APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0011303-54.2002.4.03.6100
RELATOR: Gab. 09 - DES. FED. NELTON DOS SANTOS
APELANTE: BANESPREV FUNDO BANESPA DE SEGURIDADE SOCIAL, BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A., ASSOCIAÇÃO DOS FUNCIONÁRIOS APOSENTADOS DO BANCO DO ESTADO DE SÃO PAULO, UNIÃO FEDERAL
Advogado do(a) APELANTE: PAULO EDUARDO PRADO - SP182951-A
Advogado do(a) APELANTE: LUCIANO DE SOUZA GODOY - SP258957-A
Advogado do(a) APELANTE: JOAO ROBERTO EGYDIO DE PIZA FONTES - SP54771-A
APELADO: BANESPREV FUNDO BANESPA DE SEGURIDADE SOCIAL, BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A., UNIÃO FEDERAL, BANCO CENTRAL DO BRASIL, ASSOCIAÇÃO DOS FUNCIONÁRIOS APOSENTADOS DO BANCO DO ESTADO DE SÃO PAULO
Advogados do(a) APELADO: PAULO EDUARDO PRADO - SP182951-A, RENATO TADEU RONDINA MANDALITI - SP115762-A
Advogado do(a) APELADO: LUCIANO DE SOUZA GODOY - SP258957-A
Advogado do(a) APELADO: JOAO ROBERTO EGYDIO DE PIZA FONTES - SP54771-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0011303-54.2002.4.03.6100 RELATOR: Gab. 09 - DES. FED. NELTON DOS SANTOS APELANTE: BANESPREV FUNDO BANESPA DE SEGURIDADE SOCIAL, BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A., ASSOCIAÇÃO DOS FUNCIONÁRIOS APOSENTADOS DO BANCO DO ESTADO DE SÃO PAULO, UNIAO FEDERAL Advogado do(a) APELANTE: PAULO EDUARDO PRADO - SP182951-A APELADO: BANESPREV FUNDO BANESPA DE SEGURIDADE SOCIAL, BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A., UNIAO FEDERAL, BANCO CENTRAL DO BRASIL, ASSOCIAÇÃO DOS FUNCIONÁRIOS APOSENTADOS DO BANCO DO ESTADO DE SÃO PAULO Advogados do(a) APELADO: PAULO EDUARDO PRADO - SP182951-A, RENATO TADEU RONDINA MANDALITI - SP115762-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O Senhor Desembargador Federal Nelton dos Santos (Relator): : Trata-se de apelação e remessa necessária em ação civil pública ajuizada pela Associação dos Funcionários Aposentados do Banco do Estado de São Paulo (AFABESP) em face da União, do Banco Central do Brasil (BACEN), do Banco Santander (Brasil) S/A (sucessor do BANESPA), e do Fundo Banespa de Seguridade Social (BANESPREV), postulando, em síntese: i) a declaração de inegociabilidade dos títulos garantidores do pagamento da complementação da aposentadoria e pensão dos associados, decorrente da inconstitucionalidade das Portarias n. 214/2000 e 386/2000, do Decreto n. 3540 e da Medida Provisória n. 1974/82; ii) o direcionamento do pagamento das complementações de aposentadorias e pensões a um Fundo de Pensão, conforme cálculo atuarial; iii) a criação de um plano de complementação para atender aos ex-funcionários que não participaram do Plano BANESPREV; iv) a condenação do Santander (sucessor do Banespa) ao pagamento das diferenças recebidas por ele para remuneração dos títulos federais e que não foram repassadas aos aposentados e pensionistas, assim como das vincendas, até a efetiva contribuição do Fundo reivindicado; e v) a constituição da obrigação de não dar aos títulos outra finalidade que não a de conceder liquidez ao Fundo. Houve sentença de extinção do feito sem julgamento de mérito, por indeferimento da inicial (f. 651-660). A AFABESP interpôs recurso de apelação (f. 756-771), cujo provimento foi negado por esta Corte (f. 1051-1052), que entendeu que a ação civil pública não é o meio adequado para a defesa desta espécie de direitos homogêneos. A AFABESP e o Ministério Público Federal interpuseram recursos especiais aos quais foi dado provimento (f. 1314-1316), reconhecendo-se a legitimidade da AFABESP para a propositura de ação em defesa de interesses individuais homogêneos da categoria que representa. O Ministério Público Federal interpôs recurso extraordinário, julgado prejudicado. Os autos retornaram às instâncias ordinárias. Houve deferimento da tutela antecipada (f. 1441-1451), tendo sido determinada a inclusão do BANESPREV no polo passivo, bem como o imediato reajuste das complementações de aposentadoria e pensão dos representados pela Associação de acordo com variação do índice IGP-DI-FGV desde o ano 2000, descontados os reajustes efetivamente aplicados no período. Em face dessa decisão, houve a interposição de agravo de instrumento pelo Banco Santander (Brasil) S/A (Agravo n. 0011995-34.2013.4.03.0000) e pelo BANESPREV (Agravo n. 0013684-16.2013.4.03.0000). Foi dado parcial provimento aos dois agravos de instrumento, tendo sido decidido que: i) em sede de tutela antecipada, a aplicação do índice pleiteado (IGP-DI-FGV) produz efeitos a partir da prolação da decisão agravada; ii) os beneficiários que optaram pelas Cláusulas 43ª e 44ª do Acordo Coletivo de Trabalho referente ao Biênio 2004/2006, firmado pelo Banco Santander, a princípio não estão albergados pelo acórdão referente ao agravo de instrumento, merecendo tal questão exame mais acurado pelo Juízo a quo no momento oportuno. O juízo a quo determinou o imediato cumprimento da decisão. O Banco Santander interpôs outros dois agravos de instrumento (n. 0022994-46.2013.4.03.0000 e 0007981-36.2015.4.03.0000), cujos seguimentos foram negados. O juízo a quo prolatou sentença com dispositivo (f. 2978-2993): "JULGO EXTINTO O PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, nos termos do artigo 267, VI, do Código de Processo Civil, em relação ao pedido de constituição de fundo de pensão complementar para gerência das contas; em relação à determinação das características a serem observadas pelo plano complementar, bem como perda do objeto em relação ao optantes da Cláusula 43ª do Acordo Coletivo de Trabalho 2004/2006; JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE A AÇÃO, para o fim de condenar os réus BANESPREV e BANCO SANTANDER a, solidariamente, proceder à revisão do benefício de complementação de aposentadoria e pensão dos beneficiários Pré-75, mediante a incorporação do IGP-DI nos períodos em que não houve a aplicação de nenhuma forma de reajuste monetário do benefício. Concedo a tutela antecipada nos limites do item III, acima descrito. Condeno os réus BANCO SANTANDER e BANESPREV, solidariamente, ao pagamento dos atrasados, que devem ser atualizados monetariamente nos termos da resolução n. 267/2013 do Conselho da Justiça Federal. Ressalto que a presente condenação não implica a desconsideração de qualquer acordo realizado pelos réus com os beneficiários, especialmente os pertinentes ao Acordo Coletivo de Trabalho 2004/2006. Ante a sucumbência recíproca, compenso as verbas honorárias nos termos do artigo 21 do Código de Processo Civil. Custas ex lege. Considerando que não houve provimento condenatório em desfavor da União Federal, a presente sentença não está sujeita a reexame necessário." (f. 2978-2993). A AFABESP, o Banco Santander e o BANESPREV opuseram embargos de declaração. Foram rejeitados os embargos de declaração opostos por Banco Santander e pelo BANESPREV e parcialmente acolhidos os manejados pela AFABESP para corrigir erros materiais apontados (f. 3034-3035). O Banco Santander Brasil S/A interpôs apelação (f. 3127-3171), sustentando que: a)a ação foi movida por associação representativa de funcionários aposentados do BANESPA admitidos até 22.05.75 e que recebem complementação de aposentadoria equivalente à diferença entre o benefício pago pelo INSS e a remuneração do cargo a que o funcionário pertencia na data da aposentadoria, nos termos do artigo 87 e ss. do Regulamento de Pessoal do BANESPA; b) o artigo 88 do Regulamento de Pessoal do BANESPA estabeleceu, de forma exclusiva, que o abono mensal seria reajustado no caso de majoração da remuneração dos empregados em atividade, quer por medida de ordem geral, quer por reajustamento de padrões de salários das categorias efetivas ou valores dos cargos em comissão; c) a aludida forma de revisão dos benefícios de complementação de aposentadoria tinha amparo na lei de regência vigente à época (Lei 6.435/77) e foi mantida pela Lei Complementar 108/01, que previu que os reajustes dos benefícios em manutenção seriam efetuados de acordo com critérios estabelecidos nos regulamentos dos planos de benefícios; d) no ano 2000, os aposentados e pensionistas tiveram a oportunidade de alterar a forma de reajuste do abono mensal mediante opção de migração para um novo Plano, denominado "BANESPREV Pré-75", que previa a correção do benefício pelo IGP-DI-FGV; e) alguns dos aposentados e pensionistas optaram pela migração e muitos, orientados pela própria AFABESP, mantiveram os reajustes de seus benefícios vinculados ao regime de paridade com a remuneração dos empregados em atividade, nos termos do artigo 88 do Regulamento de Pessoal; f) ocorre que a pretensão deduzida nesta ação pela AFABESP tem por finalidade obter a aplicação do índice IGP-DI-FGV para o reajuste do benefício dos aposentados e pensionistas que livremente optaram por se manterem vinculados ao artigo 88 do Regulamento de Pessoal, ou seja, com o reajuste do abono mensal de complementação de aposentadoria vinculado à variação dos salários dos empregados ativos; g) não pretende a autora a aplicação do IGP-DI-FGV em substituição à regra de reajuste do plano anterior, e sim como vantagem adicional, em pretensão que não encontra abrigo sequer sob as regras protetivas do Direito do Trabalho; h) ao apreciar e rejeitar a alegação de vício na representação processual, a sentença incorreu em equivocada compreensão acerca dos limites da questão decidida pelo STJ no REsp 1.241.944/SP, aplicando mal as regras processuais atinentes à preclusão, aos limites objetivos da coisa julgada e ao dever de apreciação das questões de ordem pública; i) ao rejeitar a alegação de litispendência com o processo n. 0095900-43.2005.5.00.0005, que tramita na Justiça do Trabalho, a sentença interpretou e aplicou de forma equivocada os artigos 104 do Código de Defesa do Consumidor e do artigo 301, §§ 1º e 2º, do Código de Processo Civil, bem como desrespeitou o já decidido pelo Supremo Tribunal Federal no RE 586.453/SE, com repercussão geral reconhecida; j) a sentença acolheu o pedido de assegurar o reajuste do benefício pela variação do IGP-DI-FGV a partir de causa de pedir distinta da declinada na petição inicial, incorrendo em julgamento extra petita e contrariando o disposto nos artigos 128 e 460 do Código de Processo Civil de 1973; l) ao determinar a aplicação de critério de reajuste dos benefícios absolutamente distinto daquele previsto no plano de benefícios, sob a equivocada invocação de potestividade da cláusula contratual plenamente válida, a sentença violou os artigos 5º, XXXVI, 7º, XXVI, 173, § 1º, e 202, caput, da Constituição da República; o artigo 42, IV e § 2º, da Lei 6.367/76; e o artigo 115 do Código Civil de 1916 (vigentes à época do contrato). A AFABESP, por sua vez, também apelou (f. 3037-3085), aduzindo, em síntese, que: a)a sentença deve ser parcialmente reformada porque, ao determinar a aplicação do índice IGP-DI-FGV somente em relação aos períodos em que não houve reajuste nenhum, determinou um reajuste menor do que o que foi pedido na petição inicial; b) embora a sentença tenha analisado de forma segregada as questões da inegociabilidade dos títulos e da vinculação entre seu índice de correção e a atualização dos benefícios previdenciários, as circunstâncias do caso concreto demonstram que as duas questões estão diretamente relacionadas; c) no processo que visava a viabilizar a privatização do Banco Banespa, a União assumiu as dívidas do banco junto aos aposentados e pensionistas Pré-75, conforme expressamente previsto no artigo 5º e no artigo 7º da Lei Estadual 9.343/96, com a redação dada pela Lei Estadual 9.466/96; d) para tanto, a União emitiu os títulos ATSP970315, escriturados no Sistema Securitizar da Central de Custódia e de Liquidação Financeira de Títulos - CETIP e com caráter de inegociabilidade, garantindo as obrigações do Banespa junto aos aposentados e pensionistas de funcionários admitidos até 22.05.1975; e) não obstante, apesar da entrega dos títulos de valores bilionários ao banco, os aposentados e pensionistas titulares do direito em questão tiveram seus benefícios congelados por vários anos ou reajustados por índices muito inferiores ao rendimento dos títulos, culminando em uma grande defasagem das complementações previdenciárias; f) a sentença deve ser reformada, por que não é apenas quando não houve atualização dos benefícios que o IGP-DI-FGV deve incidir, mas sim durante todos os períodos desde 2000, descontados os reajustes até então aplicados. O BANESPREV, por seu turno, também interpôs apelação (f. 3089-3115), alegando, em suma, que a sentença deve ser reformada por que: a)deve ser declarada sua ilegitimidade passiva, bem como a existência de litispendência com ação civil pública proposta perante a Justiça do Trabalho (n. 0095900-43.2005.5.02.0005 - 5ª Vara do Trabalho de São Paulo/SP), extinguindo-se o processo sem resolução do mérito, nos termos do artigo 267, V, VI e § 3º do Código de Processo Civil; b) deve ser reconhecida a absoluta incompetência da Justiça Federal ante a ausência de interesse da União e do Banco Central do Brasil (BACEN) no feito, extinguindo-se o processo nos termos do artigo 113 do Código de Processo Civil; c) a sentença foi extra petita ao conceder além do que foi pedido na inicial e determinar a indexação pelo índice IGP-DI-FGV; d) quisessem os beneficiários ter aderido ao reajuste pelo IGP-DI-FGV, deveriam ter exercido o direito à migração ao plano "BANESPREV Pré-75" quando lhes foi oportunizado (no ano 2000) e não, dois anos após a oferta para migração voluntária, vir a juízo postular, indevidamente, a aplicação do mesmo índice; e) vincular o critério de reajuste do benefício a índice diverso daquele legalmente instituído, como pretende a autora, materializa verdadeira pretensão contra legem, pois vai de encontro ao disposto no artigo 2º da Lei Estadual 1.386/51; f) na iniciativa privada, via de regra, é direito do empregador fixar o valor do salário para cada cargo, mas isso não implica discricionariedade nem arbitrariedade quanto ao reajuste dos vencimentos, o que está sempre atrelado à prévia negociação com o sindicato da categoria, por isso não há que se falar em cláusula puramente potestativa do empregador; g) as aposentadorias e pensões Pré-75 mantiveram observância aos critérios de reajuste conferido aos benefícios da Previdência Oficial, concedendo aos aposentados e pensionistas enquadrados no grupo Pré-75 o direito ao recebimento de abono referente à diferença apurada, verificando-se, assim, que apesar de não estar atrelado a um índice específico, houve efetiva recomposição econômica; h) devem ser julgados totalmente improcedentes os pedidos formulados, afastando inclusive a necessidade de recomposição pelo período de congelamento salarial. A União interpôs apelação adesiva (f. 3174-3181), alegando, em suma, que: a)a União é parte ilegítima porque o mero fato de ter funcionado como acionista majoritária do BANESPA, a contar da federalização em 1999 (Portarias da Secretaria do Tesouro Nacional, Medida Provisória n. 1974-82 e Decreto 3.540/2000) não a torna legitimada passiva; b) com o advento da Lei 12.154/09, foi criada a Superintendência Nacional de Previdência Complementar (PREVIC), autarquia de natureza especial vinculada ao Ministério da Previdência Social, a quem competia a fiscalização e supervisão das atividades das entidades fechadas de previdência complementar e, portanto, se se entender que houve alguma falha com relação à Previdência dos ex-empregados do BANESPA, é a PREVIC que deverá ser citada para compor o polo passivo da presente ação, e não a União; c) a função primordial da ação civil pública, instituída pela Lei 7.347/85, é a de responsabilizar os agentes causadores de danos patrimoniais e morais ao meio ambiente, ao consumidor, aos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, ao passo que a associação autora ajuizou a presente ação com o fito de obter a declaração de inconstitucionalidade das Portarias 214/2000 e 386/2000, bem como do Decreto 3.540/00 e da Medida Provisória 1.974-82, o que torna evidente a inadequação da via eleita; d) a associação autora visa, com a presente demanda, a defender os interesses econômicos de seus representados, o que não a legitima a propor a presente ação. Com contrarrazões da União (f. 3182-3186), do BACEN (f. 3205-3208), da AFABESP (f. 3225-3268), do Banco Santander (f. 3269-3305) e do BANESPREV (f. 3340-3356), vieram os autos a este Tribunal. A Procuradoria Regional da República, em parecer da lavra do e. Dr. Robério Nunes dos Anjos Filho, opinou pelo conhecimento de ofício da remessa oficial e pelo parcial provimento da remessa oficial e do apelo da AFABESP, apenas para que os réus sejam condenados também a viabilizarem a manutenção da garantia das obrigações previdenciárias aos substituídos por meio de quantidade suficiente de títulos com as mesmas características dos originariamente negociados, e a reajustar doravante as complementações de aposentadoria e pensão segundo índice IGP-DI-FGV desde 2000, promovendo o desconto dos reajustes aplicados, estando prejudicados os apelos do BANESPREV, do Banco Santander e da União (f. 3528-3540). Esta Terceira Turma, por maioria, em um primeiro momento, rejeitou a preliminar de ilegitimidade passiva da União suscitada nas apelações, manteve a causa na Justiça Federal e autorizou a continuidade do julgamento, em acórdão assim ementado: "PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO BANCO CENTRAL. LEGITIMIDADE PASSIVA DA UNIÃO FEDERAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. PROSSEGUIMENTO DO FEITO. 1. Acolhe-se a preliminar de ilegitimidade passiva do Banco Central do Brasil. A autarquia simplesmente conduziu o processo de privatização do BANESPA, sem que tenha praticado qualquer ato prejudicial ao regime de aposentadoria e pensões dos funcionários da instituição admitidos até 22/05/1975. 2. Nenhum dos pedidos da ação civil pública se dirige diretamente ao BACEN - estabelecimento de fundo de previdência e reajuste de benefícios previdenciários conforme a variação do IGP-DI. A declaração de inegociabilidade dos títulos entregues ao BANESPA atinge, portanto apenas a União Federal, enquanto entidade emissora. 3. Rejeita-se a preliminar de ilegitimidade passiva da União Federal. A Associação dos Funcionários Aposentados do Banco do Estado de São Paulo - AFABESP questiona expressamente atos de órgãos federais que teriam degenerado o regime aplicável à assunção do passivo atuarial do BANESPA, especificamente os títulos do Tesouro Nacional entregues como garantia de pagamento dos benefícios de previdência complementar. 4. Observa-se que a associação civil impugna atos concretos de órgãos federais realizados no programa de refinanciamento de dívidas do Estado de São Paulo e pede que outros sejam praticados, no sentido da inegociabilidade dos títulos emitidos. Os interesses da União sofrem afetação direta, porquanto ela terá de mudar a destinação dos bônus, tornando-os inegociáveis e vinculando a respectiva remuneração ao fundo de previdência dos funcionários do BANESPA. 5. Sob o ponto de vista, portanto, dos elementos da ação civil pública (causa de pedir e pedido), a União possui legitimidade passiva. A procedência ou não deles envolve o mérito da causa; a presença das condições de agir compreende uma lógica abstrata, que foi devidamente respeitada na petição inicial da associação civil. 6. Apelação do BANESPREV parcialmente provida, apenas para reconhecer a ilegitimidade passiva ad causam e do Banco Central do Brasil. 7. Rejeitada preliminar de ilegitimidade passiva da União Federal suscitada nas apelações. 8. Autorizado o prosseguimento do feito." É o relatório.
Advogado do(a) APELANTE: LUCIANO DE SOUZA GODOY - SP258957-A
Advogado do(a) APELANTE: JOAO ROBERTO EGYDIO DE PIZA FONTES - SP54771-A
Advogado do(a) APELADO: LUCIANO DE SOUZA GODOY - SP258957-A
Advogado do(a) APELADO: JOAO ROBERTO EGYDIO DE PIZA FONTES - SP54771-A
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0011303-54.2002.4.03.6100 RELATOR: Gab. 09 - DES. FED. NELTON DOS SANTOS APELANTE: BANESPREV FUNDO BANESPA DE SEGURIDADE SOCIAL, BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A., ASSOCIAÇÃO DOS FUNCIONÁRIOS APOSENTADOS DO BANCO DO ESTADO DE SÃO PAULO, UNIÃO FEDERAL Advogado do(a) APELANTE: PAULO EDUARDO PRADO - SP182951-A APELADO: BANESPREV FUNDO BANESPA DE SEGURIDADE SOCIAL, BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A., UNIÃO FEDERAL, BANCO CENTRAL DO BRASIL, ASSOCIAÇÃO DOS FUNCIONÁRIOS APOSENTADOS DO BANCO DO ESTADO DE SÃO PAULO Advogados do(a) APELADO: PAULO EDUARDO PRADO - SP182951-A, RENATO TADEU RONDINA MANDALITI - SP115762-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O - V I S T A Trata-se de apelações interpostas em face de sentença que, em ação civil pública da Associação dos Funcionários Aposentados do Banco do Estado de São Paulo - AFABESP, julgou prejudicado pedido de instituição de fundo de previdência privada aos funcionários do BANESPA admitidos até 22/05/1975 e acolheu parcialmente as demais pretensões da entidade, para condenar o BANESPREV - Fundo Banespa de Seguridade Social e o Banco Santander S/A a reverem a complementação das aposentadorias e pensões segundo a variação do IGP-Dl nos meses de ausência de qualquer reajuste, com o pagamento das diferenças apuradas. O Banco Santander S/A, em razões de apelação, sustenta que a sentença deixou de analisar a irregularidade de representação processual da associação – ausência de autorização específica dos associados – e, apesar da identidade de elementos com a ação civil pública nº 0095900-43.2005.5.00.0005, em trâmite na Justiça do Trabalho, afastou indevidamente a preliminar de coisa julgada. Argumenta que a decisão apresenta nulidade, invocando causa de pedir que não chegou a integrar os limites do conflito de interesses - – reajuste de benefícios previdenciários segundo a majoração dos salários de empregados em atividade como cláusula puramente potestativa, sujeita ao arbítrio do empregador. Alega, no mérito, que os funcionários do BANESPA admitidos até 22/05/1975 não podem modificar a forma de reajuste das complementações de aposentadorias e pensões, seja porque não exerceram a opção de migração para plano que previa a indexação ao IGP-DI (BANESPREV Pré-75), seja porque a medida violaria o ato jurídico perfeito, representado pelo Regulamento de Pessoal do Banespa. O BANESPREV - Fundo Banespa de Seguridade Social, em razões recursais, defende ilegitimidade de parte, litispendência com causa trabalhista, incompetência da Justiça Federal pela ausência de interesse da União e do Banco Central do Brasil e nulidade da sentença, decorrente de inovação de causa de pedir – paridade com vencimentos como cláusula puramente potestativa. Afirma, no mérito, que os funcionários do BANESPA admitidos até 22/05/1975 tiveram a oportunidade de mudar o reajuste do abono mensal para a variação do IGP-DI com a implantação do BANESPREV Pré-75 e, mesmo assim, decidiram se manter no regime de paridade, sem que possam posteriormente se arrepender e revogar ato jurídico perfeito. Pondera que a política de salários da empresa não configura uma cláusula puramente potestativa do empregador, demandando a participação dos sindicatos, na forma de negociação coletiva, e houve a manutenção do poder aquisitivo do abono dos funcionários que não migraram para o plano de benefícios, sem a ocorrência de maiores prejuízos. A Associação dos Funcionários Aposentados do Banco do Estado de São Paulo – AFABESP também recorreu. Sustenta que o reajuste pela variação do IGP-DI deve incidir não apenas nos períodos de congelamento de salários, mas também nos de aplicação da regra de paridade, e os títulos públicos entregues pela União ao BANESPA no processo de assunção de dívidas do Estado de São Paulo e de privatização do banco (ATSP970315, escriturados no Sistema Securitizar da Central de Custódia e de Liquidação Financeira de Títulos – CETIP) estão vinculados ao passivo atuarial existente, inclusive pela cláusula de inegociabilidade, de modo que a remuneração prevista deve ser apropriada nos benefícios e não nos ativos da instituição financeira. Acrescenta que o Banco Santander S/A congelou os salários dos empregados por três anos, dando benefícios indiretos que não repercutiram no abono dos aposentados e pensionistas e negociando os próprios títulos que garantiam a indexação do complemento à variação do IGP-DI. Destaca que o Tesouro Nacional não poderia ter feito a permuta por títulos negociáveis, em detrimento do direito adquirido dos funcionários do BANESPA. A União, da mesma forma, apelou. Insiste na preliminar de ilegitimidade passiva, sob o fundamento de que foi simples controladora do BANESPA por determinado período e a resolução do passivo atuarial do banco cabe à Superintendência Nacional de Previdência Complementar. Argumenta também que a ação civil pública não serve para impugnar abstratamente a constitucionalidade de atos que autorizaram a permuta de títulos públicos (Portarias 214/2000 e 386/2000 da STN, Decreto 3.540/00 e Medida Provisória 1.974-82), nem para defender interesses econômicos de associados. Houve apresentação de contrarrazões a cada um dos recursos de apelação. O Ministério Público Federal se manifestou pelo ”conhecimento de ofício da remessa oficial e pelo parcial provimento da remessa oficial e do apelo da AFABESP, apenas para que os réus sejam condenados também a viabilizarem a manutenção da garantia das obrigações previdenciárias aos substituídos por meio de quantidade suficiente de títulos com as mesmas características dos originariamente negociados, e a reajustar doravante as complementações de aposentadoria e pensão segundo índice IGP-DI-FGV desde 2000, promovendo o desconto dos reajustes aplicados, estando prejudicados os apelos do BANESPREV, do Banco Santander e da União.” A Terceira Turma, por maioria de votos, rejeitou a preliminar de ilegitimidade passiva da União, mantendo a competência da Justiça Federal e autorizando a continuidade do julgamento. Em nova sessão, o eminente relator Nelton dos Santos, após profundo voto, julgou prejudicados, por perda de objeto, os pedidos de constituição de fundo complementar para administração e pagamento das contas Pré-75 e dos associados optantes da Cláusula 43 do Acordo Coletivo de Trabalho 2004/2006 firmado com o Banco Santander, negou provimento à apelação da AFABESP e da União e deu provimento à remessa necessária e à apelação do Santander e do BANESPREV. Fundamentou que a adesão a plano de previdência privada segue os princípios da facultatividade e da liberdade contratual, de maneira que os funcionários do BANESPA admitidos até 22/05/1975 tiveram a opção de migrar para plano que previa fórmula de reajuste diversa e, ao deixarem de exercê-la, não podem posteriormente anular a vontade manifestada, em prejuízo da obrigatoriedade dos contratos e da própria sustentabilidade do plano de benefícios. Ponderou que os funcionários concordaram expressamente com a manutenção de reajuste proporcional à majoração dos salários dos empregados em atividade, declinando do BANESPREV Pré-75 e da cláusula de aplicação do IGP-DI. Acrescentou que a própria Justiça do Trabalho negou a pretensão dos associados na ação civil pública nº 0095900-43.2005.5.00.0005, o que recomenda decisão similar da Justiça Federal, e, com a inviabilidade da mudança de reajuste, fica prejudicado o pedido de vinculação dos rendimentos dos títulos públicos emitidos pela União à complementação de aposentadorias e pensões. Pedi vista dos autos para melhor análise da causa. Primeiramente, nos termos do parecer da Procuradoria Regional da República, a remessa oficial deve ser conhecida de ofício, em função da decretação de carência e de improcedência de parte dos pedidos (artigo 19, caput, da Lei nº 4.717/1965). E deve estar voltada apenas aos interesses sob tutela do autor da ação popular, devido à existência de norma especial sobre a matéria. A legitimidade passiva da União e do BACEN já foi abordada e decidida pela Terceira Turma; resta a análise das outras preliminares invocadas. A representação processual da associação não contém irregularidades. Embora efetivamente a declaração de legitimidade ativa da AFABESP para tutela de interesses individuais homogêneos, nos termos do acórdão do STJ (Resp 1241944), não tenha significado dispensa de autorização assemblear específica e de relação nominal de filiados, a exigência não é aplicável ao caso. Isso porque não se trata de representação processual, em que o consentimento dos representados se faz imprescindível, mas de substituição processual, legitimidade extraordinária, que decorre diretamente de lei. Desde que a associação seja constituída há mais de um ano e tenha como objeto institucional a proteção de interesses coletivos, ela está habilitada a ingressar em Juízo independentemente de autorização específica de assembleia ou de relação nominal de filiados (artigo 5º, V, da Lei nº 7.347/1985). A Associação dos Funcionários Aposentados do Banco do Estado de São Paulo – AFABESP preencheu os ambos os requisitos, como se pode extrair da data de constituição e do objeto institucional – defesa dos interesses dos aposentados e pensionistas do Banco do Estado de São Paulo - BANESPA, o que inclui logicamente o reajuste das complementações dos benefícios previdenciários dos funcionários admitidos no banco até 22/05/1975. Observa-se que não se encontram em discussão direitos individuais de aposentados e pensionistas, em que a noção de representação processual faria sentido, mas direitos de natureza coletiva (artigo 81, parágrafo único, I, da Lei nº 8.078/1990), que transcendem a individualidade de cada titular e alcançam uma massa de sujeitos formada num mesmo contexto fático-jurídico – reajuste do abono mensal para funcionários admitidos até 22/05/1975. Assim, o acórdão proferido pelo STF no RE 573232, que previu requisitos adicionais à atuação de associações em Juízo na hipótese de representação processual, resta obedecido, com a dispensa de autorização assemblear específica e de relação nominal de filiados para a representatividade adequada da AFABESP. O BANESPREV - Fundo Banespa de Seguridade Social também constitui parte legítima. Segundo o exame abstrato das condições da ação, ele, na condição de gestor das contas de todos os aposentados e pensionistas do BANESPA, sofreria os efeitos da declaração de inalienabilidade dos ativos securitizados e de complementação dos benefícios previdenciários de acordo com a variação do IGP-DI – não poderia negociá-los e deveria calcular e pagar as prestações conforme o novo indexador. Da mesma forma, a preliminar de litispendência, que progrediu, na verdade, para a de coisa julgada, não está configurada. Como se pode extrair da comparação com os elementos da ação civil pública trabalhista nº 95900-43.2005.5.02.0005, o pedido formulado na ação coletiva em discussão é diferente: a AFABESP requer a declaração de inegociabilidade dos ativos securitizados pela União na época da federalização do BANESPA e de repercussão nas complementações de aposentadorias e pensões dos funcionários admitidos até 22/05/1975. Esse pedido não foi formulado na ação civil pública trabalhista. A associação requereu basicamente a reabertura do prazo de adesão ao “Plano Pré-75” para os funcionários admitidos até 22/05/1975 e que não migraram a ele no ano de 2000, fundamentando que o banco congelou a remuneração do pessoal em atividade, em prejuízo das complementações de aposentadorias e pensões reajustáveis na proporção da majoração dos salários. Na ação civil pública, a associação não pede a aplicação do “Plano Pré-75”, mas a declaração de inalienabilidade dos ativos securitizados pela União, com o consequente reajuste das complementações de benefícios previdenciários segundo o indexador dos títulos públicos emitidos – IGP-DI. Há, na verdade, conexão entre as causas, que, porém, não leva à extinção dos processos, mas à reunião deles, prejudicada pelo trânsito em julgado da sentença proferida na ação civil pública trabalhista (artigo 55, §1º, do CPC). Ademais, o exame da procedência do pedido observará apenas a natureza dos títulos públicos emitidos, sem a abordagem do “Plano Pré-75”, do prazo de adesão e do desvio de finalidade do congelamento de salários. A medida evita qualquer contradição com a decisão da Justiça do Trabalho, como garantia de unidade de jurisdição e de segurança jurídica. Por fim, a preliminar de nulidade da sentença não procede. A aplicação do IGP-DI como indexador das complementações de aposentadorias e pensões de funcionários admitidos até 22/05/1975 no BANESPA, sob o fundamento de que o reajuste de acordo com a majoração dos vencimentos do pessoal da ativa configura cláusula puramente potestativa, sujeita ao arbítrio do empregador, não significa fuga dos limites da lide. A AFABESP, na petição inicial, repudiou o congelamento dos salários como desvio de finalidade do processo de equacionamento do passivo atuarial do BANESPA, alegando que o banco tem maior controle na negociação coletiva e pôde prejudicar os funcionários que não aderiram ao “Plano Pré-75”. A validade da cláusula sempre esteve presente na lide. Ocorreu, na realidade, uma diferença de qualificação jurídica da forma de reajuste do abono mensal – cláusula puramente potestativa ou desvio de finalidade -, que não degenera o conflito de interesses no formato original e mantém a sentença nos limites das garantias processuais – inércia, contraditório e ampla defesa. No mérito, entretanto, ouso divergir parcialmente do ilustre relator. A divergência não se refere ao exame do pedido de constituição de fundo de previdência para a complementação de aposentadorias e pensões dos funcionários admitidos até 22/05/1975. No curso da ação, o BANESPREV - Fundo Banespa de Seguridade Social assumiu a gestão dos benefícios, instituindo um fundo contábil e promovendo a segregação patrimonial. Apesar de a garantia do pagamento do abono dos que não aderiram ao “Plano Pré-75” corresponder aos ativos em geral do Banco Santander S/A, a administração foi confiada a um fundo de pensão, prejudicando o requerimento de constituição. A mesma conclusão se aplica aos interesses dos associados optantes da Cláusula 43 do Acordo Coletivo de Trabalho 2004/2006. Eles aceitaram o pagamento de indenização, abono extraordinário pelo congelamento das complementações no período posterior à instituição do “Plano Pré-75”, com renúncia expressa aos direitos individuais homogêneos discutidos na ação civil pública. A divergência diz respeito ao regime dos títulos públicos emitidos pela União na federalização do BANESPA e na assunção do passivo atuarial do banco. Com a vênia do relator, a associação não requer, nesta ação civil pública, a equiparação de direitos com os funcionários que aderiram ao “Plano Pré-75” ou a reabertura do prazo de adesão, ignorando a natureza contratual e facultativa do plano de previdência privada e todo o regime aplicável – obrigatoriedade dos contratos. Todas essas questões já foram decididas pela Justiça do Trabalho na ação civil pública nº 0095900-43.2005.5.00.0005, com a incidência, inclusive, de eficácia preclusiva sobre a presença de cláusula puramente potestativa no reajuste dos benefícios condicionado à majoração dos salários. A AFABESP pretende a declaração de inalienabilidade dos ativos securitizados no processo e a consequente vinculação dos rendimentos ao abono mensal devido, que correspondem justamente à variação do IGP-DI desde a securitização do passivo atuarial. Portanto, a análise da pretensão de reajuste não deve partir da oferta do “Plano Pré-75” a todos os funcionários do BANESPA admitidos até 22/05/1975, mas do regime dos títulos públicos emitidos pela União no contexto da assunção do passivo atuarial do banco. Sob essa perspectiva, o pedido da associação procede. Com o refinanciamento das dívidas do Estado de São Paulo junto ao BANESPA no Programa de Apoio à Reestruturação e ao Ajuste Fiscal dos Estados (Lei nº 9.496/1997), a União assumiu expressamente o passivo atuarial do banco. Além da dívida pública mobiliária, houve a assunção de dívida contratual, como garantia de suprimento de caixa e de recuperação de liquidez da instituição financeira. A União, então, para operacionalizar a incorporação do passivo, securitizou as obrigações previdenciárias, emitindo títulos públicos com prazo de vencimento de vinte e cinco anos em favor do BANESPA. Segundo o Contrato de Assunção de Dívida, o Parecer nº 201/1997 da Secretaria do Tesouro Nacional e o registro mantido na Central de Custódia e de Liquidação Financeira de Títulos - CETIP, os títulos de código ATSP970315 eram inegociáveis e seriam corrigidos monetariamente pelo IGP-DI. Conquanto naturalmente não houvesse uma vinculação real dos ativos ao pagamento das complementações de aposentadorias e pensões, a entrega dos títulos significou a mudança da fórmula de reajuste então prevista. A União assumiu expressamente o passivo atuarial do BANESPA, escriturando o respectivo valor (R$ 2,65 bilhões) e capitalizando o banco na mesma proporção, com a previsão de indexador específico. O banco ficou encarregado apenas de administrar os pagamentos, usando todos os recursos transferidos, inclusive os rendimentos a serem pagos. Ao preverem o IGP-DI como indexador nos instrumentos contratuais, a União e o Estado de São Paulo revogaram a fórmula de reajuste segundo a majoração da remuneração do pessoal em atividade, como constava do Regulamento do Pessoal do BANESPA. Não faria sentido que a União assumisse o passivo atuarial e ainda remunerasse o devedor original, mediante a transferência dos rendimentos dos títulos públicos. A União capitalizou o BANESPA na dimensão necessária ao pagamento das complementações e ao reajuste, sem qualquer subsídio, o que necessariamente direciona o indexador então previsto ao abono mensal. A nota de inegociabilidade confirma a destinação dos títulos aos aposentados e pensionistas. O BANESPA ficou inibido de negociar os ativos securitizados, mantendo a custódia até o vencimento da dívida pública, que foi planejado na mesma proporção da duração do passivo atuarial. Se a União pretendia entregar títulos livres ao próprio BANESPA, como forma de suprimento de caixa e de resgate de liquidez da instituição financeira, deveria ter previsto a nota de negociabilidade, como fez com as demais dívidas refinanciadas do Estado de São Paulo junto ao banco – certificados de depósito interbancário, débitos com o BACEN e limites de depósitos compulsórios. Não seria coerente que a União pretendesse recuperar a liquidez do BANESPA e lhe entregasse títulos inegociáveis, de grande duração. A União pretendeu apenas assumir o passivo atuarial do banco em todas as dimensões, capitalizando-o na medida necessária e prevendo indexador específico não para a apropriação da instituição financeira, mas para o reajuste dos benefícios, com a revogação da fórmula então vigente. Aliás, a posterior permuta dos ativos, de certa forma, veio a confirmar a destinação dos rendimentos dos títulos originários: uma parte deles foi redirecionada ao BANESPREV com a manutenção da nota de inegociabilidade (Portaria nº 386/2000 da Secretaria do Tesouro Nacional), como um ativo do fundo de pensão segregado do patrimônio da entidade patrocinadora e cujos frutos serão distribuídos entre os beneficiários. Enquanto não havia a permuta, naturalmente todos os ativos securitizados estavam vinculados ao pagamento de todas as complementações. E só não estavam vinculados contabilmente, porquanto o BANESPA tardou em cumprir a legislação sobre previdência complementar (Lei nº 6.435/1977), que levaria à apropriação dos títulos pelo fundo de pensão, sobretudo dos rendimentos neles previstos, com a consequente repercussão no valor dos benefícios. Portanto, os títulos estavam vinculados ao pagamento de todas as complementações de aposentadorias e pensões dos funcionários admitidos até 22/05/1975, tanto que a parte permutada posteriormente foi entregue ao fundo de pensão do BANESPREV (Portaria nº 386/2000 da STN), mediante segregação patrimonial e incorporação de todos os produtos financeiros. Os posteriores desdobramentos da federalização do BANESPA preservam a conclusão de vinculação: no edital de privatização, consta como obrigação do comprador o pagamento das complementações de aposentadorias e pensões dos funcionários admitidos até 22/05/1975, com a descrição dos próprios títulos que serviram de lastro, inclusive com a nota de inegociabilidade (código ATSP970315). Desse modo, o abono mensal tinha o reajuste assegurado pelos títulos emitidos pela União na assunção do passivo atuarial do BANESPA e não poderia ser prejudicado com a posterior permuta dos ativos, mediante desconsideração de todas as operações feitas no processo de federalização. Nova fórmula de reajuste foi introduzida no Programa de Apoio à Reestruturação e ao Ajuste Fiscal dos Estados e nos contratos celebrados entre todos os interessados, formando direito adquirido, ato jurídico perfeito, insuscetível de modificação por ato administrativo posterior (artigo 5º, XXXVI, da CF). Naturalmente, não cabe a declaração de invalidade da legislação que permitiu a permuta de ativos securitizados por títulos públicos (artigo 1º, VII, da Lei nº 10.179/2001 e Decreto nº 3.540/2000). Ela só não era aplicável aos títulos vinculados ao pagamento dos aposentados e pensionistas do BANESPA, como diversamente fizeram os atos administrativos do Tesouro Nacional (Portaria nº 386/2000). Sobre eles deve recair o vício de invalidade, de violação do ato jurídico perfeito. Não se pode dizer que os títulos eram negociáveis ou que a aplicação do IGP-DI, além de violar ato jurídico perfeito já materializado no Regulamento do Pessoal do BANESPA, desembocaria no aumento de remuneração de pessoal, em detrimento das atribuições do Poder Executivo. Em primeiro lugar, não apenas o Parecer nº 201/1997 da Secretaria do Tesouro Nacional, enquanto órgão encarregado do controle de dívida pública federal, qualificou os títulos de inegociáveis, como o próprio registro mantido na CETIP traz essa informação. Também o contexto de assunção do passivo atuarial, com a capitalização do banco na mesma medida, sem qualquer subsídio, e com a previsão do IGP-DI como indexador específico, reforça a entrega dos títulos para lastro dos pagamentos do abono mensal e não para disponibilidades da instituição financeira. Em segundo lugar, os contratos feitos entre a União e o Estado de São Paulo, a cuja administração indireta pertencia o BANESPA, são instrumentos capazes de modificar o Regulamento do Pessoal, trocando a fórmula de reajuste do abono mensal então prevista. A legislação federal e estadual em geral autorizou a operação, no âmbito do Programa de Apoio à Reestruturação e ao Ajuste Fiscal dos Estados. Se haveria interessados em questionar a mudança, eles seriam os próprios aposentados e pensionistas, como titulares do abono mensal. E, como se extrai da ação civil pública, a maioria pretende o novo indexador, na mesma linha dos funcionários que migraram ao “Plano Pré-75”. E, em terceiro lugar, os Poderes Executivo e Legislativo da União e do Estado de São Paulo participaram do processo de alteração do indexador da complementação dos benefícios, editando leis que, através da reestruturação e do refinanciamento da dívida pública, permitiram a assunção do passivo atuarial do BANESPA, com possibilidade de alteração das fórmulas de reajuste. A iniciativa do Poder Executivo se faz presente. Com a declaração de inegociabilidade dos ativos securitizados, os aposentados e pensionistas que não migraram ao “Plano Pré-75” fazem jus ao reajuste das complementações segundo a variação do IGP-DI, com início na data de colocação dos títulos e com dedução naturalmente dos valores de reajustamento pagos pela regra anterior. As diferenças decorrentes devem sofrer correção monetária e juros de mora, nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal. A condenação não põe em risco um princípio elementar da previdência privada, especificamente o de equilíbrio atuarial, de sustentabilidade do plano de benefícios, seja porque não se formalizou rigorosamente um plano de benefícios para os aposentados e pensionistas que não fizeram a migração, seja porque o Banco Santander S/A se apropriou dos rendimentos no ativo geral, tendo base para o pagamento. Eventual desproporção não pode ser transferida aos aposentados e pensionistas, mas à União, que assumiu o passivo atuarial do BANESPA e entregou títulos que serviriam de lastro à cobertura, com designação, inclusive, no processo de privatização. Já o pedido de vinculação dos títulos originalmente emitidos ao fundo de pensão não pode ser deferido, porquanto eles foram permutados pelo Banco Santander S/A, com a autorização administrativa da União (Portaria nº 386/2000 da STN). Os ativos entregues na permuta são majoritariamente negociáveis, impedindo também qualquer vinculação. A condenação deve ser cumprida nos mesmos moldes da permuta feita para os beneficiários do BANESPREV, isto é, através de permuta de títulos em poder do Banco Santander S/A por outros inegociáveis emitidos especificamente pela União, com garantia de equivalência econômica (artigo 1º, VII, da Lei nº 10.179/2001). A permuta naturalmente não deve considerar o prazo original de vencimento de vinte e cinco anos iniciado em 1997, mas apenas o período que restar no cumprimento de obrigação de fazer; o reajuste das prestações anteriores já contou com a garantia do patrimônio do banco, adicionado, inclusive, da rentabilidade dos ativos securitizados, sem que houvesse qualquer inadimplência, devendo ser garantido por títulos pelo tempo remanescente (2022). Essa forma de condenação acaba por representar uma parte do pedido de vinculação dos títulos originais, mantendo os limites da petição inicial e assegurando o princípio jurisdicional da relatividade (artigo 492 do CPC). Se a associação não pode receber os ativos iniciais, deve receber substitutos com as mesmas características, a serem emitidos especificamente pela União e permutados com o Banco Santander S/A, nos termos da Lei nº 10.179/2001. Em relação ao pedido de equiparação de direitos ao plano do BANESPREV, ele não tem cabimento. Como explicado ao longo do voto, a Justiça do Trabalho já negou a pretensão e a causa de pedir da ação civil pública versa sobre a inegociabilidade de títulos públicos emitidos para a assunção do passivo atuarial do BANESPA, com repercussões apenas no reajuste das complementações de aposentadorias e pensões. Os demais aspectos do Regulamento de Pessoal do BANESPA não foram alterados e continuar a governar a relação jurídica. Por fim, apesar da ampliação da sucumbência dos réus, a isenção de despesas processuais e de honorários de advogado se mantém, em função do princípio da simetria e da ideia de desoneração em geral dos processos coletivos (artigo 18 da Lei nº 7.347/1985). Ante o exposto, com a vênia do relator, dou parcial provimento à remessa oficial e à apelação da AFABESP e nego provimento aos recursos do Banco Santander S/A, do BANESPREV e da União, julgando prejudicada uma parte dos pedidos. É o voto.
Advogado do(a) APELANTE: LUCIANO DE SOUZA GODOY - SP258957-A
Advogado do(a) APELANTE: JOAO ROBERTO EGYDIO DE PIZA FONTES - SP54771-A
Advogado do(a) APELADO: LUCIANO DE SOUZA GODOY - SP258957-A
Advogado do(a) APELADO: JOAO ROBERTO EGYDIO DE PIZA FONTES - SP54771-A
V O T O - V I S T A
Remessa oficial e apelações interpostas pela ASSOCIAÇÃO DOS FUNCIONÁRIOS APOSENTADOS DO BANCO DO ESTADO DE SÃO PAULO - AFABESP (Id. 106220182 – fls. 33/80), pelo FUNDO BANESPA DE SEGURIDADE SOCIAL – BANESPREV (Id. 106220182 – fls. 88/112) e pelo BANCO SANTANDER BRASIL S/A (Id. 106220182 – fls. 127/169) e recurso adesivo manejado pela UNIÃO (Id. 106220182 – fls. 174/189) contra sentença que, em sede de ação civil pública, verbis: “JULGO EXTINTO O PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, nos termos do artigo 267, VI, do Código de Processo Civil, em relação ao pedido de constituição de fundo de pensão complementar para gerência das contas; em relação à determinação das características a serem observadas pelo plano complementar, bem como perda do objeto em relação ao optantes da Cláusula 43ª do Acordo Coletivo de Trabalho 2004/2006; JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE A AÇÃO, para o fim de condenar os réus BANESPREV e BANCO SANTANDER a, solidariamente, proceder à revisão do benefício de complementação de aposentadoria e pensão dos beneficiários Pré-75, mediante a incorporação do IGP-DI nos períodos em que não houve a aplicação de nenhuma forma de reajuste monetário do benefício. Concedo a tutela antecipada nos limites do item III, acima descrito. Condeno os réus BANCO SANTANDER e BANESPREV, solidariamente, ao pagamento dos atrasados, que devem ser atualizados monetariamente nos termos da resolução n. 267/2013 do Conselho da Justiça Federal. Ressalto que a presente condenação não implica a desconsideração de qualquer acordo realizado pelos réus com os beneficiários, especialmente os pertinentes ao Acordo Coletivo de Trabalho 2004/2006. Ante a sucumbência recíproca, compenso as verbas honorárias nos termos do artigo 21 do Código de Processo Civil. Custas ex lege. Considerando que não houve provimento condenatório em desfavor da União Federal, a presente sentença não está sujeita a reexame necessário." (Id. 106215479 – fls. 231/262). Opostos embargos de declaração (Id. 106220182– fls. 03/09, 10/20 e 21/23), foram rejeitados (Id. 106220182– fls. 28/30). Opostos novos aclaratórios (Id. 106220182 – fls. 207/209 e 212/214), foram rejeitados os da AFABESP e acolhidos em parte os do BACEN para corrigir o último parágrafo da sentença a fim de incluir seu nome (Id. 107834216 – fls. 172/174).
O tema da ilegitimidade passiva da União e do BACEN já foi decidido pela turma, que, por unanimidade, rejeitou as preliminares e manteve a competência da Justiça Federal para apreciar e julgar o feito, de modo que, prosseguindo o julgamento, o exame limitar-se-á às demais preliminares e ao mérito da demanda.
O relator, Desembargador Federal NELTON DOS SANTOS, manteve a sentença na parte que declarou prejudicados, por perda de objeto, os pedidos de constituição de fundo complementar para administração e pagamento das contas Pré-75 e dos associados optantes da cláusula 43 do Acordo Coletivo de Trabalho 2004/2006 firmado com o Banco Santander, negou provimento às apelações da AFABESP e da União e deu provimento à remessa necessária e à apelação do Santander e do BANESPREV, no que foi acompanhado pela Juíza Federal DENISE AVELAR. Após, foi apresentado voto-vista pelo Desembargador Federal ANTÔNIO CEDENHO, que divergiu para dar parcial provimento à remessa oficial e à apelação da AFABESP e negar provimento aos recursos do Banco Santander S/A, do BANESPREV e da União, bem como declarar prejudicada uma parte dos pedidos, no que foi acompanhado pelo Desembargador Federal NERY JÚNIOR. Pedi vista dos autos.
Trata-se de caso de remessa obrigatória, pois, embora a Lei nº 7.347/1985 silencie a respeito, por interpretação sistemática das ações de defesa dos interesses difusos e coletivos conclui-se aplicável analogicamente o artigo 19 da Lei nº 4.717/1965, que determina a submissão da sentença ao duplo grau nos casos de improcedência no todo em parte do pedido, verbis:
Art. 19. A sentença que concluir pela carência ou improcedência da ação está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal; da que julgar a ação procedente, caberá apelação, com efeito suspensivo. (Redação dada pela Lei nº 6.014/73)
Nesse sentido a jurisprudência do STJ: AgRg no REsp 1.219.033/RJ.
Afasta-se a preliminar de ilegitimidade ativa da AFABESP, à vista da decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça (Id. 106198102 – fls. 86/89 e 106/113), transitada em julgado (Id. 106198102 – fl. 121). Ademais, é lícita a sua atuação como substituta processual na defesa de direitos e interesses de seus integrantes, em razão de expressa autorização estatutária (artigo 5º, II, do Estatuto Social – Id. 106197902 fls. 74/86), bem como por estar constituída há mais de um ano. Nesse sentido, destaco entendimento desta corte:
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO. ARTIGO 557, §1º DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. ASSOCIAÇÃO . LEGITIMIDADE ATIVA. SERVIÇO POSTAL. ART. 21 DA CF/88. LEI 6.538/78. EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS - ECT. CONDOMÍNIO HORIZONTAL. ENTREGA INDIVIDUALIZADA DE CORRESPONDÊNCIAS. OBRIGAÇÃO DA ECT. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. A associação autora possui legitimidade ativa ad causam para atuar como substituta processual, na defesa de direitos e interesses de seus integrantes, pois existindo a autorização estatutária, desnecessária se mostra a autorização individual prévia de cada um dos associados. Precedentes do STJ. 2. Compete à União manter o serviço postal (art. 21, X, da Constituição Federal e Lei 6.538/78), por meio da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT (Dec.-lei 509/69). (...)
(AC 00029236020124036110, DESEMBARGADOR FEDERAL NELTON DOS SANTOS, TRF3 - TERCEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:14/01/2016)(grifei)
A legitimidade do BANCO SANTANDER é evidente. Compete-lhe, como sucessor do antigo BANESPA, a administração e pagamento da complementação das aposentadorias e pensões dos funcionários PRÉ-75. De outro lado, 0 BANESPREV também deve compor o polo passivo da lide, porquanto é o responsável pelo benefício e a procedência do pedido afetará seus interesses econômico e jurídico.
Quanto à preliminar de litispendência/coisa julgada, também deve ser afastada. Dispunha o artigo 301 do Código de Processo Civil de 1973, vigente quando propostos tais feitos:
Art. 301. [...]
§ 1o Verifica-se a litispendência ou a coisa julgada, quando se reproduz ação anteriormente ajuizada. (Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973)
§ 2o Uma ação é idêntica à outra quando tem as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido. (Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973)
§ 3o Há litispendência, quando se repete ação, que está em curso; há coisa julgada, quando se repete ação que já foi decidida por sentença, de que não caiba recurso. (Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973)
§ 4o Com exceção do compromisso arbitral, o juiz conhecerá de ofício da matéria enumerada neste artigo. (Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973)
No caso em análise, a própria associação admite a propositura da ação civil pública nº 00959200500502009, ajuizada perante a 5ª Vara do Trabalho de São Paulo, mas alega que os feitos têm pedidos distintos e diferença subjetiva. Conforme consignado na declaração de voto do Desembargador Federal Antônio Cedenho, na demanda trabalhista: “a associação requereu basicamente a reabertura do prazo de adesão ao “Plano Pré-75” para os funcionários admitidos até 22/05/1975 e que não migraram a ele no ano de 2000, fundamentando que o banco congelou a remuneração do pessoal em atividade, em prejuízo das complementações de aposentadorias e pensões reajustáveis na proporção da majoração dos salários. Na presente ação civil pública, a associação não pede a aplicação do “Plano Pré-75”, mas a declaração de inalienabilidade dos ativos securitizados pela União, com o consequente reajuste das complementações de benefícios previdenciários segundo o indexador dos títulos públicos emitidos – IGP-DI. Há, na verdade, conexão entre as causas, que, porém, não leva à extinção dos processos, mas à reunião deles, prejudicada pelo trânsito em julgado da sentença proferida na ação civil pública trabalhista (art. 55, §1º, do CPC). Dessa forma, a preliminar deve ser afastada.
No que se refere à alegação de que a sentença é nula, também não procede. A análise da natureza jurídica das cláusulas do Regulamento de Pessoal dos Funcionários do BANESPA não implica julgamento extra petita, porquanto a parte autora requereu na exordial a revisão das aposentadorias e pensões dos funcionários PRÉ-75 mediante a aplicação do IGP-DI desde o ano de 2000, ao fundamento de que os benefícios ficaram congelados, e o magistrado determinou a incidência do referido índice apenas no período em que não houve aplicação de qualquer fator de correção. Assim, não foi concedido pedido diverso do pleiteado. Ademais, o decisum também não examinou a validade dos critérios de correção aplicados aos funcionários da ativa e eventualmente repassados aos inativos, de modo que referida arguição deve ser afastada também sob tal aspecto.
Em conclusão, no que toca à matéria preliminar, acompanho o relator para rejeitá-la.
Passo a examinar o mérito.
Inicialmente, conforme consignado na sentença, todos os aposentados e pensionistas do PRÉ-75 migraram em 2007 para o BANESPREV PRÉ-75, de modo que resta prejudicado o pedido da parte autora de criação de um fundo de pensão para tais profissionais inativos. De outro lado, parte desses funcionários aderiu à cláusula 43 do acordo coletivo de trabalho do ano 2004/2006, os quais renunciaram à complementação dos benefícios mediante recebimento de indenização, de maneira que o pedido também está prejudicado em relação a eles.
No mais, a divergência posta nos autos diz respeito ao regime jurídico dos títulos emitidos pela União para securitizar o passivo devido aos aposentados e pensionistas do BANESPA, ou seja, se tais títulos são inegociáveis e se estão vinculados ao pagamento dos benefícios, de maneira a se aplicarem os mesmos critérios de correção, com incidência do IGP-DI e de juros remuneratórios de 12% (doze por cento) ao ano.
O benefício de complementação de aposentadoria e suplementação de pensão dos funcionários do antigo BANESPA foi criado pelas Leis n° 1.386/1951, nº 999/1951 e nº 4.819/1958 e pelo Decreto n° 34.536/1959, implementado em 23/06/1962 por meio do Regulamento de Pessoal (Id. 106197902 – fl. 97/102) e extinto em 23/05/1975, em razão da revogação dessas normas pela Lei Estadual n° 200/1974, salvaguardados os direitos adquiridos dos empregados admitidos até 22/05/1975, os denominados PRÉ-75. Para as novas contratações foi instituído o FUNDO BANESPA DE SEGURIDADE SOCIAL - BANESPREV, com base na Lei n° 6.435/1977 (Id. 106198436 – fls. 32/86). Posteriormente, para dar cumprimento às disposições dessa regra, relativamente ao pagamento das complementações, os governos do Estado de São Paulo e o Federal, com a anuência do Senado, aprovaram, por meio da Mensagem n° 106/97 (Id. 106198436 – fl. 87) e da Resolução n° 118/97 (Id. 106198436 – fls. 106/108), a emissão de títulos no montante correspondente à dívida atuarial daquela instituição financeira, os quais constaram do acordo (Id. 106198436 – fls. 16/23) e do contrato de assunção de dívida (Id. 106198436 – fls. 24/29), celebrado entre os entes públicos.
Importante ressaltar que o Parecer nº 201, de 22/05/1997, emitido pela Secretaria do Tesouro Nacional (Id. 106198436 – fls. 99/103), que integrou referida mensagem, consignou que:
“No montante correspondente à dívida atuarial do Banespa, a União assumirá a responsabilidade do Estado de São Paulo junto àquele Banco, mediante a securitização das obrigações representada por ativos escriturados no Sistema Securitizar da Central de Custódia e de Liquidação Financeira de Títulos - CETIP, com as seguintes características
(....)
c) modalidade: nominativa e inegociável".
De outro lado, a Central de Custódia e de Liquidação Financeira de Títulos - CETIP elaborou em 18/12/1997 o anexo Comunicado SMP nº 113/97 (Id. 106197931 - fl. 89), informando oficialmente aos participantes do sistema de moedas de privatização - SECURITIZAR que:
"de acordo com o Ofícios STN/CODIP/DIEDI n2. 4.448 e 4.492, da Secretaria do Tesouro Nacional, está cadastrado o ativo ATSP970315 no Sistema SECURITIZAR. O referido ativo (...) é inegociável, não podendo ser comercializado no mercado securitário nem utilizado na aquisição de bens e direitos no âmbito do Programa Nacional de Desestatização - PND".
Relativamente ao passivo previdenciário, tem-se também a cláusula terceira, parágrafo segundo, do contrato de assunção de dívida que dispôs das garantias das obrigações do BANESPA junto aos seus aposentados e pensionistas (Id. 106198436 – fls. 25/26):
"A parte da dívida a ser securitizada será representada por ativos ATSP970315, escriturados no Sistema Securitizar da Central de Custódia e de Liquidação Financeira de Títulos - CETIP".
O edital de privatização do BANESPA (EDITAL n° 3, de 03/10/2000) também mencionou os títulos em seu capítulo 6, item 6.2, e contemplou a obrigação pelo pagamento da complementação de aposentadoria e pensão em foco, conforme item 6.7.4, título “Informações Adicionais":
"O BANESPA, consoante estabelecido em seu Regulamento do Pessoal, é responsável pelo pagamento e complementação de aposentadorias e pensões dos empregados admitidos até o dia 22/05/75 que não aderiram aos Planos de Previdência administrados pelo BANESPREV.°
Vê-se, assim, que a obrigação de pagamento da complementação de aposentadorias e pensões dos funcionários PRÉ-75 foi transmitida no processo de privatização do BANESPA aos apelantes SANTANDER, vencedor do negócio jurídico, e BANESPREV e garantida pelos títulos federais emitidos. Reconhecida essa premissa, tem-se que os benefícios deveriam ser reajustados nos mesmos moldes dos títulos, sob pena de enriquecimento ilícito do responsável pelo seu pagamento.
Posteriormente, com o advento da Medida Provisória nº 1974-81, de 19/06/2000 (Id. 106198436 – fls. 113/115), convertida na Lei nº 10.179/2001 (Id. 106198436 – fls. 134/137), a União foi autorizada a emitir novos títulos públicos com objetivo de permutá-los por novos ou por créditos decorrentes de securitização de obrigações da União, ambos na forma escritural, observada a equivalência econômica. Para tanto, foi editada a Portaria nº 386, de 14/07/2000, pelo Secretário do Tesouro Nacional, com fundamento no Decreto nº 3540/2000 e na Portaria nº 214/2000, a qual deu efetividade à permuta dos títulos originariamente emitidos, permitindo sua livre negociação. Referida troca não gerou prejuízo, na medida em que foi mantida a equivalência econômica, com incidência da taxa de juros e correção monetária idênticas (12% a.a. mais IGP-Dl). Assim, os novos títulos obrigatoriamente deverão garantir as obrigações previdenciárias em comento.
Em conclusão, ressalta-se que os aposentados e pensionistas do grupo PRÉ-75 fazem jus ao reajuste das complementações de seus benefícios com base na variação do IGP-DI, desde a data de emissão dos títulos, deduzidos os valores de reajustamento já pagos, acrescido o montante devido de correção monetária e de juros de mora, nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, consoante voto do Desembargador Federal Antônio Cedenho.
Ante o exposto, acompanho a divergência para dar parcial provimento à remessa oficial e à apelação da AFABESP e negar provimento aos recursos do Banco Santander S/A, do BANESPREV e da União, bem como declarar prejudicada uma parte dos pedidos.
É como voto.
ANDRÉ NABARRETE - DESEMBARGADOR FEDERAL
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0011303-54.2002.4.03.6100
RELATOR: Gab. 09 - DES. FED. NELTON DOS SANTOS
APELANTE: BANESPREV FUNDO BANESPA DE SEGURIDADE SOCIAL, BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A., ASSOCIAÇÃO DOS FUNCIONÁRIOS APOSENTADOS DO BANCO DO ESTADO DE SÃO PAULO, UNIAO FEDERAL
Advogado do(a) APELANTE: PAULO EDUARDO PRADO - SP182951-A
Advogado do(a) APELANTE: LUCIANO DE SOUZA GODOY - SP258957-A
Advogado do(a) APELANTE: JOAO ROBERTO EGYDIO DE PIZA FONTES - SP54771-A
APELADO: BANESPREV FUNDO BANESPA DE SEGURIDADE SOCIAL, BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A., UNIAO FEDERAL, BANCO CENTRAL DO BRASIL, ASSOCIAÇÃO DOS FUNCIONÁRIOS APOSENTADOS DO BANCO DO ESTADO DE SÃO PAULO
Advogados do(a) APELADO: PAULO EDUARDO PRADO - SP182951-A, RENATO TADEU RONDINA MANDALITI - SP115762-A
Advogado do(a) APELADO: LUCIANO DE SOUZA GODOY - SP258957-A
Advogado do(a) APELADO: JOAO ROBERTO EGYDIO DE PIZA FONTES - SP54771-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Senhor Desembargador Federal Nelton dos Santos (Relator): Admitida a legitimidade passiva da União, rejeitada a legitimidade passiva do Banco Central do Brasil e superada a questão preliminar de incompetência da Justiça Federal, prossigo no julgamento da causa.
De início, ressalte-se que a apelação da União versa apenas sobre sua ilegitimidade passiva, requerendo o ingresso na lide da Superintendência Nacional de Previdência Complementar (PREVIC), entidade de fiscalização e de supervisão das atividades das entidades fechadas de previdência complementar.
Ocorre, porém, que a PREVIC foi criada por meio da Lei 12.154/09, ao passo que os fatos que deram ensejo ao ajuizamento da presente ação remontam a 01.2000, data na qual a supervisão das entidades de previdência complementar era feita pela União.
Assim, afigura-se improfícuo admitir o ingresso na lide, já em fase recursal, da PREVIC, entidade que não atuou no processo de opção de migração dos planos de aposentadoria do BANESPA.
Isso posto, passo à análise do mérito.
Narra a associação autora que o BANESPA, garantido por um fundo de ativos, formado por títulos públicos federais nominativos e inegociáveis, costumava pagar aos aposentados e pensionistas, admitidos até 22.05.1975, aposentadorias e pensões com base nos salários pagos aos funcionários da ativa.
Com a privatização do BANESPA pelo Banco Santander S/A, foi constituído um Fundo de Previdência denominado BANESPREV.
Afirma a AFABESP que em 01.2000, foi proposto a estes aposentados e pensionistas um plano de aposentadoria administrado pelo BANESPREV (Plano Pré-75), que seria reajustado pelo IGP-DI da FGV. A AFABESP, por entender que o plano seria desvantajoso para os associados, orientou-os a não aderir, e a permanecer recebendo a aposentadoria ou pensão com base nos salários pagos aos funcionários da ativa.
Ocorre, porém, que aos não optantes do Plano Pré-75, o BANESPA não efetuou mais os reajustes salariais paritários com os trabalhadores da ativa. O BANESPA passou a efetuar apenas pagamento de benefícios indiretos aos funcionários da ativa que não alcançaram os inativos, o que acarretou uma redução drástica das aposentadorias e pensões dos inativos.
Ao perceberem que a adesão ao Plano Pré-75 teria sido mais vantajosa do que permanecer no Plano regrado pelo Regulamento de Pessoal do Banespa, os aposentados e pensionistas ingressaram em juízo, requerendo, em síntese, a aplicação dos mesmos índices de reajuste (pelo IGP-DI da FGV) do plano de aposentadoria administrado pelo BANESPREV, ou, subsidiariamente, a reabertura do prazo de adesão ao Plano Pré-75, bem como a declaração de inegociabilidade dos títulos federais emitidos para a garantia do pagamento das aposentadorias e pensões.
Nesse passo, convém contextualizar o pedido dos autores.
A previdência complementar, na definição de Wladimir Novaes Martinez, consiste em:
"Estruturalmente, cuida-se de um conjunto de operações econômico-financeiras, cálculos atuariais, práticas contábeis e normas jurídicas, empreendidas no âmbito particular da sociedade, inserida no Direito privado, subsidiária do esforço estatal, de adesão espontânea, propiciando benefícios adicionais ou assemelhados, mediante recursos exclusivos do protegido (aberta e associativa), ou divididos os encargos entre o empregado e o empregador, ou apenas de um deste último (fechada)." (In Curso de direito previdenciário: previdência complementar, tomo IV, 3ª ed., São Paulo, LTr, 2009, p. 45) (grifei)
O contrato previdenciário, por sua vez, no conceito de Arnoldo Wald:
"É o contrato pelo qual uma pessoa denominada participante se obriga a pagar contribuições periódicas a uma entidade de previdência privada, aberta ou fechada, que, por sua vez, se compromete a conceder benefícios previdenciários ao próprio participante ou aos seus beneficiários, na medida em que forem sendo cumpridas as condições estabelecidas no regulamento do plano de benefícios aprovado pelo órgão público competente, que pode ser modificado pelo legislador ou na forma contratual prevista." (In Direito das Obrigações - Teoria Geral das Obrigações e Contratos Civis e Comerciais, 15ª ed., São Paulo, Malheiros, p. 635)
Uma das características mais marcantes da previdência privada complementar, portanto, é a sua facultatividade, que lhe confere um caráter eminentemente privado, regido pela autonomia da vontade. Nesse sentido, a doutrina:
"Ao contrário dos regimes públicos, de filiação obrigatória para todos os que exercem atividade econômica, a previdência privada tem caráter facultativo, em que a manifestação de vontade é a principal característica. A natureza contratual lhes dá caráter eminentemente privado.
Não há obrigatoriedade de adesão a plano de previdência privada. Tanto é assim que a legislação não utiliza o termo 'segurado', mas, sim, denomina 'participantes' 'àqueles que, por vontade própria, subscreveram o contrato de adesão oferecido pelas EAPC e EFPC, e de 'assistido' ao participante, ou seu beneficiário, quando em gozo de benefício de prestação continuada' (Hermes Arrais Alencar, Benefícios previdenciários, 4ª ed., São Paulo, Livraria e Editora Universitária de Direito, 2009).
Por se tratar de adesão voluntária, a contribuição para o custeio do plano privado também é voluntária.
O vínculo entre os participantes, patrocinadores ou instituidores e as entidades de previdência complementar se firma por contrato.'
Fundamentais dos Fundos de Pensão, TJRJ, CEDES - Centro de Estudos e Debates, 2006, p. 47-62) (...)" (Santos, Marisa Ferreira dos, Direito Previdenciário Esquematizado. Coord. Pedro Lenza, 6ª ed., São Paulo, Saraiva, 2016) (grifei)
Ressalte-se, ademais, que consoante já entendeu o Superior Tribunal de Justiça, a facultatividade da Previdência Privada decorre do princípio constitucional da livre associação, que inclusive é cláusula pétrea. Veja-se:
"Direito civil e processual civil. Recurso especial. Ação de cobrança de contribuições previdenciárias. Previdência privada de caráter complementar. Facultatividade. Filiação e contribuição.
- Ninguém pode ser compelido a permanecer filiado a regime de previdência privada de caráter complementar, o qual a própria CF estabelece ser facultativo (art. 202), notadamente quando há coexistência harmoniosa entre a CF e a Lei Complementar n.º 109/01, harmonia que não se repete entre estas e as leis estaduais que nortearam a fundamentação do acórdão recorrido.
- Ao se falar na faculdade de agregação ao regime de previdência privada de caráter complementar não se pode olvidar que tal possibilidade decorre justamente do princípio da livre associação, previsto na CF (art. 5º, inc. XX), o qual apresenta duas facetas: a positiva, concernente à livre filiação ao regime escolhido, e a negativa, consistente na liberdade de desligar-se da Carteira, exercitando, assim, o princípio da autonomia da vontade.
- Há que se ter em consideração, neste particular, que o direito de livre associação é cláusula pétrea da CF, o que não autoriza a edição de lei, quer seja estadual, quer seja federal, que imponha a filiação a qualquer entidade associativa, sob pena de quebra de preceito erigido constitucionalmente como intocável.
- Presente a competência concorrente entre os Estados e a União para legislar sobre matéria previdenciária, fica suspensa a lei estadual naquilo que se contraponha ao texto de lei federal.
- O filiado que se desliga do regime de previdência privada complementar tem o direito de resgatar as parcelas que recolheu, o que levou, inclusive, à edição de Súmula no âmbito da Segunda Seção no sentido de que "a restituição das parcelas pagas a plano de previdência privada deve ser objeto de correção plena, por índice que recomponha a efetiva desvalorização da moeda? (Súmula 289-STJ).
- Se assim já se decidiu, muito mais pode o filiado defender-se para não ser forçado a permanecer nesta condição ad aeternum, tampouco obrigado a recolher compulsoriamente as contribuições à Carteira.
Recurso especial conhecido e parcialmente provido."
(REsp 615.088/PR, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 15/08/2006, DJ 04/09/2006, p. 260) (grifei)
"AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PREVIDÊNCIA PRIVADA COMPLEMENTAR. FILIAÇÃO E CONTRIBUIÇÃO. CARÁTER FACULTATIVO. PRECEDENTES DESTA CORTE SUPERIOR. SÚMULA 83/STJ. VIOLAÇÃO AO ART. 6º DA LICC. NATUREZA CONSTITUCIONAL. NÃO CABIMENTO. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. FALTA DE PREQUESTIONAMENTO. DECISÃO MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO." (AgRg no AREsp 444.596/PR, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 14/10/2014, DJe 20/10/2014) (grifei)
Resta claro, por conseguinte, que, em 01.2000, quando lhes foi concedida a oportunidade de ingressar no plano de previdência privada e migrar para o Plano Pré-75, os participantes tinham plena ciência das cláusulas de reajuste dos benefícios que viriam a receber no momento do resgate, caso optassem por permanecer no Plano regrado pelo Regulamento de Pessoal do Banespa.
Se, naquela ocasião, exerceram a autonomia da vontade e optaram por permanecer no Plano regrado pelo Regulamento de Pessoal do Banespa, não podem vir a juízo requerer que se aplique a este Plano as regras vigentes no Plano Pré-75, cuja correção é feita pelo índice IGP-DI (FGV), ou pretender que o juízo determine a reabertura do prazo para opção de migração.
A fim de melhor elucidar a questão, cite-se o seguinte ensinamento de Arnoldo Wald:
"(...) Na realidade, o Estado algumas vezes confunde a previdência privada com a previdência social e, como interfere nesta, também pretende exercer o seu poder regulamentar naquela. Mas, embora exercendo funções complementares, previdência privada e previdência social têm uma diferença básica de estrutura e natureza, sendo, pois, inconfundíveis.
Não obstante o aspecto complementar e a identidade do substantivo previdência, é evidente que a natureza e a sistemática de ambas as instituições são totalmente diferentes e que a intervenção estatal não pode transformar a previdência privada numa subespécie de previdência social.
A tese fundamental, para salvaguarda dos contratos previdenciários, é a da liberdade contratual e da consequente responsabilidade, nos termos dos contratos e exclusivamente de acordo com os mesmos.
Essa liberdade contratual deve ser focalizada sob dois aspectos distintos, mas complementares: a liberdade e responsabilidade perante os participantes e a liberdade e responsabilidade perante o Poder Público, no tocante às aplicações feitas pelas entidades de previdência privada, a fim de garantir o adequado cumprimento dos contratos.
Em relação aos participantes, o contrato é lei entre as partes e só pode ser modificado mediante determinação legal ou regulamentar, ou acordo entre ambas as partes, ou em virtude de previsão contratual, que admita alterações decididas pelos estatutos ou pela assembleia geral, dentro de certos limites. (...)" (In Direito das Obrigações - Teoria Geral das Obrigações e Contratos Civis e Comerciais, 15ª ed., São Paulo, Malheiros, p. 636-637) (grifei)
Sendo assim, o contrato firmado entre os participantes e a entidade de previdência faz lei entre as partes, e deve ser observado, nos termos do princípio pacta sunt servanda.
Cumpre ressaltar, por outro lado, que com o advento da Lei Complementar 108/01, houve previsão expressa no sentido de que os reajustes dos benefícios em manutenção serão efetuados de acordo com critérios estabelecidos nos regulamentos dos planos de benefícios, veja-se:
"Art. 3o Observado o disposto no artigo anterior, os planos de benefícios das entidades de que trata esta Lei Complementar atenderão às seguintes regras:
I - carência mínima de sessenta contribuições mensais a plano de benefícios e cessação do vínculo com o patrocinador, para se tornar elegível a um benefício de prestação que seja programada e continuada; e
II - concessão de benefício pelo regime de previdência ao qual o participante esteja filiado por intermédio de seu patrocinador, quando se tratar de plano na modalidade benefício definido, instituído depois da publicação desta Lei Complementar.
Parágrafo único. Os reajustes dos benefícios em manutenção serão efetuados de acordo com critérios estabelecidos nos regulamentos dos planos de benefícios, vedado o repasse de ganhos de produtividade, abono e vantagens de qualquer natureza para tais benefícios." (grifei)
Em suma, considerando que a constituição de reservas no regime de previdência privada complementar é realizada com base em cálculos atuariais, que preveem as despesas e asseguram o respectivo custeio, não é possível admitir que, de modo inopinado, seja o BANESPREV condenado a arcar com diferenças de correção monetária de benefícios recebidos por quem não é participante de seu regime, concedendo, aos associados da associação autora, verba não prevista no regulamento de seu plano de benefícios de previdência privada.
Nesse sentido, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que já decidiu a questão até mesmo em recurso representativo de controvérsia:
"PREVIDÊNCIA PRIVADA. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. PLANO DE BENEFÍCIOS SUBMETIDO À LEI COMPLEMENTAR N. 108/2001, JÁ OPERANTE POR OCASIÃO DO ADVENTO DA LEI. VEDAÇÃO DE REPASSE DE ABONO E VANTAGENS DE QUALQUER NATUREZA PARA OS BENEFÍCIOS EM MANUTENÇÃO. CONCESSÃO DE VERBA NÃO PREVISTA NO REGULAMENTO DO PLANO DE BENEFÍCIOS DE PREVIDÊNCIA PRIVADA, AINDA QUE NÃO SEJA PATROCINADO POR ENTIDADE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. IMPOSSIBILIDADE.
1. Para fins do art. 543-C do Código de Processo Civil: a) Nos planos de benefícios de previdência privada fechada, patrocinados pelos entes federados - inclusive suas autarquias, fundações, sociedades de economia mista e empresas controladas direta ou indiretamente -, é vedado o repasse de abono e vantagens de qualquer natureza para os benefícios em manutenção, sobretudo a partir da vigência da Lei Complementar n. 108/2001, independentemente das disposições estatutárias e regulamentares; b) Não é possível a concessão de verba não prevista no regulamento do plano de benefícios de previdência privada, pois a previdência complementar tem por pilar o sistema de capitalização, que pressupõe a acumulação de reservas para assegurar o custeio dos benefícios contratados, em um período de longo prazo.
2. Recurso especial provido." plano de aposentadoria administrado pelo BANESPREV (REsp 1425326/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 28/05/2014, DJe 01/08/2014) (grifei)
"AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PRINCÍPIO PACTA SUNT SERVANDA. VIOLAÇÃO. PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. SÚMULA Nº 211/STJ. PREVIDÊNCIA PRIVADA. PATROCINADOR. ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. ENTIDADE FECHADA DE PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR. EMPREGADOS EM ATIVIDADE. VANTAGENS. PARIDADE. INADMISSIBILIDADE. INOVAÇÃO RECURSAL.
1. A tese veiculada nos arts. 421, 422 e 423 do Código Civil, apontados como violado no recurso especial, não foi objeto de debate pelas instâncias ordinárias, sequer de modo implícito, e embora opostos embargos de declaração com a finalidade de sanar omissão porventura existente, não foi indicada a contrariedade ao art. 535 do Código de Processo Civil de 1973, motivo pelo qual, ausente o requisito do prequestionamento, incide o disposto na Súmula nº 211/STJ.
2. A orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que o patrocinador não possui legitimidade para figurar no polo passivo de demandas que envolvam participante e entidade de previdência privada, ainda mais se a controvérsia se referir ao plano de benefícios, como a concessão de aposentadoria suplementar.
3. 1. A Segunda Seção desta Corte Superior, ao julgar o REsp nº 1.425.326/RS, em 28/5/2014, submetido ao rito dos recursos repetitivos (art. 543-C do Código de Processo Civil de 1973), consagrou o entendimento de que: a) nos planos de benefícios de previdência privada fechada, patrocinados pelos entes federados - inclusive suas autarquias, fundações, sociedades de economia mista e empresas controladas direta ou indiretamente -, é vedado o repasse de abono e vantagens de qualquer natureza para os benefícios em manutenção, sobretudo a partir da vigência da Lei Complementar nº 108/2001, independentemente das disposições estatutárias e regulamentares, e b) não é possível a concessão de verba não prevista no regulamento do plano de benefícios de previdência privada, pois a previdência complementar tem por pilar o sistema de capitalização, que pressupõe a acumulação de reservas para assegurar o custeio dos benefícios contratados, em um período de longo prazo.
4. Não é possível a análise de tese alegada apenas nas razões do agravo interno por se tratar de evidente inovação recursal.
5. Agravo interno não provido." (AgInt nos EDcl no AREsp 957.316/RJ, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 14/02/2017, DJe 21/02/2017)
Ademais, no caso em tela, o Santander (sucessor do BANESPA) vem efetuando os pagamentos das aposentadorias e pensões nos exatos termos previstos no Plano regrado pelo Regulamento de Pessoal do Banespa, e, não havendo ilegalidade, não há que se falar em intervenção do Poder Judiciário.
A fim de evitar decisões conflitantes, em respeito à segurança jurídica e à coisa julgada, cumpre pontuar que a Justiça do Trabalho já chegou a essa mesma conclusão, em decisão transitada em julgado em 10.08.2018, nos autos do processo n. 0095900-43.2005.5.02.0005, movido pela própria AFABESP e pelo Sindicato Nacional dos Funcionários Aposentados dos Bancos do Estado de São Paulo (SINFAB) em face da União, do Banco Central do Brasil e da Fazenda do Estado de São Paulo, e cujo pedido, em síntese, assemelha-se ao formulado na presente ação civil pública. Em suma, entendeu o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região que, como o banco reclamado vem complementando a aposentadoria dos beneficiários na forma em que se obrigou, não merece acolhida o pedido dos reclamantes de concessão de reajustes com base no IGP-DI. Veja-se a ementa:
"EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ERRO MATERIAL. EMENTA. "Reconhecida a existência de erro material na ementa do acórdão embargado, são acolhidos os declaratórios nessa parte, para que reflita a questão debatida no julgado, passando a ter a seguinte redação: "AÇÃO CIVIL PÚBLICA - COMPLEMENTAÇÃO DE APOSENTADORIA - BANESPA - OPÇÃO PLANO PRÉ-75. Tendo em vista que o Banco reclamado vem complementando a aposentadoria dos beneficiários na forma em que se obrigou, não merece acolhida a tese da inicial no sentido de que os reajustes dos ativos não têm acompanhado a inflação medida pelo IGPI-DI, visando a impor ao reclamado a concessão de reajustes diversos daqueles previstos na norma regulamentadora do benefício. Recurso ordinário dos autores improvido". Embargos de declaração do reclamado providos em parte, sem impressão de efeito modificativo ao julgado." (TRT2, proc. 0095900-43.2005.5.02.0005, 18ª Turma, Rel. Desembargadora Federal do Trabalho Maria Cristina Fisch, Data do Julgamento 05.12.2012) (grifei)
Como foi negado seguimento ao recurso de revista e ao recurso extraordinário interpostos pela parte autora, a decisão prolatada pelo Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, nos autos do processo n. 0095900-43.2005.5.02.0005, transitou em julgado em 10.08.2018.
Por decorrência lógica, se não é aplicável aos beneficiários do plano regrado pelo Regulamento de Pessoal do Banespa os mesmos índices de reajuste do plano de aposentadoria administrado pelo BANESPREV, não há que se falar em declaração de inegociabilidade dos títulos federais emitidos pela União.
Sendo assim, a sentença deve ser reformada, a fim de: i) denegar o pedido de aplicação dos mesmos índices de reajuste (pelo IGP-DI da FGV) do plano de aposentadoria administrado pelo BANESPREV; ii) denegar o pedido de reabertura do prazo de adesão ao Plano Pré-75; iii) denegar o pedido de declaração de inegociabilidade dos títulos federais emitidos para a garantia do pagamento das aposentadorias e pensões.
Por fim, cumpre apontar que houve perda do objeto quanto ao pedido de constituição de fundo complementar para administração e pagamento das contas Pré-75, pois, conforme constou nos autos, em 2007 todos os aposentados e pensionistas representados pela AFABESP foram transferidos para o BANESPREV.
Houve perda de objeto, ademais, no que tange aos optantes da Cláusula 43 do Acordo Coletivo de Trabalho 2004/2006 firmado com o Banco Santander, porquanto, no acordo, restou consignado que esses beneficiários receberiam indenização e renunciariam a quaisquer direitos de complementação dos benefícios previdenciários, inclusive os postulados na presente ação.
Ante o exposto, JULGO PREJUDICADOS, por perda de objeto, os pedidos de constituição de fundo complementar para administração e pagamento das contas Pré-75; JULGO PREJUDICADO, por perda de objeto, o pedido dos associados optantes da Cláusula 43 do Acordo Coletivo de Trabalho 2004/2006 firmado com o Banco Santander; NEGO PROVIMENTO à apelação da AFABESP e da União e DOU PROVIMENTO à remessa necessária e à apelação do Santander e do BANESPREV.
Sem condenação em honorários advocatícios, nos termos do artigo 18 da Lei 7.347/85.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL. LEGITIMIDADE DAS PARTES. INEXISTÊNCIA DE COISA JULGADA. OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DA CONGRUÊNCIA. VALIDADE DA SENTENÇA. COMPLEMENTAÇÃO DE APOSENTADORIAS E PENSÕES. REGIME DOS TÍTULOS PÚBLICOS EMITIDOS. DECLARAÇÃO DE INALIENABILIDADE DOS ATIVOS SECURITIZADOS. VINCULAÇÃO DOS RENDIMENTOS AO ABONO MENSAL DEVIDO. APELAÇÃO DA UNIÃO FEDERAL, DO BANCO SANTANDER S/A E DO BANESPREV, DESPROVIDAS. REMESSA OFICIAL E APELAÇÃO DA AFABESP PARCIALMENTE PROVIDAS.
1. O caso é de ação civil pública ajuizada pela Associação dos Funcionários Aposentados do Banco do Estado de São Paulo (AFABESP) em face da União, do Banco Central do Brasil (BACEN), do Banco Santander (Brasil) S/A (sucessor do BANESPA), e do Fundo Banespa de Seguridade Social (BANESPREV), postulando, em síntese: i) a declaração de inegociabilidade dos títulos garantidores do pagamento da complementação da aposentadoria e pensão dos associados, decorrente da inconstitucionalidade das Portarias n. 214/2000 e 386/2000, do Decreto n. 3540 e da Medida Provisória n. 1974/82; ii) o direcionamento do pagamento das complementações de aposentadorias e pensões a um Fundo de Pensão, conforme cálculo atuarial; iii) a criação de um plano de complementação para atender aos ex-funcionários que não participaram do Plano BANESPREV; iv) a condenação do Santander (sucessor do Banespa) ao pagamento das diferenças recebidas por ele para remuneração dos títulos federais e que não foram repassadas aos aposentados e pensionistas, assim como das vincendas, até a efetiva contribuição do Fundo reivindicado; e v) a constituição da obrigação de não dar aos títulos outra finalidade que não a de conceder liquidez ao Fundo.
2. A representação processual da associação não contém irregularidades. Embora efetivamente a declaração de legitimidade ativa da AFABESP para tutela de interesses individuais homogêneos, nos termos do acórdão do STJ (Resp 1241944), não tenha significado dispensa de autorização assemblear específica e de relação nominal de filiados, a exigência não é aplicável ao caso. Isso porque não se trata de representação processual, em que o consentimento dos representados se faz imprescindível, mas de substituição processual, legitimidade extraordinária, que decorre diretamente de lei. Desde que a associação seja constituída há mais de um ano e tenha como objeto institucional a proteção de interesses coletivos, ela está habilitada a ingressar em Juízo independentemente de autorização específica de assembleia ou de relação nominal de filiados (artigo 5º, V, da Lei nº 7.347/1985).
3. O BANESPREV - Fundo Banespa de Seguridade Social também constitui parte legítima. Segundo o exame abstrato das condições da ação, ele, na condição de gestor das contas de todos os aposentados e pensionistas do BANESPA, sofreria os efeitos da declaração de inalienabilidade dos ativos securitizados e de complementação dos benefícios previdenciários de acordo com a variação do IGP-DI – não poderia negociá-los e deveria calcular e pagar as prestações conforme o novo indexador.
4. A preliminar de litispendência, que progrediu, na verdade, para a de coisa julgada, não está configurada. Como se pode extrair da comparação com os elementos da ação civil pública trabalhista nº 95900-43.2005.5.02.0005, o pedido formulado na ação coletiva em discussão é diferente: a AFABESP requer a declaração de inegociabilidade dos ativos securitizados pela União na época da federalização do BANESPA e de repercussão nas complementações de aposentadorias e pensões dos funcionários admitidos até 22/05/1975. Há, na verdade, conexão entre as causas, que, porém, não leva à extinção dos processos, mas à reunião deles, prejudicada pelo trânsito em julgado da sentença proferida na ação civil pública trabalhista (artigo 55, §1º, do CPC).
5. A preliminar de nulidade da sentença não procede. A aplicação do IGP-DI como indexador das complementações de aposentadorias e pensões de funcionários admitidos até 22/05/1975 no BANESPA, sob o fundamento de que o reajuste de acordo com a majoração dos vencimentos do pessoal da ativa configura cláusula puramente potestativa, sujeita ao arbítrio do empregador, não significa fuga dos limites da lide. A validade da cláusula sempre esteve presente na lide. Ocorreu, na realidade, uma diferença de qualificação jurídica da forma de reajuste do abono mensal – cláusula puramente potestativa ou desvio de finalidade -, que não degenera o conflito de interesses no formato original e mantém a sentença nos limites das garantias processuais – inércia, contraditório e ampla defesa.
6. Quanto ao regime dos títulos públicos emitidos pela União na federalização do BANESPA e na assunção do passivo atuarial do banco, a AFABESP pretende a declaração de inalienabilidade dos ativos securitizados no processo e a consequente vinculação dos rendimentos ao abono mensal devido, que correspondem justamente à variação do IGP-DI desde a securitização do passivo atuarial. Portanto, a análise da pretensão de reajuste não deve partir da oferta do “Plano Pré-75” a todos os funcionários do BANESPA admitidos até 22/05/1975, mas do regime dos títulos públicos emitidos pela União no contexto da assunção do passivo atuarial do banco.
7. Com o refinanciamento das dívidas do Estado de São Paulo junto ao BANESPA no Programa de Apoio à Reestruturação e ao Ajuste Fiscal dos Estados (Lei nº 9.496/1997), a União assumiu expressamente o passivo atuarial do banco. Além da dívida pública mobiliária, houve a assunção de dívida contratual, como garantia de suprimento de caixa e de recuperação de liquidez da instituição financeira. Então, para operacionalizar a incorporação do passivo, a União securitizou as obrigações previdenciárias, emitindo títulos públicos com prazo de vencimento de vinte e cinco anos em favor do BANESPA. Segundo o Contrato de Assunção de Dívida, o Parecer nº 201/1997 da Secretaria do Tesouro Nacional e o registro mantido na Central de Custódia e de Liquidação Financeira de Títulos - CETIP, os títulos de código ATSP970315 eram inegociáveis e seriam corrigidos monetariamente pelo IGP-DI.
8. Conquanto naturalmente não houvesse uma vinculação real dos ativos ao pagamento das complementações de aposentadorias e pensões, a entrega dos títulos significou a mudança da fórmula de reajuste então prevista. A União assumiu expressamente o passivo atuarial do BANESPA, escriturando o respectivo valor (R$ 2,65 bilhões) e capitalizando o banco na mesma proporção, com a previsão de indexador específico. O banco ficou encarregado apenas de administrar os pagamentos, usando todos os recursos transferidos, inclusive os rendimentos a serem pagos. Ao preverem o IGP-DI como indexador nos instrumentos contratuais, a União e o Estado de São Paulo revogaram a fórmula de reajuste segundo a majoração da remuneração do pessoal em atividade, como constava do Regulamento do Pessoal do BANESPA.
9. Não faria sentido que a União assumisse o passivo atuarial e ainda remunerasse o devedor original, mediante a transferência dos rendimentos dos títulos públicos. A União capitalizou o BANESPA na dimensão necessária ao pagamento das complementações e ao reajuste, sem qualquer subsídio, o que necessariamente direciona o indexador então previsto ao abono mensal. Se a União pretendia entregar títulos livres ao próprio BANESPA, como forma de suprimento de caixa e de resgate de liquidez da instituição financeira, deveria ter previsto a nota de negociabilidade, como fez com as demais dívidas refinanciadas do Estado de São Paulo junto ao banco – certificados de depósito interbancário, débitos com o BACEN e limites de depósitos compulsórios. Não seria coerente que a União pretendesse recuperar a liquidez do BANESPA e lhe entregasse títulos inegociáveis, de grande duração.
10. A União pretendeu apenas assumir o passivo atuarial do banco em todas as dimensões, capitalizando-o na medida necessária e prevendo indexador específico não para a apropriação da instituição financeira, mas para o reajuste dos benefícios, com a revogação da fórmula então vigente.
11. Os títulos estavam vinculados ao pagamento de todas as complementações de aposentadorias e pensões dos funcionários admitidos até 22/05/1975, tanto que a parte permutada posteriormente foi entregue ao fundo de pensão do BANESPREV (Portaria nº 386/2000 da STN), mediante segregação patrimonial e incorporação de todos os produtos financeiros. O abono mensal tinha o reajuste assegurado pelos títulos emitidos pela União na assunção do passivo atuarial do BANESPA e não poderia ser prejudicado com a posterior permuta dos ativos, mediante desconsideração de todas as operações feitas no processo de federalização. Nova fórmula de reajuste foi introduzida no Programa de Apoio à Reestruturação e ao Ajuste Fiscal dos Estados e nos contratos celebrados entre todos os interessados, formando direito adquirido, ato jurídico perfeito, insuscetível de modificação por ato administrativo posterior (artigo 5º, XXXVI, da CF).
12. Não cabe a declaração de invalidade da legislação que permitiu a permuta de ativos securitizados por títulos públicos (artigo 1º, VII, da Lei nº 10.179/2001 e Decreto nº 3.540/2000). Ela só não era aplicável aos títulos vinculados ao pagamento dos aposentados e pensionistas do BANESPA, como diversamente fizeram os atos administrativos do Tesouro Nacional (Portaria nº 386/2000). Sobre eles deve recair o vício de invalidade, de violação do ato jurídico perfeito. Não se pode dizer que os títulos eram negociáveis ou que a aplicação do IGP-DI, além de violar ato jurídico perfeito já materializado no Regulamento do Pessoal do BANESPA, desembocaria no aumento de remuneração de pessoal, em detrimento das atribuições do Poder Executivo.
13. Com a declaração de inegociabilidade dos ativos securitizados, os aposentados e pensionistas que não migraram ao “Plano Pré-75” fazem jus ao reajuste das complementações segundo a variação do IGP-DI, com início na data de colocação dos títulos e com dedução naturalmente dos valores de reajustamento pagos pela regra anterior. As diferenças decorrentes devem sofrer correção monetária e juros de mora, nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal.
14. A condenação não põe em risco um princípio elementar da previdência privada, especificamente o de equilíbrio atuarial, de sustentabilidade do plano de benefícios, seja porque não se formalizou rigorosamente um plano de benefícios para os aposentados e pensionistas que não fizeram a migração, seja porque o Banco Santander S/A se apropriou dos rendimentos no ativo geral, tendo base para o pagamento. Eventual desproporção não pode ser transferida aos aposentados e pensionistas, mas à União, que assumiu o passivo atuarial do BANESPA e entregou títulos que serviriam de lastro à cobertura, com designação, inclusive, no processo de privatização.
15. Já o pedido de vinculação dos títulos originalmente emitidos ao fundo de pensão não pode ser deferido, porquanto eles foram permutados pelo Banco Santander S/A, com a autorização administrativa da União (Portaria nº 386/2000 da STN). Os ativos entregues na permuta são majoritariamente negociáveis, impedindo também qualquer vinculação.
16. A condenação deve ser cumprida nos mesmos moldes da permuta feita para os beneficiários do BANESPREV, isto é, através de permuta de títulos em poder do Banco Santander S/A por outros inegociáveis emitidos especificamente pela União, com garantia de equivalência econômica (artigo 1º, VII, da Lei nº 10.179/2001).
17. A permuta naturalmente não deve considerar o prazo original de vencimento de vinte e cinco anos iniciado em 1997, mas apenas o período que restar no cumprimento de obrigação de fazer; o reajuste das prestações anteriores já contou com a garantia do patrimônio do banco, adicionado, inclusive, da rentabilidade dos ativos securitizados, sem que houvesse qualquer inadimplência, devendo ser garantido por títulos pelo tempo remanescente (2022). Essa forma de condenação acaba por representar uma parte do pedido de vinculação dos títulos originais, mantendo os limites da petição inicial e assegurando o princípio jurisdicional da relatividade (artigo 492 do CPC). Se a associação não pode receber os ativos iniciais, deve receber substitutos com as mesmas características, a serem emitidos especificamente pela União e permutados com o Banco Santander S/A, nos termos da Lei nº 10.179/2001.
18. Em relação ao pedido de equiparação de direitos ao plano do BANESPREV, ele não tem cabimento. Como explicado ao longo do voto, a Justiça do Trabalho já negou a pretensão e a causa de pedir da ação civil pública versa sobre a inegociabilidade de títulos públicos emitidos para a assunção do passivo atuarial do BANESPA, com repercussões apenas no reajuste das complementações de aposentadorias e pensões. Os demais aspectos do Regulamento de Pessoal do BANESPA não foram alterados e continuar a governar a relação jurídica.
19. Por fim, apesar da ampliação da sucumbência dos réus, a isenção de despesas processuais e de honorários de advogado se mantém, em função do princípio da simetria e da ideia de desoneração em geral dos processos coletivos (artigo 18 da Lei nº 7.347/1985).
20. Apelação da União Federal, do Banco Santander S/A e do BANESPREV, desprovidas. Remessa oficial e apelação da AFABESP parcialmente providas.