/10/2019. Nessa data, retirei o feito de pauta (ID 104551992 /v.21 – fls. 97/98, 103/104).

 

Em 9/10/2019, os autos físicos foram encaminhados para digitalização, retornando em 15/7/2020 (ID 104551992 /v.21 – fls. 105, ID 136955435).

 

O espólio de WESLEY WEY JUNIOR, representado por sua inventariante MARIA APARECIDA DE SOUZA WEY, requereu a regularização da representação processual do corréu WESLEY WEY JUNIOR, falecido em 26/9/2019 (ID 107725503, ID 107725505, ID 137007601).

 

A PROCURADORIA REGIONAL DA REPÚBLICA reiterou o parecer de 104551992/v.21 – fls. 54/66 (ID 152028523).

 

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma
 

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0054385-77.1998.4.03.6100

RELATOR: Gab. 21 - DES. FED. JOHONSOM DI SALVO

APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, UNIÃO FEDERAL, ESTADO DE SAO PAULO, DALTON DE ALENCAR FISCHER CHAMONE, PAULO ROSSETTI OLIVEIRA CABRAL, MARCELO PUPKIN PITTA, PEDRO ENRIQUE DORLHIAC LLACER

Advogado do(a) APELANTE: JULIANA CAMPOLINA REBELO HORTA - SP301795-B
Advogado do(a) APELANTE: SAMUEL MAC DOWELL DE FIGUEIREDO - SP29393
Advogado do(a) APELANTE: SAMUEL MAC DOWELL DE FIGUEIREDO - SP29393
Advogado do(a) APELANTE: SAMUEL MAC DOWELL DE FIGUEIREDO - SP29393
Advogado do(a) APELANTE: CLAUDIO MAURO HENRIQUE DAOLIO - SP172723-A

APELADO: UNIÃO FEDERAL, MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, DALTON DE ALENCAR FISCHER CHAMONE, PAULO ROSSETTI OLIVEIRA CABRAL, MARCELO PUPKIN PITTA, PEDRO ENRIQUE DORLHIAC LLACER, ESPÓLIO DE WESLEY WEY JUNIOR
REPRESENTANTE: MARIA APARECIDA DE SOUZA WEY

Advogado do(a) APELADO: SAMUEL MAC DOWELL DE FIGUEIREDO - SP29393
Advogado do(a) APELADO: SAMUEL MAC DOWELL DE FIGUEIREDO - SP29393
Advogado do(a) APELADO: SAMUEL MAC DOWELL DE FIGUEIREDO - SP29393
Advogado do(a) APELADO: CLAUDIO MAURO HENRIQUE DAOLIO - SP172723-A
Advogados do(a) APELADO: FERNANDA PASQUARIELLO MONTEIRO - SP357201-A, BRUNO SANCHEZ BELO - SP287404-A, ANTONIO CELSO FONSECA PUGLIESE - SP155105-A,

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

V O T O

 

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOHONSOM DI SALVO, RELATOR:

 

Inicialmente observo que a Primeira Seção do STJ, em 17/12/2019, afetou ao rito dos recursos repetitivos os REsp nº 1.553.124/SC, nº 1.605.586/DF, nº1.502.635/PI e nº 1.601.804/TO, sob o Tema/Repetitivo 1042, e determinou a suspensão em segundo grau de jurisdição de todas as ações típicas de improbidade administrativa julgadas improcedentes e submetidas a reexame necessário. A saber:

 

DIREITO SANCIONADOR. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. DEFINIÇÃO SE HÁ APLICAÇÃO DO REEXAME NECESSÁRIO NAS AÇÕES DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ATO DE AFETAÇÃO AO RITO DOS REPETITIVOS PELO COLEGIADO DA PRIMEIRA SEÇÃO DO STJ. OBSERVÂNCIA DO ART. 1.036, §  5o. DO CÓDIGO FUX E  DOS ARTS. 256-E, II,  256-I DO RISTJ. SUSPENSÃO DOS FEITOS EM SEGUNDO GRAU DE JURISDIÇÃO.

1.    Delimitação da tese: definir se há –  ou não – aplicação da figura do reexame necessário nas ações típicas de improbidade administrativa, ajuizadas com esteio na alegada prática de condutas previstas na Lei 8.429/1992, cuja pretensão é  julgada improcedente em primeiro grau; discutir se há remessa de ofício nas referidas ações típicas, ou se deve ser reservado ao autor da ação, na postura de órgão acusador –  frequentemente o  Ministério Público – exercer a prerrogativa de recorrer ou não do desfecho de improcedência da pretensão sancionadora.

2.    Recurso Especial afetado ao rito do art. 1.036 e seguintes do Código Fux (arts. 256-D, II e 256-I do RISTJ).

(STJ - ProAfR no REsp 1.553.124/SC, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 17/12/2019, DJe 19/12/2019)

 

Não é o caso dessa ação civil pública, uma vez que a sentença de parcial procedência foi atacada por recursos de apelação das partes autora e ré.

 

DA MATÉRIA PRELIMINAR

 

Das preliminares de incompetência da Justiça Federal e de ilegitimidade ativa do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

 

Compulsando os autos, verifico que o feito foi originalmente distribuído ao Juízo da 14ª Vara Federal de São Paulo/SP.

 

Em 29/1/1999 o pedido liminar foi parcialmente deferido para determinar a indisponibilidade de bens dos réus. Nessa decisão, o Juízo a quo assegurou a legitimidade ativa do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, considerando que (1) os atos de improbidade administrativa narrados na inicial atingem o SUS, integrado pela UNIÃO FEDERAL; (2) os atos de improbidade administrativa narrados na inicial atingem a FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO, com 34% do patrimônio composto por capital federal e recebedora de verba federal; (3) o corréu DALTON DE ALENCAR FISCHER CHAMONE teria praticado atos de improbidade administrativa no cargo de Coordenador de Sangue e Hemoderivados do Ministério da Saúde (ID 104511852/v.1 – fls. 179/186).

 

Contra a decisão que determinou a indisponibilidade de bens dos réus, DALTON DE ALENCAR FISCHER CHAMONE, MARCELO PUPKIN PITTA, PAULO ROSSETTI OLIVEIRA CABRAL e WESLEY WEI JÚNIOR interpuseram o agravo de instrumento nº 0007352-24.1999.4.03.0000 e PEDRO ENRIQUE DORLHIAC LLACER o agravo de instrumento nº 0007351-39.1999.4.03.0000, distribuídos nesse TRF3R à relatoria da Desembargadora Federal Salette Nascimento, que concedeu o efeito suspensivo. Posteriormente, ambos os recursos foram desprovidos pela Sexta Turma dessa Corte, sob a relatoria do Desembargador Federal Lazarano Neto (ID 104518326/v.2A – fls. 14/89, 90/106, ID 104518319/v.9A – fls. 158/168, ID 104548262/v.12 – fls. 57/65).

 

Confira-se o v. acórdão proferido no agravo de instrumento nº 0007352-24.1999.4.03.0000:

 

AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - LIMINAR PRESENÇA DOS PRESSUPOSTOS - CONCESSÃO - POSSIBILIDADE

1. Para a concessão de liminar em ação civil pública a lei exige, cumulativamente, a presença dos requisitos de fundamento relevante (fumus boni iuris) e do periculum in mora.

2. Ação Civil Pública. Liminar parcialmente deferida, para decretar a indisponibilidade de todos os bens imóveis, veículos automotores e linhas telefônicas dos réus. Expediente necessário a assegurar o integral ressarcimento dos danos causados ao patrimônio público no caso de futura condenação.

3. O Fumus boni iuris, ou seja, a plausibilidade do direito invocado, nos termos da fundamentação da decisão recorrida, exsurge do Relatório do Inquérito Civil Público nº 2/98 que, pela riqueza de detalhes aponta a prática, pelos réus, de atos de natureza gravíssima na gestão da Fundação Pró-Sangue - Hemocentro de São Paulo e da Fundação do Sangue, reveladores, em princípio, da improbidade administrativa.

4. O periculum in mora, por sua vez, traduz-se na possibilidade da ineficácia da prestação jurisdicional, acaso a medida pleiteada, seja deferida somente a final, impossibilitando o integral ressarcimento dos danos causados ao patrimônio público no caso de futura condenação.

5. A medida liminar, tal como deferida, mostra-se necessária a garantir a efetividade da prestação jurisdicional final, pelo que deve ser mantida a decisão recorrida.

6. Depreende-se que a questão posta nos autos foi exaustivamente examinada pelo Juízo de origem, com apoio nos documentos que teriam sido acostados a inicial. Esta é a conclusão a que se chega da leitura da decisão agravada, a qual, fundada em fatos e fundamentos sólidos, não afastados pelos agravantes, deferiu parcialmente a liminar.

7. Não há nenhum argumento dos agravantes que afaste, em concreto, os fundamentos da decisão guerreada.

8. Agravo Regimental prejudicado.

9. Agravo de instrumento a que se nega provimento.

 

E no agravo de instrumento nº 0007351-39.1999.4.03.0000:

 

AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - LIMINAR PRESENÇA DOS PRESSUPOSTOS - CONCESSÃO -POSSIBILIDADE

1. Para a concessão de liminar em ação civil pública a lei exige, cumulativamente, a presença dos requisitos de fundamento relevante (fumus boni iuris) e do periculum in mora.

2. Ação Civil Pública. Liminar parcialmente deferida, para decretar a indisponibilidade de todos os bens imóveis, veículos automotores e linhas telefônicas dos réus. Expediente necessário a assegurar o integral ressarcimento dos danos causados ao patrimônio público no caso de futura condenação.

3. O Fumus boni iuris, ou seja, a plausibilidade do direito invocado, nos termos da fundamentação da decisão recorrida, exsurge do Relatório do Inquérito Civil Público nº 2/98 que, pela riqueza de detalhes aponta a prática, pelos réus, de atos de natureza gravíssima na gestão da Fundação Pró-Sangue - Hemocentro de São Paulo e da Fundação do Sangue, reveladores, em princípio, da improbidade administrativa.

4. O periculum in mora, por sua vez, traduz-se na possibilidade da ineficácia da prestação jurisdicional, acaso a medida pleiteada, seja deferida somente a final, impossibilitando o integral ressarcimento dos danos causados ao patrimônio público no caso de futura condenação.

5. A medida liminar, tal como deferida, mostra-se necessária a garantir a efetividade da prestação jurisdicional final, pelo que deve ser mantida a decisão recorrida.

6. Depreende-se que a questão posta nos autos foi exaustivamente examinada pelo Juízo de origem, com apoio nos documentos que teriam sido acostados a inicial. Esta é a conclusão a que se chega da leitura da decisão agravada, a qual, fundada em fatos e fundamentos sólidos, não afastados pelos agravantes, deferiu parcialmente a liminar.

7. Não há nenhum argumento do agravante que afaste, em concreto, os fundamentos da decisão guerreada.

8. Agravo Regimental prejudicado.

9. Agravo de instrumento a que se nega provimento.

 

Ou seja, esses julgados são restritos à questão da indisponibilidade de bens dos corréus.

 

Prosseguindo, em 1/10/1999 o Juízo a quo declarou a preclusão da preliminar de ilegitimidade ativa do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, haja vista a decisão de 29/1/1999, e dentre outras matérias preliminares, afirmou a competência da Justiça Federal, acrescentando que corroborava essa decisão (1) o pedido da UNIÃO FEDERAL para integrar o polo ativo da lide, como assistente simples, (2) e a manifesta falta de interesse do MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL (ID 104511851/v.10B – fls. 90/108).

 

Contra essa decisão, que também afastou dos corréus de suas funções na FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO, DALTON DE ALENCAR FISCHER CHAMONE, PAULO ROSSETTI OLIVEIRA CABRAL e WESLEY WEI JÚNIOR interpuseram o agravo de instrumento nº 0049574-07.1999.4.03.0000 e PEDRO ENRIQUE DORLHIAC LLACER o agravo de instrumento nº 0053982-41.1999.4.03.0000, distribuídos nesse TRF3R à relatoria da Desembargadora Federal Salette Nascimento, que concedeu o efeito suspensivo. Posteriormente, ambos os recursos foram parcialmente providos pela Sexta Turma dessa Corte (ID 104511851/v.10B – fls. 122/147, 173/180, ID 104548268/v.11A – fls. 3/29, 31/39, 158/170, 331, ID 104548269/v.11B – fls. 1/14).

 

Confira-se o v. acórdão proferido no agravo de instrumento nº 0049574-07.1999.4.03.0000:

 

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LEI Nº 8.429/92. DECISÃO SINGULAR QUE AFASTA OS AGRAVANTES DE SUAS FUNÇÕES. PRELIMINARES. REJEIÇÃO. AGRAVO A QUE SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO.

1. Agravo de instrumento tirado dos autos da Ação Civil Pública aforada pelo Ministério Público Federal em face dos Agravantes, com esteio na Lei nº 8.429/92.

2. Preliminares de: a) ilegitimidade ativa "ad causam" do Parquet Federal; b) incompetência da Justiça Federal; c) incompetência funcional, em razão de alegada prevenção; d) inépcia da inicial e e) falta de condições da ação, rejeitadas à luz da Constituição Federal, Lei Processual Civil e orientação pretoriana.

3. Decisão singular que afasta os Agravantes de suas funções reformadas, vez que tal medida não se faz necessária à instrução processual (art. 20, da Lei nº 8.429/92, parte final), ausente menção a atos específicos e individualmente atribuídos àqueles a reclamar tal providência.

4. Agravo parcialmente provido.

 

E no agravo de instrumento nº 0053982-41.1999.4.03.0000:

 

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LEI Nº 8.429/92. DECISÃO SINGULAR QUE AFASTA O AGRAVANTE DE SUAS FUNÇÕES. PRELIMINARES. REJEIÇÃO. AGRAVO A QUE SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO.

1. Agravo de instrumento tirado dos autos da Ação Civil Pública aforada pelo Ministério Público Federal em face do Agravante, com esteio na Lei nº 8.429/92.

2. Preliminares de: a) ilegitimidade ativa "ad causam" do Parquet Federal; b) incompetência da Justiça Federal; c) incompetência funcional, em razão de alegada prevenção; d) inépcia da inicial e e) falta de condições da ação, rejeitadas à luz da Constituição Federal, Lei Processual Civil e orientação pretoriana.

3. Decisão singular que afasta o Agravante de sua função reformada, vez que tal medida não se faz necessária à instrução processual (art. 20, da Lei nº 8.429/92, parte final), ausente menção a atos específicos e individualmente atribuídos ao Agravante a reclamar tal providência.

4. Agravo parcialmente provido.

 

Percebe-se que nos agravos de instrumento nº 0049574-07.1999.4.03.0000 e nº 0053982-41.1999.4.03.0000, a Sexta Turma dessa Corte rejeitou as preliminares arguidas pelos agravantes, dentre as quais a de ilegitimidade ativa do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e de incompetência da Justiça Federal, nos termos do voto da Desembargadora Federal Salette Nascimento, relatora. Todavia, extrai-se desse voto que a análise dessas preliminares se deu de forma perfunctória, na medida permitida pela via estreita do recurso interposto.

 

Em outras palavras, a análise das preliminares postas em sede de agravo de instrumento foi superficial, ligeira, mesmo porque a relatora dispunha apenas dos elementos iniciais constante nos autos.

 

Entretanto, no decorrer dos últimos vinte anos, muitos outros fatos importantes foram agregados ao processo, razão pela qual – nesse específico caso – entendo que as preliminares arguidas pelos corréus em suas apelações, relativas à competência da Justiça Federal e à legitimidade do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, não foram atingidas pela preclusão e merecem avaliação mais aprofundada.

 

Ademais, o posicionamento do STJ é no sentido de que a competência e a legitimidade integram o rol das chamadas matérias de ordem pública, sendo insuscetíveis de preclusão pro judicato. Confira-se:

 

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. PRECLUSÃO. NÃO OCORRÊNCIA. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CABIMENTO.

1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).

2. A incompetência absoluta constitui matéria de ordem pública, que pode ser declarada até mesmo de ofício, a qualquer tempo e grau de jurisdição, não se sujeitando à preclusão.

3. Hipótese em que a inadmissão do recurso especial interposto na origem, notadamente quanto à alegada ofensa aos arts. 1º e 1º-A da Lei nº 12.409/2011 e 5º da Lei nº 13.000/2014, não ocorreu com fundamento em tese firmada sob o rito dos recursos especiais repetitivos, a justificar, portanto, o cabimento do agravo em recurso especial.

4. Agravo interno não provido.

(STJ - AgInt no AREsp 1654760/PE, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 11/11/2020, DJe 17/11/2020)

 

AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - AÇÃO CONDENATÓRIA - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE RECONHECEU DE OFÍCIO A INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA COMUM. INSURGÊNCIA DA PARTE DEMANDADA.

1. Nos termos da jurisprudência do STJ, havendo cumulação de pretensões distintas, sendo um pedido antecedente, de reconhecimento da natureza salarial da verba CTVA, em face da ex-empregadora (CEF), deve a ação prosseguir primeiramente na Justiça do Trabalho.

2. A incompetência absoluta pode ser conhecida de ofício em qualquer tempo ou grau de jurisdição, e não está sujeita à preclusão pro judicato. Precedentes.

3. Não cabe ao STJ o exame de dispositivos constitucionais em sede de embargos de declaração, ainda que manejados para fins de prequestionamento. Precedentes.

4. Agravo interno desprovido.

(STJ - AgInt nos EDcl nos EDcl no AgInt no AREsp 1301661/DF, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 04/05/2020, DJe 07/05/2020)

 

AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA, DECORRENTE DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DE SUCUMBÊNCIA, CONTRA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA EM LIQUIDAÇÃO EXTRAJUDICIAL (BANCO ECONÔMICO S.A.). INCLUSÃO DO BANCO BRADESCO S.A. NO POLO PASSIVO, SOB O FUNDAMENTO DE OCORRÊNCIA DE SUCESSÃO. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA. LEGITIMIDADE PASSIVA DEBATIDA EM ANTERIOR AGRAVO DE INSTRUMENTO. REAPRECIAÇÃO DA QUESTÃO AO SE ANALISAR A IMPOSSIBILIDADE DE PROSSEGUIMENTO DA EXECUÇÃO MERCÊ DE A INSTITUIÇÃO FINANCEIRA SUPOSTAMENTE SUCEDIDA SE ENCONTRAR EM LIQUIDAÇÃO EXTRAJUDICIAL. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. NÃO OCORRÊNCIA DE PRECLUSÃO PRO JUDICATO. POSSIBILIDADE DE SE ANALISAR A QUESTÃO EM SEDE DE RECURSO ESPECIAL, ANTE O PREQUESTIONAMENTO DA MATÉRIA. JURISPRUDÊNCIA DO STJ QUE TEM SE SEDIMENTADO PELA IMPOSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO DE SUCESSÃO DE INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS TÃO SOMENTE COM BASE NA TEORIA DA APARÊNCIA. OFENSA AO ART. 535 DO CPC DE 1973 CONFIGURADA. RETORNO DOS AUTOS À CORTE DE ORIGEM.

1. A decisão que, em fase de cumprimento de sentença, redireciona a execução contra pessoa que não integrou a lide originária, tem natureza interlocutória, de sorte que, por estar sujeita à preclusão, referida decisão não se submete ao fenômeno da coisa julgada material.

2. A preclusão é sanção imposta à parte. Todavia, conservada a jurisdição (não concluída), se a instância ordinária retoma a análise de matéria de ordem pública - tal como a legitimidade passiva ad causam, na hipótese vertente -, não há falar em preclusão para o juízo, qualquer que seja o grau de jurisdição ordinária. Precedentes.

...

6. Agravo interno não provido.

(AgInt no REsp 1488048/MT, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 04/09/2018, DJe 23/10/2018)

 

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. MEMBRO DO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL. PRERROGATIVA DE FUNÇÃO. INEXISTÊNCIA. NULIDADE DO JULGAMENTO.

1. O Plenário do STJ decidiu que "aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas até então pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça" (Enunciado Administrativo n. 2).

2. Conforme entendimento consolidado no âmbito da Suprema Corte e do Superior Tribunal de Justiça, a ação de improbidade administrativa proposta contra agente público que tenha foro por prerrogativa de função é processada e julgada pelo juiz de primeiro grau.

3. Hipótese em que a corte paulista julgou originariamente ação de improbidade administrativa ajuizada contra membros do ministério público estadual, de modo a configurar nulidade de feição absoluta, sem prejuízo da subsistência dos atos instrutórios.

4. Muito embora o TJ/SP, no curso do processo, tenha reconhecido a sua competência para processar e julgar a presente ação de improbidade, a conclusão ora alvitrada encontra amparo na doutrina e na jurisprudência, para as quais as matérias de ordem pública, tal como a incompetência absoluta, não se acham sujeitas à preclusão pro judicato.

5. Nulidade do julgamento proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo e dos demais atos decisórios ali praticados reconhecida, preservando-se os atos instrutórios. Recursos especiais prejudicados.

(STJ - REsp 1287317/SP, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, Primeira Turma, julgado em 21/09/2017, DJe 19/12/2017)

 

ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. RECURSO ESPECIAL. OFENSA AO ART. 535 DO CPC NÃO DEMONSTRADA. COMPETÊNCIA ABSOLUTA DA JUSTIÇA FEDERAL PROCLAMADA EM ANTERIOR AGRAVO DE INSTRUMENTO. POSTERIOR DECLARAÇÃO DE SUA INCOMPETÊNCIA EM APELAÇÃO. POSSIBILIDADE. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. PRESSUPOSTO PROCESSUAL. ART. 473 DO CPC. INEXISTÊNCIA DE PRECLUSÃO PRO JUDICATO.

1. Verifica-se não ter ocorrido ofensa ao art. 535 do CPC, na medida em que o Tribunal de origem dirimiu, fundamentadamente, as questões que lhe foram submetidas, apreciando integralmente a controvérsia posta nos autos, não se podendo, ademais, confundir julgamento desfavorável ao interesse da parte com negativa ou ausência de prestação jurisdicional.

2. De acordo com a jurisprudência do STJ, estando em curso a lide, inexiste preclusão pro judicato diante de matérias de ordem pública, de que é exemplo a apreciação do pressuposto processual concernente à competência absoluta. Precedentes.

3. Como explicam LUIZ GUILHERME MARINONI e DANIEL MITIDIERO, "Determinadas matérias são insuscetíveis de preclusão e podem voltar a ser examinadas pelo órgão jurisdicional dentro do mesmo grau de jurisdição ainda que já decididas. São infensas à preclusão. O art. 267, § 3º, CPC, arrola exemplos da espécie - os pressupostos processuais e as condições da ação são insuscetíveis de preclusão" (Código de Processo Civil comentado artigo por artigo. 4. ed. São Paulo: RT, 2012, nota 2 ao art. 473, p. 454).

4. Logo, deve prevalecer a combatida decisão do TRF da 3ª Região que, ao julgar a apelação, decidiu ser da Justiça Estadual a competência para julgar a ação, mesmo tendo, em anterior agravo de instrumento, proclamado a competência da Justiça Federal.

5. Recurso especial a que se nega provimento.

(STJ - REsp 1240091/SP, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/10/2016, DJe 02/02/2017)

 

No mesmo sentido, colaciono julgados da Sexta Turma dessa Corte:

 

PROCESSUAL CIVIL E ECONÔMICO. AGRAVO LEGAL. CADERNETAS DE POUPANÇA. DIFERENÇAS DE CORREÇÃO MONETÁRIA. DECISÃO MONOCRÁTICA QUE RECONHECEU A INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL PARA JULGAR A LIDE ENTRE POUPADOR E INSTITUIÇÃO FINANCEIRA PRIVADA, DETERMINANDO A REMESSA DOS AUTOS À JUSTIÇA ESTADUAL APÓS O RECOLHIMENTO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DEVIDOS AO BACEN. IMPOSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO DE PEDIDOS: ART. 292, II, DO CPC/73. SENTENÇA DE FLS. 275/285 ANULADA. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. INEXISTÊNCIA DE PRECLUSÃO PRO JUDICATO. DESMEMBRAMENTO DOS AUTOS PARA REMESSA À JUSTIÇA ESTADUAL, COMPETENTE PARA JULGAR A LIDE ENTRE O POUPADOR E O BANCO PRIVADO, MANTIDO O ACÓRDÃO DE FLS. 191/203, QUE RESOLVEU A LIDE ENTRE O POUPADOR E O BACEN. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS: CUMPRIMENTO DE SENTENÇA DEPENDE DE REQUERIMENTO DO CREDOR - ARTS. 475-B E 475-J DO CPC/73 (ART. 523 DO CPC/2015). AGRAVO LEGAL PARCIALMENTE PROVIDO.

1. O banco depositário, instituição financeira privada, é o único legitimado a responder pelas diferenças de correção monetária de valores não bloqueados - janeiro/89 (Plano Verão) e março/90 (conta poupança com data base na 1ª quinzena). Sendo assim, é manifestamente descabida a cumulação de pedidos, nos termos do art. 292, II, do CPC/73, justamente porque falece à Justiça Federal competência para processar e julgar lide derivada de relação jurídica travada exclusivamente com o banco privado.

2. O fato desta C. Corte haver proclamado a competência da Justiça Federal no julgamento do agravo de instrumento nº 1999.03.00.012783-2 não constitui empecilho à nova apreciação da matéria por este Colegiado, pois a competência é matéria de ordem pública, insuscetível de preclusão pro judicato (AgRg no AREsp 107.914/SP, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 21/11/2017, DJe 24/11/2017, REsp 1287317/SP, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 21/09/2017, DJe 19/12/2017, RESP 201100386596, SÉRGIO KUKINA, STJ - PRIMEIRA TURMA, DJE DATA:02/02/2017, EDRESP 201401767376, HUMBERTO MARTINS, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:16/11/2015, AGP 201202758820, OG FERNANDES, STJ - CORTE ESPECIAL, DJE DATA:06/10/2014, RESP 200800992226, LUIZ FUX, STJ - PRIMEIRA TURMA, DJE DATA:02/02/2010, dentre inúmeros outros).

3. É incabível o condicionamento da remessa dos autos à Justiça Estadual ao pagamento dos honorários advocatícios devidos ao BACEN, pois é preciso que haja pedido para o cumprimento de sentença, nos termos dos arts. 475-B e 475-J do CPC/73 (art. 523 do CPC/2015) por se tratar de obrigação de pagar quantia.

4. Deve-se esclarecer, ademais, que é caso de desmembramento dos autos para remessa à Justiça Estadual, pois apesar de ter sido reconhecida a incompetência absoluta da Justiça Federal para o julgamento da lide em relação à instituição financeira privada, houve julgamento do pedido formulado em face do BACEN. Portanto, os autos permanecerão na Justiça Federal, onde eventual execução de honorários devidos à autarquia federal deverá ser processada.

5. Agravo legal parcialmente provido.

(TRF 3ª Região, Sexta Turma, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 803143 - 0020711-16.1995.4.03.6100, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL JOHONSOM DI SALVO, julgado em 07/06/2018, e-DJF3 15/06/2018)

 

DIREITO ECONÔMICO E PROCESSUAL CIVIL. EXPURGOS INFLACIONÁRIOS. CONTA POUPANÇA. MÊS DE ABRIL/90. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO BACEN: INEXISTÊNCIA DE VALORES BLOQUEADOS E TRANSFERIDOS À AUTARQUIA. POSSIBILIDADE DE NOVA DECISÃO SOBRE LEGITIMIDADE PASSIVA: MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA INSUSCETÍVEL DE PRECLUSÃO PRO JUDICATO. LEGITIMIDADE PASSIVA DO BANCO DEPOSITÁRIO, INSTITUIÇÃO FINANCEIRA PRIVADA: INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL PARA PROCESSAR E JULGAR A LIDE. SENTENÇA PARCIALMENTE ANULADA, COM REMESSA DOS AUTOS À JUSTIÇA ESTADUAL. APELAÇÃO PREJUDICADA.

1. Os extratos juntados à inicial não deixam pairar dúvida de que a autora busca a correção monetária de valores não bloqueados pelo BACEN. Sim, pois além de inexistir nos extratos qualquer informação sobre a existência do bloqueio e transferência dos ativos financeiros ao BACEN, eles deixam claro que, na data do bloqueio, 15.03.1990, o saldo da conta poupança da autora era de NCz$ 35.826,46, ou seja, não excedia NCz$ 50.000,00.

2. Sucede que o BACEN só tem legitimidade para figurar no polo passivo de ações que objetivem a correção monetária dos cruzados novos bloqueados em cadernetas de poupança e transferidos à autarquia. Jurisprudência consolidada do STJ.

3. Calha registrar, considerando que esta Corte já havia proclamado a legitimidade passiva do BACEN, que naquele julgamento não houve análise dos extratos acostados aos autos, apenas do entendimento jurisprudencial do STJ. Além disso, a legitimidade é matéria de ordem pública, insuscetível de preclusão pro judicato (RESP 201100386596, SÉRGIO KUKINA, STJ - PRIMEIRA TURMA, DJE DATA:02/02/2017, EDRESP 201401767376, HUMBERTO MARTINS, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:16/11/2015, (AGP 201202758820, OG FERNANDES, STJ - CORTE ESPECIAL, DJE DATA:06/10/2014, RESP 200800992226, LUIZ FUX, STJ - PRIMEIRA TURMA, DJE DATA:02/02/2010, dentre inúmeros outros).

4. Extinção do processo, sem resolução de mérito, em relação ao BACEN, com condenação da autora ao pagamento de honorários advocatícios de 10% do valor da causa atualizado à autarquia.

5. Por outro lado, tendo em vista que o banco depositário, instituição financeira privada, é o único legitimado a responder pela correção monetária de valores não bloqueados, falece à Justiça Federal competência para processar e julgar a lide, tendo em vista que o caso não se amolda a nenhuma das hipóteses do art. 109 da Constituição Federal.

6. Sentença anulada na parte em que decidiu a relação jurídica entre o poupador e o banco privado, com remessa dos autos à Justiça Estadual.

7. Apelação prejudicada.

(TRF 3ª Região, Sexta Turma, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 451840 - 0025013-88.1995.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal JOHONSOM DI SALVO, julgado em 01/02/2018, e-DJF3 09/02/2018)

 

AGRAVO LEGAL. PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. DÍVIDA ATIVA NÃO-TRIBUTÁRIA. DISSOLUÇÃO IRREGULAR DE PESSOA JURÍDICA NÃO COMPROVADA. REDIRECIONAMENTO AO SÓCIO. IMPOSSIBILIDADE NA HIPÓTESE. AGRAVO IMPROVIDO.

1. A análise dos autos revela que o Procurador Federal foi regularmente intimado da decisão agravada proferida pelo r. Juízo da 1ª Vara Federal de Registro/SP, mediante expedição de carta precatória ao Juízo Federal de Santos/SP. Tal expediente cumpre a exigência de intimação pessoal exigida pelo art. 25 da Lei n.º 6.830/80 e art. 17 da Lei n.º 10.910/2004.

2. Muito embora a Lei n.º 11.033/2004, em seu artigo 20, tenha instituído a prerrogativa da intimação pessoal do Procurador da Fazenda Nacional mediante a entrega dos autos com vista, regra que alcança também o Procurador Federal, esta exigência deve ser relativizada na hipótese em que inexiste, na circunscrição territorial onde tramita a ação, sede da Procuradoria Federal (art. 237, II do CPC/73).

3. Em se tratando de matéria de ordem pública, ou seja, aquelas relacionadas aos pressupostos processuais (jurisdição, citação, capacidade postulatória, competência, etc) ou condições da ação (legitimidade ad causam, possibilidade jurídica do pedido e interesse processual), podem ser arguidas em qualquer fase do processo, nos termos do disposto no art. 267, §3º, do CPC/73.

4. Quanto à ilegitimidade de parte, não prospera a alegação de preclusão pro judicato, porquanto é matéria de ordem pública, passível de ser conhecida de ofício a qualquer tempo e grau de jurisdição, razão pela qual não está inserida na proibição prevista no art. 471 do CPC/73.

...

11. Agravo legal improvido.

(TRF 3ª Região, Sexta Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 570357 - 0025386-85.2015.4.03.0000, Rel. Desembargadora Federal CONSUELO YOSHIDA, julgado em 04/08/2016, e-DJF3 16/08/2016)

 

PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. AGRAVO LEGAL. ART. 557, § 1º, CPC. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. FALHA OU DEFEITO NO MEDIDOR DE CONSUMO DE ENERGIA. INTERESSE DA ANEEL NÃO VERIFICADO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL. AGRAVO DESPROVIDO.

- A decisão agravada foi prolatada a teor do disposto no artigo 557 do Código de Processo Civil, bem como em conformidade com a legislação aplicável à espécie e amparado em súmula ou jurisprudência dominante do Tribunal ou dos Tribunais Superiores.

- Deve ser afastada a alegação de nulidade da decisão pela ocorrência de preclusão "pro judicato", na medida em que o juiz pode rever pronunciamentos que decidam questões de ordem pública, como a competência absoluta do órgão julgador.

...

- Agravo desprovido.

(TRF 3ª Região, Sexta Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 500341 - 0007062-18.2013.4.03.0000, Rel. Juiza Convocada LEILA PAIVA, julgado em 17/03/2016, e-DJF3 01/04/2016)

 

Sob esse prisma, passo à análise da competência da Justiça Federal e da legitimidade ad causam do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL – que são matérias de ordem pública não resolvidas a contento no decorrer da longuíssima instrução processual – utilizando dados compilados na sentença de primeiro grau, exarada pelo Juízo da 25ª Vara Federal de São Paulo/SP (ID 104548264/v.19A – fls. 19/164)

 

Como amplamente registrado, o escopo dessa ação civil pública por ato de improbidade administrativa abarca (1) a gestão dos recursos federais repassados pela FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO à FUNDAÇÃO DO SANGUE e todas as implicações dela decorrentes; (2) a execução do convênio firmado entre as duas fundações, especialmente quanto à alocação de recursos públicos; (3) a eventual intermediação pela FUNDAÇÃO DO SANGUE de ações e serviços executados pela FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO; (4) demais fatos relacionados à utilização do patrimônio ou serviços da FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO não compatíveis com sua natureza ou com o recebimento de recursos federais destinados ao sistema público de saúde.

 

Tais assertivas decorreram das conclusões do inquérito civil público nº 2/98, instaurado em 21/1/1998 pela PROCURADORIA DA REPÚBLICA em São Paulo/SP, no sentido de que no ano de 1997 (1) 89% da receita da FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO foi constituída por recursos federais; (2) a FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO repassou R$ 15.237.405,74 à FUNDAÇÃO DO SANGUE; (3) a FUNDAÇÃO DO SANGUE, utilizando a estrutura da FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO, auferiu R$ 4.578.057,81; (4) a FUNDAÇÃO DO SANGUE direcionou sua atuação para clientes privados em detrimento dos hospitais públicos; (5) a FUNDAÇÃO DO SANGUE era utilizada como anteparo para evitar processos licitatórios e concursos públicos para contratação de pessoal.

 

Pois bem.

 

A FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO, fundação pública estadual, com autonomia administrativa e financeira, foi instituída pelo Estado de São Paulo, autorizado por meio da Lei Estadual nº 3.415/82, com a lavratura de escritura pública perante o 19º Tabelionato de Notas de São Paulo/SP, em 23/10/1984.

 

A FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO está ligada à Secretaria da Saúde do Governo do Estado de São Paulo e ao Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), com a qual mantém estreito laço de cooperação acadêmica e técnico-científica. Como instituição voltada às áreas de medicina transfusional e terapia celular, é considerada referência para a Organização Pan-Americana de Saúde, a Organização Mundial da Saúde e para o Ministério da Saúde. Sua principal missão é o fornecimento de sangue, hemocomponentes e serviços hemoterápicos concordantes com a legislação vigente e com os padrões internacionais de qualidade (http://www.prosangue.sp.gov.br/artigos/institucional.html).

 

Suas finalidades estão relacionadas no artigo 4º da Lei Estadual nº 3.415/82:

 

Artigo 4º - A Fundação terá por finalidades:

I - realizar estudos, pesquisas e experiências em hematologia e hemoterapia;

II - promover a formação de hematologistas e hemoterapeutas e o treinamento de técnicos especializados;

III - centralizar a coleta de sangue, utilizando a doação voluntária e gratuita e organizar sua distribuição e dos seus componentes e frações;

IV - fornecer sangue e derivados, preferencialmente para os hospitais governamentais e, em havendo excedentes, para outros hospitais;

V - industrializar o plasma sanguíneo obtendo os derivados respectivos;

VI - divulgar, entre profissionais de medicina e outros ligados a área de saúde, bem assim junto ao público, ensinamentos essenciais sobre o sangue, e o seu uso em medicina e cirurgia;

VII - registrar os casos hematológicos e imuno-hematológicos e empreender estudos epidemiológicos e pesquisas médico-sociais;

VIII - cooperar técnica e administrativamente com entidades públicas e particulares, mediante convênios, para fins de pesquisa, ensino e assistência em hematologia e hemoterapia;

IX - prestar serviços técnicos especializados, no âmbito de suas finalidades, mediante remuneração compatível;

X - pesquisar novos métodos de prevenção, diagnóstico e tratamento de moléstias hematológicas e doenças correlatas;

XI - difundir as melhores técnicas para o diagnóstico das doenças do sangue, dos desvios das células do sangue, da imuno-hematologia e das reações imunológicas;

XII - desenvolver esforços visando a identificar e prevenir fatores químicos, físicos ou biológicos da patologia do sangue;

XIII - cooperar com instituições públicas ou privadas no desenvolvimento de estudos para a obtenção de recursos terapêuticos a partir do plasma sanguíneo e das células do sangue;

XIV - atuar de forma integrada, com os programas da Organização Mundial de Saúde, no seu campo de ação;

XV - cooperar com o Ministério da Educação e Cultura no sentido de proporcionar noções básicas sobre o sangue, seu relevante papel na saúde e na doença, aos escolares de primeiro grau, graus médio e universitário, sob forma de opúsculos, textos e material de comunicação em geral a ser distribuído à rede escolar federal, estadual e municipal;

XVI - empreender campanhas públicas, juntamente com os órgãos governamentais, para a mais ampla divulgação do valor do sangue como agente terapêutico, salvador, e como fonte de conhecimentos essenciais ao progresso da Medicina e da Biologia em geral;

XVII - produzir hemoderivados básicos, tais como albumina, gamaglobulina, fator anti-hemofílico e concentrados de elementos figurados, de maior interesse médico-sanitário, controlando sua distribuição, segundo critérios predefinidos;

XVIII - promover medidas de proteção à saúde do doador, capacitando-se para o tratamento de pacientes portadores de doença do sangue;

XIX - instituir mecanismos de incentivo à permanência dos doadores, pela doação periódica e regular, sendo considerado serviço público relevante à comunidade a colaboração dos doadores;

XX - implantar sistema de coleta, classificação e armazenamento de dados clínicos e laboratoriais, concernentes aos doadores, para utilização como indicadores da saúde da população;

XXI - realizar o controle de qualidade do sangue e dos hemoderivados;

XXII - desenvolver o ensino e a pesquisa nos campos da hematologia e da hemoterapia, para formação de recursos humanos especializados, visando a plena capacitação científica e tecnológica do País, nesse setor.

 

E, nos termos da Lei nº 8.080/90, que regula no território nacional as ações e serviços de saúde, a FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO é parte integrante do SUS:

 

Art. 4º O conjunto de ações e serviços de saúde, prestados por órgãos e instituições públicas federais, estaduais e municipais, da Administração direta e indireta e das fundações mantidas pelo Poder Público, constitui o Sistema Único de Saúde (SUS).

§ 1º Estão incluídas no disposto neste artigo as instituições públicas federais, estaduais e municipais de controle de qualidade, pesquisa e produção de insumos, medicamentos, inclusive de sangue e hemoderivados, e de equipamentos para saúde.

 

É incontroverso, portanto, que a FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO recebe recursos federais, (1) por meio de convênios celebrados com órgãos da administração federal direta e indireta e (2) na qualidade de agente credenciado para a prestação de serviços ambulatoriais no âmbito do SUS.

 

A FUNDAÇÃO DO SANGUE, por sua vez, era uma fundação privada, sem fins lucrativos, constituída por escritura pública lavrada perante o 19º Tabelionato de Notas de São Paulo/SP, em 29/9/1990.

 

A FUNDAÇÃO DO SANGUE foi extinta pela Justiça Estadual paulista, nos autos da ação civil pública nº 0217478-87.2007.8.26.0100/11ª Vara da Família e Sucessões - Foro Central Cível, ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO. Confira-se a sentença de primeiro grau, extraída do sistema de acompanhamento processual do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP):

 

...VISTOS.

Trata-se de ação Civil Pública de Extinção de Fundação ajuizada pelo Ministério Público, visando obter a extinção da FUNDAÇÃO DO SANGUE, sob a alegação de que esta não cumpre suas finalidades estatutárias por inviabilidade econômica e financeira, sendo sua manutenção custosa e prejudicial no momento, o que poderá vir a comprometer os poucos bens que ainda lhe restam, os quais devem ser repassados à Fundação Pró Sangue Hemocentro de São Paulo.

A ré foi citada e reconheceu a procedência do pedido.

Deu-se também por citada a Fundação Pró Sangue Hemocentro de São Paulo, manifestando que assumirá o ativo e passivo da fundação em extinção. Requereu o autor o julgamento antecipado da lide.

É O RELATÓRIO.

FUNDAMENTO E DECIDO.

A ação é procedente.

A ré reconhece a procedência do pedido e os documentos acostados com a inicial demonstram seguramente que se tornou impossível o cumprimento da finalidade a que visava a referida fundação, o que autoriza a postulada extinção, nos termos do artigo 69 do código Civil.

Tal como disposto no ato constitutivo da fundação e em seu estatuto (fls. 51/72), deve o patrimônio da ré ser incorporado pela Fundação Pró Sangue Hemocentro de São Paulo, que, inclusive, se manifestou favoravelmente nos autos, concordando em assumir o ativo, bem como as dívidas contraídas pela aludida fundação.

Outrossim, conforme disposto no artigo 69 do Código Civil, a fundação que não cumpre seus objetivos deverá ser extinta, assistindo o Ministério Público legitimidade para requerer o pedido.

Assim, JULGO PROCEDENTE a presente ação para decretar a extinção da Fundação do Sangue e a transferência integral de seu patrimônio (ativo e passivo), à fundação Pró Sangue Hemocentro de São Paulo e declaro EXTINTO O PROCESSO, com a apreciação do mérito, nos termos do 269, inciso I, do Código de Processo Civil.

Expeça-se mandado ao 6º Ofício de Registro de Pessoas Jurídicas para averbar a referida extinção, comunicando-se ainda à Caixa Econômica Federal em São Paulo, Secretaria do Estado da Fazenda, ao INSS, e à Municipalidade de São Paulo nos termos requeridos na cota ministerial de fls. 394/396. P. R. I., dil. e ciência ao Ministério Público...

(https://esaj.tjsp.jus.br)

 

A título de esclarecimento, em 26/11/2019, a 9ª Câmara de Direito Privado do TJSP negou provimento ao reexame necessário dessa sentença de primeiro grau proferida na ação civil pública nº 0217478-87.2007.8.26.0100/11ª Vara da Família e Sucessões - Foro Central Cível. E, consoante o sistema de acompanhamento processual do TJSP, a decisão colegiada é alvo de embargos de declaração pendentes de julgamento (https://esaj.tjsp.jus.br).

 

Prosseguindo, eram finalidades da FUNDAÇÃO DO SANGUE, de acordo com seu estatuto social:

 

I. colaborar com a Fundação Pró-Sangue de São Paulo, assim como outras entidades públicas ou privadas, visando o desenvolvimento científico, tecnológico e cultural, nas áreas de hematologia e da hemoterapia;

II. promover o desenvolvimento de pesquisas para a produção ou importação de hemoderivados, reagentes, medicamentos, matérias primas, equipamentos, acessórios, material de consumo e afins, necessários à área da saúde em geral ou à hematologia e hemoterapia em particular, podendo promover a sua produção, importação e distribuição diretamente ou por intermédio de terceiros;

III. distribuir a laboratórios, hospitais e clínicas, públicas e privadas, assim como à empresas ou de associações seguro-saúde ou similares, produtos e serviços elaborados com o concurso da Fundação Pró-Sangue Hemocentro de São Paulo ou produzidos e/ou importados nos termos no nº II acima;

IV. promover a realização de cursos técnicos de gestão na área de saúde;

V. prestar serviços especializados na área de saúde;

VI. participar de eventos ou empreendimentos que, embora estranhos à área dessaúde, possam proporcionar à Fundação receitas a serem aplicadas na realização de suas finalidades.

 

A FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO e a FUNDAÇÃO DO SANGUE, em 1/11/1995, celebraram o Convênio nº 01/95, objetivando um regime de cooperação e intercâmbio científico, tecnológico, cultural e administrativo, em benefício da realização das finalidades atribuídas a ambas, legal e estatutariamente (ID 104511854/v.5A – fls. 192/200).

 

O Convênio nº 01/95 estabeleceu, dentre outras disposições, que (1) a FUNDAÇÃO DO SANGUE poderia adquirir e colocar à disposição da FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO materiais, produtos e equipamentos julgados necessários; (2) a FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO permitiria o uso de seus equipamentos e instalações à FUNDAÇÃO DO SANGUE, que se encarregaria de sua conservação e guarda; (3) ambas as partes poderiam utilizar temporariamente o pessoal uma da outra (ID 104511854/v.5A – fls. 192/200).

 

Financeiramente, ficou acertado que as atividades previstas no Convênio nº 01/95 seriam suportadas por aportes da FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO, no valor das despesas mensalmente realizadas, e da FUNDAÇÃO DO SANGUE, no valor das suas receitas vinculadas, ou seja, as eventualmente obtidas na distribuição de bens e prestação de serviços a terceiros, decorrentes do convênio; depositados em uma "conta de operações do convênio", administrada pela FUNDAÇÃO DO SANGUE (ID 104511854/v.5A – fls. 192/200).

 

Nesse cenário, é fundamental saber se os recursos federais recebidos pela FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO foram indevidamente repassados à FUNDAÇÃO DO SANGUE.

 

Para tanto, retomo as conclusões exaradas pelo Juízo sentenciante.

 

Primeiramente, a perícia contábil realizada no decorrer da instrução processual constatou a existência de dependência econômico-financeira entre a FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO e a FUNDAÇÃO DO SANGUE.

 

Com efeito, tomando por base o ano de 1997, o perito verificou que (1) a receita operacional da FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO totalizou R$ 37.406.414,00, sendo R$ 32.893.420,00 repassados pelos SUS; (2) a FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO transferiu R$ 15.532.449,00, equivalentes a 56% de sua receita operacional, para a FUNDAÇÃO DO SANGUE, integrando 75% da receita operacional desta; (3) sem os valores repassados pelo SUS, a FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO apresentaria insuficiência de recursos no montante de R$ 11.019.455,00 (ID 104552001/v.14A – fls. 97/115). 

 

O Juízo sentenciante, então, abordou o estudo elaborado pelo Tribunal de Contas da União (TCU), denominado "Orientações para Conselheiros de Saúde", especificamente o capítulo que trata das formas de transferência dos recursos federais para a saúde (https://portal.tcu.gov.br/biblioteca-digital/orientacoes-para-conselheiros-de-saude-2-edicao.htm).

 

Assim, consoante o TCU, os recursos federais destinados à saúde são repassados aos Municípios e Estados por meio de (1) remuneração por serviços produzidos, (2) convênios, contratos de repasse e outros instrumentos similares e (3) transferências fundo a fundo.

 

Passemos à análise de cada uma dessas modalidades de financiamento em relação aos fatos tratados nessa ação civil pública.

 

Remuneração por serviços produzidos

 

Na modalidade remuneração por serviços produzidos, as "Orientações para Conselheiros de Saúde" esclarecem que:

 

...é feito o pagamento de forma direta aos prestadores de serviços hospitalares e ambulatoriais realizados em instituições cadastradas no SUS. É preciso lembrar que as instituições onde os serviços são prestados não precisam ser necessariamente públicas; elas podem ser privadas, mas precisam estar cadastradas e credenciadas para realizar procedimentos pelo SUS.

Para que haja o pagamento aos prestadores de serviços, é necessária a apresentação de uma fatura, calculada com base nas tabelas de serviços do Sistema de Informações Ambulatoriais (SIA) e do Sistema de Informações Hospitalares (SIH), ambas do Ministério da Saúde...

 

Cuida-se, portanto, de remuneração paga diretamente ao prestador de serviços, que pode ser instituição pública ou privada, mediante apresentação de fatura e tendo por parâmetros os valores constantes no SAI e SIH.

 

Como acentuado na sentença, essas considerações do TCU vão de encontro ao disposto no manual básico para "Gestão Financeira do Sistema Único de Saúde" do Ministério da Saúde, sobre a remuneração por serviços produzidos (http://www.fns2.saude.gov.br/documentos/Publicacoes/Manual_Gestao_Fin_SUS.pdf):

 

...É a modalidade de transferência caracterizada pelo pagamento direto aos prestadores de serviços da rede cadastrada do SUS nos estados e municípios não habilitados em Gestão Plena de Sistema - Rede Cadastrada.

Destina-se ao pagamento do faturamento hospitalar registrado no Sistema de Informações Hospitalares - SIH e da produção ambulatorial registrada no Sistema de Informações Ambulatoriais - SIA, contemplando ações de Assistência de Média e Alta Complexidade, também observados os tetos financeiros dos respectivos estados e municípios...

 

No caso dos autos, a Gerência Estadual do Ministério da Saúde em São Paulo, a requerimento do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, informou que no ano de 1997 foram repassados R$ 32.893.420,00 à FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO, pela participação no SAI/SUS - mesmo valor apresentado na perícia técnica e que foi parcialmente transferido à FUNDAÇÃO DO SANGUE.

 

Seguindo o raciocínio do Juízo sentenciante, a UNIÃO FEDERAL não sofreu qualquer prejuízo nessa operação, considerando que tão-somente ressarciu os serviços efetivamente prestados pela FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO.

 

Em outras palavras, o dinheiro pago pelo SUS pelos serviços prestados ingressou no patrimônio/titularidade da FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO, motivo pelo qual o repasse à FUNDAÇÃO DO SANGUE não diz respeito e nem atinge a UNIÃO FEDERAL.

 

Corrobora essa conclusão o entendimento do TCU de que a fiscalização da posterior aplicação dos recursos federais repassados pelo Ministério da Saúde para ressarcimento de despesas já efetuadas compete aos órgãos de controle locais:

 

ACÓRDÃO Nº 38/2005 - TCU - Plenário

1. Processo: TC 001.509/1997-7

2. Grupo II; Classe de Assunto VII - Representação

3. Interessado: Tribunal de Contas do Estado do Piauí.

4. Unidade: Secretaria Estadual de Saúde do Piauí.

5. Relator: Ministro-Substituto Lincoln Magalhães da Rocha.

6. Representante do Ministério Público: Procuradora Cristina Machado da Costa e Silva.

7. Unidades Técnicas: Secex/PI e 4ª Secex.

8. Advogado constituído nos autos: não há.

9. Acórdão:

VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Representação decorrente de documentação encaminhada pelo Tribunal de Contas do Estado do Piauí, noticiando possíveis irregularidades praticadas pela Secretaria Estadual de Saúde na gestão de recursos do Sistema Único de Saúde - SUS.

ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão Plenária, ante as razões expostas pelo Relator, em:

9.1. com fulcro no art. 237, inciso IV, e parágrafo único, do Regimento Interno, conhecer da presente Representação, por preencher os requisitos de admissibilidade aplicáveis à espécie, para, no mérito, considerá-la prejudicada ante a perda do objeto;

9.2. firmar entendimento de que:

9.2.1. na hipótese de transferência de recursos pelo Ministério da Saúde para ressarcimento de despesas já efetivadas pelas unidades prestadoras de serviços de saúde nas áreas de atendimento ambulatorial e internação hospitalar, compete ao TCU averiguar a efetiva realização dos serviços de saúde informados e a pertinência dos valores;

9.2.2. a fiscalização da aplicação posterior daqueles recursos oriundos do ressarcimento é de competência dos órgãos de controle locais em vista das disposições do art. 77, § 3º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, art. 16, XIX, e 36, §2º, da Lei 8.080/90 e art. 6º da Lei 8.689/93;

9.3. remeter cópia do presente Acórdão, acompanhado do Relatório e Voto que o fundamentam, ao Tribunal do Contas do Estado do Piauí, bem como ao Juiz de Direito Cândido Ribeiro, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, aos demais Tribunais de Contas dos Estados, Tribunais de Contas dos Municípios e às Secretarias de Saúde Estaduais ou órgãos equivalentes, por meio das quais se dará conhecimento às Secretarias Municipais ou órgãos equivalentes;

9.4. arquivar o presente processo.

10. Ata nº 2/2005 - Plenário

11. Data da Sessão: 26/1/2005 - Ordinária

...

 

Convênios, contratos de repasse e outros instrumentos similares

 

No que tange aos recursos federais recebidos pela FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO por conta de convênios celebrados com órgãos da administração federal direta e indireta federal, objetivando a execução de programas de trabalho, projetos e atividades de interesse recíproco - ou seja, para finalidade específica - deve-se destacar que (1) não há notícias nos autos de que esses valores foram irregularmente repassados à FUNDAÇÃO DO SANGUE ou tiveram destinação distinta das contidas nos planos de trabalho; (2) esses valores estão sujeitos à prestação de contas e ao controle dos órgãos concedentes; (3) não há notícias nos autos de que os órgãos concedentes tenham julgado irregulares as prestações de contas da FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO.

 

Transferências fundo a fundo

 

Após detida análise da documentação apresentada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, que fica aqui corroborada, o Juízo sentenciante concluiu que não há prova de que recursos federais transferidos por meio de fundos, de forma direta ou indireta, foram irregularmente repassados à FUNDAÇÃO DO SANGUE pela FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO.

 

Passemos agora à questão da constituição do patrimônio da FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO SÃO PAULO com recursos federais.

 

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL também atribui interesse federal a essa ação civil pública à composição do patrimônio da FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO SÃO PAULO, com 34% de capital federal.

 

A perícia técnica confirmou que em 11/1982, após a promulgação da Lei Estadual nº 3.415/82, os CR$ 31.000.000,00 (trinta e um milhões de cruzeiros) transferidos pelo Ministério da Saúde, nos termos do Convênio nº 07/82, para a aquisição de equipamentos, foram contabilizados no patrimônio da FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO como dotação inicial da UNIÃO FEDERAL (ID 104552001/v.14A – fls. 97/115). 

 

Para as defesas ocorreu um equívoco no lançamento do livro diário da FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO, pois referido Convênio nº 07/82, celebrado entre o Ministério da Saúde e o Estado de São Paulo, destinava-se a compra de equipamentos para a Divisão de Transfusão de Sangue do Hospital das Clínicas da FMUSP. E que esse repasse foi muito anterior a instituição da FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO, em 23/10/1984, com a lavratura de escritura pública perante o 19º Tabelionato de Notas de São Paulo/SP (ID 104548263/v.15 – fls. 85/86).

 

O Juízo sentenciante deu razão às defesas, considerando que (1) o artigo 5º, IV, do Decreto-Lei nº 200/67, prevê que a fundação é uma entidade dotada de personalidade jurídica de direito privado, sem fins lucrativos, criada em virtude de autorização legislativa; (2) o Estado de São Paulo, autorizado pela Lei Estadual nº 3.415/82, instituiu a FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO com a lavratura de escritura pública perante o 19º Tabelionato de Notas de São Paulo/SP, em 23/10/1984; (3) a Lei Estadual nº 3.415/82, quando trata do patrimônio da FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO, não menciona a UNIÃO FEDERAL.

 

Acrescente-se que a própria UNIÃO FEDERAL negou vínculo patrimonial com a FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO, por meio do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão/Secretaria de Patrimônio da União/Gerência Regional do Patrimônio da União no Estado de São Paulo, e do Ministério da Saúde/Coordenação-Geral de Recursos Logísticos/Subsecretaria de Assuntos Administrativos (ID 104548262/v.12 – fls. 26/27).

 

Resta claríssimo, portanto, que inexiste interesse federal nos fatos narrados na inicial, considerando que:

 

(1) os recursos federais repassados pelo SUS remuneraram os serviços efetivamente prestados pela FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO, ingressando no seu patrimônio/ titularidade;

 

(2) não há notícias nos autos de irregularidades nas prestações de contas da FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO, atinentes aos recursos federais recebidos pela celebração de convênios com órgãos da administração federal direta e indireta federal;

 

(3) não há notícias nos autos de que recursos federais transferidos por meio de fundos, de forma direta ou indireta, foram irregularmente repassados à FUNDAÇÃO DO SANGUE pela FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO;

 

(4) a própria UNIÃO FEDERAL, por meio de dois Ministérios, negou a existência de vínculo patrimonial com a FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO.

 

Inclusive, essa foi a constatação do Juízo sentenciante:

 

...Com efeito, independentemente do prisma sobre o qual se analisa a questão (repasse de recursos federais ou constituição do patrimônio), a conclusão alcançável é no sentido de que, no caso em apreço, inexiste razão para a atuação desta Justiça Federal no que toca aos recursos repassados pela FUNDAÇÃOPRÓ-SANGUE à FUNDAÇÃO DO SANGUE.

Vale dizer: tendo em vista que os recursos encaminhados à FUNDAÇÃO DO SANGUE são aqueles que originariamente ingressaram nos "cofres" da FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE na condição de remuneração por serviços produzidos no âmbito do SIA/SUS, e, portanto, incorporados ao patrimônio do ente público, segue-se que da destinação final que lhes for dada não resultará qualquer prejuízo para a UNIÃO FEDERAL...

(ID 104548264/v.19A – fls. 19/164)

 

O Juízo sentenciante, todavia, deixou de apreciar a preliminar de incompetência da Justiça Federal aos seguintes fundamentos:

 

...Contudo, como já salientado, encontrando-se preclusa a este Magistrado a possibilidade de reapreciar a matéria atinente à competência desta justiça Federal para processamento do feito e considerando que o Estado de São Paulo requereu seu ingresso na lide na condição de litisconsorte ativo do autor da ação, ocasião em que "(...) constatou o acerto dos pedidos formulados pelo Ministério Público FederaL" (fl. 2294/2297), há de se prosseguir no exame do mérito, para cujo mister já está firmada a competência deste juízo...

(ID 104548264/v.19A – fls. 19/164)

 

Entretanto, diferentemente do exposto na sentença, a análise da competência da Justiça Federal – que é matéria de ordem pública – não está abatida pela preclusão, como acima esclarecido. E o fato da FAZENDA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO ter ingressado na lide ao lado do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, não constitui impeditivo para apreciação dessa questão.

 

Assim, reconheço a incompetência absoluta da Justiça Federal para processar e julgar a presente ação civil pública por ato de improbidade administrativa, com fulcro no artigo 109, I, da Constituição Federal:

 

Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:

I - as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, exceto as de falência, as de acidentes de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho;

 

Consequentemente, reconheço a ilegitimidade ativa do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, com fulcro no artigo 37, I, da Lei Complementar nº 75/93:

 

Art. 37. O Ministério Público Federal exercerá as suas funções:

I - nas causas de competência do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça, dos Tribunais Regionais Federais e dos Juízes Federais, e dos Tribunais e Juízes Eleitorais;

 

Nesse cenário, não resta outra alternativa senão a anulação da sentença e a remessa dos autos à Justiça Estadual paulista, em observância ao artigo 64, §3º, do Código de Processo Civil/2015.

 

Nesse sentido:

 

AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL - AUTOS DE AGRAVO DE INSTRUMENTO NA ORIGEM - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE DEU PROVIMENTO AO RECLAMO DA PARTE ADVERSA, DETERMINANDO A REMESSA DOS AUTOS À JUSTIÇA ESTADUAL. IRRESIGNAÇÃO DO AGRAVANTE.

1. De acordo com o entendimento desta Corte, a incompetência do órgão perante o qual foi ajuizada a ação, ainda que se trate de incompetência absoluta, como no caso, não dá ensejo à extinção do processo, mas a sua remessa ao órgão competente. Precedentes.

2. Eventual decretação da ilegitimidade ativa de um dos órgãos do Ministério Público em relação à ação proposta, atraindo o deslocamento da competência para outro juízo, não resulta na imediata extinção da ação sem julgamento do mérito, devendo o juízo competente intimar o órgão ministerial com atribuições para a causa com o intuito de ratificar ou não a petição, dando continuidade ou não à ação proposta. Precedentes.

3. Agravo interno desprovido.

(STJ - AgInt no REsp 1592109/SP, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 17/12/2019, DJe 03/02/2020)

 

Por todo exposto, voto para acolher as preliminares de incompetência da Justiça Federal e de ilegitimidade ativa do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL arguidas nas apelações interpostas por DALTON DE ALENCAR FISCHER CHAMONE, PAULO ROSSETTI OLIVEIRA CABRAL e MARCELO PUPKIN PITTA e por PEDRO ENRIQUE DORLHIAC LLACE, anulando a sentença e determinado a remessa dos autos à Justiça Estadual paulista; e para julgar prejudicado os recursos do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, da UNIÃO FEDERAL e da FAZENDA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, bem como o reexame necessário.

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA PRATICADOS NO ÂMBITO DA FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO E DA FUNDAÇÃO DO SANGUE: a Procuradoria da República em São Paulo/SP, por meio do inquérito civil público nº 2/98, apurou a ocorrência de atos de improbidade administrativa na gestão dos recursos federais repassados pela Fundação Pró-Sangue Hemocentro de São Paulo à Fundação do Sangue e todas as implicações dela decorrentes; na execução do convênio firmado entre as duas fundações, especialmente quanto à alocação de recursos públicos; na eventual intermediação pela Fundação do Sangue de ações e serviços executados pela Fundação Pró-Sangue Hemocentro de São Paulo; nos demais fatos relacionados à utilização do patrimônio ou serviços da Fundação Pró-Sangue Hemocentro de São Paulo não compatíveis com sua natureza ou com o recebimento de recursos federais destinados ao sistema público de saúde. FUNDAÇÃO PRÓ-SANGUE HEMOCENTRO DE SÃO PAULO: fundação pública estadual, com autonomia administrativa e financeira, instituída por escritura pública lavrada em 23/10/1984, pelo Estado de São Paulo, autorizado pela da Lei Estadual nº 3.415/82. A Fundação Pró-Sangue Hemocentro de São Paulo está ligada à Secretaria da Saúde do Governo do Estado de São Paulo e ao Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), com a qual mantém estreito laço de cooperação acadêmica e técnico-científica. FUNDAÇÃO DO SANGUE: fundação privada, sem fins lucrativos, constituída por escritura pública lavrada em 29/9/1990. A Fundação do Sangue foi extinta pela Justiça Estadual paulista, nos autos da ação civil pública nº 0217478-87.2007.8.26.0100/11ª Vara da Família e Sucessões - Foro Central Cível, ajuizada pelo Ministério Público do Estado de São Paulo. RESPONSABILIDADE PELOS ATOS ÍMPROBOS: o Ministério Público Federal alocou no polo passivo dessa ação civil pública o médico Dalton de Alencar Fischer Chamone, Diretor-Presidente da Fundação Pró-Sangue Hemocentro de São Paulo, o administrador de empresas Marcelo Pupkin Pitta, Diretor-Presidente da Fundação do Sangue e ex-Diretor de Relações Externas da Fundação Pró-Sangue Hemocentro de São Paulo; o médico Pedro Enrique Dorlhiac Llacer, Diretor Técnico-Científico da Fundação Pró-Sangue Hemocentro de São Paulo; o administrador de empresas Paulo Rossetti Oliveira Cabral, Diretor de Relações Externas e ex-Diretor Administrativo da Fundação Pró-Sangue Hemocentro de São Paulo; e o administrador de empresas Wesley Wei Júnior, Diretor Administrativo e ex-Diretor de Relações Externas da Fundação Pró-Sangue Hemocentro de São Paulo. ASSISTÊNCIA: foram admitidos no polo ativo a União Federal, como assistente simples, e a Fazenda Pública do Estado de São Paulo, em litisconsórcio. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA: em primeiro grau de jurisdição, o feito foi julgado parcialmente procedente, com a condenação dos corréus Dalton de Alencar Fischer Chamone, Pedro Enrique Dorlhiac Llacer, Marcelo Pupkin Pitta e Paulo Rossetti Oliveira Cabral. MATÉRIA PRELIMINAR NÃO ATINGIDA PELA PRECLUSÃO PRO JUDICATO: as preliminares de incompetência da Justiça Federal e de ilegitimidade ativa do Ministério Público Federal foram afastadas pelo Juízo a quo, em decisão mantida pela Sexta Turma dessa Corte, em sede de agravo de instrumento. Extrai-se dos votos que acompanham os acórdãos, que a análise dessas preliminares pela Sexta Turma se deu de forma perfunctória, superficial, na medida permitida pela via estreita do recurso interposto, mesmo porque se dispunha apenas dos elementos iniciais constantes nos autos. Entretanto, no decorrer dos últimos vinte anos, muitos outros fatos importantes foram agregados ao processo, razão pela qual - nesse específico caso - entende-se que as preliminares arguidas pelos corréus em suas apelações, relativas à competência da Justiça Federal e à legitimidade do Ministério Público Federal, não foram atingidas pela preclusão pro judicato e merecem avaliação mais aprofundada. POSICIONAMENTO JURISPRUDENCIAL: corrobora esse entendimento a jurisprudência do STJ, no sentido de que a competência e a legitimidade integram o rol das chamadas matérias de ordem pública, sendo insuscetíveis de preclusão pro judicato (STJ –  AgInt no AREsp 1654760/PE, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 11/11/2020, DJe 17/11/2020; AgInt nos EDcl nos EDcl no AgInt no AREsp 1301661/DF, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 04/05/2020, DJe 07/05/2020; AgInt no REsp 1488048/MT, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Quarta Turma, julgado em 04/09/2018, DJe 23/10/2018; REsp 1287317/SP, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, Primeira Turma, julgado em 21/09/2017, DJe 19/12/2017; REsp 1240091/SP, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, Primeira Turma, julgado em 18/10/2016, DJe 02/02/2017). No mesmo sentido, são os julgados da Sexta Turma dessa Corte (TRF 3ª Região, Sexta Turma, Ap 0020711-16.1995.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal JOHONSOM DI SALVO, julgado em 07/06/2018, e-DJF3 15/06/2018; Ap 0025013-88.1995.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal JOHONSOM DI SALVO, julgado em 01/02/2018, e-DJF3 09/02/2018; AI - 0025386-85.2015.4.03.0000, Rel. Desembargadora Federal CONSUELO YOSHIDA, julgado em 04/08/2016, e-DJF3 16/08/2016; AI - 0007062-18.2013.4.03.0000, Rel. Juíza Convocada LEILA PAIVA, julgado em 17/03/2016, e-DJF3 01/04/2016). Sob esse prisma, passou-se à análise da competência da Justiça Federal e da legitimidade ad causam do Ministério Público Federal. RECURSOS FEDERAIS: é incontroverso que a Fundação Pró-Sangue Hemocentro de São Paulo recebe recursos federais por meio de convênios celebrados com órgãos da administração federal direta e indireta e na qualidade de agente credenciado para a prestação de serviços ambulatoriais no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), do qual é parte integrante, nos termos do artigo 4ª, §1º, da Lei nº 8.080/90. CONVÊNIO Nº 01/95: a Fundação Pró-Sangue Hemocentro de São Paulo e a Fundação do Sangue, em 1/11/1995, celebraram o Convênio nº 01/95, objetivando um regime de cooperação e intercâmbio científico, tecnológico, cultural e administrativo, em benefício da realização das finalidades atribuídas a ambas, legal e estatutariamente. Financeiramente, ficou acertado que as atividades previstas no convênio seriam suportadas por aportes da Fundação Pró-Sangue Hemocentro de São Paulo, no valor das despesas mensalmente realizadas, e da Fundação do Sangue, no valor das suas receitas vinculadas, ou seja, as eventualmente obtidas na distribuição de bens e prestação de serviços a terceiros, decorrentes do convênio. DEPENDÊNCIA ECONÔMICO-FINANCEIRA: a perícia contábil realizada no decorrer da instrução processual constatou a existência de dependência econômico-financeira entre as duas fundações, tomando por base o ano de 1997. TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO: o estudo elaborado pelo TCU, denominado "Orientações para Conselheiros de Saúde", informa que os recursos federais destinados à saúde são repassados aos Municípios e Estados por meio de remuneração por serviços produzidos, de convênios, contratos de repasse e outros instrumentos similares e de transferências fundo a fundo. REMUNERAÇÃO POR SERVIÇOS PRODUZIDOS: remuneração paga diretamente ao prestador de serviços, que pode ser instituição pública ou privada, mediante apresentação de fatura e tendo por parâmetros os valores constantes nos Sistema de Informações Ambulatoriais (SIA)/Sistema de Informações Hospitalares (SIH), do Ministério da Saúde. No caso dos autos, a Gerência Estadual do Ministério da Saúde em São Paulo informou que no ano de 1997 foram repassados R$ 32.893.420,00 à Fundação Pró-Sangue Hemocentro de São Paulo, pela participação no SAI/SUS - mesmo valor apresentado na perícia técnica e que foi parcialmente transferido à Fundação do Sangue. Concluiu-se, assim, que a União Federal não sofreu qualquer prejuízo nessa operação, pois tão-somente ressarciu os serviços efetivamente prestados pela Fundação Pró-Sangue Hemocentro de São Paulo. CONVÊNIOS, CONTRATOS DE REPASSE E OUTROS INSTRUMENTOS SIMILARES: no que tange aos recursos federais recebidos pela Fundação Pró-Sangue Hemocentro de São Paulo nessa modalidade, objetivando a execução de programas de trabalho, projetos e atividades de interesse recíproco, deve-se destacar que não há notícias nos autos de que esses valores foram irregularmente repassados à Fundação do Sangue ou tiveram destinação distinta das contidas nos planos de trabalho. TRANSFERÊNCIAS FUNDO A FUNDO: após detida análise da documentação apresentada pelo Ministério Público Federal, concluiu-se que não há prova de que recursos federais transferidos por meio de fundos, de forma direta ou indireta, foram irregularmente repassados à Fundação do Sangue pela Fundação Pró-Sangue Hemocentro de São Paulo. CONSTITUIÇÃO PATRIMONIAL: o Ministério Público Federal também atribui interesse federal a essa ação civil pública à composição do patrimônio da Fundação Pró-Sangue Hemocentro de São Paulo, com 34% de capital federal. A perícia técnica confirmou que em 11/1982, após a promulgação da Lei Estadual nº 3.415/82, os CR$ 31.000.000,00 (trinta e um milhões de cruzeiros) transferidos pelo Ministério da Saúde, nos termos do Convênio nº 07/82, para a aquisição de equipamentos, foram contabilizados no patrimônio da Fundação Pró-Sangue Hemocentro de São Paulo como dotação inicial da União Federal. TESE DEFENSIVA: as defesas afirmaram que ocorreu um equívoco no lançamento do livro diário da Fundação Pró-Sangue Hemocentro de São Paulo, pois referido Convênio nº 07/82, celebrado entre o Ministério da Saúde e o Estado de São Paulo, destinava-se a compra de equipamentos para a Divisão de Transfusão de Sangue do Hospital das Clínicas da FMUSP. E que esse repasse foi muito anterior a instituição da Fundação Pró-Sangue Hemocentro de São Paulo, em 23/10/1984. NEGATIVA DE VÍNCULO PATRIMONIAL COM A UNIÃO FEDERAL: deu-se razão às defesas, considerando que o artigo 5º, IV, do Decreto-Lei nº 200/67, prevê que a fundação é uma entidade dotada de personalidade jurídica de direito privado, sem fins lucrativos, criada em virtude de autorização legislativa; o Estado de São Paulo, autorizado pela Lei Estadual nº 3.415/82, instituiu a Fundação Pró-Sangue Hemocentro de São Paulo com a lavratura de escritura pública em 23/10/1984; a Lei Estadual nº 3.415/82, quando trata do patrimônio da Fundação Pró-Sangue Hemocentro de São Paulo, não menciona a União Federal. Ademais, a própria União Federal negou vínculo patrimonial com a Fundação Pró-Sangue Hemocentro de São Paulo, por meio do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão e do Ministério da Saúde. INEXISTÊNCIA DE INTERESSE FEDERAL NOS FATOS NARRADOS NA INICIAL: é o que se conclui, tendo em vista que os recursos federais repassados pelo SUS remuneraram os serviços efetivamente prestados pela Fundação Pró-Sangue Hemocentro de São Paulo, ingressando no seu patrimônio/ titularidade; não há notícias nos autos de irregularidades nas prestações de contas da Fundação Pró-Sangue Hemocentro de São Paulo, atinentes aos recursos federais recebidos pela celebração de convênios com órgãos da administração federal direta e indireta federal; não há notícias nos autos de que recursos federais transferidos por meio de fundos, de forma direta ou indireta, foram irregularmente repassados à Fundação do Sangue; a própria União Federal, por meio de dois Ministérios, negou a existência de vínculo patrimonial com a Fundação Pró-Sangue Hemocentro de São Paulo. PRELIMINARES ACOLHIDAS: reconhecida a incompetência absoluta da Justiça Federal para processar e julgar a presente ação civil pública por ato de improbidade administrativa, com fulcro no artigo 109, I, da Constituição Federal, e a ilegitimidade ativa do Ministério Público Federal, com fulcro no artigo 37, I, da Lei Complementar nº 75/93, arguidas nas apelações interpostas pelas defesas, anulando-se a sentença de primeiro grau. REMESSA À JUSTIÇA ESTADUAL: com o trânsito em julgado, os autos devem ser remetidos à Justiça Estadual, em observância ao artigo 64, §3º, do Código de Processo Civil/2015 (STJ - AgInt no REsp 1592109/SP, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 17/12/2019, DJe 03/02/2020).


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sexta Turma, por unanimidade, acolhe as preliminares de incompetência da Justiça Federal e de ilegitimidade ativa do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL arguidas nas apelações interpostas por DALTON DE ALENCAR FISCHER CHAMONE, PAULO ROSSETTI OLIVEIRA CABRAL e MARCELO PUPKIN PITTA e por PEDRO ENRIQUE DORLHIAC LLACE, anulando a sentença e determinado a remessa dos autos à Justiça Estadual paulista; e julgar prejudicado os recursos do MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, da UNIÃO FEDERAL e da FAZENDA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, bem como o reexame necessário, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.