Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de São Paulo
9ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0002124-67.2019.4.03.6305

RELATOR: 26º Juiz Federal da 9ª TR SP

RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RECORRIDO: IVALDETE DA SILVA

Advogados do(a) RECORRIDO: SEBASTIAO CARLOS FERREIRA DUARTE - SP77176-N, CELIANE SUGUINOSHITA - SP270787-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

Trata-se de pedido de pensão por morte formulado na condição de companheira do segurado falecido. Sentença de procedência.

Recorre pelo o INSS, sustentando as teses de que: i) a parte autora não se desincumbiu do ônus probatório, na medida em que não demonstrou a contento, inclusive por meio de prova material, a alegada união estável, tampouco comprovou que na data do óbito convivia com o de cujus, de forma contínua e duradoura, com o objetivo de constituição de família; ii) eventualmente, a fixação da DIB na data da citação.

É o relatório. Decido.

 

 


Conforme a inteligência da norma contida no art. 201, inciso V, § 2º, da Constituição Federal, a pensão por morte é o benefício pago aos dependentes do segurado, homem ou mulher, que falecer, e visa a substituição do salário de contribuição ou do rendimento do trabalho do segurado falecido.

Releva destacar que, em matéria de pensão por morte, deve ser aplicada a regra vigente ao tempo do óbito (tempus regit actum). Nesse sentido, a Súmula nº 340 do STJ: “A lei aplicável à concessão de pensão previdenciária por morte é aquela vigente na data do óbito do segurado”.

Para a concessão da pensão por morte, é necessário o cumprimento dos seguintes requisitos: a) a qualidade de segurado do falecido; b) a morte real ou presumida deste; c) a existência de dependentes que possam se habilitar como beneficiários, segundo o rol do art. 16 da Lei nº 8.213/91; d) para os óbitos ocorridos a partir de 15.1.2015, o cônjuge, companheiro ou companheira terá de comprovar antes da morte o recolhimento de 18 (dezoito) contribuições mensais e pelo menos 2 (dois) anos após o início do casamento ou da união estável. Do contrário, a pensão tem duração de 4 (quatro) meses, excetuando a hipótese de óbito do segurado decorrente de acidente de qualquer natureza ou doença profissional ou do trabalho; ou ainda se o cônjuge ou companheiro for portador de invalidez ou deficiência.

No tocante à prova da união estável, tanto o Superior Tribunal de Justiça (STJ) quanto a Turma Nacional de Uniformização (TNU) possuem entendimento predominante no sentido de que a prova exclusivamente testemunhal é suficiente, desde que seja coerente e idônea à formação da convicção do juízo (PEDILEF 200538007607393, Rel. Juiz Federal JOSÉ ANTONIO SAVARIS, DJ 01/03/2010). Por oportuno: “A comprovação de união estável para efeito de concessão de pensão por morte prescinde de início de prova material (TNU, Súmula 63, DOU 23/08/2012).

A partir da vigência da Lei nº 13.846/2019, que incluiu o § 5º ao art. 16, da Lei nº 8.213/91, “As provas de união estável e de dependência econômica exigem início de prova material contemporânea dos fatos, produzido em período não superior a 24 (vinte e quatro) meses anterior à data do óbito ou do recolhimento à prisão do segurado, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no regulamento”.

Em caso de ruptura da vida em comum (separação ou divórcio), sem prestação de qualquer auxílio material, não é lícito ao ex-cônjuge/ex-companheiro(a) pleitear a condição de dependente em igualdade de condições com o companheiro(a) e/ou filho(a)s do de cujus por ocasião de seu passamento, alegando um estado de miserabilidade posterior a morte do segurado.

Assim já decidiu a TNU: “a necessidade superveniente deve se mostrar presente em momento anterior ao óbito, momento no qual nasce o eventual direito ao pensionamento (tempus regit actum)(PEDILEF 200684005094360, Relator JUÍZA FEDERAL SIMONE DOS SANTOS LEMOS FERNANDES, 25/04/2012).

No caso em tela, conforme averbado pela sentença recorrida, foram apresentados documentos indicando a existência de união estável durante longo período, não havendo indícios de ruptura do laço afetivo antes do óbito do segurado. Os depoimentos colhidos em juízo dão credibilidade à prova documental apresentada, constituindo um conjunto robusto e convincente de molde a colmatar a convicção no sentido da existência de convívio conjugal por prazo superior a 2 (dois) anos. Transcrevo trecho da sentença recorrida:

“[...] Quanto à alegada união estável, a parte autora apresentou, entre outros, os seguintes documentos:

i) certidão de óbito de José Fortes, no dia 29/06/2018, em que consta que a parte autora convivia em união estável com o de cujus – fl. 12 do evento 2;

ii) ficha financeira Assist. Funeral Angelus, em que consta a parte autora como esposa do de cujus (titular do plano), inclusão em 02/12/2014 – fls. 15/16 do evento 2;

iii) cartão do plano de Assist. Funeral Angelus, em que consta o de cujus como titular e a parte autora como dependente – fl. 18 do evento 2;

iv) comprovante de residência (conta de luz), em nome do falecido (CPF:

973.201.458-04), endereço Rua São Paulo, n. 112, Vila São João, em Sete Barras/SP, com data de emissão em 21/01/2015, (Janeiro/2015) e vencimento em 04/02/2015 – fl. 19 do evento 2;

v) contas de água em nome da parte autora, datadas de setembro/2015,

setembro/2016 e setembro/2017, com enderenço à Rua São Paulo, n. 112, em Sete Barras/SP – fls. 20/22 do evento 2;

vi) orçamento da Loja de Móveis Campos, cuja razão social é Vania Rubian Bonturi Bolsonaro EPP, em nome do falecido José Fortes, CPF: 973.201.458-04, com endereço na Rua São Paulo, n. 112, Vila São João, em Sete Barras/SP, documento com data de emissão em 27/04/2017 – fls. 23/25 do evento 2; e

vii) prontuário médico do falecido, do mês de junho/2018, em que consta a parte autora como responsável pelo paciente – fls. 26/71 do evento 2.

A prova material consiste, basicamente, na certidão de óbito de José Fortes, no ano de 2018, em que consta que a autora convivia em união estável com o falecido, bem como documentos do plano de assistência funeral, ‘Angelus’, no qual a autora consta como era dependente do falecido, comprovantes de endereço do falecido e da autora, e, documentos de internação hospitalar e médicos do falecido.

Cabe lembrar o teor da Súmula 63 da TNU: “A comprovação de união estável para efeito de concessão de pensão por morte prescinde de início de prova material.”

Comprovada a qualidade de segurado do falecido, que era aposentado por idade, passemos à verificação da condição de dependente da companheira, ora demandante, em relação ao segurado falecido, de cujus, porquanto foi o motivo do indeferimento administrativo (ev.2, fl. 100).

Na audiência de instrução realizada neste JEF, a prova oral indica a existência da união estável entre a parte autora e o falecido, José Fortes, os quais viveram juntos, a partir do ano de 2010 até quando da morte dele no ano de 2018, com endereço na Rua São Paulo, casa 112, Vila São João, na cidade de Sete Barras/SP.

Em depoimento pessoal, a autora disse, em resumo: que, inicialmente foi casada com outra pessoa, Oscar Oliveira, por cerca de 25 anos e tiveram 7 filhos; que, depois de separada do primeiro marido, então, conheceu o falecido Sr. José Fortes em 2010; que moraram juntos por aproximadamente 8 anos na Rua São Paulo, Vila São João, na cidade de Sete Barras; que não tiveram filhos, que, na época em que estava doente, acompanhou o companheiro/falecido nas internações hospitalares até o seu óbito; que, atualmente, não trabalha, faz “bicos”, e recebe a quantia de R$90,00 por meio do Programa Bolsa Família; que reside no mesmo endereço até a presente data.

As testemunhas, Manoel, Mildo e Joana, em resumo, disseram: que conhecem a parte autora (Manoel e Joana há aproximadamente 8 anos, Mildo há mais de 45 anos); que são vizinhos da parte autora moradores da mesma rua e conheceram o casal, autora e José Fortes, a partir do momento em que eles foram residir no referido endereço (Manoel e Joana); que o casal não tinha filhos; que o falecido José era aposentado, e que em frente a residência do casal havia um “barzinho”, que era cuidado pelo próprio Sr. José, com o auxílio da autora; que viveram juntos até a data do óbito do Sr. José Fortes.

Do cotejo da prova material e da prova testemunhal produzidas nestes autos virtuais, ficou demonstrado, de forma suficiente, a relação de união estável estabelecida entre o de cujus e a parte autora.

Conforme se observou da prova coletada, ambos viviam como se fossem marido e mulher, companheiros, apresentando-se como tal para a sociedade, na cidade de Sete Barras/SP. [...]”

No que alude ao tema relativo à data de início de benefício da pensão por morte, cabe ressaltar que  a Turma Nacional de Uniformização, reverberando entendimento do Superior Tribunal de Justiça, asseverou que “Na vigência do art. 74 da Lei n° 8.213/91, com redação conferida pela Lei n° 9.528/97, o termo inicial do benefício da pensão por morte deve ser fixada na data do óbito, quando requerida até 30 dias depois deste, ou na data em que ocorreu o requerimento, quando requerida após aquele prazo. Não se apresenta como critério distintivo para a fixação da DIB a data em que o requerente logrou fazer prova do direito invocado.” (TNU, PEDILEF 00007163820104036311, RELATORA JUÍZA FEDERAL FLÁVIA PELLEGRINO SOARES MILLANI, DOU 27/09/2016). Na mesma assentada, aduziu a Juíza Federal Relatora que é aplicável “raciocínio jurídico semelhante em casos de aposentadorias, conforme se infere do teor da Súmula n° 33, aplicável analogicamente ao caso: Quando o segurado houver preenchido os requisitos legais para concessão da aposentadoria por tempo de serviço na data do requerimento administrativo, esta data será o termo inicial da concessão do benefício”, [...] “não se pode confundir o direito com o momento em que dele se faz prova”.

Nessa linha de raciocínio, a data de início do benefício da pensão por morte referenciada deve retroagir até a data do requerimento administrativo, pois neste momento a autora já havia cumprido todos os requisitos legais, não alterando a determinação legal o fato de eventual elemento de convicção ter sido produzido posteriormente àquela data.

Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso interposto pelo INSS.

Condenação do recorrente ao pagamento de honorários advocatícios, que arbitro em 10% (dez por cento) do valor da condenação, nos termos do artigo 55 da Lei Federal nº 9.099/1995 (aplicado subsidiariamente), cujo montante deverá ser corrigido monetariamente desde a data do presente julgamento colegiado (artigo 1º, § 1º, da Lei Federal nº 6.899/1981), de acordo com os índices da Justiça Federal (“Manual de Orientação de Procedimentos para Cálculos na Justiça Federal”, aprovado pela Resolução nº 134/2010, com as alterações da Resolução nº 267/2013, ambas do Conselho da Justiça Federal – CJF).



EMENTA: PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. PENSÃO POR MORTE. UNIÃO ESTÁVEL COMPROVADA. CUMPRIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS PARA A CONCESSÃO DA PRESTAÇÃO PREVIDENCIÁRIA NA DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. RECURSO IMPROVIDO.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, Visto, relatado e discutido este processo, em que são partes as acima indicadas, decide a Nona Turma Recursal do Juizado Especial Federal da Terceira Região - Seção Judiciária de São Paulo, por unanimidade, negar provimento ao recurso interposto pelo INSS, nos termos do voto da Juíza Federal Relatora. Participaram do julgamento os Excelentíssimos Juízes Federais Marisa Regina Amoroso Quedinho Cassettari, Alessandra de Medeiros Nogueira Reis e Danilo Almasi Vieira Santos., nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.