APELAÇÃO (198) Nº 5001087-61.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. MARISA SANTOS
APELANTE: SABRINA DE AVILA FERREIRA
Advogado do(a) APELANTE: KETHI MARLEM FORGIARINI VASCONCELOS - MS1062500A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELAÇÃO (198) Nº 5001087-61.2017.4.03.9999 RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. MARISA SANTOS APELANTE: SABRINA DE AVILA FERREIRA Advogado do(a) APELANTE: KETHI MARLEM FORGIARINI VASCONCELOS - MS1062500A APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO Advogado do(a) APELADO: R E L A T Ó R I O A Desembargadora Federal MARISA SANTOS (RELATORA): Ação ajuizada contra o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), objetivando a concessão de pensão por morte de SUELI MARIA SILVA AVILA, falecida em 11.04.2015. Narra a inicial que a autora é neta da falecida, sendo sua dependente. Noticia que, desde o nascimento, vivia sob guarda da avó. O Juízo de 1º grau julgou improcedente o pedido e condenou a autora em custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 10% do valor da causa, observando-se o disposto no art. 98, §3º do CPC/2015. A autora apela, sustentando, em síntese, que é devida a pensão por morte ao menor sob guarda. Com contrarrazões, subiram os autos. Nesta Corte, o Ministério Público Federal opinou pelo provimento da apelação. É o relatório.
Advogado do(a) PROCURADOR:
DECLARAÇÃO DE VOTO Com a devida vênia, divirjo da E. Relatora. Trata-se de ação objetivando a concessão de pensão por morte à autora, menor incapaz, em decorrência do óbito de sua avó materna. A falecida segurada detinha a guarda definitiva da autora definitiva, conforme termo acostado no ID 44581. O Juízo a quo promoveu o julgamento antecipado da lide ao fundamento de ausência de amparo legal quanto ao reconhecimento da qualidade de dependente, para fins previdenciários, do menor sob guarda do segurado. Destarte, foi dispensada a regular produção de provas. A condição de dependentes é verificada com amparo no rol estabelecido pelo art. 16 da Lei de Benefícios, segundo o qual possuem dependência econômica presumida o cônjuge, o(a) companheiro(a) e o filho menor de 21 (vinte e um) anos, não emancipado ou inválido. Também ostentam a condição de dependente do segurado, desde que comprovada a dependência econômica, os pais e o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido. De acordo com o § 2º do supramencionado artigo, o enteado e o menor tutelado são equiparados aos filhos mediante declaração do segurado e desde que comprovem a dependência econômica. Impende considerar, aprioristicamente, que o menor sob guarda deixou de ser considerado dependente com a edição da Medida Provisória n.º 1.523, de 11 de outubro de 1996, a qual foi convertida na Lei n.º 9.528/97. Esse comando normativo encontra aparente conflito com o art. 33 do Estatuto da Criança e do Adolescente, (Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990), in verbis: "Art. 33. A guarda obriga a prestação de assistência material, moral e educacional à criança ou adolescente, conferindo a seu detentor o direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais. § 1º A guarda destina-se a regularizar a posse de fato, podendo ser deferida, liminar ou incidentalmente, nos procedimentos de tutela e adoção, exceto no de adoção por estrangeiros. § 2º Excepcionalmente, deferir-se-á a guarda, fora dos casos de tutela e adoção, para atender a situações peculiares ou suprir a falta eventual dos pais ou responsável, podendo ser deferido o direito de representação para a prática de atos determinados. § 3º A guarda confere à criança ou adolescente a condição de dependente, para todos os fins e efeitos de direito, inclusive previdenciários" (grifei). Acerca da matéria, inicialmente, trago à colação o entendimento firmado pela Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento de caso semelhante, no sentido de que ao menor sob guarda deve ser assegurado o benefício de pensão por morte, em virtude da prevalência do disposto no artigo 33, § 3º do Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA sobre norma previdenciária específica, confira-se: "PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PENSÃO POR MORTE. MENOR SOB GUARDA JUDICIAL. APLICABILIDADE DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE - ECA. INTERPRETAÇÃO COMPATÍVEL COM A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E COM O PRINCÍPIO DE PROTEÇÃO INTEGRAL DO MENOR. 1. Caso em que se discute a possibilidade de assegurar benefício de pensão por morte a menor sob guarda judicial, em face da prevalência do disposto no artigo 33, § 3º, do Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA, sobre norma previdenciária de natureza específica. 2. Os direitos fundamentais da criança e do adolescente têm seu campo de incidência amparado pelo status de prioridade absoluta, requerendo, assim, uma hermenêutica própria comprometida com as regras protetivas estabelecidas na Constituição Federal e no Estatuto da Criança e do Adolescente. 3. A Lei 8.069/90 representa política pública de proteção à criança e ao adolescente, verdadeiro cumprimento da ordem constitucional, haja vista o artigo 227 da Constituição Federal de 1988 dispor que é dever do Estado assegurar com absoluta prioridade à criança e ao adolescente o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. 4. Não é dado ao intérprete atribuir à norma jurídica conteúdo que atente contra a dignidade da pessoa humana e, consequentemente, contra o princípio de proteção integral e preferencial a crianças e adolescentes, já que esses postulados são a base do Estado Democrático de Direito e devem orientar a interpretação de todo o ordenamento jurídico. 5. Embora a lei complementar estadual previdenciária do Estado de Mato Grosso seja lei específica da previdência social, não menos certo é que a criança e adolescente tem norma específica, o Estatuto da Criança e do Adolescente que confere ao menor sob guarda a condição de dependente para todos os efeitos, inclusive previdenciários (art. 33, § 3º, Lei n.º 8.069/90), norma que representa a política de proteção ao menor, embasada na Constituição Federal que estabelece o dever do poder público e da sociedade na proteção da criança e do adolescente (art. 227, caput, e § 3º, inciso II). 6. Havendo plano de proteção alocado em arcabouço sistêmico constitucional e, comprovada a guarda, deve ser garantido o benefício para quem dependa economicamente do instituidor. 7. Recurso ordinário provido. (STJ, Primeira Seção, RMS 36034/MT, Relator Ministro Benedito Gonçalves, DJe - 15/04/2014). A aplicação de tal entendimento procede-se mediante a verificação fática da dependência econômica do menor sob guarda, uma vez que os comandos legais em comento não estão a colidir, senão a trazer equilíbrio jurídico à relação intersubjetiva que se estabelece entre o menor e o Instituto Autárquico, visto que ambos são detentores de direitos indisponíveis. Dessa forma, o art. 33 do Estatuto da Criança e do Adolescente e o § 2º do art. 16 da Lei de Benefícios, com redação alterada pela Lei 9.528/97, não discrepam na essência, embora o enfoque teleológico de cada dispositivo seja diverso. Ou seja, enquanto ambas as normas encontram seu nascedouro nos princípios constitucionais de proteção à Ordem Social, é certo que o art. 33 da Lei 8.069/90 tem sua tônica na tutela dos interesses do menor, enquanto o § 2º do art. 16 da Lei de Benefícios ressalta a necessidade de verificação de dependência econômica, a fim de não a ter por presumida. Portanto, mister se faz análise individualizada de cada situação fática, no intuito de se adequar à legislação aplicável, ainda mais porque a autora, ora se encontra sob guarda da tia, de modo a presumir que não se encontra, de fato, amparada pelos seus genitores. Ante o exposto, voto por anular a sentença, a fim de que seja promovida a regular audiência de instrução, com a devida oitiva de testemunhas, como também produzidas demais provas pertinentes, a fim de se auferir a efetiva dependência econômica da autora perante a segurada falecida. GILBERTO JORDAN DESEMBARGADOR FEDERAL
APELAÇÃO (198) Nº 5001087-61.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. MARISA SANTOS
APELANTE: SABRINA DE AVILA FERREIRA
Advogado do(a) APELANTE: KETHI MARLEM FORGIARINI VASCONCELOS - MS1062500A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
Advogado do(a) APELADO:
Advogado do(a) PROCURADOR:
V O T O
A Desembargadora Federal MARISA SANTOS (RELATORA):
Em matéria de pensão por morte, o princípio segundo o qual tempus regit actum impõe a aplicação da legislação vigente na data do óbito do segurado.
O evento morte está comprovado com a certidão de óbito, juntada às fls. 18.
Considerando que o falecimento ocorreu em 2015, aplica-se a Lei nº 8.213/91.
A qualidade de segurada da falecida não é questão controvertida nos autos, mas está comprovada, eis que era beneficiária de aposentadoria por idade (NB 134.808.913-7).
Cabe apurar, então, se a parte autora era dependente da falecida na data do óbito.
Foi juntado o Termo de Guarda, com data de 26.01.2011, onde consta que a falecida assumiu a guarda definitiva da autora (fl. 17).
Na redação original, o §2º do art. 16 da Lei nº 8.213/91 equiparava a filho o menor sob guarda por determinação judicial.
O § 2º foi alterado pela MP nº 1.536/96, convertida na Lei nº 9.528/97, e o menor sob guarda judicial deixou de ter a condição de dependente.
Surgiu, então, a questão: os menores que estavam sob a guarda judicial do segurado antes da modificação legislativa, tendo este falecido depois, teriam direito adquirido à condição de dependente?
O direito adquirido, nessa hipótese, não está configurado porque a relação jurídica entre dependente e previdência só se forma quando o segurado morre ou é recolhido à prisão.
Ademais, já se disse, o princípio tempus regit actum impõe seja aplicada a legislação vigente na data do óbito do segurado.
No caso, o óbito da segurada ocorreu em 11.04.2015, após, portanto, a modificação do § 2º do art. 16 pela Lei nº 9.528/97, razão pela qual não haveria direito adquirido a invocar.
Entretanto, em razão de decisões proferidas em Ações Civis Públicas ajuizadas pelo Ministério Público Federal, o INSS editou a IN INSS/D nº 106, de 14.04.2004, que estabeleceu que os menores sob guarda judicial continuavam mantendo a condição de dependente mesmo após a publicação da Lei nº 9.528/97, nos Estados de São Paulo, Minas Gerais, Sergipe e Tocantins.
Ocorre, contudo, que o STJ cassou a liminar concedida nos autos da Ação Civil Pública 97.0057902-6, que tramitou na 7ª Vara Federal Previdenciária de São Paulo - SP.
O acórdão proferido no REsp 773.944 - SP, Proc. 2005/0135286-6 (5ª Turma), de relatoria do Min. Arnaldo Esteves Lima, publicado no DJE de 18.05.2009, foi lavrado nos seguintes termos:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. PENSÃO POR MORTE. MENOR DESIGNADO. LEI 8.069/90 (ECA). NÃO-APLICAÇÃO. ENTENDIMENTO DA TERCEIRA SEÇÃO. LEI 9.528/97. INCIDÊNCIA. OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO TEMPUS REGIT ACTUM. RESSALVA PESSOAL DO RELATOR. RECURSO PROVIDO.
1. A Terceira Seção deste Tribunal pacificou o entendimento no sentido de que, em se tratando de menor sob guarda designado como dependente de segurado abrangido pelo Regime Geral da Previdência Social, a ele não se aplicam as disposições previdenciárias do Estatuto da Criança e do Adolescente. Ressalva de ponto de vista pessoal do relator.
2. Recurso especial provido.
Tendo o STJ pacificado entendimento no sentido de que as disposições previdenciárias do ECA não se aplicam ao menor sob guarda, não há como acolher a pretensão da autora.
Por outro lado, o art. 3º da Instrução Normativa INSS/DC Nº 106 - de 14/04/2004, publicada no DOU de 15/04/2004, estabeleceu expressamente que "os efeitos deste Ato são restritos aos Estados de Minas Gerais, São Paulo, Sergipe e Tocantins, onde ficam suspensas, enquanto vigorarem as respectivas decisões judiciais, a aplicação dos artigos 15, 233, 271 e 290 da Instrução Normativa nº 95 INSS/DC, de 7 de outubro de 2003, e os seus procedimentos devem ser aplicados em todos os processos de benefícios pendentes de decisão final, quer em primeira instância administrativa, quer em instância recursal, bem como para os pedidos de revisão de benefícios" (grifei).
Portanto, tendo o STJ cassado a liminar concedida nos autos da Ação Civil Pública nº 97.0057902-6, que tramitou na 7ª Vara Federal Previdenciária de São Paulo - SP, não prevalece a tese sustentada na inicial, razão pela qual deve ser mantida a improcedência do pedido inicial.
Em razão da sucumbência recursal, majoro em 100% os honorários advocatícios fixados na sentença, observando-se o limite máximo de 20% do valor da causa, na forma dos § 2º e 11, do art. 85 do CPC/2015.
NEGO PROVIMENTO à apelação.
É o voto.