Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0023341-83.2011.4.03.6100

RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE

APELANTE: SOCIETE AIR FRANCE

Advogado do(a) APELANTE: PAULO RICARDO STIPSKY - SP174127-A

APELADO: AGENCIA NACIONAL DE AVIACAO CIVIL - ANAC

Advogado do(a) APELADO: ARAKEN OLIVEIRA DA SILVA - SP95593

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0023341-83.2011.4.03.6100

RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE

APELANTE: SOCIETE AIR FRANCE

Advogado do(a) APELANTE: PAULO RICARDO STIPSKY - SP174127-A

APELADO: AGENCIA NACIONAL DE AVIACAO CIVIL - ANAC

Advogado do(a) APELADO: ARAKEN OLIVEIRA DA SILVA - SP95593

OUTROS PARTICIPANTES:

[ialima]

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

Apelação interposta pela Société Air France contra sentença que julgou improcedente o pedido nulidade do auto de infração 054/SAC-GL-2/2008 e da multa objeto do Processo Administrativo n.º 60800.078463/2009-30, referente ao descumprimento ao artigo 302, inciso II, alínea “u”, do Código Brasileiro da Aeronáutica, bem como fixou os honorários advocatícios em 10% do valor atribuído à causa (Id 94821689, p. 20/29). Opostos embargos de declaração (Id 94821689, p. 33/38), foram rejeitados (Id 94821689, p. 39/40).

 

Aduz (Id 94821689, p. 42/52) que:

 

a) não houve a indicação da infração específica praticada e apta à imposição da multa aplicada, uma vez que a conduta prevista no artigo 302, inciso III, alínea "u", do Código Brasileiro de Aeronáutica (Lei n.º 7.565/86) referente à infração de condições gerais de transporte, é demasiadamente genérica e carece de norma regulamentadora;

 

b) ocorreu a decadência do direito de constituição do crédito por suposta conduta contrária às regras gerais que regem o transporte aéreo de passageiros, conforme disposto no artigo 319 da Lei nº 7.565/86, que não foi alterada pela edição da Lei n.º 9.873/99;

 

c) as penalidades aplicadas com base no artigo 302 do Código Brasileiro de Aeronáutica, além de dependerem de regulamentação, estão submetidas aos limites do artigo 299 de até 1.000 valores de referência;

 

d) o valor de referência a ser considerado é o da UFIR - unidade fiscal de referência, em vigor por ocasião da publicação da Lei n° 7.565/86, conforme jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.

 

Em contrarrazões (Id 94821689, p. 58/70), a apelada requer o desprovimento do recurso.

 

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0023341-83.2011.4.03.6100

RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE

APELANTE: SOCIETE AIR FRANCE

Advogado do(a) APELANTE: PAULO RICARDO STIPSKY - SP174127-A

APELADO: AGENCIA NACIONAL DE AVIACAO CIVIL - ANAC

Advogado do(a) APELADO: ARAKEN OLIVEIRA DA SILVA - SP95593

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

V O T O

 

 

I - Dos fatos

 

Ação proposta por Société Air France contra a Agência Nacional de Aviação Civil - ANAC, com vista ao reconhecimento da nulidade do auto de infração 054/SAC-GL-2/2008 e da multa objeto do Processo Administrativo n.º 60800.078463/2009-30, em que foi sancionada em razão de avarias em bagagem.

 

II – Da aplicação da lei processual

 

Inicialmente, ressalta-se que a sentença recorrida foi proferida em 24.01.2013 (Id 94821689, p. 20/29), razão pela qual, aplicada a regra do tempus regit actum, segundo a qual os atos jurídicos se regem pela lei vigente à época em que ocorreram, o recurso será analisado à luz do Diploma Processual Civil de 1973 (Enunciados Administrativos n.º 01 e 03/2016, do STJ).

 

III – Da decadência

 

Afirma a apelante a ocorrência da decadência para imposição de sanção, na forma do artigo 319 da Lei n.º 7.565/86. Contudo, não lhe assiste razão, pois a Lei n.º 9873/99 refere-se especialmente aos prazos de exercício de ação punitiva por autoridade administrativa federal direta ou indireta. O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial n.º 1115078 (Tema 325), representativo da controvérsia, firmou o entendimento de que dois elementos são determinantes para aplicação da Lei 9.873/99: a natureza punitiva da ação administrativa e o caráter federal da autoridade responsável por essa ação.

 

Cumpre ressaltar que a Lei n.º 9.873/99, não obstante utilize-se do termo prescrição, estabeleceu verdadeiro prazo decadencial de cinco anos para que a administração apure o cometimento da infração e constitua o crédito que resulta do poder de polícia:

 

Art. 1º Prescreve em cinco anos a ação punitiva da Administração Pública Federal, direta e indireta, no exercício do poder de polícia, objetivando apurar infração à legislação em vigor, contados da data da prática do ato ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado.

 

Nesse sentido, confira-se:

 

ADMINISTRATIVO. EXECUÇÃO FISCAL. ANAC. MULTA. INFRAÇÃO AMBIENTAL. DECADÊNCIA. LEIS 9.873/99 E 11.941/09.

1. No caso da cobrança de multa administrativa aplicada por ente da Administração Pública Federal, no exercício de seu poder de polícia, têm lugar os ditames da Lei n.º 9.873/99, com as alterações promovidas pela Lei n.º 11.941/09. Por conseguinte, encontra-se o órgão autuante sujeito à observância de três prazos distintos: (a) um prazo decadencial de cinco anos para a apuração da infração e constituição do crédito, contado da data da infração ou, do dia em que a mesma houver cessado, se permanente ou continuada (artigo 1º), o qual poderá ser interrompido nas hipóteses do artigo 2º e aplicado inclusive às infrações perpetradas antes da Lei n.º 9.873/99, conforme a regra de transição prevista no artigo 4º; (b) um prazo de três anos para a conclusão do procedimento administrativo apuratório já iniciado e paralisado, figurando como uma espécie de "prescrição intercorrente" (artigo 1º, parágrafo 1º); e, finalmente, (c) um prazo prescricional de cinco anos para a cobrança da penalidade pecuniária aplicada, contado da constituição definitiva do crédito, verificada com o término do processo administrativo de apuração da infração e constituição da dívida, passível de interrupção nas situações elencadas pelo artigo 2º-A. 2. Transcorrido prazo superior a cinco anos entre os marcos interruptivos do prazo decadencial, resta configurada a decadência do direito de constituição do crédito, que justifica a extinção do executivo fiscal.

(TRF 4ª Região, AC 5007138-23.2011.4.04.7105, Terceira Turma, Rel. Maria Lúcia Luz Leiria, j. 21.09.2012)

 

No caso, verifica-se que entre 04.09.2007, data do fato que deu ensejo à lavratura do auto de infração 054/SAC-GL-2/2008, e a data da instauração do processo administrativo em 01.03.2011, não houve o decurso do prazo decadencial.

 

III – Da multa

 

Cinge-se a questão ao exame da legalidade da exigência da multa aplicada por descumprimento ao disposto no artigo 302, inciso III, alínea “u”, do Código Brasileiro da Aeronáutica, que assim dispõe:

 

Art. 302. A multa será aplicada pela prática das seguintes infrações:

(...)

III - infrações imputáveis à concessionária ou permissionária de serviços aéreos:

(...)

u) infringir as Condições Gerais de Transporte, bem como as demais normas que dispõem sobre os serviços aéreos;

 

A Portaria n.º 676/2000 do Comando da Aeronáutica dispôs sobre as condições gerais de transporte e assim estabeleceu acerca do extravio de bagagens:

 

Art. 33. O recebimento da bagagem, sem protesto, faz presumir o seu bom estado.

 

Parágrafo único. O protesto, nos casos de avaria ou atraso, far-se-á mediante ressalva lançada em documento específico ou por qualquer comunicação escrita encaminhada ao transportador.

 

Art. 35. A bagagem será considerada extraviada se não for entregue ao passageiro no ponto de destino.

 

Desse modo, constatada a existência de avarias na bagagem do passageiro Gian Luigi Fumagalli (Id 94818531, p. 62/67), verifica-se o cometimento da infração prevista no Código Brasileiro da Aeronáutica.

 

Relativamente ao valor da multa, a aplicação do artigo 20 da Resolução ANAC n.º 25/2008, com a indicação em moeda corrente não viola o disposto no artigo 299 do Código Brasileiro da Aeronáutica, porquanto em consonância com o poder regulamentar da agência reguladora estabelecido no artigo 47 da Lei n.º 11.182/2005.  Nesse sentido:

 

PROCESSO CIVIL E ADMINISTRATIVO. SENTENÇA “EXTRA PETITA”. NÃO CONFIGURADA. ANAC. AUTO DE INFRAÇÃO. EXTRAVIO DE BAGAGEM DE PASSAGEIRO. LEI 7.565/86. PRAZO PRESCRICIONAL. MULTA. LEGALIDADE. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA DESPROVIDA. APELAÇÃO DA PARTE RÉ E REMESSA NECESSÁRIA PROVIDAS EM PARTE.

1. Trata-se de ação ajuizada com o fito de obter a anulação do auto de infração n° 016/SAC-GL/2008, lavrado pela ANAC, em razão da suposta prática pela empresa autora da infração descrita no artigo 302, III, “u”, do Código Brasileiro de Aeronáutica.

(...)

3. A existência de protesto por atraso na restituição da bagagem, com constatação de sua efetiva ocorrência, comprova o descumprimento das "Condições Gerais de Transporte", a demonstrar a correta tipificação da hipótese ao artigo 302, III, "u", da Lei 7.565/86, por se configurar a infração administrativa de "extravio da bagagem", caracterizada pela falta de entrega ao passageiro no ponto de destino.

4. Mesmo que a condição de bagagem extraviada tenha perdurado por cinco dias, é certo que sua entrega dentro dos trinta dias, prevista no § 2° do artigo 35 da Portaria 676/2000 do Comando da Aeronáutica, não tem o efeito de afastar o atraso ocorrido na restituição, caracterizador da infração, mas apenas de excluir a necessidade de indenização ao passageiro.

(...)

7. A jurisprudência possui entendimento de que a atualização e conversão do valor da multa infracional em reais, prevista originalmente em "unidades de referência", por ato normativo da ANAC, não ofende o princípio da legalidade, por estar abrangida e limitada no poder regulamentar conferido à autarquia pelo artigo 47, I, da Lei 11.182/2005. Precedente.

8. A conduta caracterizada por “Infringir as Condições Gerais de Transporte, bem como as demais normas que dispõe sobre os serviços aéreos”, prevista na Resolução ANAC nº 25/2008, à época dos fatos, estava sujeita à aplicação de multa que variava de R$ 4.000,00 (quatro mil reais) a R$ 10.000,00 (dez mil reais).

(...)

11. Apelação da autora desprovida.

12. Apelação da parte ré e remessa necessária parcialmente providas.

(TRF 3ª Região, Terceira Turma, ApelRemNec 0004422-75.2013.4.03.6100, Rel. Juíza Federal Conv. Denise Aparecida Avelar, j. 23.07.2020, destaquei).

                                        

ADMINISTRATIVO. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. AGÊNCIA NACIONAL DE AVIAÇÃO CIVIL. EXTRAVIO DE BAGAGEM. MULTA. LEGALIDADE.

1. Inexiste qualquer ilegalidade em multa aplicada à companhia aérea, a partir de reclamação de passageira que noticiou o extravio de sua bagagem, nos termos do artigo 302, inciso III, alínea 'u', da Lei nº 7565/86 (Código Brasileiro de Aeronáutica - CBA), c/c os artigos 32 e 35 da Portaria ANAC nº 676/GC-05/2000.

2. A tabela de valores fixada pela ANAC na Resolução nº 25/2008, no exercício do poder regulamentar conferido pela Lei nº 11.182/2005, atende ao artigo 299 do CBA, meramente substituindo o parâmetro de multiplicação do valor de referência por valor fixo da multa, sem agravamento da sanção ou indevida inovação na ordem jurídica.

3. A infração restou devidamente configurada e a companhia aérea nada alegou de concreto que a afastasse, senão a responsabilidade dos funcionários aeroportuários, sem nada comprovar. O auto de infração atende aos requisitos legais, não se lhe podendo inquinar de nulidade por não conter o horário em que foi lavrado ou o endereço da autuada.

4. Apelação desprovida

(TRF 2ª Região, Sexta Turma Especializada, AC 201151015045452, Rel. Guilherme Couto de Castro, j. 18.08.2014, destaquei).

 

Por fim, as questões relativas ao demais artigos suscitados pelo apelante, quais sejam, 5º, incisos XXXIX e LV, e 37 da CF, 2º do Decreto n.º 4.657/72 (LINDB), bem como o Decreto n° 70.235/72, não têm o condão de alterar esse entendimento pelos motivos já apontados.

 

III – Do dispositivo

 

Ante o exposto, nego provimento à apelação.

 

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO. ANAC. AUTO DE INFRAÇÃO. AVARIAS EM BAGAGEM. LEI 7.565/86. DECADÊNCIA NÃO VERIFICADA. MULTA. LEGALIDADE. RECURSO DESPROVIDO.

- A sentença recorrida foi proferida em antes da vigência da Lei n.º 13.105/2015 (NCPC), razão pela qual, aplicada a regra do tempus regit actum, segundo a qual os atos jurídicos se regem pela lei vigente à época em que ocorreram, o recurso será analisado à luz do Diploma Processual Civil de 1973 (Enunciados Administrativo n.º 01 e 03/2016, do STJ).

- O Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Recurso Especial n.º 1115078 (Tema 325), representativo da controvérsia, firmou o entendimento de que dois elementos são determinantes para aplicação da Lei 9.873/99: a natureza punitiva da ação administrativa e o caráter federal da autoridade responsável por essa ação.

- A Lei n.º 9.873/99, não obstante utiliza-se do termo prescrição, estabeleceu verdadeiro prazo decadencial de cinco anos para que a administração apure o cometimento da infração e constitua o crédito que resulta do poder de polícia.

- Entre a data do fato que deu ensejo à lavratura do auto de infração e a instauração do processo administrativo, não houve o decurso do prazo decadencial.

- Ocorridas avarias na bagagem, verifica-se o cometimento da infração prevista no artigo 302, inciso III, alínea “u”, do Código Brasileiro da Aeronáutica.

- Relativamente ao valor da multa, a aplicação do artigo 20 da Resolução ANAC n.º 25/2008, com a indicação em moeda corrente não viola o disposto no artigo 299 do Código Brasileiro da Aeronáutica, porquanto em consonância com o poder regulamentar da agência reguladora estabelecido no artigo 47 da Lei n.º 11.182/2005.  Precedentes.

- Apelação desprovida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quarta Turma, à unanimidade, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do voto do Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE (Relator), com quem votaram a Des. Fed. MÔNICA NOBRE e o Des. Fed. MARCELO SARAIVA. Ausente, justificadamente, em razão de férias, a Des. Fed. MARLI FERREIRA (substituída pelo Juiz Federal Convocado SILVA NETO) , nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.