APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0006149-10.2019.4.03.6181
RELATOR: Gab. 38 - DES. FED. FAUSTO DE SANCTIS
APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
APELADO: NELSON TAVARES MARTINS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0006149-10.2019.4.03.6181 RELATOR: Gab. 38 - DES. FED. FAUSTO DE SANCTIS APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP APELADO: NELSON TAVARES MARTINS OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS: Trata-se de Apelação interposta pela Defensoria Pública da União em favor de NELSON TAVARES MARTINS (nascido em 12.05.1939), em face da r. sentença (ID nº 161769750), que julgou IMPROCEDENTE o pedido de decreto condenatório formulado na denúncia para: ABSOLVER o réu NELSON TAVARES MARTINS da imputação da prática do delito previsto no artigo 296, §1º, III, do Código Penal, com fulcro no art. 386, VII, do Código de Processo Penal, por não existir prova suficiente para a condenação; ABSOLVER o réu NELSON TAVARES MARTINS da imputação da prática do delito previsto no art. 29, § 1º, III c.c. §4º, inciso I, da Lei nº 9.605/98, com fulcro no art. 386, VII, do Código de Processo Penal, por não existir prova suficiente para a condenação. ABSOLVER o réu NELSON TAVARES MARTINS da imputação da prática do delito previsto no artigo 32 da Lei n.º 9.605/98, com fundamento no art. 386, II, do Código de Processo Penal, ante a ausência de prova da existência do fato. Narra a denúncia (fls. 231/235 – ID nº 161769750) que: Consta do inquérito policial em anexo que NELSON TAVARES MARTINS adquiriu, apanhou, guardou e teve em cativeiro ou depósito 10 (dez) aves silvestres em situação irregular, incorrendo assim no crime do art. 29, § V, III, da Lei n0 9.605/98. Isso porque em 21 de junho de 2017, como decorrência da chamada "Operação Fibra", que investigava fraudes executadas em benefício de criadores amadores de passeriformes cadastrados no IBAMA, agentes ambientais da referida autarquia realizaram diligência fiscalizatória na residência de NELSON TAVARES MARTINS, localizada na Rua Bragança Paulista, n. 121, bairro Santo Amaro, São Paulo/SP, CEP 4727000, e, em situação de flagrância, encontraram 10 (dez) aves silvestres em situação irregular, vez que 1 (uma) delas portava anilha considerada ‘recreativa`, ou seja, inapta para a identificação legal de passeriformes nos termos da legislação e (9) nove aves portavam anilhas falsas. Convém salientar que a anilha é um documento federal materializador de um sinal público, emitido pelo IBAMA, semelhante a um anel de metal, preso à pata do animal, cujo objetivo é a identificação de passeriformes silvestres para controle do IBAMA nos termos da legislação vigente (IN 1012011). Toda ave silvestre pertencente a criador passeriforme registrado no IBAMA deve portar referido sinal público fornecido pelo113A1VIA, utilizado para comprovar que o animal que a ostenta está devidamente regularizado perante o referido órgão. Conforme relatórios de fiscalização elaborados pelo IBAMA (fls. 10/16 e 9/15 do apenso I) e pareceres técnicos do Centro de Recuperação de Animais Silvestres do Parque Ecológico do Tietê, para onde foram levadas as aves apreendidas (fis. 182/183 e 63/64 do apenso 1), os 10 (dez) animais apreendidos em poder do denunciado tratavam-se de: Assim, o denunciado incorreu também na majorante prevista no art. 29, § 4º, inciso I da Lei n. 9.605/98, vez que as três aves da espécie "bicudo", nome científico Sporophila maximilliani, apreendidas na residência do denunciado, estão ameaçadas de extinção, nos termos da Portaria do Ministério do Meio Ambiente n. 44412014 e do Decreto Estadual/SP 60.133/2014 -fls. 43 do relatório do IBAMA). Como se não bastasse, o denunciado também cometeu o crime previsto no art. 32 da lei n. 9.605/98, pois, por meio dos pareceres técnicos realizados pelo Centro de Recuperação de Animais Silvestres do Parque Ecológico do Tietê, para onde foram levadas as aves apreendidas (fis. 182/183 e 63/64 do apenso 1), verificou-se que 06 (seis) delas apresentavam sinais de maus-tratos causados pelo denunciado. Segundo os peritos do CRAS/PET, os sinais de maus-tratos abaixo elencados indicam desnutrição, tentativa constante de fuga e privação das espécies à alimentação natural adequada e exercício do vôo. Os animais encontrados em condições de maus-tratos encontram-se identificados abaixo: O denunciado NELSON TAVARES MARTINS também cometeu o crime previsto no art. 296, § 1º, III, do Código Penal, já que a falsidade de 9 (nove) das dez anilhas apreendidas e acima descritas, cada uma delas aposta à pata de uma ave, foi demonstrada por meio de laudos periciais elaborados pelo IBAMA, de fls. 52- verso/55 e fls. 9/15 -verso do apenso 1. Tais anilhas alteradas, falsificadas e cujo uso foi feito de forma indevida pelo denunciado são as de identificação Diante disso, o Ministério Público Federal denunciou NELSON TAVARES MARTINS como incurso nas penas do art. 29, § 1º, III, e art. 32, caput, ambos da Lei 9.605/1998 e art. 296, § 1º, III, do Código Penal, c.c. art. 29, § 1º, inciso III c.c. § 4º, e art. 32, caput, da Lei n. 9.605/1998, em concurso material (art. 69 do Código Penal). A denúncia foi recebida em 19.06.2019 (fls. 236/237 - ID nº161760750). Processado regularmente o feito, sobreveio a r. sentença absolutória em 19.06.2019 (fls. 236/237 – ID n. 161760750). Em suas razões de Apelação (ID nº 161761820), o Ministério Público Federal requer a reforma da r. sentença e o Réu seja condenado pelos crimes previstos nos arts. 296, § 1º, III, do CP, bem como no art. 29, § 1º, III c.c. § 4º, I, e art. 32, ambos da Lei 9065/1998. Em suas contrarrazões, a Defensoria Pública da União requer seja negado provimento ao recurso de apelação interposto pela acusação, mantendo-se a r. sentença de primeiro grau, que absolveu o acusado, ora apelado, nos termos do artigo 386, II e VII, do Código de Processo Penal. (ID nº 161761824). A Procuradoria Regional da República, em seu parecer (ID nº 161884213), opina pelo provimento do recurso ministerial. É o relatório. À revisão.
APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 0006149-10.2019.4.03.6181 RELATOR: Gab. 38 - DES. FED. FAUSTO DE SANCTIS APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP APELADO: NELSON TAVARES MARTINS OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS: Narra a denúncia (fls. 231/235 – ID nº 161769750) que: Consta do inquérito policial em anexo que NELSON TAVARES MARTINS adquiriu, apanhou, guardou e teve em cativeiro ou depósito 10 (dez) aves silvestres em situação irregular, incorrendo assim no crime do arit. 29, § V, 111 da Lei n0 9.605/98. Isso porque em 21 de junho de 2017, como decorrência da chamada "Operação Fibra", que investigava fraudes executadas em benefício de criadores amadores de passeriformes cadastrados no IBAMA, agentes ambientais da referida autarquia realizaram diligência fiscalizatória na residência de NELSON TAVARES MARTINS, localizada na Rua Bragança Paulista, n6 121, bairro Santo Amaro, São Paulo/SP, CEP 4727000, e, em situação de flagrância, encontraram 10 (dez) aves silvestres em situação irregular, vez que 1 (uma) delas portava anilha considerada 11 recreativa`, ou seja, inapta para a identificação legal de passenformes nos termos da legislação e (9) nove aves portavam anilhas falsas. Convém salientar que a anilha é um documento federal materializador de um sinal público, emitido pelo IBAMA, semelhante a um anel de metal, preso à pata do animal, cujo objetivo é a identificação de passeriformes silvestres para controle do IBAMA nos termos da legislação vigente (IN 1012011). Toda ave silvestre pertencente a criador passeriforme registrado no IBAMA deve portar referido sinal público fornecido pelo113A1VIA, utilizado para comprovar que o animal que a ostenta está devidamente regularizado perante o referido órgão. Conforme relatórios de fiscalização elaborados pelo IBAMA (fis, 10116 - verso e 9115 -verso do apenso I) e pareceres técnicos do Centro de Recuperação de Animais Silvestres do Parque Ecológico do Tietê, para onde foram levadas as aves apreendidas (fis. 1821183 e 63164 do apenso 1), os 10 (dez) animais apreendidos em poder do denunciado tratavam-se de: Assim, o denunciado incorreu também na majorante prevista no art. 29, § 4% inciso 1 da Lei n1 9.605198, vez que as três aves da espécie "bicudo", nome científico Sporophila maximilliani, apreendidas na residência do denunciado, estão ameaçadas de extinção, nos termos da Portaria do Ministério do Meio Ambiente n. 44412014 e do Decreto Estadual/SP 60.13312014 ffis. 43 do relatório do IBAMA). Como se não bastasse, o denunciado também cometeu o crime previsto no art. 32 da lei n0 9.605198, pois por meio dos pareceres técnicos realizados pelo Centro de Recuperação de Animais Silvestres do Parque Ecológico do Tietê, para onde foram levadas as aves apreendidas (fis. 1821183 e 63164 do apenso 1), verificouse'que 16 (seis) delas apresentavam sinais de maus -tratos causados pelo denunciado. Segundo os peritos do CRAS/PET, os sinais de maus -tratos abaixo elencados indicam desnutrição, tentativa constante de fuga e privação das espécies à alimentação natural adequada e exercício do vôo. Os animais encontrados em condições de maus -tratos encontram-se identificados abaixo: O denunciado NELSON TAVARES MARTINS também cometeu o crime previsto no art. 296, § 10, 111 do Código Penal, já que a falsidade de 9 (nove) das dez anilhas apreendidas e acima descritas, cada uma delas aposta à pata de uma ave, foi demonstrada por meio de laudos periciais elaborados pelo IBAMA, de fis. 52- verso/55 e fis. 9115 -verso do apenso 1. Tais anilhas alteradas, falsificadas e cujo uso foi feito de forma indevida pelo denunciado são as de identificação Diante disso, o Ministério Público Federal denunciou NELSON TAVARES MARTINS como incurso nas penas do art. 29, § 1º, III, e art. 32, caput, ambos da Lei 9.605/1998 e art. 296, § 1º, III, do Código Penal, c.c. art. 29, § 1º, inciso III c.c. § 4º, e art. 32, caput, da Lei n. 9.605/1998, em concurso material (art. 69 do Código Penal). DA OCORRÊNCIA DE PRESCRIÇÃO QUANTO AOS DELITOS DO ART. 32 E ART. 29, § 1º, III, C.C. § 4º, AMBOS DA LEI N. 9.605/1998 No caso em tela, observa-se, DE OFÍCIO, o advento da prescrição da pretensão punitiva na modalidade abstrata com relação aos delitos do art. 32 e art. 29, § 1º, III, c.c. § 4º, ambos da Lei n. 9.605/1998. A prescrição é instituto jurídico que impede, após certo lapso de tempo, o exercício da pretensão punitiva ou da pretensão executória do Estado, sendo que a extinção da punibilidade pela ocorrência de prescrição pode ser reconhecida a qualquer tempo e em qualquer grau de jurisdição, inclusive de ofício (inteligência do art. 61 do CPP). No que diz respeito à prescrição da pretensão punitiva, é oportuno salientar que, de acordo com a doutrina, esta subdivide-se em: i) abstrata (regula-se pela pena máxima cominada in abstrato), ii) superveniente ou intercorrente (que, em tendo havido trânsito em julgado para a acusação, efetiva-se pela pena in concreto, sempre após a data em que foi publicada a sentença ou acórdão condenatórios) e iii) retroativa (que ocorre pela pena in concreto, mas "para trás", isto é, em relação aos lapsos entre a consumação do delito e o recebimento da denúncia e entre este e a publicação da sentença condenatória. Atente-se que, após o advento da Lei n.º 12.234/2010, de 05.05.2010, a qual, por sua vez, somente se aplica a fatos praticados a partir de sua vigência, não se há mais de falar em prescrição retroativa relacionada ao lapso entre a consumação do delito e o recebimento da denúncia ou queixa. Tecidas estas premissas, o artigo 109, inciso V, do Código Penal estabelece que: Art. 109. A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, salvo o disposto no § 1o do art. 110 deste Código, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, verificando-se: (...) V - em quatro anos, se o máximo da pena é igual a um ano ou, sendo superior, não excede a dois (...). Já o artigo 115 do Código Penal estabelece que: Art. 115 - São reduzidos de metade os prazos de prescrição quando o criminoso era, ao tempo do crime, menor de 21 (vinte e um) anos, ou, na data da sentença, maior de 70 (setenta) anos. Analisando o caso em concreto, tem-se que o réu nasceu no ano de 1939 e conta com 82 (oitenta e dois) anos de idade sem que tenha havido ainda a prolação de sentença condenatória em seu desfavor. Com efeito, verificando-se as balizas estabelecidas pelos citados dispositivos legais, a prescrição da pretensão punitiva, deve ser reduzida à metade, e, considerada a pena máxima abstrata de 01 (um) ano para o delito do art. 32, e 01 (um) ano e 06 (seis) meses para aquele do art. 29, §4º, ambos da Lei de Crimes Ambientais, a prescrição da pretensão punitiva do réu quanto a ambos os delitos deve dar-se em 02 (dois) anos. Nesse diapasão, considerando-se que a sentença absolutória não configura marco interruptivo de prescrição, verifica-se que, entre a data do recebimento da r. denúncia (19.06.2019) e a presente data, verifica-se ter ocorrido o transcurso de lapso temporal superior a 02 (dois) anos, de modo que a pretensão da punição estatal está fulminada pela prescrição desde 19.06.2021. Ressalte-se, por fim, que a prescrição ora reconhecida não ocorreu por desídia deste gabinete de trabalho, uma vez que a sentença a quo foi proferida em 27.05.2021 e a distribuição deste feito a este Relator deu-se em 16.06.2021, apenas 03 dias antes do marco para a prescrição da pretensão punitiva, sem, portanto, o mínimo tempo hábil para que os presentes autos fossem analisados e pautados, segundo o calendário desta E. 11 ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região. Com esteio nestes fundamentos, DECLARO, de ofício, EXTINTA A PUNIBILIDADE do réu NELSON TAVARES MARTINS quanto aos delitos do art. 32 e art. 29, § 1º, III, c.c. § 4º, ambos da Lei n. 9.605/1998, nos termos do artigo 107, inciso IV (primeira figura), c.c. os artigos 109, inciso V e 115, todos do Código Penal. Remanesce, portanto, tão somente a análise da autoria e materialidade referente ao delito de uso de sinal público falsificado ou adulterado (art. 296, § 1º, inciso III, do Código Penal). DA MATERIALIDADE DO DELITO DO ART. 296 DO CÓDIGO PENAL No tocante à imputação do crime de uso de sinal falsificado, foram apreendidas nove aves na residência do acusado NELSON TAVARES MARTINS e a falsidade das anilhas IBAMA encontradas em seus tarsos foi atestada pelo Laudo n.º 005/17/U.A - BAURU/SUPES-SP/IBAMA (fls. 28/30 – ID n. 161760745), Laudo n.º 004 17/U.A. BAURU/SUPES-SP/IBAMA (fls. 85/88 – ID n. 161760748) e Relatório de Apuração de Infrações Administrativas de fls. 09/13 (ID n. 161760743), nos seguintes termos: Ademais, como bem apontado pelo r. juízo sentenciante, não há que se falar de falsidade da anilha recreativa CBV-26-6-2000-472 que foi encontrada em uma das aves "picharro", nome científico Saltator simillis, uma vez que sequer foi realizado laudo pericial de inidoneidade da referida anilha, visto que o referido código refere-se à “anilha produzida e distribuída por federação ornitológica, não seguindo os padrões estabelecidos pelo IBAMA para confecção de anilhas a partir do ano de 2001” (fl. 479), conforme descrito no Ofício n.º 158/2019/SUPES-SP de fls. 477/480. Nesse sentindo, a testemunha comum Cinthia Masumoto explicou, em juízo, que as anilhas recreativas são aquelas entregues por associações e clubes de passarinheiros e que estas possuem validade nos pássaros que foram anilhados no período em que era permitido pelo IBAMA. (IDs 47296754, 47296770, 47297240, 47297661). Assim, apesar de, ao que tudo indica, como consta na inicial acusatória, tal anilha de recreação mostrar-se incapaz de legitimar a posse de uma ave silvestre nos termos da legislação, mostrou-se impossível, no caso concreto, determinar se a referida anilha estava, ou não, em conformidade com a regulamentação, não sendo suficiente, assim, o fato de ser uma anilha recreativa suficiente, por si só, para embasar um decreto condenatório, especialmente a se considerar que não houve a produção de laudo pericial a precisar tal informação constante do Relatório de Ocorrência. Importante divisar, ainda, quanto à formação do convencimento do magistrado, que o art. 155 do Código de Processo Penal desautoriza que os elementos colhidos no inquérito policial sejam os únicos a influir no juízo de valoração probatória, sendo válida, a contrario sensu, a sua utilização quando estiverem corroborados, complementados ou reforçados pela prova judicial. No mesmo sentido, decisão desta C. 11ª Turma acerca de crime ambiental, na qual a ausência de exame de corpo de delito maculou a materialidade delitiva, in verbis: PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME AMBIENTAL. ART. 34, PARÁGRAGO ÚNICO, INCISO II, C.C ART. 36, DA LEI Nº 9.605/98. MATERIALIDADE. AUSÊNCIA DE EXAME DE CORPO DE DELITO. ABSOLVIÇÃO MANTIDA. Foi imputada ao réu a conduta de praticar atos de pesca mediante a utilização de petrecho proibido, prevista no art. 34, parágrafo único, inciso II, c.c. art. 36, ambos da Lei nº 9.605/98. No tocante à materialidade delitiva, os elementos probatórios coligidos não permitem a formação do juízo de certeza necessário para embasar um decreto condenatório. Apelação não provida. (TRF 3ª Região, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, Ap. - APELAÇÃO CRIMINAL - 71614 - 0001476-23.2015. 4.03.6113, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO, julgado em 05/06/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:12/06/2018) Dessa forma, não reconhecida a materialidade com relação à anilha de recreação "CBV-26-6-2000-472", referente ao pássaro Saltator Similis, porém constatada a devida comprovação da materialidade delitiva relacionada às demais 09 (nove) anilhas do IBAMA, que demonstraram todas elas serem falsas por adulteração, sendo que a anilha IBAMA 03104 3,2 007443 ostentava falsidade por clonagem. DA AUTORIA E DO ELEMENTO SUBJETIVO DO DOLO A autoria delitiva atribuída ao réu, bem como o elemento subjetivo exigido pelos tipos penais, igualmente restaram demonstrados pelo conjunto probatório carreado aos autos. Como já mencionado anteriormente, o Relatório de Apuração de Infrações Administrativas (fls. 09/13 ID n. 161760743) narra que, em razão da Operação deflagrada em 2014, inúmeros criadores amadoristas envolvidos em fraudes no SISPASS tiveram seus acessos ao sistema suspensos, e as anilhas de seu plantel inseridas de forma fraudulenta foram bloqueadas. As movimentações desses criadores no SISPASS foram objeto de análise por parte da Coordenação de Inteligência da Fiscalização - COINF e, a partir desta análise, gerados relatórios apontando as irregularidades cometidas. Entre os criadores que fazem parte dessa rede de pessoas que inseriram dados fraudulentos no SISPASS com o objetivo de "legalizar" animais sem origem legal foram identificados acessos vinculados ao CPF 100.064.358-15 do criador amador NELSON TAVARES MARTINS. No data dos fatos, consta do relatório ainda que a Polícia Militar Ambiental procedeu até a residência do acusado a fim de checar tais supostas irregularidades, sendo que constataram durante a visita, no plantel em nome do acusado, bem como no plantel de sua esposa que era, de fato, também da responsabilidade de NELSON TAVARES MARTINS, a existência de 09 pássaros com anilhas adulteradas, e, além disso, 36 espécimes de passeriformes silvestres nativos de diferentes espécies que constavam na relação do criador amador no SISPASS, mas que não estavam no local fiscalizado. As declarações em Juízo colhidas durante a instrução probatória, especialmente aquelas dos policiais militares ambientais que participaram da abordagem, corroboraram a descrição fática que consta na denúncia e nos autos do inquérito, e mostraram-se coerentes e harmônicas entre si e com os demais elementos probatórios colhidos, confirmando, assim, a autoria delitiva de maneira sobrejacente. Com efeito, Thiago Eduardo Bianconi, policial militar ambiental, reiterou que, a partir de informações provenientes da denominada “Operação Fibra” de atuação do IBAMA com a Polícia Federal desde 2014, receberam a informação de supostas anilhas adulteradas no plantel de NELSON TAVARES, razão pela qual se dirigiram à residência do acusado, local onde se depararam com diversas aves com anilhas adulteradas, além de outras irregularidades, tais como aves cadastradas no SISPASS que não se encontravam na residência. Cinthia Masumoto, de igual forma, confirmou o quanto alegado por seu colega de farda, afirmando que NELSON era um dos alvos de uma Operação do IBAMA que verificava possíveis anilhas falsificadas, bloqueadas no sistema por tal razão. Além das anilhas adulteradas, a policial alegou terem encontrado outras infrações de diversos outros pássaros que estavam na relação SISPASS e não estavam na casa o acusado, o que, segundo ela, demonstra que ele fazia transações fora do sistema. Além disso, NELSON também tinha outra criação amadora em sua casa, que era da esposa dele, o que também é proibido segundo a legislação regulamentadora. Por fim, a testemunha de acusação explicou que uma anilha falsa por adulteração quer dizer que a anilha é verdadeira, mas foi rompida, ou alargamento, ou achatamento, e que, in casu, a solda estava quebrada em uma delas, sendo bastante grosseiras as adulterações, e que, como criador amador, cabia ao acusado a obrigação, antes de receber o animal correto, de olhar a numeração e verificar as anilhas. Em seu termo de declarações perante a autoridade policial, o declarante alegou que: “é criador amador de passeriformes há mais de vinte anos e criador comercial aproximadamente há quinze anos, registrado no IBAMA; QUE uma equipe do IBAMA realizou fiscalização no seu endereço acima declinado a fim de verificar a regularidade dos seus pássaros; QUE, em relação ao criadouro comercial, havia trinta fêmeas e oito machos de bicudo, sendo que foram apreendidos por aquele órgão duas fêmeas e um macho; QUE na mesma ocasião foram apreendidos quatro ou cinco fêmeas e um macho de trinca ferro que o declarante criava mas que estavam registrados em nome de sua esposa MARIA HELENA MARTIINS, operada de um aneurisma há um ano; QUE o declarante afirma que estes pássaros eram seus e que somente os registrou em nome de sua esposa pois, após a ação dos fiscais do IBAMA, o acesso do declarante ao SISPASS foi bloqueado; QUE o declarante reitera e assevera que MARIA HELENA não era proprietária, destes passeriformes, que não cuidava destes e que não possuía qualquer interesse em criar pássaros, assumindo, assim, a integral responsabilidade sob estes animais; QUE MARIA HELENA foi intimada em IPL 12012017-13 para o dia 08 de novembro do corrente mês; QUE desconhece a falsidade apontada em anilhas apreendidas posto que adquiriu estes pássaros de criadores amadores e por isso supôs que estas estavam regulares; QUE não sabe informar quais foram os amadores que realizaram essas transações com o declarante, QUE o declarante afirma que toda solicitação junto ao SISPASS/IBAMA para aquisição de novas anilhas foram realizadas pelo declarante. QUE desconhece a pessoa de ICAN BARBETO (fl. 48 – ID. 161760743). Em seu interrogatório judicial, NELSON reiterou o quanto afirmado em sede policial, confirmando que é criador cadastrado no IBAMA há várias décadas, e que, ademais do criadouro amador, tinha um criadouro comercial de pássaros bicudos. Com relação às transações de pássaros, aduziu que “para não dar problema”, sempre buscava pássaros que estavam devidamente cadastrados no IBAMA e que, por tal razão, desconhecia a adulteração das anilhas. Segundo alegou, as anilhas são colocadas nos pássaros em seus primeiros dias de vida e, portanto, se há qualquer adulteração nas anilhas em questão, a responsabilidade por tais adulterações seria dos criadores que deram entrada no nascimento dos pássaros. Diante disso, ao contrário do alegado, resta nítido que o réu tinha conhecimento da adulteração das 09 (nove) anilhas em questão. O acusado já atuava há bastante tempo como criador amador de pássaros (mais de 20 anos, segundo narrado pelo próprio acusado em seu termo de declarações perante a autoridade policial), assim sendo, com conhecimento acima do homem médio, o que demonstra a larga experiência do acusado em transações de transferências e recebimentos de pássaros, reforçando que seu conhecimento acerca das exigências e especificidades das anilhas ultrapassava o senso comum, tendo plena consciência de sua responsabilidade enquanto criador amador para a devida regularização das aves perante os órgãos responsáveis. Com efeito, a norma que regulamenta a criação amadora de passeriformes é a Instrução Normativa n.º 10, de 20.09.2011, do IBAMA, vigente à época dos fatos, sendo certo que nos termos do parágrafo 4º do artigo 1º somente os sistemas de controle adotados pelo IBAMA em todo o país serão aceitos para a comprovação da legalidade das atividades de criação, manutenção, treinamentos, exposição, transporte e realização de torneios com passeriformes da fauna silvestre. Os criadores amadores e comerciais de passeriformes deverão manter atualizados os seus dados e do seu plantel por meio do SISPASS, disponível na rede mundial de computadores, no endereço eletrônico www.IBAMA.gov.br, cujo objetivo é a gestão das informações referentes às atividades de manutenção e criação de passeriformes, sendo de responsabilidade do criador as informações ali inseridas (artigo 33 da IN n.º 10, de 20.09.2011). Nestes termos, ao manter os pássaros com anilhas adulteradas ou falsificadas sem examinar a adequação e a regularidade de sua procedência e tampouco buscar regularizá-los perante a administração ambiental, incorreu conscientemente no uso espúrio dos respectivos sinais identificadores. Como criador habilitado deveria, sob qualquer ótica, ter verificado a origem legal do pássaro e o seu regular cadastro perante o IBAMA. Assim, se o recorrente se dispôs a criar pássaros e habilitou-se perante o IBAMA para tanto, tinha a obrigação de instruir-se acerca do procedimento a ser adotado e tomar as devidas cautelas no momento de adquirir pássaros, sobretudo acerca da situação das aves perante o órgão fiscalizador. Ressalte-se, a título exemplificativo, que, de acordo com o documento do IBAMA acostado à fl. 20 (ID n. 161760746), a transferência da ave que ostentava a anilha IBAMA AO 3,5 532020 ao plantel de NELSON deu-se em 2010, o que lhe dava tempo mais que suficiente para verificar adequadamente se a anilha e a transferência haviam sido feitas de maneira regular pelo antigo criador. Inclusive, o apelante em seu interrogatório foi incapaz de citar ao menos um criador do qual teria recebido pelo menos uma das 09 (nove) aves já portando anilha inidônea. De fato, como bem apontado pelas razões de Apelação ministeriais, o parecer técnico elaborado pelo CRAS-PET, instituição que recebeu as aves apreendidas, atesta que as lesões encontradas nas aves indicavam que os animais haviam sido "recém capturados na natureza com intolerância ao cativeiro" e que apresentavam "lesões recentes" causadas pela "tentativa constante de fuga" (ID 34638768 - Pág. 76). Tais fatos depõem frontalmente contra a versão do acusado de que já teria recebido as aves portando anilhas adulteradas, que teriam sido inseridas pelo criador responsável quando do nascimento das aves. Diante disso, não tendo o réu buscado qualquer outra forma de comprovação que afastasse a irregularidade da aquisição de tais aves silvestres, como notas fiscais da compra ou provas de que as aves já foram adquiridas anilhadas, razão pela qual não se desincumbiu do ônus que lhe cabia, nos termos do art. 156 do Código de Processo Penal. Nesse sentido colaciono os seguintes julgados: PENAL. PROCESSO PENAL. ART. 296, § 1º, I, DO CÓDIGO PENAL. ART. 29, § 1º, III, DA LEI N. 9.605/98. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. DOSIMETRIA. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. Materialidade e autoria comprovadas mediante prova documental. O dolo da conduta exsurge da própria condição de criador do réu, a quem é dado o conhecimento da obrigação de registrar os pássaros em seu plantel e de tê-los anilhados para controle do IBAMA. Anoto que a defesa não fez prova em sentido contrário. Reformada a dosimetria da pena para afastar os antecedentes penais e substituir a pena de prestação pecuniária. (TRF3, ACR 00084674120124036106/SP, Rel. Desembargador Federal André Nekatschalow, QUINTA TURMA julgado em 11/04/2016) PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ADULTERAÇÃO DE SELO OU SINAL PÚBLICO. CRIME AMBIENTAL. FAUNA SILVESTRE. PRESCRIÇÃO. CONSUNÇÃO INOCORRENTE. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO. DOSIMETRIA DA PENA. 1. Considerando-se que a prescrição da pretensão punitiva incide sobre cada crime isoladamente (CP, art. 119), as penas aplicadas prescrevem, respectivamente, em 4 (quatro) anos e em 3 (três) anos, nos termos do art. 109, V e VI, do Código Penal. Assim, tendo transcorrido período de tempo superior a 3 (três) anos entre a data da publicação da sentença penal condenatória (24.08.2016) e o presente momento, operou-se a prescrição da pretensão punitiva estatal pela pena aplicada para crime do art. 29, § 1º, III, da Lei nº 9.605/98. 2. Os delitos imputados ao acusado tutelam bens jurídicos diversos e decorrem de condutas igualmente diversas, não se podendo falar em absorção de um crime pelo outro. Além disso, para a manutenção irregular de espécimes silvestres, a falsificação ou adulteração de anilhas não é essencial, razão pela qual o delito previsto no art. 296, § 1º, I do Código Penal não exaure a sua potencialidade lesiva na prática de guarda de espécime silvestre sem a devida autorização, até porque tem pena mais grave do que aquela prevista para o crime ambiental. Princípio da consunção não aplicável. Precedentes da Turma. 3. A conduta de falsificar, adulterar ou alterar anilhas amolda-se ao tipo penal descrito no art. 296, § 1º, I, do Código Penal, uma vez que se trata de identificação sequenciada fornecida exclusivamente por órgão público, tendo como escopo auxiliar a fiscalização da criação, posse e comercialização de animais silvestres pela autoridade ambiental. Enquadra-se no critério de selo público. 4. Materialidade, autoria e dolo comprovados quanto ao crime previsto no art. 296, § 1º, III, do Código Penal. 5. A tese de falsificação grosseira e, por consequência, de crime impossível é infirmada pelo laudo pericial. 6. O apelante possuía carteira de criador amador de passeriformes, não se tratando, por isso, de pessoa leiga no assunto. Tinha o dever de conferir a regularidade da anilha de cada ave que estava em sua posse e de manter apenas pássaros devidamente anilhados. Quanto à falsificação, foi-lhe imputada a conduta de fazer uso de selo ou sinal falsificado. Criador registrado no IBAMA, agiu, no mínimo, com dolo eventual. 7. Dosimetria da pena mantida. 8. Apelações desprovidas. (TRF 3ª Região, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, ApCrim - APELAÇÃO CRIMINAL - 70035 - 0000593-41.2014.4.03.6136, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL NINO TOLDO, julgado em 23/04/2020, e-DJF3 Judicial 1 DATA:07/05/2020) APELAÇÃO CRIMINAL. ART. 29, §1º, III DA LEI 9.605/98. ART. 296, §1º, I DO CP. PRELIMINAR REJEITADA. CARÁTER NEGOCIAL DO ANPP. INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. EMENDATIO LIBELLI. USO DE SINAL PÚBLICO ADULTERADO. DOSIMETRIA. CONCURSO FORMAL. FIXAÇÃO DO PATAMAR DE AUMENTO CONFORME O NÚMERO DE INFRAÇÕES PRATICADAS. RECURSO DESPROVIDO. O Juízo da 7ª Vara Federal de Ribeirão Preto condenou o réu pela prática do crime do artigo 296, II, do CP, em concurso formal, e pelo cometimento do delito do art. 29, §1º, III, da Lei 9.605198, mas em relação a esse último crime houve a concessão do perdão judicial, nos termos do art. 29, §2º da Lei 9.605/98. O ANPP - Acordo de Não Persecução Penal foi incluído no Código de Processo Penal, em seu art. 28-A, pela Lei nº 13.964/2019, que entrou em vigor após a prolação da sentença condenatória nos presentes autos, razão pela qual não há nulidade a ser reconhecida. Nesta Corte, o Ministério Público Federal manifestou-se pela inviabilidade de oferecimento de proposta de ANPP e pugnou pelo regular prosseguimento do feito. O oferecimento de ANPP não é direito público subjetivo do investigado. Ao revés, tal instituto constitui poder-dever do titular da ação penal, a quem cabe analisar a possibilidade de sua aplicação. Diante disso, não cabe qualquer manifestação desta Corte quanto ao tema, dado esse caráter negocial do ANPP, que pressupõe a atuação da defesa e da acusação (ao Poder Judiciário cabe a verificação das condições e sua viabilidade e, se o caso, a homologação judicial). Os tipos penais do art. 296 do CP e art. 29 da Lei 9.605/98 tutelam bens jurídicos distintos (o primeiro, a fé pública; o segundo, o meio ambiente ecologicamente equilibrado, destacadamente, a fauna silvestre), além de decorrerem de condutas diversas e autônomas, razão pela qual não se vislumbra, na presente hipótese, a incidência do princípio da consunção. Extrai-se do laudo pericial que, embora verdadeiras, as anilhas estavam violadas, o que comprova a adulteração. Tais anilhas foram utilizadas em quatro pássaros silvestres em relação aos quais o réu não detinha autorização para criação. As imagens constantes do laudo demonstram claramente a existência de um corte na parede das anilhas. As anilhas oficiais fornecidas pelo IBAMA aos criadores amadores de pássaros são consideradas sinais públicos de identificação. No que se refere ao delito do art. 296, II do CP, mostra-se necessária a modificação da capitulação jurídica atribuída na denúncia, para que o réu seja condenado pelo uso de sinal falsificado, conduta que se amolda ao tipo penal do art. 296, §1º, I do CP, e que está devidamente descrita na denúncia, sendo perfeitamente cabível a modificação da classificação jurídica neste momento processual, considerando que o réu se defende dos fatos e não da capitulação jurídica. Não há óbice em relação à aplicação da emendatio libelli em segundo grau, ainda que em exame de recurso exclusivo da defesa, desde que respeitado o montante final da pena fixada no édito recorrido, sob pena de inaceitável ofensa ao princípio do ne reformatio in pejus, e em linha com a prescrição do artigo 617 do Código de Processo Penal. O réu possui larga experiência enquanto criador amador de passeriformes registrado no IBAMA há mais de quinze anos, com pleno conhecimento tanto em relação à proibição de adulterar a anilha fornecida pelo IBAMA como de utilizá-la em ave diversa. Devidamente demonstrados a materialidade, autoria e dolo do apelante em relação à prática delitiva tipificada no artigo 296, §1º, I do CP e no artigo 29, § 1º, III da Lei 9.605/98. Dosimetria. A fração de aumento decorrente do concurso formal de delitos deve ser fixada considerando a quantidade de infrações penais cometidas. Apelação desprovida. (TRF 3ª Região, 11ª Turma, ApCrim - APELAÇÃO CRIMINAL - 0009031-27.2015.4.03.6102, Rel. Desembargador Federal JOSE MARCOS LUNARDELLI, julgado em 30/04/2021, Intimação via sistema DATA: 04/05/2021) PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ART. 296, §1º, INC. I, DO CP. USO DE SINAL FALSIFICADO. ANILHA. ART. 29, §1º, INC. III, DA LEI 9.605/98. CRIME CONTRA FAUNA. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO COMPROVADOS. DOSIMETRIA DAS PENAS MANTIDAS. RESIGNAÇÃO DA DEFESA. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. A materialidade dos crimes restou devidamente demonstrada pelo Auto de Apresentação e Apreensão, pelo Boletim de Ocorrência, pelo Auto de Infração Ambiental, pelo Termo de Entrega de Materiais) e pelo Laudo Pericial, que atestou a falsidade ou adulteração das anilhas encontradas nos pássaros apreendidos em poder do apelante. 2. Autoria e dolo comprovados pelo conjunto probatório carreado nos autos. 3. Sendo o réu um criador de pássaros, tem como dever, além de conferir o número e a regularidade da anilha ao adquirir cada ave, o de registrar todo o seu plantel junto ao IBAMA. Em assim sendo, não é crível que o réu não tivesse o conhecimento de que seus pássaros estavam com anilha falsas e/ou adulteradas e que outros sequer estavam registrados em seu nome. 4. Não há como se acolher a tese de erro de proibição do acusado, de modo a afastar o elemento subjetivo do tipo (o dolo), sobretudo porque o compulsar dos autos revela que o réu já esteve envolvido em fatos similares aos que ora estão sendo julgados, o que foi admitido em juízo por ele próprio, o que evidencia a consciência do réu quanto à ilicitude de sua conduta. 5. Ao não averiguar a regularidade das anilhas dos seus pássaros, tampouco de registrar devidamente a totalidade do seu plantel, pode-se afirmar que, no mínimo, o réu assumiu o risco do resultado, ensejando a condenação, ainda que pela caracterização do dolo eventual. 6. Dosimetria das penas mantidas. 7. Recurso não provido. (ACR 00020071120124036115, DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO FONTES, TRF3 - QUINTA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:25/11/2016) Ressalte-se que, ademais dos pássaros com anilhas adulteradas, o acusado ostentava diversas irregularidades outras a indicar trocas de aves fora do sistema como o fato de constar em seu plantel do SISPASS 36 (trinta e seis) aves que não estavam em sua residência no dia da abordagem. Inclusive, a título exemplificativo, a anilha IBAMA AO 3,5 602103, além de constar com anilha adulterada, ainda estava fora do plantel do acusado, caindo por terra, assim, qualquer alegação de que desconhecia que guardava a referida ave ao arrepio da legislação. Pesa em seu desfavor, ademais, o fato de que das 41 (quarenta e uma) aves existentes no plantel em seu nome, apenas uma estava em situação regular, conforme consta do Relatório de Apuração de Infração Administrativa, o que também demonstra plena ciência e desrespeito contumaz e deliberado às normas regulamentadoras do órgão ambiental. Ademais, como bem apontado pelo Ministério Público Federal em suas razões de Apelação, o réu não era apenas um criador amador bastante experiente, registrado junto ao IBAMA há décadas, como também era um criador profissional focado em comércio de aves, de forma que a alegação de que desconhecia a inidoneidade das anilhas apreendidas em seu poder mostra-se amplamente inverossímil. Não há que se falar, portanto, em ausência de dolo por parte do acusado. Verifica-se, portanto, que o conjunto probatório foi conclusivo no sentido de que a conduta perpetrada pelo réu se amolda perfeitamente ao tipo penal delineado no artigo 296, § 1º, inciso III, do Código Penal. DOSIMETRIA DA PENA O cálculo da pena deve atentar aos critérios dispostos no artigo 68 do Código Penal, de modo que, na primeira etapa da dosimetria, observando as diretrizes do artigo 59 do Código Penal, o magistrado deve atentar à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao comportamento da vítima, e estabelecer a quantidade de pena aplicável, dentro de uma discricionariedade juridicamente vinculada, a partir de uma análise individualizada e simultânea de todas as circunstâncias judiciais. Na segunda fase de fixação da pena, o juiz deve considerar as agravantes e atenuantes, previstas nos artigos 61 a 66, todos do Código Penal. Finalmente, na terceira etapa, incidem as causas de diminuição e de aumento da pena. Na primeira fase da dosimetria penal, ponderadas as circunstâncias judiciais, verifica-se que não existem fatores hábeis a justificar a imposição da reprimenda acima do mínimo legal, que já se mostra patamar suficiente para a repressão e prevenção do delito, restando prudentemente dimensionada em 02 (dois) anos de reclusão. Na segunda e terceira fases, não havendo, circunstâncias agravantes ou atenuantes, bem como causas de aumento ou de diminuição capazes de incidir na espécie, a pena corporal torna-se definitiva em 02 (dois) anos de reclusão. Pena de Multa Atendendo ao caráter proporcional face à pena privativa de liberdade, a pena de multa deve ser fixada em 10 (dez) dias-multa, no valor unitário de 1/30 do salário mínimo vigente à época dos fatos, atualizado monetariamente. DO REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DE PENA O regime inicial de cumprimento de pena a ser reconhecido deve ser o regime ABERTO ante a pena definitiva estabelecida e a primariedade e circunstâncias do caso concreto, nos termos do art. 33, § 2º, alínea “c”, e § 3º do Código Penal. DA SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR PENAS RESTRITIVAS DE DIREITO Presentes os requisitos legais, deve ser concedida ao réu a substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direito, consistentes em prestação de serviços à comunidade, pelo mesmo prazo da pena substituída, e prestação pecuniária no importe de 01 (um) salário-mínimo, ambas em favor de entidade beneficente designada pelo Juízo da Execução Penal. DISPOSITIVO Ante o exposto, voto por declarar, DE OFÍCIO, EXTINTA A PUNIBILIDADE do réu NELSON TAVARES MARTINS quanto aos delitos do art. 32 e art. 29, § 1º, III, c.c. § 4º, ambos da Lei n. 9.605/1998, nos termos do artigo 107, inciso IV (primeira figura), c.c. os artigos 109, inciso V e 115, todos do Código Penal, e para DAR PARCIAL PROVIMENTO à Apelação do Ministério Público Federal para condenar o réu quanto ao delito do art. 296, § 1º, inciso III, do Código Penal, restando sua pena definitiva fixada em 02 (dois) anos de reclusão, em regime inicial ABERTO, além de 10 (dez) dias-multa, cada qual no valor unitário de 1/30 do salário-mínimo vigente à época dos fatos, atualizado monetariamente, e substituída a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, quais sejam, prestação de serviços à comunidade, pelo mesmo prazo da pena substituída, e prestação pecuniária no importe de 01 (um) salário-mínimo, ambas em favor de entidade beneficente designada pelo Juízo da Execução Penal. É o voto. Comunique-se o Juízo das Execuções Penais.
E M E N T A
PENAL. PROCESSUAL PENAL. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE QUANTO AOS DELITOS DO ART. 29 E ART. 32 DA LEI 9.605/1998. RÉU MAIOR DE 70 ANOS. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. PRESCRIÇÃO ABSTRATA. MATERIALIDADE COMPROVADA COM RELAÇÃO A NOVE ANILHAS IBAMA. AUTORIA DELITIVA COMPROVADA. DOLO COMPROVADO. ART. 296, § 1º, III, DO CÓDIGO PENAL. CONDENAÇÃO. DOSIMETRIA DA PENA. PENA NO MÍNIMO LEGAL. REGIME INICIAL ABERTO. SUBSTITUIÇÃO DE PENA RESTRITIVA DE DIREITOS. APELAÇÃO MINISTERIAL PARCIALMENTE PROVIDA.
- A prescrição é instituto jurídico que impede, após certo lapso de tempo, o exercício da pretensão punitiva ou da pretensão executória do Estado, sendo que a extinção da punibilidade pela ocorrência de prescrição pode ser reconhecida a qualquer tempo e em qualquer grau de jurisdição, inclusive de ofício (inteligência do art. 61 do CPP).
- Analisando o caso em concreto, tem-se que o réu nasceu no ano de 1939 e conta com 82 (oitenta e dois) anos de idade sem que tenha havido ainda a prolação de sentença condenatória em seu desfavor. Com efeito, verificando-se as balizas estabelecidas pelos citados dispositivos legais, a prescrição da pretensão punitiva, deve ser reduzida à metade, e, considerada a pena máxima abstrata de 01 (um) ano para o delito do art. 32, e 01 (um) ano e 06 (seis) meses para aquele do art. 29, §4º, ambos da Lei de Crimes Ambientais, a prescrição da pretensão punitiva do réu quanto a ambos os delitos deve dar-se em 02 (dois) anos.
- Nesse diapasão, considerando-se que a sentença absolutória não configura marco interruptivo de prescrição, verifica-se que, entre a data do recebimento da r. denúncia (19.06.2019) e a presente data, verifica-se ter ocorrido o transcurso de lapso temporal superior a 02 (dois) anos, de modo que a pretensão da punição estatal está fulminada pela prescrição desde 19.06.2021.
- No tocante à imputação do crime de uso de sinal falsificado, foram apreendidas nove aves na residência do acusado NELSON TAVARES MARTINS e a falsidade das anilhas IBAMA encontradas em seus tarsos foi atestada pelo Laudo n.º 005/17/U.A - BAURU/SUPES-SP/IBAMA (fls. 28/30 – ID n. 161760745), Laudo n.º 004 17/U.A. BAURU/SUPES-SP/IBAMA (fls. 85/88 – ID n. 161760748) e Relatório de Apuração de Infrações Administrativas de fls. 09/13 (ID n. 161760743). Ademais, como bem apontado pelo r. juízo sentenciante, não há que se falar de falsidade da anilha recreativa CBV-26-6-2000-472 que foi encontrada em uma das aves "picharro", nome científico Saltator simillis, uma vez que sequer foi realizado laudo pericial de inidoneidade da referida anilha, visto que o referido código refere-se à “anilha produzida e distribuída por federação ornitológica, não seguindo os padrões estabelecidos pelo IBAMA para confecção de anilhas a partir do ano de 2001” (fl. 479), conforme descrito no Ofício n.º 158/2019/SUPES-SP de fls. 477/480. Nesse sentindo, a testemunha comum Cinthia Masumoto explicou, em juízo, que as anilhas recreativas são aquelas entregues por associações e clubes de passarinheiros e que estas possuem validade nos pássaros que foram anilhados no período em que era permitido pelo IBAMA. (IDs 47296754, 47296770, 47297240, 47297661).
- As declarações em Juízo colhidas durante a instrução probatória, especialmente aquelas dos policiais militares ambientais que participaram da abordagem, corroboraram a descrição fática que consta na denúncia e nos autos do inquérito, e mostraram-se coerentes e harmônicas entre si e com os demais elementos probatórios colhidos, confirmando, assim, a autoria delitiva de maneira sobrejacente.
- Resta nítido que o réu tinha conhecimento da adulteração das 09 (nove) anilhas em questão. O acusado já atuava há bastante tempo como criador amador de pássaros (mais de 20 anos, segundo narrado pelo próprio acusado em seu termo de declarações perante a autoridade policial), assim sendo, com conhecimento acima do homem médio, o que demonstra a larga experiência do acusado em transações de transferências e recebimentos de pássaros, reforçando que seu conhecimento acerca das exigências e especificidades das anilhas ultrapassava o senso comum, tendo plena consciência de sua responsabilidade enquanto criador amador para a devida regularização das aves perante os órgãos responsáveis.
- Os criadores amadores e comerciais de passeriformes deverão manter atualizados os seus dados e do seu plantel por meio do SISPASS, disponível na rede mundial de computadores, no endereço eletrônico www.IBAMA.gov.br, cujo objetivo é a gestão das informações referentes às atividades de manutenção e criação de passeriformes, sendo de responsabilidade do criador as informações ali inseridas (artigo 33 da IN n.º 10, de 20.09.2011).
- Nestes termos, ao manter os pássaros com anilhas adulteradas ou falsificadas sem examinar a adequação e a regularidade de sua procedência e tampouco buscar regularizá-los perante a administração ambiental, incorreu conscientemente no uso espúrio dos respectivos sinais identificadores. Como criador habilitado deveria, sob qualquer ótica, ter verificado a origem legal do pássaro e o seu regular cadastro perante o IBAMA. Assim, se o recorrente se dispôs a criar pássaros e habilitou-se perante o IBAMA para tanto, tinha a obrigação de instruir-se acerca do procedimento a ser adotado e tomar as devidas cautelas no momento de adquirir pássaros, sobretudo acerca da situação das aves perante o órgão fiscalizador.
- Ressalte-se, a título exemplificativo, que, de acordo com o documento do IBAMA acostado à fl. 20 (ID n. 161760746), a transferência da ave que ostentava a anilha IBAMA AO 3,5 532020 ao plantel de NELSON deu-se em 2010, o que lhe dava tempo mais que suficiente para verificar adequadamente se a anilha e a transferência haviam sido feitas de maneira regular pelo antigo criador. Inclusive, o apelante em seu interrogatório foi incapaz de citar ao menos um criador do qual teria recebido pelo menos uma das 09 (nove) aves já portando anilha inidônea. De fato, como bem apontado pelas razões de Apelação ministeriais, o parecer técnico elaborado pelo CRAS-PET, instituição que recebeu as aves apreendidas, atesta que as lesões encontradas nas aves indicavam que os animais haviam sido "recém capturados na natureza com intolerância ao cativeiro" e que apresentavam "lesões recentes" causadas pela "tentativa constante de fuga" (ID 34638768 - Pág. 76). Tais fatos depõem frontalmente contra a versão do acusado de que já teria recebido as aves portando anilhas adulteradas, que teriam sido inseridas pelo criador responsável quando do nascimento das aves.
- Diante disso, não tendo o réu buscado qualquer outra forma de comprovação que afastasse a irregularidade da aquisição de tais aves silvestres, como notas fiscais da compra ou provas de que as aves já foram adquiridas anilhadas, razão pela qual não se desincumbiu do ônus que lhe cabia, nos termos do art. 156 do Código de Processo Penal.
- Ademais, como bem apontado pelo Ministério Público Federal em suas razões de Apelação, o réu não era apenas um criador amador bastante experiente, registrado junto ao IBAMA há décadas, como também era um criador profissional focado em comércio de aves, de forma que a alegação de que desconhecia a inidoneidade das anilhas apreendidas em seu poder mostra-se amplamente inverossímil. Não há que se falar, portanto, em ausência de dolo por parte do acusado. Verifica-se, portanto, que o conjunto probatório foi conclusivo no sentido de que a conduta perpetrada pelo réu se amolda perfeitamente ao tipo penal delineado no artigo 296, § 1º, inciso III, do Código Penal.
- Na primeira fase da dosimetria penal, ponderadas as circunstâncias judiciais, verifica-se que não existem fatores hábeis a justificar a imposição da reprimenda acima do mínimo legal, que já se mostra patamar suficiente para a repressão e prevenção do delito, restando prudentemente dimensionada em 02 (dois) anos de reclusão.
- Na segunda e terceira fases, não havendo, circunstâncias agravantes ou atenuantes, bem como causas de aumento ou de diminuição capazes de incidir na espécie, a pena corporal torna-se definitiva em 02 (dois) anos de reclusão.
- Atendendo ao caráter proporcional face à pena privativa de liberdade, a pena de multa deve ser fixada em 10 (dez) dias-multa, no valor unitário de 1/30 do salário-mínimo vigente à época dos fatos, atualizado monetariamente.
- O regime inicial de cumprimento de pena a ser reconhecido deve ser o regime ABERTO ante a pena definitiva estabelecida e a primariedade e circunstâncias do caso concreto, nos termos do art. 33, § 2º, alínea “c”, e § 3º, do Código Penal.
- Presentes os requisitos legais, deve ser concedida ao réu a substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade, pelo mesmo prazo da pena substituída, e prestação pecuniária no importe de 01 (um) salário-mínimo, ambas em favor de entidade beneficente designada pelo Juízo da Execução Penal.
- Apelação do Ministério Público Federal parcialmente provida.